automação

Aura Popa e Kurt Schlegel, na abertura da conferência Gartner Data & Analytics, na semana passada em São Paulo - Foto: divulgação

IA cria uma inteligência coletiva unindo pessoas e máquinas em torno de um propósito

By | Tecnologia | No Comments

A cada dia, aplicações com inteligência artificial surgem nos mais diversos setores. O ChatGPT mostrou para as massas como essa tecnologia pode trazer grandes ganhos de produtividade, e isso ciou uma sensação de que a IA automatizará tudo por conta própria. Mas isso não é verdade: o ser humano ainda precisa supervisionar seu aprendizado e suas conclusões. Ainda assim, a colaboração inteligente entre máquinas e pessoas pode tornar possível coisas até então inimagináveis.

Esses foram alguns dos principais temas da conferência Gartner Data & Analytics, que aconteceu em São Paulo na terça e na quarta passada. Na palestra de abertura, Aura Popa, diretora-sênior, e Kurt Schlegel, vice-presidente da consultoria, fizeram uma analogia entre a inteligência coletiva do mundo animal e o que podemos fazer junto com a inteligência artificial.

Esse fenômeno se observa desde enxames de abelhas até matilhas de lobos. Nelas, cada indivíduo tem autonomia para tomar suas decisões, mas também trabalha para os objetivos do grupo. Dessa maneira, ele não apenas sobrevive, como também prospera, atingindo coletivamente ganhos que não conseguiria sozinho.

Segundo os executivos, a inteligência artificial funciona agora como um facilitador para as pessoas criarem valores inéditos juntas. Mas, para isso, as empresas precisam reorganizar seus modelos operacionais para dar autonomia e flexibilidade aos profissionais. Devem também ampliar sua educação para usos conscientes dos dados e da IA. Por fim, precisam distribuir autoridade e responsabilidade para que todos atuem com um propósito bem definido, em todos os níveis da organização.

É uma proposta interessante, neste momento em que ainda tateamos a inteligência artificial para encontrar formas positivas de usá-la. Em diversos momentos na conferência, ficou claro que não se deve delegar decisões críticas completamente à máquina, pois ela pode cometer erros graves. Fazer isso também aceleraria o temor generalizado de termos nossos empregos substituídos por robôs.


Veja esse artigo em vídeo:


“Desencadeamos uma nova era de inteligência coletiva, que combina inteligência humana e de máquina”, disse Schlegel. Segundo eles, para se atingir esses objetivos, as empresas precisam investir em estratégia, mas também se dedicar mais na execução.

“Concentre-se na execução e gaste mais tempo trabalhando em toda a empresa para descobrir como usar esses dados”, explicou Popa, que concluiu: “concentre-se nos fundamentos da governança e na maturidade da implantação, e olhe além dos resultados de curto prazo.”

Uma pesquisa do Gartner realizada no segundo trimestre de 2023, indicou que 75% dos CEOs já haviam experimentado a IA generativa, sendo que 64% não acham que exista exageros no que se fala dela e 62% já discutiram a IA com os conselhos de administração de suas empresas. Por outro lado, 53% dos líderes de tecnologia disseram não ter certeza se estão preparados para mitigar os riscos da IA.

Um bom caminho para se enfrentar esse desafio recai sobre os dados usados nas plataformas, incluindo a precisão, confiança e transparência nessas informações, além de sua proteção. Segundo a consultoria, organizações com práticas maduras de governança de dados têm 25% mais chance de ter sucesso com essas inovações.

Essa inteligência coletiva viabilizada pela IA abre um incrível caminho para melhorar as decisões de negócios, que passam a ser mais contextualizadas, conectadas e contínuas. Isso contrasta com o que se vê hoje: segundo o próprio Gartner, 65% dos entrevistados disseram usar dados para justificar uma decisão já tomada, normalmente pela pessoa mais bem paga na organização.

 

IA ajudando nas decisões

“Muitas escolhas de negócios ainda possuem poucos dados internos, e isso tem que mudar”, afirmou Pieter den Hamer, vice-presidente do Gartner. Para ele, as empresas precisam passar de “orientadas por dados” para “orientadas por decisões”. “É essencial abrir a caixa preta da tomada de decisões”, disse.

Frank Buytendijk, chefe de pesquisa do Gartner Futures Lab, sugeriu que poderemos ver, em poucos anos, plataformas de IA ocupando posições em conselhos de administração, e ele considera isso assustador. Segundo ele, um robô que soubesse tudo que os grandes executivos disseram ou escreveram não seria necessariamente útil, pois esse “superexecutivo” nunca existiu e nunca esteve na liderança de uma única companhia.

Mas ele não duvida que decisões de alto nível passem a ser cada vez mais auxiliadas (e até feitas) pela inteligência artificial. Isso poderia levar a um futuro distópico, com dois extremos. Em um deles, veremos a tomada de decisões e a liderança se tornando demasiadamente centralizadas por tecnologias digitais. “Isto eliminaria a autonomia das pessoas, e lhe falta a diversidade e a inclusão que levam a melhores decisões”, explicou. O extremo oposto é um cenário de excessiva distribuição, em que cada um faz suas próprias coisas, sem a visão do todo.

Gestores de diferentes áreas, mas principalmente aqueles ligados a implantações de inteligência artificial e análise de dados, devem cuidar para que não cheguemos a isso. A IA deve auxiliar na tomada de decisões, mas não pode responder sozinha por elas. Considerando que, em um tempo relativamente curto, todo mundo usará essa tecnologia no seu cotidiano, as pessoas devem ser educadas para compreender o que estão fazendo e se apropriar do processo, sedo responsáveis pelas consequências de suas decisões apoiadas pelas máquinas.

No final, o conceito de inteligência coletiva do mundo animal pode mesmo guiar nossos passos nesse mundo em transformação acelerada pela IA. Todos devemos ter autonomia para tomar mais e melhores decisões dentro do escopo de nossas atuações, mas elas devem estar sempre alinhadas com um objetivo maior, que vise o crescimento de onde estivermos e o bem-estar da sociedade como um todo.

 

Crianças com “laptop de US$ 100” do projeto “One Laptop Per Child”, criado por Nicholas Negroponte - Foto: OLPC/Creative Commons

Volta às aulas reacende debate sobre o lugar da tecnologia na escola

By | Educação | No Comments

Estamos em plena volta às aulas! Com os alunos, ressurge o debate sobre como usar a tecnologia na educação, com uma inteligência artificial cada vez mais poderosa. E a prefeitura do Rio de Janeiro jogou lenha na fogueira ao proibir, na sexta passada, que os alunos usem celulares nas escolas públicas municipais, mesmo no recreio.

Especialistas aprovam a decisão, que tem 30 dias para ser implantada. Já debatemos longamente, nesse mesmo espaço, como os celulares em sala de aula em atividades não acadêmicas roubam a atenção dos alunos e prejudicam profundamente seu aprendizado. No caso do recreio, eles atrapalham os processos de socialização entre as crianças, necessários para o seu desenvolvimento. Pela nova regra, os equipamentos devem ficar desligados ou silenciados na mochila do estudante, podendo ser usados apenas se o professor os solicitar para alguma atividade, ou em casos excepcionais, como alunos com algum problema de saúde.

A determinação é interessante para ampliarmos o debate sobre a digitalização do ensino. Nessa mesma época, no ano passado, os professores estavam em polvorosa devido ao então recém-lançado ChatGPT. Muitos achavam que não conseguiriam mais avaliar seus alunos e alguns temiam até perderem o emprego para as máquinas.

Passado um ano, nada disso aconteceu, até porque descobrimos que essa tecnologia ainda erra muito. Mas todo aquele burburinho serviu para, pelo menos, os professores repensarem os seus processos de avaliação. Em uma sociedade altamente digitalizada, não dá mais para só pedir que alunos entreguem textos escritos em casa.

Mas se sabemos o que não deve mais ser feito, ainda não há clareza sobre como usar todo esse poder digital de maneira criativa e construtiva com os estudantes, desde a infância até a universidade. A despeito dos riscos e problemas conhecidos, os alunos devem aproveitar o que ela também oferece de bom, de forma adequada a sua idade. Essa é uma lição de casa que todos nós temos que fazer.


Veja esse artigo em vídeo:


Há 15 anos, eu trabalhava com o desenvolvimento de conteúdos didáticos digitais e sistemas de apoio pedagógico. Era uma época em que Nicholas Negroponte, fundador do Media Lab, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), propunha o uso de notebooks de US$ 100 para crianças estudarem melhor com o apoio da tecnologia.

Essas máquinas chegaram a ser criadas e pude conhecer alguns modelos. Eram pequenas maravilhas tecnológicas para a época, a um preço convidativo. O projeto foi implantado em alguns países, mas em muitos casos (inclusive no Brasil) não evoluiu, não pela tecnologia, mas porque os professores não sabiam bem o que fazer com ela.

De certa forma, vivemos algo semelhante agora. Estamos cercados por telas, e as crianças têm acesso a elas cada vez mais cedo. Segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil, divulgada em 25 de outubro pelo Cetic.br (órgão de pesquisa ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil), 95% dos brasileiros entre 9 e 17 anos estão online, e 24% tiveram seu primeiro acesso até os seis anos de idade.

O ChatGPT popularizou a inteligência artificial, e muitas empresas correm para criar soluções educacionais com ela. Como exemplo, em maio, Salman Khan, fundador e CEO da Khan Academy, uma organização que oferece educação online gratuita, demonstrou uma ferramenta que auxilia professores e alunos. Ela não dava respostas aos estudantes, ajudando-os a pensar na solução dos problemas. Para professores, a ferramenta ajudava a planejar aulas engajadoras. Khan afirmou que, para os alunos, a IA atua como um tutor, enquanto, para os professores, age como um assistente.

Esse é um sonho antigo do Vale do Silício. Não tenho dúvidas que a tecnologia pode ajudar na educação: eu cresci com isso! Mas também sei que ela sozinha não resolve, nem mesmo a “IA tutora” de Khan. Uma educação eficiente em qualquer idade não se resume a conteúdo de qualidade ou tutores que façam provocações inteligentes. Ela depende também da humanidade dos professores, capazes de ensinar, mas também de engajar e acolher seus alunos além de suas necessidades pedagógicas.

De todo jeito, está na hora de repensarmos a educação à luz da tecnologia.

 

Celulares e IA como apoio

Vivemos um cenário paradoxal. Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), o excesso de telas sem orientação prejudica a aprendizagem e até a saúde mental de crianças e adolescentes. O órgão sugere também que a IA não seja usada antes dos 13 anos de idade. Por outro lado, a ausência de tecnologia põe estudantes em desvantagem educacional.

Devemos ter cuidado para não nos deslumbrarmos com as possibilidades da tecnologia nem tampouco rechaçá-la por temor do desconhecido. Isso significa que as escolas não podem abraçar inconsequentemente uma solução como a de Khan (que tem muitos méritos), especialmente como marketing, nem demonizar as telas na sala de aula, como alguns podem entender a determinação da prefeitura do Rio de Janeiro.

Precisamos ser guiados por consciência e equilíbrio. Vimos, no ano passado, a tentativa do governo do Estado de São Paulo de abandonar os livros, que seriam substituídos por questionáveis slides produzidos pelo próprio governo. Isso sim é um uso inadequado da tecnologia, reduzindo profundamente o papel do professor.

Há muito tempo, a sociedade brasileira debate a “atualização” e a “utilidade” dos currículos escolares. E nos últimos anos, uma parcela da população aprendeu a demonizar os professores. Para esses, quanto menos professor, melhor, e a inteligência artificial poderia ser a resposta a suas preces.

Naturalmente a escola precisa estar alinhada ao nosso mundo em constante transformação. Mas devemos ter cuidado para não reduzi-la a algo meramente utilitário. A escola deve principalmente formar cidadãos conscientes e viáveis, capazes de lidar com os desafios da sociedade e melhorá-la, e isso não se faz só com a capacidade de ler ou de fazer contas: são necessárias empatia, inteligência emocional, pensamento livre e humanidade.

Quem ensina isso são os professores e o melhor lugar para uma criança e um adolescente aprenderem é a escola. A tecnologia deve ser vista como uma parceira valiosa nesse processo de transformação, não uma substituta.

Por tudo isso, tenho visto professores em algumas listas de “profissões do futuro”. Mas naturalmente serão aqueles que usam a tecnologia para ampliar seus próprios limites e os de seus alunos. O amanhã pertence a quem domine a tecnologia, sem perder nada de sua humanidade.

 

Cena de “O Exterminador do Futuro” (1984), em que máquinas inteligentes querem exterminar a humanidade - Foto: reprodução

Qual será a próxima vítima da inteligência artificial?

By | Tecnologia | No Comments

No dia 13, o sindicato dos atores de Hollywood se juntou à greve do sindicato dos roteiristas dos EUA, que acontece desde maio. É a primeira vez em 63 anos que as duas organizações cruzam os braços ao mesmo tempo, o que já impacta a produção de filmes e séries. Entre reivindicações mais convencionais, como melhores condições de trabalho e salários, os dois grupos preocupam-se com o impacto que a inteligência artificial terá em suas profissões.

Já debati longamente, nesse mesmo espaço, sobre a substituição de profissionais por essa tecnologia. Mas esse caso é emblemático porque são as primeiras grandes entidades trabalhistas que colocam isso na pauta de reivindicações para seus patrões.

É curioso porque, no atual estágio de desenvolvimento da inteligência artificial, não se vislumbra que ela substitua consistentemente atores ou roteiristas em grandes produções, como filmes ou séries. Isso não quer dizer que, com o avanço galopante de sua evolução, não possa acontecer em algum momento. Portanto, a reivindicação dos sindicatos visa uma proteção futura, contra um concorrente digital implacável que ainda está por vir.

O que me preocupa, no presente, são empresas de todos os setores que possam estar se preparando para usar a IA, do jeito que está, para substituir trabalhadores de “níveis mais baixos da cadeia alimentar”, mesmo quando isso resulte em produtos ou atendimentos piores para os consumidores. Aqueles dispostos a cortar custos de forma dramática, irresponsável e impensada representam um perigo muito maior que a tecnologia em si.

Como dizem por aí, “isso é tão Black Mirror!”


Veja esse artigo em vídeo:


Não me interpretem mal! Sou um entusiasta da inteligência artificial bem usada, e entendo que esse movimento não tem volta. E nem deveria ter: quando aplicada de forma consciente e responsável, a IA traz inegáveis benefícios a empresas e a indivíduos. Nós mesmos já somos muito beneficiados em nosso cotidiano, em incontáveis aplicativos em nosso celular, que só existem graças a ela.

Mas a inteligência artificial não é uma panaceia. E isso fica claro com o popularíssimo ChatGPT, lançado em novembro e que provocou uma explosão de discussões e de uso da IA, além de uma corrida para empresas demonstrarem que estão nesse barco. Depois do frisson criado pela sua capacidade de manter conversas consistentes sobre qualquer assunto, as pessoas começaram a perceber que muito do que ele fala são verdadeiras bobagens. A despeito dos melhores esforços de seus desenvolvedores, ainda é uma ferramenta sem compromisso com a verdade.

Mas isso não impede que pessoas e empresas usem a plataforma como um oráculo. Gestores vêm confiando em respostas da plataforma para oferecer serviços. Alguns chegam a alimentar o sistema com dados sigilosos de seus clientes, uma calamidade se considerarmos que a ferramenta não promete nenhuma segurança nisso.

Da mesma forma, algumas pessoas têm usado o ChatGPT para funções para as quais não foi desenvolvido, como “fazer terapia” com um sistema incapaz de desenvolver empatia ou que sequer sabe realmente o que está falando: todas essas plataformas simplesmente encadeiam palavras seguindo análises estatísticas a partir de uma gigantesca base de informações com a qual foram “treinadas”.

O problema não é, portanto, usar a tecnologia, e sim usar mal uma coisa boa! Se o objetivo for somente economizar custos, essa é uma “economia porca” que resulta em uma queda dramática na entrega ao público.

 

Exterminador do Futuro

No dia 18, James Cameron, diretor e roteirista de sucessos como “Avatar” (2009) e “Titanic” (1997), deu uma entrevista à rede de TV canadense CTV News, afirmando que a inteligência artificial não é capaz de produzir roteiros. “Não acredito que uma mente desencarnada, que apenas regurgita o que outras mentes vivas disseram sobre a vida que tiveram, sobre amor, sobre mentira, sobre medo, sobre mortalidade, tenha algo que vá comover o público”, disse.

Há um ponto essencial na fala de Cameron, que também foi diretor e roteirista de “O Exterminador do Futuro” (1984), em que máquinas inteligentes tentam eliminar a humanidade: precisamos entender que a inteligência artificial não é realmente criativa!

Ela apenas agrupa padrões e estilos para suas criações, mas não tem algo essencial a qualquer artista: a subjetividade. A nossa história de vida faz com que os padrões que aprendemos sejam inspiração para nossa criatividade, e não uma limitação. A máquina, por outro lado, fica restrita a eles, sendo incapaz de alterá-los.

Mas eu não me iludo: o que puder ser automatizado será. Funções cujos trabalhadores atuam de forma previsível, seguindo regras muito estritas, já estão sendo substituídas por robôs. Em situações como essas, a máquina desempenha as tarefas de maneira mais rápida, eficiente e barata. A qualidade das entregas ao cliente pode até melhorar!

Nos demais casos, a inteligência artificial não deveria ser usada como uma ferramenta para substituir profissionais, e sim para torná-los mais eficientes em suas atividades, oferecendo-lhes sugestões e informações que jamais conseguiriam ter sozinhos, pelas suas limitações humanas.

Em outra frente, o Google está testando, com alguns jornais, um sistema baseado em inteligência artificial capaz de escrever textos a partir de informações que lhe forem apresentadas. Em um comunicado, a empresa disse que “essa ferramenta não pretende e não pode substituir o papel essencial que os jornalistas têm em reportar, criar e verificar os fatos”, devendo ser usado como um apoio a esses profissionais, liberando seu tempo para tarefas mais nobres. Resta saber se, uma vez lançado, o produto não será usado por editores para enxugar mais as já minguadas redações, mesmo que isso resulte em publicações suscetíveis a erros e menos criativas.

Na mesma entrevista, Cameron explicou que, sobre os roteiros, “nunca é uma questão de quem os escreveu, mas de serem boas histórias”. Só faltou definir, de maneira inequívoca, o que é “boa”. Alguns filmes têm roteiros escritos por humanos que são muito ruins. Para escrever aquilo, talvez a inteligência artificial bastasse.

Isso vale para roteiristas, atores, jornalistas e qualquer profissional que se sinta ameaçado pela tecnologia. A melhor proteção que podem ter contra os robôs é fazer melhor que o que eles são capazes de entregar.

Nós, como clientes de todos esses serviços, também temos um papel importante: não podemos aceitar que produtos ruins nos sejam empurrados. Muitos gestores tentarão usar esses recursos assim! Com isso, perderemos nós e os profissionais, todos vítimas dessa “tecnoganância”. Isso não pode passar e muito menos se normalizar.

 

Matt Hicks, CEO da Red Hat, durante a abertura do Red Hat Summit 2023: “esse é o momento da IA” - Foto: Paulo Silvestre

Inteligência artificial produz coisas incríveis, mas não podemos perder nosso protagonismo

By | Tecnologia | No Comments

Estive na semana passada em Boston (EUA), participando do Red Hat Summit, maior evento de software open source do mundo. Apesar desse modelo de desenvolvimento de programas aparecer a todo momento, a estrela da festa foi a inteligência artificial. E algo que me chamou a atenção foi a preocupação da Red Hat e de seus executivos em demonstrar como essa tecnologia, por mais poderosa que seja, não deve fazer nada sozinha, precisando ser “treinada” com bons dados, com o ser humano ocupando o centro do processo.

O próprio CEO, Matt Hicks, abriu a conferência dizendo que esse é o “momento da IA”. Muitos dos principais anúncios do evento, como o Ansible Lightspeed e o OpenShift AI, embutiam um incrível poder da inteligência artificial na automação de tarefas, como geração de código a partir de pedidos simples em português, liberando o tempo das equipes para funções mais nobres.

Isso não quer dizer, entretanto, que os profissionais possam simplesmente “terceirizar” o raciocínio e a sua criatividade para as máquinas. Pelo contrário, por mais fabulosas que sejam essas ferramentas, elas pouco ajudam se o usuário não conhecer pelo menos o essencial do que os sistemas produzem.

Tanto é verdade que assistimos a casos de pessoas e de empresas que enfrentam grandes contratempos por usar plataformas generalistas de inteligência artificial (como o ChatGPT) de maneira descuidada. Precisamos ter em mente que, por mais que ela chegue a parecer mágica, não é infalível!


Veja esse artigo em vídeo:


Foi o que aconteceu recentemente com o advogado americano Steven Schwartz, da firma Levidow, Levidow & Oberman, com mais de 30 anos de experiência: ele enfrentará agora medidas disciplinares por usar o ChatpGPT para pesquisas para o caso de um cliente que processava a Avianca. Tudo porque apresentou à corte um documento com supostos casos semelhantes envolvendo outras empresas aéreas.

O problema é que nenhum desses casos existia: todos foram inventados pelo ChatGPT. Schwartz ainda chegou a perguntar à plataforma se os casos eram reais, o que ela candidamente confirmou. É o que os especialistas chamam de “alucinação da inteligência artificial”: ela apresenta algo completamente errado como um fato, cheia de “convicção”, a ponto de conseguir argumentar sobre aquilo.

“Nessa nova fase, temos que conhecer a pergunta para qual queremos a resposta”, explicou-me Hicks, em uma conversa com jornalistas durante o Summit. “Se você for um novato, poderá criar melhor, mais rápido; se for um especialista, poderá melhorar muito o que faz e usar seu domínio para refinar a entrega”, concluiu.

Para Paulo Bonucci, vice-presidente e gerente-geral da Red Hat para a América Latina, “não adianta você chegar com inteligência artificial assustando a todos, dizendo que vai faltar emprego”. Para o executivo, a transformação que a inteligência artificial promoverá nas empresas passa por uma transformação cultural nos profissionais. “A atenção principal enquanto se desenvolvem os códigos e as tecnologias de inteligência artificial são as pessoas, são os talentos”, acrescenta.

Chega a ser reconfortante ver lideranças de uma empresa desse porte –a Red Hat é a maior empresa de soluções empresariais open source do mundo– demonstrando essa consciência. Pois não se enganem: a inteligência artificial representa uma mudança de patamar tecnológico com um impacto semelhante ao visto com a introdução dos smartphones ou da própria Internet comercial.

A diferença é que, no mundo exponencial em que vivemos, as transformações são maiores e os tempos são menores. E nem sempre as empresas e ainda mais as pessoas têm sido capazes de absorver esse impacto.

 

Corrida do ouro

Infelizmente o que se vê é uma corrida tecnológica, que pode estar atropelando muita gente por descuido e até falta de ética de alguns fabricantes. “Existem empresas grandes que fazem anúncios quando sua tecnologia não está madura”, afirma Victoria Martínez, gerente de negócios e data science da Red Hat para a América’ Latina. “Essa corrida tornou-se muito agressiva”.

É interessante pensarmos que as pesquisas em inteligência artificial existem há décadas, mas o assunto se tornou um tema corriqueiro até entre não-especialistas apenas após o ChatGPT ser lançado, em novembro. Não é à toa que se tornou a ferramenta (de qualquer tipo) de adoção mais rápida da história: todos querem usar o robô para passar para ele suas tarefas. E, graças a essa corrida, isso tem sido feito de maneira descuidada, pois alguns fabricantes parecem não se preocupar tanto com perigos que isso pode representar.

“Isso é uma coisa que a gente deveria estar discutindo mais”, sugere Eduardo Shimizu, diretor de ecossistemas da Red Hat Brasil. “Entendo que nós, não só como especialistas em segurança ou em tecnologia, mas como seres humanos, precisamos discutir esses temas éticos da forma de usar a tecnologia”, acrescenta.

Martínez lembra das preocupações que educadores vêm apresentando sobre o uso de plataformas de IA generativas, como o próprio ChatGPT por crianças. “Não podemos esquecer de aprender o processo”, alerta. Em uma situação limite, seria como entregar uma calculadora a uma criança que não sabe sequer conceitualmente as quatro operações básicas. Ela se desenvolveria como um adulto com seríssimos problemas cognitivos e de adaptação à realidade.

Por isso, a qualquer um que não saiba fazer uma divisão deveria ser proibido usar uma calculadora. Por outro lado, para quem domina suficientemente a matemática, a calculadora e mais ainda uma planilha eletrônica são ferramentas inestimáveis.

É assim que devemos encarar essa mudança de patamar tecnológico. Como escreveu Hicks em um artigo recente, “não sabemos o que o futuro reserva –nem mesmo o ChatGPT é precognitivo ainda. Isso não significa que não podemos antecipar quais desafios enfrentaremos nos próximos meses e anos.”

Quaisquer que sejam, quem deve estar no comando somos nós. Os robôs, por sua vez, serão ajudantes valiosíssimos nesse processo.


Você pode assistir à íntegra em vídeo das minhas entrevistas com os quatro executivos da Red Hat. Basta clicar no seu nome: Matt Hicks, Paulo Bonucci, Victoria Martínez e Eduardo Shimizu.

 

Um terço dos brasileiros teme ser trocado por um robô

By | Tecnologia | No Comments

Cerca de um terço dos trabalhadores no Brasil e no mundo tem medo de perder seus empregos para uma máquina nos próximos três anos. Apesar de esse número estar diminuindo (em 2019, era 50%), ainda é muito alto e demonstra que existem graves falhas na formação profissional.

Esses indicadores fazem parte da “Pesquisa Global de Esperanças e Medos da Força de Trabalho”, realizada pela consultoria PwC e apresentada no último dia 24 durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça). Na sua elaboração, foram ouvidas 52.195 pessoas em 44 países, inclusive no Brasil.

Diante desse receio, o estudo traz ainda que os trabalhadores esperam que as empresas os ajudem a desenvolver suas competências digitais e tecnológicas. Isso faz ainda mais sentido em um país como o nosso, em que a educação falha nessa tarefa. Mas 35% dos profissionais no Brasil e 39% no mundo dizem que seus empregadores também não fazem isso bem.


Veja esse artigo em vídeo:


Um fato curioso do levantamento da PwC é que os que se sentem mais ameaçados pela tecnologia não são os mais velhos, como se poderia imaginar. Entre os trabalhadores da “Geração Z” (nascidos a partir de 1997), 38% temem ser substituídos pela automação digital nos próximos três anos, contra apenas 19% dos “Baby Boomers” (nascidos entre 1946 e 1964). Eles também são os que mais sentem falta de treinamento tecnológico de seus empregadores: 44% contra 29% dos “boomers”.

Não por coincidência, os mais jovens são os menos satisfeitos com seu trabalho. Os pesquisadores afirmam que os profissionais que sentem ter habilidades valorizadas pelo mercado são mais propensos a se sentir satisfeitos com seu trabalho (70%), a ser ouvidos pelos seus gerentes (63%) e a ter dinheiro sobrando após pagar suas contas (56%).

Investir no desenvolvimento de habilidades digitais e capacitação técnica de seus quadros torna-se, portanto, cada vez mais crucial para as empresas. “O investimento deve ser guiado por um princípio de equidade, fortalecendo as capacidades dos funcionários qualificados e fornecendo vias de acesso para aqueles que não possuem essas habilidades”, explica Carol Stubbings, líder global de serviços jurídicos e tributários da PwC. Para a executiva, “o investimento em todo o mix de habilidades é bom para as empresas, bom para os indivíduos e bom para a sociedade.”

O poder de barganha pende para o funcionário, mas, no Brasil, o desemprego alto atrapalha isso. Na terça passada, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que essa taxa foi de 10,5% no trimestre encerrado em abril. Apesar de estar em queda, ainda são desempregados demais para se observar aqui um fenômeno visto em economias mais sólidas, especialmente a dos EUA.

Trata-se da chamada “Grande Renúncia”: muitas pessoas estão de demitindo para facilmente se recolocar em outras empresas, com melhores condições. A PwC explica que, se esse fenômeno nos ensinou alguma coisa, é que não há “lealdade eterna” de funcionários. As empresas precisam estar atentas a essas demandas ou perderão cada vez mais profissionais em diferentes níveis. Mas a maioria não presta atenção nisso!

No Brasil, além dos 11,3 milhões de desempregados, a situação ainda se agrava pela falta de acesso a recursos digitais de qualidade para a maioria da população. Outro estudo, batizado de “O abismo digital no Brasil”, publicado em março pela mesma PwC e pelo Instituto Locomotiva, demonstra que apenas 29% dos brasileiros são “plenamente conectados”. Do outro lado, 20% são totalmente “desconectados”.  Entre eles, estão 26% “parcialmente conectados” e os 25% “subconectados”.

Perdem o profissional, a empresa e a sociedade.

 

Desenvolvendo habilidades

As companhias precisam compreender, de uma vez por todas, que a capacitação digital de seus funcionários se tornou fundamental para seus negócios, que vêm se digitalizando de maneira exponencial há anos. Isso mudou como trabalhamos, estudamos, compramos, nos divertimos e nos relacionamos com tudo e todos!

O estudo sobre o abismo digital brasileiro apontou que profissões tradicionais, que respondiam por 15,4% das vagas em 2020, encolherão para 9% até 2025. Já as ligadas à tecnologia passarão de 7,8% a 13,5%. No Brasil, o setor de tecnologia demandará 800 mil profissionais até 2025, mas o déficit deve ficar em 530 mil vagas não preenchidas.

Como as universidades não estão suprindo essa mão de obra na quantidade e com a qualidade que o mercado pede, resta mesmo às empresas realizarem o “upskilling”, termo em inglês que indica o desenvolvimento de novas habilidades.

A mesma PwC afirma que, se a força de trabalho for devidamente aprimorada até 2028, isso pode resultar em um aumento do PIB latino-americano em 7,7% até 2030, o equivalente a US$ 12,5 bilhões. Mas também estamos “patinando nisso”: globalmente, 40% das empresas estão fazendo “upskilling”, mas, no Brasil, só 27% investem nisso.

Uma terceira pesquisa, essa feita pela escola de negócios francesa Insead, coloca o Brasil como 75º no ranking de competitividade global de talentos, entre 134 países. Ele se baseia na capacidade de os países desenvolverem profissionais e de atrair e reter seus talentos. Na América Latina, ocupamos uma modesta 9ª posição.

Diante de tudo isso, gestores de empresas de todos os portes e segmentos precisam sair de sua zona de conforto. “Os trabalhadores não estão apenas procurando por uma remuneração decente: eles querem mais controle sobre como trabalham e querem obter maior significado do que fazem”, afirma Bob Moritz, presidente global da PwC. “Ao adquirir competências, os trabalhadores podem obter o controle sobre o trabalho que procuram”, conclui.

Apesar de os profissionais desejarem que seus empregadores atuem diretamente na solução de seu desenvolvimento tecnológico, isso não desobriga governos e escolas de igualmente atuarem nisso. Mas essa tarefa precisa ser feita de maneira integrada e inteligente, colocando os recursos onde realmente forem mais necessários.

Essa é uma deficiência estrutural de vários países, mas fica mais grave no Brasil, graças a alguns de nossos problemas históricos, como políticas públicas sem foco e sem continuidade de um governo para outro, e educação deficiente. Enquanto a sociedade não se organizar para trabalhar de maneira coordenada para o crescimento de todos, continuaremos vendo nossa produtividade caindo, tornando nossas empresas e nossos profissionais menos competitivos internacionalmente.

 

Videodebate: o robô vai substituir até o seu corpo

By | Tecnologia | No Comments

A crise está brava! Se isso já não bastasse para criar incertezas e grandes dificuldades para todos, os robôs e os sistemas de inteligência artificial estão cada vez mais eficientes na execução de tarefas que antes eram exclusivas dos humanos. Em alguns casos, são até mesmo capazes de simular os corpos dos trabalhadores!

O que vai sobrar para nós fazermos?

Muita calma nessa hora! Sim, é verdade que a substituição de trabalhadores por robôs só cresce. Mas nem tudo está perdido.

Nesse cenário, despontam duas certezas: o que puder ser automatizado será, e não dá para continuar na zona de conforto. Quem quiser não apenas sobreviver a essa nova revolução, como ainda aproveitar o momento para se destacar precisa fazer as coisas de maneira diferente.

Quer saber como? Veja no meu vídeo abaixo! E depois compartilhe aqui com todos como você vê esse avanço da tecnologia sobre os trabalhos, e como superar isso.

Ou então fique continue na mesma, e aguente as consequências.


Reflexão: como se preparar para as profissões do futuro?

By | Educação | No Comments

Nesta quinta, tive duas conversas muito instigantes sobre o futuro do trabalho. Há um consenso: rumamos para uma ruptura, especialmente em países ocidentais, em que as pessoas podem chegar a um ponto de não terem mais o que fazer.

Isso se deve à crescente automação, incluindo recursos cada vez mais incríveis de inteligência artificial. Ocorre também pelos países orientais, especialmente China e Índia, que, graças à digitalização e às telecomunicações, oferecem mão de obra mais barata e qualificada para realizar tarefas que antes eram feitas por profissionais daqui.

Esse movimento sempre aconteceu, mas, se na Revolução Industrial a sociedade teve uns 200 anos para encontrar novos trabalhos, isso agora precisa ser refeito a cada década (se muito!).

Curiosamente, hoje vi uma reportagem sobre novos trabalhos na Business Insider (https://read.bi/2GGgn3v). Todos muito bacanas, mas que exigem excelente formação. Mas as pessoas que estão perdendo seus empregos são justamente as menos preparadas.

Moral da história: sim, muitos trabalhos já estão sendo substituídos por máquinas, e outros tantos estão criados. Mas os profissionais precisam urgentemente melhorar sua formação!

Se quiserem saber o que penso disso, recomendo a leitura do meu artigo “A inteligência artificial só roubará o seu emprego se você deixar”: https://www.linkedin.com/pulse/intelig%C3%AAncia-artificial-s%C3%B3-roubar%C3%A1-o-seu-emprego-se-silvestre-jr-/

Daí pergunto: como vai a nossa educação mesmo?

Como será quando um robô tomar seu trabalho?

By | Tecnologia | 2 Comments

Foto: Visualhunt/Creative Commons

Podemos estar assistindo à gestação de uma crise de empregos global sem precedente. A troca de pessoas por máquinas na indústria não é uma novidade, mas isso já se observa também em todos os setores da economia, e com uma taxa de adoção cada vez mais intensa. Não se trata só do velho embate “máquina versus humanos”: chegará o momento em que a maioria das atividades produtivas será feita por robôs? Mais dramático que isso: quando isso acontecer, as pessoas ainda terão uma função na sociedade e meios para se sustentar?

Já debatemos aqui o fato de muitos profissionais e empresas estarem se tornando obsoletos diante de novas iniciativas que oferecem produtos ou serviços melhores e mais baratos. O enfoque, naquele outro artigo, era de pessoas ocupando o lugar de outras pessoas, auxiliadas pela tecnologia. E já foi o bastante para muita gente conversar comigo sobre sua preocupação com o tema. Mas a revolução mais comovente deve vir das máquinas, justamente por tirarem o ser humano da equação.


Vídeo relacionado:


Na semana passada, a Foxconn, empresa chinesa que monta os iPhones, substituiu 60 mil postos de trabalho da sua unidade na província de Kunshan por robôs. Mesmo em um país acostumado a quantidades superlativas, é muita gente perdendo o emprego: 55% do total da fábrica.

A empresa diz que, “a longo prazo”, não haverá diminuição de postos de trabalho, pois funcionários poderão passar a fazer atividades mais nobres e menos repetitivas. Esse é o discurso típico de quem automatiza uma linha de montagem. Mas o fato é que, a curto prazo, o pessoal foi para a rua mesmo! Tudo para reduzir custos e atender metas de produção da Apple. E não há nenhuma garantia que essas pessoas sejam reaproveitadas pela empresa. Pior: não se sabe sequer se serão mesmo capazes de aprender as tais tarefas “mais nobres”.

Naturalmente algumas profissões estão mais em risco que outras. A BBC criou um infográfico interativo a partir de uma pesquisa da Universidade de Oxford, que avalia os riscos de automação de 365 profissões nos próximos 20 anos. Apesar de levar em consideração dados do Reino Unido, os resultados podem ser extrapolados para profissionais de todo o mundo. Mais cedo ou mais tarde, a automação impactará quase todos, mas a pesquisa de Oxford demonstra que, para algumas profissões, isso já acontece e de uma maneira absolutamente determinante, forçando categorias inteiras de profissionais a se reinventar.

Impossível não pensar na Revolução Industrial, cujos raízes remontam na Inglaterra do século 18, e os processos industriais acabaram por quase extinguir os artesãos de diferentes segmentos. A transição para um novo formato social e econômico foi traumática, contando até com o surgimento de movimentos que resistiam à automação, como o ludismo.

Porém, apesar de todo aquele drama, o mundo acabou se reorganizando, com uma grande evolução da humanidade. Os artesãos realmente ficaram para trás, mas as pessoas encontraram um novo caminho.

Mas qual será o caminho a seguir agora?

 

Futuro Blade Runner?

A mesma tecnologia que extingue profissões cria outras completamente novas.

Por exemplo, estamos assistindo ao fortalecimento do Movimento Maker, em que pessoas começam a produzir, até mesmo em casa, coisas incríveis e tecnologicamente sofisticadas. Além disso, a tecnologia digital também permite que paradigmas sejam quebrados, subvertendo modelos de negócios consolidados há décadas. O fenômeno dos youtubers, por exemplo, já pode ser considerado uma ameaça à TV, especialmente se olharmos para o público mais jovem. E a economia compartilhada já deixou de ser uma tendência para fazer parte da vida de milhões de pessoas, para desespero de donos de negócios tradicionais, que ganharam novos e eficientíssimos concorrentes (a guerra do Uber contra os táxis é um dos exemplos mais notáveis disso).

Seria ótimo se todo esse pessoal que perdeu o emprego para os robôs conseguisse pular nesse novo barco. Mas sejamos realistas: são poucos aqueles que conseguiriam fazer isso. E haveria mercado para todos? Usando o próprio YouTube como exemplo, existem uns poucos milionários da plataforma, e um mar de microprodutores de vídeos que nunca ganharão dinheiro com isso, nem mesmo sairão do anonimato.

A turma de 40 anos ou mais deve se lembrar do filme Blade Runner, de 1982, em que as ruas de uma Los Angeles decadente de 2019 eram tomadas por engenheiros genéticos que criavam seres artificiais para lucrar ou simplesmente se divertir. É isso que nos espera?

E qual a saída para quem não se encaixa em nada disso?

 

Sobrevivendo à automação

No dia 5 de junho, 78% dos suíços rejeitaram, em plebiscito, uma ideia de renda mínima para todo cidadão do país. Pela proposta, cada adulto receberia mensalmente 2.500 francos suíços (R$ 9.000), estando empregado ou não, enquanto cada criança receberia 625 francos suíços (R$ 2.260). Para quem trabalha, a medida faria diferença apenas para quem ganhasse menos que os R$ 9.000 (o salário médio na Suíça gira em torno de R$ 21.700).

Para os criadores da proposta, ela permitiria que as pessoas pudessem se concentrar em atividades que gostassem, e até mesmo voluntariado. E, de quebra, resolveria o problema de desempregados pela adoção de robôs. Acabou sendo rejeitada porque os suíços preferiram manter outros benefícios sociais que já têm (que seria substituídos pela renda mínima). Além disso, o governo temia que a proposta enfraquecesse o serviço público, aumentasse impostos e prejudicasse o consumo.

É pouco provável que uma proposta como essa seja viável no Brasil. Apesar de já ser lei aqui desde 2004, ainda não está valendo porque não foi regulamentada. Os principais entraves são caixa para se pagar um valor que permita um bem-estar efetivo aos eventuais beneficiados, o tamanho da população brasileira e a nossa corrupção endêmica.

Então, já que a renda mínima não passou nem na rica Suíça, os profissionais precisam dar seu jeito para fazer frente à invasão dos robôs no mercado de trabalho. E ironicamente a melhor maneira de se fazer isso é ser cada vez mais humano.

Os robôs são imbatíveis em tarefas que exigem precisão, repetição e montagens complexas. Mas eles são muito fracos em qualquer atividade que envolva relacionamento social, decisões diante de imprevistos, correr riscos e valer-se de sentimentos.

Trocando em miúdos, vale a pena investir em profissões cujas tarefas não possam ser descritas e controladas por algum tipo de programa de computador. Todo o resto caminhará cada vez mais rapidamente para os robôs.

Ou seja, faça o que os robôs não podem fazer. Pelo menos não ainda.

Além disso, profissionais têm a obrigação de se manter atualizados. Foi-se o tempo em que o que se aprendia na faculdade era garantia de um bom desempenho profissional até a aposentadoria. Com avanços tecnológicos e sociais galopantes, é preciso estar sempre estudando. Essa ação é inegociável.

Da mesma forma, as empresas têm o dever de incentivar a iniciativa e a inovação em seus quadros. Prestar atenção no que seus próprios funcionários e consumidores dizem pode ser muito mais valioso que qualquer robô. O mundo está em constante mudança e novas oportunidades podem estar a uma quadra ou do outro lado do planeta.

Por tudo isso, a melhor maneira de garantir seu lugar ao sol em uma sociedade cada vez mais automatizada é exercendo sua humanidade. Não será necessário se comportar como os luditas, e sair quebrando todas as máquinas pelo caminho para passar por mais essa Revolução Industrial.


Artigos relacionados:

 

 

Robôs podem ajudar no combate à “coisificação” dos empregos

By | Educação, Jornalismo, Tecnologia | One Comment
Cena do filme “A Invenção de Hugo Cabret” – Foto: divulgação

Cena do filme “A Invenção de Hugo Cabret”

Pouca gente sabe, mas já há algum tempo robôs escrevem parte do noticiário que consumimos. Mas longe de ser uma ameaça aos jornalistas, esse fenômeno pode ajudar a combater o desemprego, trazendo alguma luz sobre o processo de “coisificação” dos trabalhos de qualquer categoria profissional.

Esses jornalistas-robôs não são máquinas humanoides, e sim programas de computador conectados a bancos de dados de diferentes tipos. Eles procuram permanentemente por determinadas informações e, quando as encontram, produzem textos em uma fração de segundo, com uma qualidade que virtualmente impossibilita diferenciar um texto de um desses robôs de um escrito por uma pessoa.


Vídeo relacionado:


Mas os robôs não são capazes de escrever qualquer texto (pelo menos ainda não). Eles são muito eficientes na produção de material fortemente baseado em números, como resultados financeiros ou placares esportivos. Os programas não têm inteligência artificial para artigos que exijam abstração, mesmo a partir daqueles mesmo dados. Não conseguem, por exemplo, escrever um texto como este que você está lendo agora.

Robôs não ameaçam, portanto, os empregos dos jornalistas. Na verdade, eles podem lhes tirar o fardo de matérias enfadonhas, para que possam produzir reportagens e artigos de alto valor intelectual.

Infelizmente, quem ameaça esses empregos são os próprios jornalistas e as empresas de comunicação.

Neste momento de crise aguda da imprensa tradicional, os jornalistas mais experientes (e caros) são demitidos por economia. Sobram os novatos, que, além de não ter os necessários calos da profissão, acabam sobrecarregados de tarefas, e topando tudo para não perder o emprego.

O resultado previsível são textos com pouquíssimo esforço de reportagem e quase nenhum requinte intelectual. Esses profissionais ficam esmagados entre denuncismo e jornalismo palaciano de um lado e números do outro, e pressionados pelo volume de produção pelos veículos. Ou seja, os textos que produzem ficam tão limitados quanto os dos robôs, e talvez menos precisos.

Então não precisamos mais de jornalistas?

 

O valor do conhecimento

Jornalistas não estão sozinhos diante desse drama: profissionais de muitas áreas começam a sofrer concorrência de sistemas automatizados. Mas novamente aqui eles não são as reais ameaças aos seus empregos. O verdadeiro risco está na “coisificação” de seus trabalhos.

Assim como na imprensa, empresas de todos os setores passam por momentos dramáticos por conta da crise que assola nosso país. Nessas horas, demitem os funcionários mais caros, extinguem funções e cortam investimentos. Sobram os peões e a mão de obra absolutamente essencial. O objetivo: manter a fornalha acesa com o mínimo de carvão, na esperança de que o fogo não se apague até que dias melhores cheguem.

Em outras palavras, elimina-se a inovação, a iniciativa e o desejo de correr riscos. Fica-se quietinho para que ninguém perceba sua presença, torcendo para que as coisas se acertem por si só. É o típico manual do empresário amedrontado pela crise.

Esse é, entretanto, o melhor caminho para se dar mal. O guru da administração Tom Peters costuma dizer que “o fracasso é uma medalha de honra”, pois ele demonstra que se tentou. E conclui: a única maneira de não fracassar em algo é não tentar. Mas essa também é a garantia de que não se atingirá o sucesso em nada.

Quase posso ouvir agora alguns rindo nervosamente, enquanto leem esse texto e pensam: “falar é fácil”. Pois eu digo que fácil é se acomodar na toca, torcendo para que a tempestade passe logo. Se tiverem a sorte de estarem vivos quando isso acontecer, sairão dela enfraquecidos diante daqueles que aproveitaram a tormenta para reforçar criativamente suas estruturas.

Ao invés de se acovardar em seus buracos, empresas, profissionais, associações devem se unir para justamente encontrar fórmulas para fomentar a inovação e a iniciativa. Não estou dizendo para apostarem todas as fichas em uma única ideia, especialmente se não houver muitas sobre a mesa. Mas, mesmo em tempos bicudos, deve-se correr riscos por aquilo que vale a pena. E isso funciona para profissionais e para empresas.

Precisamos, portanto, de jornalista e de profissionais de todas as áreas. Especialmente dos bons e experientes o suficiente para ter sucesso correndo riscos! A alternativa é ficar lá na toca, com os dedos cruzados e produzindo coisas medíocres. Mas nesse caso, quando a crise passar, talvez encontrem mais robôs que profissionais trabalhando.


Vamos falar sobre a linguagem certa para público certo na Social Media Week? Esse é o segredo do sucesso nas redes sociais. É só entrar nesta página e clicar no botão verde de CURTIR abaixo da minha foto.


Artigos relacionados: