O que dá para comemorar nos 15 anos do Twitter?

By 3 de junho de 2021 Tecnologia No Comments

O Twitter completou 15 anos recentemente. Mas será que há muito a se comemorar?

Tudo começou em 21 de março de 2006, com a histórica mensagem “estou apenas configurando meu Twitter”, de Jack Dorsey, fundador da empresa. O mundo e as redes sociais eram muito diferentes então.

A política global era mais civilizada, a sociedade não era irracionalmente polarizada e as redes sociais eram um espaço para reencontrar amigos de infância, se divertir e trocar ideias construtivas. O Facebook tinha apenas dois anos; o LinkedIn, quatro; o Instagram ainda nem existia. O iPhone ainda não havia sido lançado e o melhor smartphone era o BlackBerry. Para ficar online, as pessoas ainda dependiam de se sentar à frente de um computador, o que limitava a experiência profundamente.

A rede social do passarinho azul nasceu naquele mundo, como um jeito rápido de as pessoas exprimirem seus pensamentos e dizerem o que estavam fazendo. Não havia fotos, vídeos e as mensagens eram limitadas a 140 caracteres. Bastante bom para um mundo em que a banda larga era uma novidade para poucos.

Fui um sucesso! E a coisa só melhorou com o surgimento de iPhones e Androids, pois as pessoas nunca mais ficaram off line.

De lá para cá, o Twitter permaneceu fiel a seus princípios e mudou pouco. Enquanto isso, outras redes sociais fizeram mudanças profundas, tornando-se espaços complexos e cheios de recursos. De uns anos para cá, todas foram, em maior ou menor escala, tomadas pela polarização política, o que tornou as conversas menos saudáveis e interessantes.

No Twitter, essa última característica aconteceu com mais força, em grande parte pelo exemplo do ex-presidente americano Donald Trump, que usava o Twitter o tempo todo para expor suas ideias, atacar desafetos e destilar seu veneno. A estratégia foi tão eficiente, que se pode creditar parcialmente à rede a eleição do mandatário americano em 2016 e sua quase reeleição no ano passado.

Trump foi imitado por outros políticos no mundo, inclusive pelo atual presidente brasileiro. Se, por um lado, isso concentrou o foco político das redes sociais no Twitter, aumentando pesadamente a troca de mensagens, por outro representou um custo terrível para a plataforma. Como se pode ver no gráfico abaixo, que traz o crescimento de usuários da plataforma na última década, a ascensão de Trump coincide com um abrupto achatamento na curva de usuários ativos na plataforma.

O Twitter se transformou em uma plataforma encharcada e dominada pelo ódio e pela polarização. Isso afastou usuários antigos e reduziu o ingresso de novos. Além disso, a rede foi acusada de fazer “vista grossa” para os abusos dos políticos, que teriam levado à polarização sem precedentes da sociedade.

Tanto que, quando ainda era presidente dos EUA, Trump sempre foi tolerado por lá. Ele teve alguns de seus tuítes mais grotescos apenas indicados como “falsos” pela rede, já no seu último ano de mandato. Quando deixou a Casa Branca, o Twitter o baniu definitivamente da rede, movimento semelhante ao de outras plataformas, mais notoriamente o Facebook.

 

Caminhos para retomada

O Twitter tenta reencontrar o bom caminho e voltar a crescer com força. Hoje a plataforma tem cerca de 340 milhões de usuários ativos, bem atrás de seus principais concorrentes, como o LinkedIn (760 milhões), o Instagram (1 bilhão), o YouTube (2 bilhões) e o Facebook (2,7 bilhões). O passarinho azul come poeira até de um rival bem mais jovem: o TikTok, que já tem 800 milhões de usuários ativos.

De certa forma, sua vontade de se manter fiel a seus princípios, algo louvável, pode atrapalhar essa retomada. Desde o lançamento de seu formato inusitado e único, há 15 anos, a plataforma não traz nenhuma inovação.

Nos últimos anos, ele tentou incorporar recursos que já existiam em concorrentes. Isso quase sempre se deu pela compra de empresas que tinham tais recursos. Foi o caso da Vine, plataforma de vídeos curtos comprada em 2012 e descontinuada em 2016, e do Periscope, uma plataforma de lives adquirida em 2015 e encerrada em março.

No início de maio, a plataforma lançou o Espaços, um recurso de criação de salas de áudio ao vivo que é basicamente uma cópia do Clubhouse. Mas aparentemente a coisa não está “pegando”.

Na quinta passada, “vazou” a informação de uma versão paga do Twitter, batizada de Twitter Blue. Ela deve permitir a edição de tuítes publicados, a criação de pastas para guardar publicações por assunto, a mudança de cor da plataforma (azul, verde amarelo, vermelho, roxo e laranja) e um modo de leitura para reunir, em um único texto, threads (grupos de tuítes). A assinatura deve sair por R$ 15,90 no Brasil e US$ 2,99 nos Estados Unidos.

Isso pode trazer algum caixa adicional, mas resta saber se conseguirá atrair novos usuários para a plataforma, o seu grande problema hoje. Ela ficou envelhecida: muitos de seus usuários são pessoas que se apaixonaram pela rede há muitos anos, e conseguem conviver com a enorme piora na qualidade das conversas e na deterioração do ambiente, pelos discursos de ódio.

Possivelmente fosse muito mais interessante que o Twitter resolvesse esse problema, para que voltasse a ser um lugar para as pessoas se divertirem de maneira saudável e trocar ideias interessantes. Mas o descuido com isso deixou o passarinho crescer como um adolescente monstruoso, uma espécie de senhor Hyde, da obra “O Médico e o Monstro”. Resta saber se ele consegue voltar a ser o agradável doutor Jekyll antes de completar 18 anos.