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Maria Juvelina de Oliveira Monteiro lidera fila para sacar em terminal Atmo, em supermercado de Oeiras do Pará - Foto: Paulo Silvestre

Na terra do “dinheiro vivo”, digitalização facilita o cotidiano

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Enquanto as pessoas das grandes metrópoles usam cada vez menos notas e moedas, nos rincões do Brasil, o “dinheiro vivo” é ainda quem manda. Seja por questões culturais ou pela dificuldade de se fazer transações eletrônicas, a população desses locais prefere andar com maços de notas para as necessidades de seu cotidiano.

Para isso, precisam fazer saques, algo simples nos grandes centros urbanos, mas um transtorno em locais em que a agência bancária ou o caixa eletrônico mais próximo fica a horas de viagem. Ironicamente, nesses casos, os recursos digitais podem facilitar muito a vida de quem quer sentir o dinheiro na mão.

Na semana passada, pude ver isso de perto em Oeiras do Pará, município de 33 mil habitantes no interior daquele Estado. Lá, em muitos casos, a dificuldade é conseguir dinheiro para sacar. Apesar de a cidade possuir uma agência do Banco do Estado do Pará e um caixa eletrônico do Bradesco, pode acontecer de o dinheiro simplesmente acabar neles, e demorar dias para ser reposto.

A empresa TecBan encontrou uma solução criativa para o problema, com seu terminal Atmo, que poderia ser definido como um “Banco24Horas sem dinheiro”. Instalado em mesas de estabelecimentos comerciais, ele permite que os clientes saquem benefícios sociais e valores de suas contas, recebendo o dinheiro do caixa de onde a máquina estiver instalada. A TecBan deposita esses valores na conta do lojista no mesmo dia e, ao final do mês, ainda o bonifica com um adicional por cada transação realizada.

Parece uma solução simples, e de certa forma é mesmo. Mas esse uso da tecnologia digital promove uma grande mudança no cotidiano das pessoas e das empresas.


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É difícil alguém que vive em cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro, onde pagamentos são feitos por aproximação de smartphones, compreender a dimensão disso tudo. Mas onde a Internet é precária e a vida é pouco digital, o dinheiro na mão é sinônimo de confiança.

O Pix colocou o Brasil na vice-liderança global de transações instantâneas, atrás apenas da Índia. Segundo o Banco Central, 5,28 bilhões de Pix movimentaram R$ 2,18 trilhões em junho. No primeiro trimestre, ele respondeu por 43% das transações, contra apenas 2% das feitas em dinheiro, 15% do cartão de crédito e 13% no débito.

Para entender melhor o abismo entre o “Brasil do Pix” e o do “dinheiro vivo”, precisamos olhar além da Internet ruim típica do segundo. Instalar uma agência bancária ou mesmo um caixa eletrônico exige um grande investimento de infraestrutura e de logística. Mesmo que existam, sua manutenção é cara.

“O Brasil é muito grande, e a logística, em alguns locais, é bem complicada”, explica Rodrigo Rocha Maranini, gerente de produtos e canais de distribuição do Banco24Horas. A maior dificuldade é o transporte do dinheiro para abastecer esses locais, uma operação complexa. No caso de Oeiras do Pará, ele chega de avião na cidade de Curralinho, e depois precisa viajar mais duas horas de barco, o que não acontece em todos os dias.

Há também o risco de problemas operacionais, que tornam o caixa inoperante até que um técnico venha de outra cidade, o que pode demorar dias. “Então a maneira que a gente encontrou para atender a população foi o Atmo”, acrescenta Maranini.

Antes disso, lojistas já faziam informalmente esse tipo de “serviço de saque”, mas cobravam por isso. Por exemplo, se o cliente quiser sacar R$ 400, ele faz uma compra inexistente no estabelecimento no valor de R$ 430, e o dono fica com a diferença.

Outra prática comum é entregar seu cartão e sua senha a uma pessoa que viaje a outra cidade, normalmente com os cartões de dezenas de pessoas, para sacar o dinheiro e trazer ao final do dia. Além de arriscado, também é cobrada uma taxa.

Do lado do lojista, o Atmo resolve o problema de ter que se viajar com o dinheiro do dia para depositá-lo na conta da empresa. “Ficava muito dinheiro na loja”, explica, Thalita Santana Pereira, responsável pelas lojas da rede de supermercados Solzão, que têm Atmos instalados. “Agora não tem mais esse problema.”

 

Dinheiro na cidade

Os lojistas também apontam a vantagem de o dinheiro ficar na cidade e até no seu estabelecimento. “Antes deixavam parte do dinheiro em outro lugar”, afirma Kledson Pantógena Pereira, dono da Farmácia Popular, em Oeiras do Pará, que também tem um Atmo. Ele sente que, com o terminal, oferece um serviço: “é bom ser útil!”

O Pará possui uma agência bancária para cada 16 mil habitantes, o 15º Estado no país nesse índice. Em São Paulo, por exemplo, há uma agência para cada 9 mil. Além disso, segundo o Cetic.br (órgão de pesquisa ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil), o Pará tem o menor percentual da população conectada à Internet no Brasil.

Maria Juvelina de Oliveira Monteiro, vendedora de açaí em Oeiras do Pará, tem celular, mas não faz Pix porque tem medo de que algo dê errado: “aí dá uma dor de cabeça, meu filho!” Ela recebe Bolsa Família e o salário do marido falecido, e saca o dinheiro todo no Atmo do supermercado Solzão da cidade assim que ele chega. “Gosto de sacar aqui, porque, em outros lugares, às vezes não tem dinheiro”, explica.

Os benefícios sociais, como o Bolsa Família e o Seguro Defeso (pago a pescadores impedidos de trabalhar na época de reprodução dos peixes), são muito importantes para a população dessas regiões. Segundo o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, 8.692 famílias de Oeiras do Pará recebem o Bolsa Família, com um valor médio de R$ 434 por mês.

Tudo isso configura um mundo muito diferente do “Brasil do Pix”. São pessoas que sacam, de uma só vez, todo dinheiro que têm, para poder pagar suas contas e comprar o que precisam, sem ter que se deslocar, às vezes longas distâncias, gastando um dia todo, para fazer isso.

Como se pode ver, mesmo onde o “dinheiro vivo” impera, os recursos digitais podem fazer uma grande diferença, se usados com criatividade.

 

Empresas analisam como seguramos e digitamos em nossos celulares para confirmar nossa identidade - Foto: Shurkin Son/Creative Commons

Em um mundo com menos dinheiro físico, tecnologia vai além de garantir transações

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No mundo todo, as pessoas cada vez mais trocam notas de dinheiro e moedas por meios eletrônicos de pagamento. Os brasileiros seguem essa tendência, e o estrondoso sucesso do Pix é o exemplo mais reluzente disso. Nesse cenário, a tecnologia digital ocupa um espaço que vai muito além de garantir as transações: ela viabiliza segurança, combate o crime e até promove a inclusão social.

Alguns podem dizer que os problemas decorrentes da digitalização dos meios de pagamento são um preço a se pagar pelos benefícios que isso traz. Pode ser verdade, mas isso não pode ser usado como desculpa para descuidos, pois os prejuízos para pessoas e empresas podem ser devastadores. E ninguém deveria passar por isso!

“Se as pessoas perderem a fé na segurança do seu meio de pagamento, eles vão parar de usá-lo e voltarão a usar dinheiro”, explicou-me Andrew Reiskind, Chief Data Officer da Mastercard, durante uma visita que fiz na semana passada ao laboratório da inovação da empresa, localizado em Nova York (EUA).

A solução não é simples e cabe a todos os envolvidos. Empresas, governos, universidades a até os usuários têm seus papeis para que a experiência de pagamentos digitais aumente seus benefícios e reduza seus riscos.

Algumas velhas preocupações ganham nova roupagem, enquanto outras surgem. A inteligência artificial e a computação quântica despontam como poderosas novidades. Enquanto isso, a ética e a experiência do cliente ganham ainda mais importância.

Uma coisa é clara: não há atalhos nesse processo, e aqueles que não se ajustarem às novas exigências podem ser fortemente penalizados pelo mercado.


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Os números do Pix dão a dimensão das transações digitais no Brasil. Segundo o Banco Central, em junho, o Brasil tinha 165,8 milhões de usuários cadastrados na sua plataforma. Em maio, foram realizadas 5,2 bilhões de transações, que movimentaram R$ 2,1 trilhões. O Pix representou 43% das transações no primeiro trimestre, contra 15% dos cartões de crédito, 13% dos de débito, 5% dos boletos e apenas 1% da TED. Com esse vigor, o país terminou 2023 na segunda posição global em transações instantâneas, atrás apenas da Índia.

Em contrapartida, os saques em dinheiro vivo nos caixas eletrônicos e agências bancárias caem ano após ano. Em 2012, os brasileiros sacaram R$ 3,9 trilhões; em 2022, esse valor foi de R$ 2,1 trilhões, o mesmo que o Pix movimentou só em maio.

Infelizmente a bandidagem também está trabalhando com força no mundo digital. O Brasil se converteu em um paraíso para golpistas, e o próprio Pix tornou-se uma de suas ferramentas preferidas, pela instantaneidade das transferências.

O golpe mais comum consiste em se passarem por outras pessoas, enganando familiares e amigos para que façam transferências. Uma vez que elas acontecem, os fraudadores passam os valores para outras contas, com o Pix. Isso impede que os bancos rastreiem o caminho do dinheiro. Assim essas instituições não se sentem obrigadas a devolver o dinheiro, e seus clientes via de regra amargam o prejuízo.

“É muito fácil fingir ser alguém ou comprar uma identidade roubada na Dark Web”, explica Chris Reid, vice-presidente executivo de soluções de identidade da Mastercard. Por isso, a gigante de meios de pagamento investe fortemente em tecnologias que tentam garantir a identidade do usuário, desde biometria até análise de comportamentos, como a forma com que a pessoa interage com seu smartphone. “Depois de 10 usos do seu dispositivo, é quase impossível alguém replicar como você o segura e como digita nele”, acrescenta.

 

O real valor do celular para o crime

Enquanto esses recursos não são amplamente disseminados, os criminosos aproveitam as deficiências de segurança dos smartphones e dos aplicativos de instituições financeiras para “limpar a conta” de vítimas. Por isso, esses aparelhos se tornaram o item mais roubado no Brasil desde o ano passado.

O problema ficou tão grave que, no último Google I/O, evento global de desenvolvedores da empresa, que acontece sempre em maio, ela anunciou novidades de segurança para o sistema operacional Android inspiradas nos crimes brasileiros. Entre eles, estão o bloqueio automático do celular se ele for retirado abruptamente da mão do usuário (como nos roubos pelas “gangues de bicicleta”), a criação de uma área escondida e protegida por senha para os aplicativos sensíveis, proteção contra “reset de fábrica” e autenticação aprimorada.

A digitalização do dinheiro e da própria vida exige também comportamentos mais transparentes e éticos das empresas no uso dos dados de seus clientes e na adoção de uma inteligência artificial responsável. No último dia 2, tivemos um movimento emblemático nesse sentido, quando a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) proibiu a Meta (empresa dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) de usar os dados dos usuários para treinar seus modelos de inteligência artificial.

“Os dados dos indivíduos não nos pertencem, não pertencem ao banco”, afirma Reiskind. “Eles não são uma mercadoria, são um direito humano e, portanto, devemos tratá-los bem!”

O executivo lembra também que as empresas devem estar atentas para que seus dados e sua IA não desenvolvam vieses que possam prejudicar os clientes. Ele cita, como exemplo, empresas que não querem fazer negócios com pessoas que vivem em áreas de muita criminalidade. Mas, segundo Reiskind, a tecnologia deve ser usada para garantir serviços mesmo nesses casos, pois nem todos que vivem ali são criminosos, e merecem respeito.

A boa notícia é que o mesmo avanço exponencial que viabiliza soluções como o Pix também permite que mais pessoas tenham acesso legítimo a recursos como esses. Abrir uma conta corrente ou aprovar transações de cartão de crédito para esses indivíduos marginalizados pelo local em que vivem significa muito mais que uma transação: pode representar um importante fator de inclusão social.

Dessa forma, empresas que abusarem dos dados de seus clientes ou não trabalharem de forma mais justa com o público podem, aos poucos, perder mercado e manchar sua reputação. É preciso sempre criar serviços incríveis, mas também devem fazer o certo socialmente, sem comprometer a segurança.


Veja a entrevista em vídeo com Andrew Reiskind, Chief Data Officer da Mastercard:

 

Troca de empregos formais pela flexibilidade da “gig economy” pode levar a queda nos rendimentos - Foto: Ono Kosuki/Creative Commons

Estudar tem dado menos dinheiro, mas não investir na sua formação é uma armadilha

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O mercado de trabalho brasileiro vem criando mais vagas de baixa qualidade, mesmo com a população estudando mais. Isso empurra profissionais bem-preparados para posições que pagam menos e para a informalidade, e arma uma perigosa arapuca.

Um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), divulgado recentemente com dados do IBGE, demonstrou que os brasileiros que estudaram mais foram os que perderam mais renda na última década, com um aumento abrupto na informalidade. O levantamento aponta ainda que despencou a vantagem dos seus rendimentos frente aos dos que estudaram muito pouco.

Outra pesquisa, essa da consultoria IDados sobre a população “sobre-educada”, indica que 5,4 milhões de brasileiros com ensino superior trabalham fora de sua área de formação ou em atividades que não tiram proveito de todo o seu potencial. Esse número vem crescendo desde 2019, quando os “sobre-educados” eram 4,5 milhões.

Esses levantamentos contrastam com a mais recente taxa de desemprego no país, divulgada pelo IBGE na sexta (29), que foi de 7,8%. É o menor índice desde fevereiro de 2015, quando era de 7,5%.

Isso se explica por uma economia sem dinamismo, com empresas que investem pouco, acostumadas a uma produtividade baixa. O grande perigo nisso tudo é se criar uma ideia errada de que não vale a pena estudar, ou pelo menos estudar muito.

Apesar dessas evidências, as pessoas que caem nessa armadilha colocam em risco a própria sobrevivência profissional, especialmente em um cenário de grande automação.


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Segundo a pesquisa do Ibre-FGV, os profissionais com mais de 16 anos de estudo viram sua renda média cair, entre 2012 e 2023, de R$ 7.211 para R$ 6.008, em valores corrigidos pela inflação. Nessa faixa, a informalidade saltou de 1,9 milhão para 4,1 milhões de trabalhadores entre 2015 e 2023. Vale apontar que percentualmente, o aumento não foi tão grande: de 14% para 19,5%, o que indica que mais pessoas chegaram a esse patamar superior de estudo no período.

De todas as faixas avaliadas no levantamento, a única que viu sua renda crescer sensivelmente de 2012 a 2023 foi justamente a dos com menos de um ano de ensino: de R$ 1.094 a R$ 1.396. Para quem estudou de 1 a 11 anos, permaneceu praticamente estável, caindo a partir daí. A informalidade também diminuiu para quem estudou até 8 anos, permaneceu estável na faixa de 9 a 11 anos de escola, e cresceu entre os que estudaram a partir de 12 anos.

O achatamento salarial é velho conhecido dos brasileiros, especialmente em momentos de crise, como a que estamos mergulhados há anos. A recente digitalização galopante agora afeta camadas profissionais mais especializadas, que antes se sentiam mais protegidas.

Mariane Guerra, vice-presidente de Recursos Humanos para a América Latina da ADP, acredita que a chamada “gig economy” também pode estar influenciando nesse processo. Por esse modelo, profissionais trocam empregos regulares por trabalhos pontuais, muitas vezes por tarefas. Se antes o grande expoente disso era a Uber, hoje temos profissionais em todos as áreas adotando o modelo, em busca de flexibilidade.

“Quando você passa a ser um trabalhador autônomo, você tem uma flutuação de renda”, afirma a executiva. “Demora até você ter uma carteira de clientes que permite ter uma renda constante, sólida, no mesmo patamar”, explica.

Para aqueles que insistem em um emprego, a situação econômica pode provocar um impacto perverso. Cresce o número de profissionais que “diminuem sua formação” no currículo (por exemplo, omitindo um doutorado) para conseguirem ser contratados.

“A gente tem a necessidade de pessoas com um perfil mais preparado, mais aculturado, mais transdisciplinar, para atender demandas mais sofisticadas”, afirma Marcelo Graglia, professor da PUC-SP e coordenador do Observatório do Futuro do Trabalho. “E a gente vê essa prática arcaica, que não faz mais sentido”, acrescenta.

 

Investindo no que importa

Os especialistas são unânimes em reafirmar a importância do estudo. Mas é preciso escolher no que focar.

O diploma de graduação deixou de ser suficiente para o sucesso profissional há muito tempo. É um consenso no mercado que se deve estudar continuamente, porque novas metodologias, recursos tecnológicos e modelos de negócios surgem a todo momento.

No cenário atual de pouco dinheiro e tempo, vemos o crescimento de busca por cursos de curta duração, para aprender habilidades técnicas específicas e de uso imediato no cotidiano profissional. É uma maneira rápida de se conseguir algum destaque no currículo.

Apesar de seu inegável valor, eles não substituem os cursos mais longos, como especializações, MBAs e até mestrados e doutorados. São eles que formam profissionais verdadeiramente diferenciados, capazes de enfrentar os desafios de um mercado cada vez mais exigente e em constante transformação.

“Os profissionais que enxergam esse momento do mercado como uma mudança estrutural cometem um equívoco estratégico para a carreira”, afirma Graglia. Ele e Guerra destacam ainda a importância das “soft skills”, competências interpessoais e emocionais para o trabalho. Para ele, “as pessoas muito especializadas, sem essas outras habilidades, são as mais suscetíveis à substituição pela tecnologia”.

Não se pode esperar que o governo resolva isso sozinho, apesar de seu papel fundamental na criação de novas políticas educacionais, que formem melhores cidadãos e profissionais mais alinhados ao mundo atual, desde o Ensino Básico até a universidade. As empresas precisam também assumir seu papel na solução, não apenas valorizando profissionais com boa formação, mas também investindo, elas mesmas, em cursos de capacitação e reciclagem. E naturalmente cada um de nós deve assumir o protagonismo da própria carreira, estudando para melhorar sempre.

“Conhecimento é perecível, então quem vai produzir mais, quem vai continuar fazendo pesquisa, se todo mundo acha que não precisa estudar mais”, questiona Guerra. Em um cenário de competição tecnológica cada vez mais acirrada, ela provoca: “quem vai dar o próximo passo qualitativo, desenvolver a próxima tecnologia?”

O mercado de trabalho e a educação caminham de mãos dadas. Quando um vai mal, a outra sente, e vice-versa. Não se pode, diante do cenário ruim que o país passa, esquecer do ensino e da valorização profissional como pilares para o crescimento de qualquer sociedade. Isso colocaria nosso futuro ainda mais em risco.

 

O principal motivo para roubos de celulares não é mais o valor do aparelho, e sim a possibilidade de se fazer transferências com ele

Isso jamais acontecerá comigo!

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Duas notícias me chamaram a atenção na semana passada. A primeira foi sobre um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que indica uma explosão nos crimes eletrônicos. A outra foi a de que metade dos brasileiros não limitou suas transferências pelo Pix, apesar de a maioria conhecer esse recurso simples e eficiente para diminuir prejuízos em um eventual roubo de celular.

As duas estão interligadas e demonstram que os brasileiros não tomam medidas para sua própria segurança diante de uma mudança nos crimes nos grandes centros urbanos. Não se trata, de forma alguma, de querer imputar qualquer culpa às vítimas, mas sim de constatar que muitas pessoas não fazem isso pela crença de que esse problema nunca acontecerá com elas.

Até que acontece! E aí não adianta “chorar sobre o leite derramado”.

Apesar de os smartphones estarem integrados a nossas vidas há mais de uma década, esses crimes só ganharam força recentemente. Portanto, os cuidados que a maioria das pessoas toma deixaram de ser suficientes, e precisam ser revistos.


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O Fórum Brasileiro de Segurança Pública indica um aumento de 74,5% de golpes eletrônicos de 2020 para 2021, chegando a 60.519 ocorrências notificadas. O crescimento é exponencial: em 2019, foram “apenas” 14.677. Além disso, esse tipo de crime é subnotificado, pois muitos acabam sendo classificados só como estelionato.

Outro levantamento recente, realizado pelo C6 Bank e pelo instituto de pesquisa Ipec, mostra que 70% dos brasileiros sabem que podem ajustar o limite de suas transferências por Pix, mas 47% não fazem isso. É possível ainda determinar contas específicas para continuarem recebendo valores maiores.

Os limites do Pix foram criados pelo Banco Central em novembro, para diminuir os sequestros-relâmpago para realização de transferências, mas também ajudam nos crescentes roubos de celulares para o mesmo fim. A redução desses limites tem efeito imediato, mas seu aumento demora no mínimo 24 horas para passar a valer.

O roubo de smartphones aumentou muito nesse ano, mas o principal objetivo não é o valor do aparelho, e sim a possiblidade de se realizar com ele transferências bancárias. Segundo a polícia, o problema se agravou com o envolvimento do PCC, o Primeiro Comando da Capital. A facção criminosa descobriu nisso uma maneira fácil de obter muito dinheiro. Há registros de transferências que superam R$ 100 mil!

Muitos roubos acontecem com o bandido em bicicleta ou moto, arrancando o aparelho destravado da mão das vítimas, facilitando as transferências. Por isso, usar o aparelho nas ruas e até no carro em bairros nobres de São Paulo se tornou muito arriscado.

A senha da tela de bloqueio no celular é uma primeira barreira, que pode ser suficiente para frustrar a ação dos bandidos. Por isso, é assustador observar que muitas pessoas não adotam essa proteção extremamente básica.

 

A responsabilidade de cada um

Em uma pesquisa informal que realizei no LinkedIn, com cerca de 800 entrevistados, 41% disseram que transferências indevidas por Pix são os crimes eletrônicos mais comuns, enquanto 40% apontaram as fraudes pelo WhatsApp. Outros 17% indicaram perfis falsos nas redes sociais e 2% escolheram outras opções.

O WhatsApp tornou-se outra enorme fonte de golpes digitais. E novamente a vulnerabilidade se dá em usos descuidados pelas pessoas, e não por falhas técnicas da plataforma. Um dos golpes mais comuns consiste no bandido ligar para vítima com alguma história que a convença a lhe passar um código gerado pela plataforma, que lhe permite assumir a conta da vítima. A partir dessa conta clonada, o criminoso fala com os contatos para pedir dinheiro, como se fosse o verdadeiro titular.

À medida que mais pessoas começaram a entender que não devem repassar esse código, os bandidos passaram a adotar outro golpe, ainda mais simples e absurdo. A partir dos perfis das vítimas nas redes sociais, eles copiam sua foto e escolhem contatos. Enviam então mensagens fazendo-se passar pelo titular e dizendo que se trata de um novo número de telefone. Se o interlocutor acredita, pedem transferências. O Pix é o método preferido, pois o dinheiro fica disponível em poucos segundos.

As características do WhatsApp, disponível em 99% dos smartphones brasileiros, facilitam a ação dos criminosos. O grande volume de conversas, e sua informalidade e instantaneidade fazem com que os usuários “baixem a guarda” e acreditem facilmente no que chega por ali. Isso vale para conversas de bandidos e para notícias falsas, que também se proliferam nesse canal. Nos dois casos, ganhar a confiança é essencial.

Portanto, a primeira dica para se defender dos cybercriminosos é manter o senso crítico aguçado. Desconfie do que chega pelas redes e pelos comunicadores, especialmente quando o outro pedir dinheiro ou suas informações pessoais, ou diga que mudou de telefone. E nunca informe qualquer número pedido pelos bandidos.

Não dá mais para ficar usando o celular na rua ou no carro sem o risco de ser assaltado. Se for necessário, entre em algum local fechado. Algumas pessoas também passaram a andar com um “celular de guerra”, barato e com o mínimo de aplicativos, para o caso de um assalto.

Limite o valor de transferências por Pix, TED e DOC. Especialistas sugerem que o ideal é liberar apenas o mínimo para cobrir as necessidades cotidianas do correntista. Da mesma forma, jamais informe senhas ou entregue cartões de conta ou crédito a terceiros, nem grave senhas no celular.

Outra dica é habilitar a chamada “autenticação de dois fatores” em todos os aplicativos que oferecerem esse recurso. Com ela, além da senha, será necessária outra informação (normalmente um código gerado na hora) para acessar suas contas.

Há uma discussão sobre a responsabilidade dos bancos nesses crimes eletrônicos. O Banco Central afirma que as instituições podem identificar os titulares das contas de origem e de destino, mas os bancos tentam se livrar de qualquer culpa. Segundo a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), cada instituição tem sua política de análise e devolução.

Por isso, no caso de golpe ou roubo de celular, o cliente deve ligar ao banco imediatamente, pedir bloqueios e documentar o fato. Também deve ser feito um boletim de ocorrência. Quanto mais rapidamente isso for feito, menor a chance de prejuízos.

No final, a grande recomendação é parar de achar que isso nunca acontecerá com qualquer um de nós. Por mais que você seja cuidadoso e nunca tenha sido assaltado, esses crimes atingiram níveis inéditos. Não se pode dar sorte ao azar!

 

Facebook mira seus canhões para meios de pagamento e e-commerce

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Você provavelmente é um dos mais de cem milhões de usuários do WhatsApp no Brasil. Usa o comunicador do Facebook para conversar com seus amigos, familiares, colegas, para fazer negócios, mandando fotos, áudios, “figurinhas” e arquivos.

Mas você toparia mandar dinheiro de verdade do mesmo jeito?

Essa é a mais recente novidade do Facebook em seus esforços para ocupar o varejo eletrônico e os métodos de pagamento. E tem potencial de sacudir o mercado.


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Na segunda passada, o próprio Mark Zuckerberg, dono do Facebook, disse em uma postagem na rede social que o Brasil foi escolhido para um amplo teste de envio de dinheiro pelo WhatsApp. Por “amplo teste” entenda-se que todos os usuários -pessoas e empresas- terão acesso ao recurso.

Antes de nós, ele já tinha sido testado na Índia, mas em um grupo reduzido de usuários, em condições mais controladas. Agora, no Brasil, a novidade vai ser solta na “vida selvagem”.

E isso é algo que pode acontecer no varejo, prejudicando a experiência global do consumidor

O recurso já estava sendo desenvolvido, mas a pandemia de Covid-19 antecipou o lançamento. Afinal, o comércio eletrônico cresce aceleradamente desde que o distanciamento social foi definido, em março.

É como diz o ditado: “enquanto alguns choram, outros vendem lenços”. E um dos que estão vendendo mais lenços é a Amazon.

Segundo “The Wall Street Journal”, a empresa de Jeff Bezos teve, em abril, o mesmo volume de pedidos de períodos como o Natal e o Dia dos Namorados. E em 16 de abril, as ações bateram sua maior alta histórica: 28% ao ano. Bezos sozinho ganhou US$ 24 bilhões desde o começo da pandemia! Foi um dos poucos bilionários a aumentar sua fortuna no período.

Zuckerberg também quer participar dessa festa! E o serviço de pagamentos pelo WhatsApp é importantíssimo nesse projeto.

Ele poderá ser utilizado por pessoas físicas e jurídicas. Usuários poderão transferir dinheiro para outros contatos e fazer compras sem ter que pagar taxas. Por outro lado, pequenas empresas que usam o WhatsApp Business pagarão uma taxa de 3,99% para receber os pagamentos de clientes, nos mesmos moldes do que acontece com recebimentos por cartões de crédito.

As transferências entre pessoas só poderão ser feitas com cartão de débito, limitadas a R$ 1.000 por transação, com um limite de 20 transações por dia e de R$ 5.000 por mês. Já para empresas, os pagamentos poderão ser tanto com cartão de débito quanto de crédito.

Por enquanto, só dará para fazer isso entre usuários no Brasil e tendo o Real como moeda.

Para evitar transações não-autorizadas, todas deverão ser aprovadas pelo usuário, com uma senha de seis dígitos ou a biometria do celular, quase sempre a impressão digital que alguns modelos leem.

Os usuários precisarão usar cartões de débito e crédito das bandeiras Visa e Mastercard, emitidos pelo Banco do Brasil, pelo Nubank ou pelo Sicredi.

Com o tempo, outras instituições devem aderir ao sistema. Todos os pagamentos serão processados pela Cielo. Ou seja, os comerciantes que desejarem utilizar a novidade para receber pagamentos terão de ter uma conta da Cielo, pelo menos por enquanto.

As transferências pelo WhatsApp estão vinculadas ao Facebook Pay, que já funciona nos Estados Unidos e permite pagamentos pelo Facebook e pelo Messenger. A ideia é que, em breve, seja possível fazer pagamentos entre todos os aplicativos da empresa, o que inclui também o Instagram

“Lojinha” e delivery de comida

Outra iniciativa do Facebook nessa seara é o Facebook Shops, ou Loja do Facebook, como deve ser conhecida aqui. Ele permite que pequenos lojistas criem vitrines de seus produtos no Facebook e no Instagram, podendo até personalizar a aparência do ambiente. Com o Facebook Pay, é possível que as pessoas até mesmo concluam as compras dentro da plataforma. A novidade, que já funciona nos Estados Unidos, deve estar disponível no Brasil em dois meses.

O Facebook ainda pode ingressar no negócio de entrega de comidas, invadindo o terreno do iFood, do Uber Eats e da Rappi. A informação saiu do próprio Zuckerberg, em entrevista ao jornal “Financial Times”.

Surge então a pergunta: isso tudo será bom aos consumidores e aos lojistas?

A princípio, tendo a dizer que sim!

Em primeiro lugar, as transferências pelo WhatsApp diminuem ainda mais a curva de adoção de meios de pagamento digitais, por ser uma plataforma totalmente disseminada no país e com a qual os usuários se sentem muito à vontade. Na prática, o Facebook entra na chamada “guerra das maquininhas”, sem sequer ter uma maquinha.

Para os pequenos negócios também pode ser uma boa ideia, pelo mesmo motivo. Resta saber se o modelo de negócios, que exige uma conta na Cielo e a cobrança de 3,99% por transação, será interessante para eles.

Do outro lado, os clientes também precisam de um cartão emitido por um dos bancos participantes, que ainda são poucos, e isso que restringe muito sua adoção. Mas a expectativa é que outros bancos se juntem aos pagamentos pelo WhatsApp depois.

Riscos de golpes

Daí vem a grande questão: a segurança.

O consumidor é sempre o elo mais fraco nisso. Tanto que a maioria dos golpes digitais não acontecem por uma invasão de sistemas.

Os disseminadores de “fake news” não são os únicos criminosos no WhatsApp. Há outro tipo de bandido que prefere essa rede: o que percebeu que é relativamente fácil enganar as pessoas para assumir suas contas e dar golpes de todo tipo. Isso acontece até com usuários que têm um bom domínio do meio digital. A bandidagem está ficando cada vez mais convincente nos seus métodos de convencimento.

Não é de se estranhar que esteja acontecendo uma verdadeira explosão de golpes virtuais nessa pandemia. E é possível que esse patamar se mantenha quando tudo estiver um pouco mais normalizado.

Ou seja, os golpes virtuais já fazem parte do chamado “novo normal”. Por isso, independentemente de você usar a novidade do WhatsApp, já deixo aqui uma dica essencial: ative a verificação em duas etapas no sistema. Isso coloca uma bem-vinda camada adicional de segurança a sua conta.

Apesar desse receio com a segurança, vejo como inevitável que essas novidades do Facebook deem certo e sejam amplamente adotadas. O brasileiro adora tecnologia, adora redes sociais e adora o WhatsApp. Não é de se estranhar que Zuckerberg tenha escolhido o Brasil para testar a novidade. E, com os devidos cuidados, o recurso pode ser mesmo bacana.

Temos apenas que entender bem como isso tudo funciona, para aproveitarmos o que elas têm de bom e não sermos vítimas de todo tipo dos criminosos.

Você está pronto para compartilhar suas informações bancárias por aí?

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Foto: reprodução

Quando você pensa em banco, o que lhe vem à cabeça? Provavelmente dinheiro e segurança de bens e informações. Na verdade, essa é praticamente a essência do serviço bancário: pagamos aos bancos para realizarmos, com confiabilidade, todo tipo de transação. Então o que você pensaria se o seu banco lhe dissesse que gostaria de compartilhar a sua informação bancária com outras empresas e pessoas?

Isso pode parecer assustador e absurdo, não é mesmo? Pois saiba que pode acontecer muito em breve, portanto é melhor entender do que se trata.


Vídeo relacionado:


Recentemente conversei sobre isso com Tyler Jewell, CEO da WSO2, e Edgar Silva, gerente geral da América Latina da mesma empresa. O papo girou em torno do “open banking”, um conceito que promete revolucionar a maneira como nós nos relacionamos com serviços financeiros e como os próprios bancos funcionam.

O conceito surgiu com força no Reino Unido em 2016, e se espalhou pelo mundo. Resumidamente, ele prevê que instituições bancárias criem mecanismos para compartilhar dados financeiros de seus clientes com outras empresas e desenvolvedores de uma maneira organizada, para que eles possam criar serviços interessantes para seu público. Ou seja, a clientela continua sendo do banco, mas pelo menos algumas de suas informações são distribuídas a terceiros autorizados, para que criem novos serviços.

Essa transferência se dá por sistemas de troca de informações entre serviços online, chamados APIs (sigla em inglês para Interface de programação de aplicações ,exatamente o negócio da WSO2). A teoria por trás do “open banking” é que, por mais que a pessoa esteja vinculada a um banco, ela é a dona das suas informações financeiras, e não a instituição. Portanto, deve ter o controle sobre elas para compartilhá-las com quem bem entender, de modo que possa escolher empresas que, a partir desses dados, lhe ofereçam serviços financeiros melhores.

Confuso? Talvez. Mas isso é porque se trata de um conceito que pode ser realmente revolucionário.

 

Pegadas financeiras na nuvem

Já nos acostumamos com a ideia de que Facebook, Google, Apple e tantos outros nos conhecem incrivelmente bem, pelas nossas pegadas digitais, cada vez mais numerosas e profundas. Mas antes, muito antes disso tudo, os bancos já sabiam bastante sobre nós, pela maneira como gastamos nosso dinheiro.

Afinal, imagine o que poderíamos inferir se soubéssemos tudo o que uma pessoa compra, de quem, quando, de que forma, e pudéssemos cruzar essa informação com suas fontes de renda, dados familiares e mais um monte de outros bancos de informação. Acrescente a isso uma capacidade brutal de processamento e os melhores algoritmos do mercado.

Pois é: os bancos sabem muito sobre nós!

Só que, até agora, elas guardam essas informações só para eles, tirando todo o proveito possível para ganhar ainda mais dinheiro com cada um de nós. O atual estágio é o resultado de um modelo de negócios que vem sendo melhorado há mais de 600 anos (o primeiro banco do mundo, o genovês Banco di San Giorgio, data de 1407). Não é de estranhar, portanto, que mesmo em tempos de crise severa, como a que vivemos, os bancos continuem batendo recordes contínuos de lucratividade.

Agora imagine se pudéssemos compartilhar toda essa riquíssima informação com várias outras empresas, para que nós -e não apenas os bancos- também lucrássemos com isso. Em um exemplo bastante simples, imagine se uma empresa tivesse acesso a nossas compras com o cartão de crédito. Com isso, poderia gerar ofertas de produtos que realmente consumimos de varejistas que os estiverem promovendo quando precisarmos deles. Ou, a partir de nossos extratos, poderiam oferecer opções de crédito ou investimento muito mais vantajosas que as do nosso próprio banco.

Com muito menos –as compras realizadas pelos clientes em suas lojas– o Pão de Açúcar transformou seu programa de relacionamento “Pão de Açúcar Mais” em um aplicativo que oferece grandes vantagens aos próprios clientes, aos seus fornecedores e a ele próprio. Não é “open banking”, mas é um ótimo exemplo como o uso inteligente de dados de consumo podem trazer incríveis resultados.

O uso de dados de clientes fornecidos pelos bancos para sistemas que geram algum tipo de serviço agregado não surgiu com o “open banking”. Ainda nos anos 1990, usuários de antigas versões dos sistemas de gestão financeira Money (Microsoft) e Quicken (Intuit) já conseguiam importar alguma coisa para dentro dessas plataformas. Mas era um processo tão complicado e limitado, que desanimava.

Agora, com o novo conceito e novas tecnologias, os clientes tendem a ganhar muito. As empresas que oferecerem essas soluções também. Já os bancos…

Bem, os bancos precisam se reinventar.

 

Se não é pelo amor, é pela dor

É verdade que os bancos são azeitadíssimas “máquinas de fazer dinheiro” (se me permitem o trocadilho infame). Mas o que vem funcionando há seis séculos precisa ser revisto diante de coisas como o “open banking” e as “fintechs”, empresas que entregam serviços financeiros pelo uso inovador de tecnologia. Portanto, apesar de seu enorme poder, os bancos precisam lidar com as mudanças impostas por essa nova realidade.

O interessante é que os próprios bancos tradicionais podem se beneficiar disso tudo. Muitos deles, inclusive no Brasil, já possuem áreas de inovação que atuam como “fintechs” e já oferecem espontaneamente APIs de “open banking”. Se, por um lado, eles se veem obrigados a fazer isso para não ficarem para trás em um grande movimento tecnológico, por outro podem usar isso para se posicionar no mercado como empresas inovadoras e digitais, bandeiras, aliás, erguidas por muitas dessas instituições.

Dessa forma, além de poderem se tornar mais simpáticos aos correntistas, podem efetivamente descobrir novas e lucrativas formas de negócios. Além disso, podem evitar que outras empresas acabem fazendo seu trabalho e levando embora parte do lucro que teriam com os próprios clientes.

A questão essencial do “open banking” de os dados pertencerem ao cliente e não à instituição envolve outro tema atualíssimo: a proteção aos dados pessoais. O Congresso Brasileiro aprovou há algumas semanas, em plenário, o projeto da Lei Geral de Proteção de Dados Brasileira (LGPD), que traz ao país alguns importantes pontos já em vigor na Europa, seguindo legislação semelhante local, a chamada GDPR. Ele aguarda agora sanção do presidente Temer.

Conversei sobre isso com Marcelo Crespo, sócio do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados; “Os bancos, como outras empresas, serão favorecidos com o surgimento de uma Lei Geral de Proteção de Dados, embora isso possa gerar, em algum momento, a necessidade de adequação aos padrões legais, pois as empresas precisarão se preocupar com a fonte dos seus bancos de dados, já que os dados pessoais, para serem tratados, precisarão de autorização específica dos titulares”, explica Crespo.

A LGPD e o próprio “open banking” dificultam a implementação do chamado “cadastro positivo”, um projeto que prevê a criação de uma lista de “bons pagadores”, e incluiria todos os moradores no país, sem que eles dessem autorização para tal. Essa informação seria usada pelos bancos para determinar, entre outras coisas, quem tem ou não direito a crédito.

 

Isso é seguro?

Pouca coisa exige mais segurança que informações bancárias. Não por acaso, os bancos desenvolveram alguns dos sistemas mais impenetráveis do mundo: a sobrevivência do seu negócio depende disso.

Então como pensar em transitar nossas informações bancárias por aí, com terceiros?

Tecnicamente, o “open banking” é bem construído. Mas há um elo muito frágil nessa corrente: o próprio usuário. Para tirar proveito verdadeiro da novidade, o cliente precisa ter um conhecimento mínimo tanto dos próprios conceitos de transações bancárias, quanto da tecnologia.

Basta ver como as próprias redes sociais são usadas para ludibriar o consumidor, que autoriza aplicativos a coletar e usar seus dados indevidamente, em troca de algum pequeno benefício, como testes do tipo “com que celebridade eu me pareço”.

Portanto, os grandes entraves para a adoção do “open banking” não são técnicos, mas sim de conscientização dos correntistas. A proposta é boa, pode realmente trazer grandes benefícios, mas exige um trabalho junto ao cidadão. E, nesse cenário, a Lei Geral de Proteção de Dados pode ser, afinal, uma interessante aliada.


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