Com a concentração do mercado de farmácias em poucas grandes redes nos últimos anos, que normalmente conseguem negociar condições comerciais mais vantajosas com fornecedores, a vida dos pequenos estabelecimentos do setor ficou mais difícil. Ainda assim, muitos deles resistem ao avanço dos gigantes, às vezes graças a um atendimento diferenciado.
No mundo digital, essa disputa se acirra, com os pequenos perdendo essa sua vantagem, o que pode se tornar dramático com o aumento do uso do e-commerce pela população. Por isso, um aplicativo criou um marketplace de pequenas e médias farmácias para ajudá-las a fazer frente ao poder das grandes.
“O Farmácias App ajuda a potencializar as farmácias sem concorrer com elas”, explica Rodrigo Carvalho, gerente-geral da plataforma. Isso quer dizer que apesar de ter como dono o grupo SantaCruz, maior distribuidor de medicamentos da América Latina, eles não vendem produtos, e sim buscam oferecer as melhores opções aos clientes finais, a partir do estoque de farmácias da região onde mora. “A ideia é ser uma referência em beleza e saúde, assim como o iFood é na alimentação”, acrescenta.
Isso cria uma vantagem competitiva que os pequenos dificilmente conseguiriam sozinhos, por falta de exposição e tecnologia. “Como são várias farmácias reunidas em um único aplicativo, e não só o estoque de uma grande rede, ele tem um sortimento muito maior, que pode até atender com mais velocidade que uma gigante”, explica Carvalho. Há também uma vantagem de se poder comparar preços e condições de muitos estabelecimentos diferentes, fugindo da opção única de uma rede.
Para isso, é fundamental que a plataforma esteja integrada, em tempo real, com as informações de estoque desses pequenos e médios estabelecimentos. Para aqueles que já possuem um sistema de controle mais robusto, os técnicos da Farmácias App simplesmente fazem uma integração direta entre as plataformas. Para aqueles com sistemas mais simples, a empresa instala um agente no servidor da farmácia para coletar e repassar imediatamente a informação à central. Já nos muito pequenos, que não possuem sistema algum desse tipo, cada mudança no estoque pode ser informada manualmente em um site de administração da parceria.
O modelo de negócios do Farmácias App é simples. Uma vez integrados na plataforma, os produtos do lojista passam a ser oferecidos aos clientes organizados por critérios como preço, distância e custo de entrega. Como em qualquer marketplace, uma mesma compra do cliente pode reunir itens de diferentes estabelecimentos, de maneira transparente. Quando qualquer venda é feita, a plataforma fica com 8,5% do valor de vendas. Não há nenhum outro custo para o lojista.
Toda a cobrança é feita pela plataforma, que depois repassa os valores para as farmácias. As entregas podem ser feitas pela plataforma ou ficar a cargo de cada lojista. Nesse caso, a equipe do Farmácias App monitora para verificar se o produto foi entregue dentro do prazo.
Hoje o serviço engloba farmácias de mais 900 cidades em 24 Estados e no Distrito Federal, a maioria delas concentradas na região Sudeste. “Nossa vontade é ter parcerias com todas as 80 mil farmácias do Brasil’, afirma Carvalho. No momento, a plataforma, que foi lançada em 2017, conta com mais de 3.000 estabelecimentos cadastrados. O crescimento de receitas do ano passado para esse ficou em torno de 270%.
O personagem Theodore, do filme “Ela”, e sua amada Samantha: o sistema do celular que carrega em seu bolso
Você se apaixonaria por uma máquina? É uma pergunta séria! Portanto, antes de mandar um sonoro “não” como resposta, deixe-me fazer outras indagações: o que é necessário para se apaixonar por alguém (ou por algo), e quanto a inteligência artificial já pode influenciar nisso?
Acha tudo isso maluquice? Pois saiba que estamos bem próximos de isso se tornar realidade! E pode ter impactos incríveis em sua vida pessoal e profissional.
O tema já foi amplamente explorado pela ficção, em filmes e livros. Um dos melhores exemplos é o filme “Ela” (“Her”, 2013), em que o protagonista Theodore (Joaquin Phoenix) se apaixona pelo sistema operacional inteligente de seu computador e de seu celular (chamado de Samantha), personificado pela voz de Scarlett Johansson.
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O filme é construído com grande sensibilidade por Spike Jonze. Mas, apesar de Theodore estar passando por uma fase depressiva, o que o faz se apaixonar por Samantha não é sua carência. O que o conquista é o fato de que o sistema sabe tudo sobre ele, pois tem acesso a todo tipo de banco de dados sobre o sujeito. Mais que isso: os dois sempre conversan, e Samantha aprende continuamente do que ele gosta. Resultado: ela sempre oferece o que ele precisa, mesmo coisas inesperadas.
Trazendo para nossa realidade, qual foi a última vez que você foi seduzido por um sistema?
O vendedor perfeito
Não, não me refiro no sentido romântico ou sexual, mas, por exemplo, para comprar algo. Afinal, uma boa venda também é uma forma de sedução. E, se até então isso era privilégio dos bons vendedores, cada vez mais a tecnologia ocupa esse espaço, seja por sistemas de autoatendimento no e-commerce, seja como suporte para vendedores humanos.
Quem trabalha com CRM, sabe que os quatro pilares para conseguir uma boa venda combinam a oferta certa, para o cliente certo, no momento certo e no canal certo. Se qualquer um deles não for atendido, a venda ainda pode acontecer, mas será mais difícil. Por outro lado, se os quatro estiverem presentes, é quase certo que o consumidor fará a compra.
Os departamentos de marketing e comerciais sempre trabalharam duro para isso. Mas essa tarefa está cada vez mais complexa, porque nós, os consumidores, também estamos sendo modificados pela tecnologia, que nos dá um incrível poder de escolha e acesso ubíquo a informações e serviços. Em um fenômeno que está sendo chamado de “pós-consumidor”, queremos tudo do nosso jeito, na nossa hora, de um jeito fácil e, ainda por cima, barato.
A melhor (e possivelmente em um futuro próximo, será a única) maneira de se manter nesse jogo é usando a tecnologia para compreender esse consumidor. A exemplo do que Samantha fez com Theodore, tecnologias como machine learning, Internet das Coisas, big data, análises preditivas e linguagem natural já permitem que empresas conheçam, de maneira cada vez mais profunda, seus consumidores, para atender, com incrível precisão, os pilares do CRM acima.
Esse, aliás, foi o tema da minha apresentação no “Colóquio de Inteligência Artificial e Redes Sociais”, realizado no dia 13 de dezembro pelo grupo de pesquisa Sociotramas, do qual faço parte na PUC-SP. Se quiser assistir à minha fala de 15 minutos, ela está no ponto no vídeo abaixo (aproveite para ver também toda a íntegra do evento: discussões de alto nível).
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Discutimos, inclusive, alguns exemplos, como as “vitrines inteligentes” da SAP. Com esse sistema, câmeras captam a imagem de uma pessoa que estiver diante da vitrine de uma loja, tentando identificar algumas informações suas essenciais para a venda, como sexo, faixa etária, como se veste e até mesmo o humor do indivíduo. Toda essa informação é cruzada com diversas bases de informações, sejam estatísticas, vindas de big data, ou do próprio indivíduo, para sugerir a melhor oferta para ele.
Falei também da tecnologia de “remessa antecipada” da Amazon, em que a gigante do varejo tenta “adivinhar” o que um consumidor quer. O objetivo é ter o item no centro de distribuição mais próximo dele antes mesmo de o pedido ser feito, para que possa ganhar da concorrência no prazo de entrega.
Se a coisa for bem-feita, é um cenário em que todos ganham. Afinal, o consumidor receberá uma boa oferta de algo que quer, na hora que busca aquilo. Portanto, suas necessidades estarão sendo bem atendidas. Do lado do varejo, ao prestar esse ótimo atendimento, suas vendas tendem a crescer. Mais que isso: há uma boa chance de aquele consumidor ser ainda fidelizado.
Mas fica sempre a dúvida: as empresas não podem passar dos limites e invadir a nossa privacidade além do razoável –e permitido? Na verdade, no colóquio acima, foi perguntado para mim quem nos protege disso.
Quais são os riscos a que estamos expostos nessa história?
A privacidade morreu?
É claro que existem limites éticos e morais nisso tudo. Aliás, nesse ano foi sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados , que trata do assunto.
Mas precisamos ter clara uma coisa: a privacidade como conhecíamos até havia bem pouco tempo, já não existe mais. Como disse no colóquio a minha orientadora Lúcia Santaella, a partir do momento em que tornamos públicas (e, na maioria das vezes, de maneira irrestrita) nossas informações pessoais, fica difícil querer exigir garantias de privacidade.
O que existem são boas práticas, tanto para empresas quanto para nós, consumidores. Para elas, a primeira recomendação é usar os dados das pessoas apenas para os fins concedidos. Ou seja, se o usuário lhe entregou dados para ganhar descontos nas farmácias, isso não deve ser usado para definir o preço de planos de saúde (ou ainda vender um carro!). Da mesma forma, esses dados não devem ser compartilhados com terceiros. Por fim, as empresas não devem enganar o usuário para coletar dados, como acontece muito nesses infames joguinhos no Facebook, que roubam um monte de nossas informações para, por exemplo, dizer apenas com qual celebridade nos parecemos.
Quanto a nós, o que precisamos fazer é aceitar que esse é o jogo atual. Somos continuamente rastreados, das mais diferentes formas, e não há como escapar disso. Mas precisamos ter, pelo menos, consciência de que isso está acontecendo, para não entregarmos alegremente tudo o que somos a qualquer um. Da mesma forma, considerando que estamos nessa “para valer”, aprendamos a aproveitar todos esses recursos para conseguirmos o que buscamos, com as melhores vantagens disponíveis.
Não vamos nos apaixonar pelo e-commerce, mas, se todos fizerem bem a sua parte, realmente é um cenário em que todos podem ganhar. No final, nossa vida fica melhor.
Só não estamos ainda na pele de Theodore.
Ainda.
E aí? Vamos participar do debate? Role até o fim da página e deixe seu comentário. Essa troca é fundamental para a sociedade.
De algumas semanas para cá, tenho visto pessoas andando pelos corredores do supermercado com o olhar fixo no celular. Lembram até a febre do Pokémon Go, quando, há um ano, multidões de jogadores invadiram as ruas para caçar os monstrinhos virtuais. Mas, dessa vez, não são pokémons: estão procurando ofertas criadas para elas, resultantes de algoritmos que trouxeram a análise de consumo dos usuários para o varejo físico. Sim, em um tempo em que a privacidade zerou no estoque, até as lojas nos rastreiam. Mas, longe de ser motivo de preocupação, essa pode ser uma boa notícia.
O responsável por isso é o Pão de Açúcar, que lançou no dia 29 de junho aplicativos para suas duas bandeiras: Extra e Pão de Açúcar. A ideia é trazer, para o celular dos clientes que fazem parte dos seus programas de fidelidade, ofertas criadas sob medida para cada indivíduo. Se o cliente colocar no carrinho um desses produtos, o desconto acontece automaticamente quando passar pelo caixa.
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Mas o funcionamento do programa vai muito além de simplesmente dar descontos em produtos que o consumidor está acostumado a comprar. Isso seria só uma evolução linear do modelo de descontos convencional, em que varejista e fornecedor abrem mão de parte de suas margens para ganhar no volume.
Na nova proposta, o fabricante ou distribuidor cria ofertas associadas a regras diretamente no sistema. Elas são executadas em cima das informações dos clientes. Por exemplo, é possível pedir ao algoritmo para dar um desconto a clientes que sempre compram produtos de uma dada categoria, mas nunca o da sua marca. Ou então para quem está acostumado a comprar um produto mais popular do fornecedor, na expectativa que passe a adquirir uma versão premium. E até oferecer algo que o Big Data sugira ser de interesse do cliente. É possível definir ainda características demográficas e a quantidade de clientes que devem ser impactados pela promoção.
As ofertas entram no ar imediatamente, pois não dependem de intermediação ou aprovação do Pão de Açúcar. Isso só é possível porque, ao contrário do modelo tradicional, todo o desconto sai do bolso do fornecedor, que pode acompanhar em tempo real a aceitação da sua oferta. E o desconto só é aplicado nos itens que forem efetivamente comercializados. Ou seja, se o fornecedor quiser “promocionar” 50 mil itens de um dado produto, mas apenas 15 mil forem comprados pelo consumidor-final, os outros 35 mil que ficaram no estoque do varejista continuarão com o preço “cheio”.
No final das contas, é um jogo em que todos ganham: o cliente pode ter um desconto apreciável na conta final; o varejista aumenta as suas vendas e o “wallet share” (os consumidores passam a comprar mais nele e menos nos concorrentes), sem prejudicar sua margem; o fornecedor tem acesso a uma base riquíssima para criar ofertas mais assertivas, criando um marketing muito mais eficiente, com um controle refinado dos custos. Vale dizer que o Pão de Açúcar garante que os dados dos consumidores não são repassados aos fornecedores, pois todas as regras são executadas dentro de seu próprio ambiente.
Sabe o que é mais incrível nessa história? Esses dados estão lá “desde sempre”. O programa Pão de Açúcar Mais existe há 17 anos. Mas faltavam duas coisas para que isso acontecer: um poder computacional imenso e a cultura de que nossos dados têm valor e podem ser convertidos em benefícios para nós mesmos.
Agora temos tudo.
Dados do consumidor em toda parte
Principal concorrente do francês Casino, controlador do Pão de Açúcar, o Carrefour também trouxe novidades nesse segmento para o Brasil.
Depois de surpreender o mercado brasileiro e encerrar seu e-commerce no final de 2012, o site nacional do gigante francês do varejo foi relançado em julho do ano passado, desenvolvido pela também francesa Keyrus. Agora a empresa começa a venda online de produtos perecíveis, algo que traz desafios adicionais.
O e-commerce do Carrefour também trabalha na análise de comportamento do consumidor, valendo-se dos recursos da plataforma SAP Hybris Marketing Cloud em que foi construído. Conversei com Stephan Samouillhan, vice-presidente de comércio digital na Keyrus, e ele me falou da importância disso para realizar ofertas mais assertivas para cada consumidor. Mais que isso, Samouillhan explicou que o grande desafio do varejo hoje é ter o acesso aos dados do consumidor e dos produtos a toda hora e em todo lugar, para incrementar as vendas.
Em outras palavras, a expectativa é que o vendedor de uma loja física tenha acesso a todo o perfil de compra de alguém que esteja atendendo para que possa fazer as melhores ofertas para aquele cliente. Seria quase como se o vendedor fosse o algoritmo, só que em carne e osso. Pois, com toda essa integração de sistemas, fica cada vez mais difícil aceitar que uma venda seja perdida porque o vendedor não tinha informação sobre o cliente, sobre o produto ou sobre as ofertas que poderiam ser oferecidas para aquela pessoa especificamente.
Foi-se o tempo em que essas decisões precisavam ser autorizadas por um gerente, com base apenas em sua intuição.
Produtos que ajudam na venda
As informações sobre o consumo das pessoas podem vir também dos próprios produtos, enquanto são usados! Elia Chatah, especialista em varejo da SAP, me falou sobre a experiência da fabricante de produtos esportivos Under Armour. A empresa desenvolveu um aplicativo capaz de coletar informações de diferentes “wearables” (equipamentos “vestíveis”, como relógios inteligentes) para rastrear padrões de consumo das pessoas, além de seus níveis de atividade física, qualidade de sono, entre outras métricas.
Graças a um sistema desenvolvido pela empresa com a SAP, a fabricante consegue, por exemplo, identificar o momento em que um dado consumidor precisa trocar seu tênis, pois ele já percorreu mais de 650 km com ele, distância em que o calçado já não protege mais o organismo do atleta adequadamente. Dessa forma, o consumidor pode ser informado que está na hora de comprar um novo.
Da mesma forma, o sistema pode identificar alterações no comportamento esportivo de uma dada população, tomando decisões de negócios a partir disso. Por exemplo, se a prática de corrida aumenta muito em uma dada cidade, a Under Armour saberá que precisa aumentar a venda de tênis de corrida para as lojas dessa região, pois mais pessoas procurarão por esse produto.
Como se vê, corremos a passos largos para um mundo em que nossos dados dizem muito sobre nós.
E a privacidade?
Diante de tudo isso, a pergunta natural é: como fica a nossa privacidade? Bom, o que posso dizer é: aceita que dói menos.
Não estou dizendo que temos que ser displicentes com nossos dados. Já escrevi aqui sobre a importância de cuidarmos muito bem das nossas informações pessoais, especialmente porque existem um monte de pilantras tentando nos enganar para práticas condenáveis e até criminosas usando nossas informações. Portanto, não podemos dar mole com isso.
Mas isso é diferente de inciativas com as descritas acima e tantas outras que já fazem parte do nosso cotidiano. Ou alguém aqui vai parar de usar o Facebook só porque ele nos conhece mais que nós mesmos, e usa essa informação para vender anúncios assertivos que aparecem no nosso feed de notícias? Ou vamos abandonar o Waze, só porque ele informa ao Google onde nós estamos em tempo real, não apenas para o próprio sistema funcionar, mas também para nos mandar ofertas baseadas em geolocalização?
Claro que não, certo?
O fato é que vivemos em uma época em que temos produtos e ofertas cada vez mais personalizados. Temos acesso a serviços que nos oferecem descontos no supermercado, fugir de congestionamentos, encontrar as informações que precisamos, falar rapidamente com qualquer pessoa, promover nossos serviços, e uma infinidade de outras coisas. Facilidades simplesmente inimagináveis há apenas dez anos, e que parecem nos ser ofertadas de graça.
Só que não existe almoço grátis. Pagamos, sim, por tudo isso. Mas a moeda são as nossas informações. E achamos isso uma troca justa! Todos esses avanços tecnológicos estão promovendo, portanto, não apenas mudanças culturais maiúsculas, mas redefinindo alguns pilares do próprio capitalismo.
Precisamos apenas ficar atentos se o uso de nossas informações continua dentro daquilo que foi combinado. Se for assim, esse é realmente um jogo em que todos podem ganhar.
No dia 4, a Qualcomm lançou o Snapdragon 835, o mais poderoso processador para celulares já criado. Mais que simples curiosidade tecnológica, a novidade coloca mais um prego no caixão dos PCs e deve impulsionar ainda mais o poder de smartphones. Não é de se estranhar, portanto, que tanta gente esteja literalmente trocando seus computadores por celulares! Mas e as empresas (inclusive a sua), estão preparadas para lidar com essa mudança de hábito dos consumidores? Resposta: a esmagadora maioria não!
Até há alguns anos, essas duas conclusões seriam contraditórias. Hoje fazem todo sentido. Isso porque a imensa maioria dos computadores comprados para residências no pais destinam-se a atividades simples, como pesquisas na Internet, conversas online e produção de textos. Até bem pouco tempo atrás, um computador era a única possibilidade de se fazer isso. Hoje os celulares cumprem essas tarefas tão bem ou até melhor que os PCs e trazem duas vantagens inegáveis: não precisam ser compartilhados com outros membros da família e estão conectados e prontos para uso o tempo todo, onde quer que estejamos.
Nossa vida está de tal forma integrada aos celulares que, se esquecemos nossa carteira em casa, damos um jeito para passar o dia sem ela, mas, se esquecemos o celular, voltamos para buscá-lo. Afinal de contas, as tarefas que desempenhamos com ele estão cada vez mais diversificadas e essenciais. Tanto que a GM usou esse comportamento no comercial abaixo, ainda em abril 2014:
É uma propaganda de carro, mas a coisa mais importante parece ser o celular! Ou seja, a capacidade de se conectar ao seu smartphone se transformou em um argumento de venda do Ônix, “um carro feito para os dias de hoje”.
E como ficam os PCs diante desse avanço dos celulares?
O que ainda garante uma sobrevida aos computadores? Existem muitas tarefas que ainda são difíceis de ser executadas em dispositivos móveis, como smartphones e tablets.
Os empecilhos podem ser agrupados em três grandes grupos: interface (um mouse é muito mais preciso que nosso dedo), tamanho da tela e capacidade de processamento. Mas os primeiros vêm sendo resolvidos criativamente pelos designers de interface, enquanto que, para os segundos, as telas estão ficando cada vez maiores. Quanto ao poder da máquina, lançamentos como o da Qualcomm minimizam continuamente a vantagem dos PCs, até que ela desapareça por completo
Mas, como dito acima, para a imensa maioria das pessoas, os celulares atuais já dão conta do recado. Para elas, a conectividade é a coisa mais importante que existe.
Mas então o que as empresas estão fazendo para tirar proveito disso?
Primeiro no celular
Quando eu trabalhava no Estadão, lá pelos idos de 2010, começou a ficar popular o conceito de “digital first”, especialmente entre os veículos de comunicação (talvez para tentar compensar o seu imperdoável atraso nisso). Ele preconizava que as empresas, ao pensar em seu negócio, deveriam considerar, desde o primeiro momento, que ele deveria funcionar bem nos meios digitais. Na verdade, se fosse para escolher entre o online e o off line, o primeiro deveria ser privilegiado.
De lá para cá, o “digital first” foi substituído pelo “mobile first”. Ou seja, não basta funcionar bem nos meios digitais: tem que funcionar bem nos celulares. E aí a coisa fica feia.
As empresas já sabem, por exemplo, que precisam ter um bom site. Mas a maioria continua pensando nos computadores quando produzem seus sites. Então possuem uma ótima presença online na Web, mas apenas quando o site é visto em PCs. Se for aberto em um celular, muitas vezes fica inutilizável.
Um erro clássico é insistir em tecnologias ultrapassadas, como, por exemplo, o Flash. É verdade que ele foi fundamental para tornar a Web muito mais bonita e interativa há uns 20 anos, mas se tornou pesado e inseguro, acabando sendo banido dos celulares. Além do mais, hoje é possível fazer a mesma coisa com HTML 5, mais estável e leve. Então por que insistir no Flash?
O negócio é tão sério, que o Google penaliza sites que não aparecem bem em celulares, jogando-os para baixo nos resultados de seu buscador. Outro bom exemplo é The New York Times, que bloqueia o próprio site nos computadores da empresa. O objetivo: forçar os funcionários a usar os produtos nos celulares, para terem a mesma experiência que a maioria dos clientes.
Mas há ainda um outro tipo de erro comum na presença das companhias nos celulares.
Use bem a plataforma
Smartphones e tablets são equipamentos incríveis, que permitem aos desenvolvedores criar soluções inovadoras e muito úteis aos usuários, graças a uma enorme quantidade de sensores (como geolocalização), ao fato de se integrar com muitas bases de dados do proprietário (como informações do Facebook e do Google) e por estar continuamente online. Então por que muitas empresas insistem em oferecer aplicativos que se limitam a transpor para a telinha o que eles oferecem na Web?
Fazer isso é muito desperdício de potencial tecnológico! É como ter uma Ferrari e usá-la apenas para ir à padaria da esquina!
Aplicativos de e-commerce são um mau exemplo disso. A maioria não oferece nada além do que está em seu site. Francamente, para que desenvolver um app então?
Mas peguemos o exemplo da Amazon. Seu aplicativo tem um recurso bastante interessante: quer comprar um produto que você está vendo na sua frente ou em uma imagem? Basta fotografá-lo com o aplicativo! Afinal, todos os celulares têm uma câmera. Em segundos ele o reconhecerá o item e dará o link direto para comprá-lo. Há ainda o caso da Amazon Go, as novas lojas físicas da empresa, em que o consumidor pega os produtos que quer e sai sem precisar passar pelo caixa, discutido aqui recentemente. Nelas, o celular tem um papel essencial na identificação do usuário.
Algumas empresas já aprenderam a se aproveitar da geolocalização –a capacidade do smartphone de saber onde o usuário está em tempo real. Dessa forma, sempre que o cliente se aproximar de uma loja física do varejista –ou de um concorrente– o celular pode jogar na tela uma oferta convincente, com base no perfil de compras do indivíduo.
Esses são apenas alguns exemplos mais óbvios de como qualquer negócio pode tirar muita vantagem dos celulares, mas poderíamos ficar aqui horas debatendo possibilidades para cada caso. Na maioria delas, nem é preciso um grande investimento. Cada vez mais, o único limite fica sendo a criatividade do dono do negócio e do desenvolvedor.
Portanto, pergunte a você mesmo e responda com sinceridade: o seu negócio já abraçou para valer os smartphones? Pois você e seus clientes já fizeram isso! Não dá para descolar uma coisa da outra.
Homeplus, sistema da Tesco na Coreia do Sul, que permite que os consumidores façam compras na plataforma do metrô com seus celulares, apenas fotografando as imagens dos produtos, que são depois enviados a suas casas
Há alguns dias, a Amazon fez outro daqueles anúncios com potencial de chacoalhar o varejo: a Amazon Go, uma loja em que o consumidor simplesmente pega os produtos que quiser e sai, sem precisar passar por um caixa. Mas apesar de ser algo incrivelmente inovador, está longe de ser a única tecnologia que impactará profundamente a nossa maneira de fazer compras em um futuro próximo. E isso dá espaço a uma série de questionamentos éticos pela forma como afeta algo tão essencial a todos nós.
Para quem não sabe do que se trata, Amazon Go é o nome de uma cadeia de lojas físicas da gigante do e-commerce, cuja principal característica é a inexistência de caixas: o consumidor pega o que quer e vai embora. Ele é identificado por um aplicativo em seu smartphone e uma grande combinação de sensores da loja verifica o que o consumidor pega e quanto pega. Caso desista da compra, é só devolver o item à gôndola. Quando terminar, basta sair da loja e todos os produtos serão automaticamente cobrados no seu cartão de crédito.
O vídeo oficial abaixo demonstra bem o conceito:
A Amazon pretende abrir 2.000 lojas como essa. A primeira está prevista para o início de 2017 em Seattle (EUA), onde fica sua sede.
Para alguém que adora tecnologia, como eu, a Amazon Go é de encher os olhos. A princípio, o que se vê é uma incrível simplificação do ato de fazer compras, e uma grande agilidade no processo. Mas a iniciativa traz muito mais que isso, inclusive potenciais riscos de invasão de privacidade.
Foi-se o tempo que varejo era movido pela intuição do gerente da loja e pela lábia do vendedor. Há anos, já se guia por uma ciência própria, que embute cada vez mais tecnologia. Inúmeras variáveis são consideradas para escolher quais produtos oferecer em uma loja e como fazer isso, como o perfil do negócio, local onde está a loja, faixa etária, classe social e nível educacional de seus compradores, época do ano, entre tantos outros.
É por isso que não existem, por exemplo, duas Lojas Americanas iguais no mundo, apesar de todas pertencerem a uma mesma empresa. Os produtos oferecidos e sua distribuição podem variar dramaticamente de uma loja para outra, seguindo critérios como os indicados acima.
O objetivo de tudo isso: maximizar a receita e os lucros. E isso só é possível conhecendo muito bem seus clientes.
E aí a Amazon Go começa a mostrar a que veio.
Quer pagar quanto?
Não é de hoje que a Amazon é um incrível case sobre como obter informações de todo tipo de seus consumidores e as combinar de maneiras inteligentes, para criar ofertas muito mais atraentes. As pessoas acabam comprando lá, mesmo quando o preço não é o mais baixo. Tudo porque as ofertas são as mais assertivas, mais adequadas a cada cliente individualmente. E isso graças à tecnologia.
Então chega a Amazon Go.
Para que funcione, ela precisa obrigatoriamente rastrear em detalhes tudo que o consumidor faz enquanto estiver dentro da loja. Isso não apenas evita furtos, como também garante que produtos selecionados sejam cobrados e que, por outro lado, o consumidor não pague por algo que não levou.
Só que, ao mesmo tempo, a Amazon coleta informações valiosíssimas sobre os hábitos de consumo dos usuários: o que compram frequentemente, o que compram eventualmente, qual a sequência de compras, o que é adquirido sem pestanejar e o que só acontece depois de alguma reflexão ou relutância, combinação de produtos adquiridos, frequência com que cada item é comprado, entre muitas outras coisas.
Para uma empresa que é conhecida como “a loja que vende de tudo” (apesar de que isso obviamente não será verdade nas lojas da Amazon Go), essa informação é valiosíssima, não apenas para organizar a oferta de produtos e de preços em cada ponto de venda e o estoque nos depósitos, como também para criar uma experiência de compra mais eficiente para cada consumidor.
Costuma-se dizer que existe uma Amazon para cada cliente, e isso não é um exagero. Transpondo isso para as lojas físicas desse projeto, o consumidor poderia ser avisado que está chegando a hora de reabastecer alguns itens de sua despensa. Mais que isso: supondo que as etiquetas de preço na loja fossem compostas por pequenas telas de cristal líquido, seria possível alterar dinamicamente o preço de acordo com o consumidor que estivesse olhando para cada produto.
Como? Se se tratar de um item que o consumidor sempre compra, exibe-se o preço “cheio”; se for algo que exige dele um pouco mais de reflexão, pode-se oferecer um desconto, “para fechar negócio”. Isso já acontece no e-commerce, mas agora pode começar a acontecer também no varejo físico.
Não será mais conversa fiada de vendedor quando ele disser que “esse preço é só para você!”
Conhecendo o consumidor como ninguém
No final das contas, a turma de Jeff Bezos faz tudo para não perder um negócio, abusando de toda a tecnologia disponível para isso. A entrega em até 30 minutos por drones, que já vem sendo anunciada há anos, literalmente decolou no início deste mês, com os primeiros testes de entregas reais na Inglaterra, como pode ser visto abaixo:
Como já foi dito antes, nem sempre o preço será o mais baixo, mas receber um produto tão rapidamente –às vezes mais que a ida a uma loja no bairro– é um atrativo inegável. E as empresas de comércio eletrônico sabem que o prazo de entrega pode ser o fator de desempate para o consumidor comprar de uma loja e não de um concorrente, que oferece o mesmo produto pelo mesmo preço.
Nesse sentido, tão ou mais ousado que a entrega por drones é o conceito de “remessa antecipada”, patenteada pela mesma Amazon no final de 2013. Funciona da seguinte maneira: os servidores da empresa tentam “adivinhar” compras de seus consumidores antes que elas tenham sido sequer feitas –e sem qualquer garantia que elas sejam efetivadas. De posse dessa informação, eles verificam se o produto está disponível no centro de distribuição da companhia mais próximo da residência do comprador em potencial. Caso não esteja, ele é enviado para lá antes que o pedido seja concretizado. O objetivo: ganhar alguns dias no prazo de entrega para cada caso e, dessa forma, vencer a concorrência nesse quesito.
Parece exagerado? Jeff Bezos acha que não. Se a informação para até mesmo antecipar o que o consumidor deseja existe, e a tecnologia para extraí-la está disponível, por que não aproveitar isso para fechar vendas?
Um outro exemplo tecnológico no melhor estilo “de grão em grão a galinha enche o papo” é o da Kiva Systems, uma empresa americana que cria robôs e sistemas de organização inteligente de grandes centros de distribuição.
No modelo tradicional desses depósitos, metade do tempo dos funcionários se consome com o pessoal literalmente andando até as prateleiras para buscar os itens que serão entregues. A Kiva criou um sistema inovador que, ao invés disso, robôs trazem as prateleiras inteiras com os produtos até os funcionários responsáveis pelo despacho, economizando muito tempo.
Mas o mais surpreendente é a devolução das prateleiras: o sistema está constantemente reorganizado o lugar delas no depósito com base no volume de pedidos de cada item individualmente. Como exemplo, se o Dia dos Namorados está chegando, as prateleiras de produtos de grande saída nessa data vão sendo, aos poucos, reposicionadas pelos robôs perto das esteiras de despacho. Tudo para ganhar preciosos minutos. Passado esse dia, tais produtos voltam a ser colocados mais para o fundo do centro de distribuição, abrindo o “espaço nobre” para outros itens, com mais demanda no novo período.
O vídeo abaixo ilustra bem isso:
O sistema traz benefícios tão claros que, em 2012 a empresa foi comprada por US$ 775 milhões. Adivinham o comparador? Uma dica: seu nome começa com “A” e termina com “mazon”. E a Kiva foi rebatizada de Amazon Robotics.
Case brasileiro na Copa do Mundo
No Brasil, também temos exemplos muito criativos –e ousados– do uso de tecnologia para vendas. E a Netshoes puxa essa fila.
Na Copa do Mundo no Brasil, a empresa ganhou destaque na imprensa e nas redes sociais com uma inusitada campanha. Pouco antes da competição, um grupo muito bem selecionado de clientes recebeu uma caixa especial da empresa contendo uma camisa oficial da Seleção Brasileira do tamanho de cada um desses clientes e com seu nome estampado atrás, além de uma Brazuca, a bola oficial daquela Copa.
Um detalhe interessante: nenhum dos clientes tinha pedido aquilo, e não era um presente. Junto com os produtos, foram instruções para pagar pelo pacote, uma conta que se aproximava de R$ 500. Caso o cliente não o quisesse, a empresa buscava a caixa, sem nenhum custo para o consumidor.
Qualquer um diria que se tratava de uma operação extremamente arriscada pela alta chance de rejeição e os custos associados. Advogados arrancariam os cabelos, pois, pelo Código de Defesa do Consumidor, o envio de produtos não solicitados configura uma amostra grátis.
Mas a campanha foi incrivelmente bem-sucedida! Uma porcentagem bastante alta dos consumidores não apenas topou pagar por aquilo, como ainda ficou extremamente feliz com o fato de “a Netshoes ter se lembrado deles”. Muitos chegaram até mesmo a viralizar a campanha, gravando vídeos e postando nas redes sociais. Apenas uma pessoa ficou muita brava com aquilo: acabou ficando com os produtos de graça, “em nome do bom relacionamento com a marca”.
Assim como nos casos acima da Amazon, o sucesso da Netshoes só aconteceu por um uso criativo e criterioso de tecnologia e de informações coletadas dos clientes: eles sabiam exatamente para quem estavam enviando sua caixa, e que existia uma grande chance de eles aceitarem a oferta.
Questões éticas
Vendo tudo isso, o futuro parece brilhante para consumidores e varejistas. E quero acreditar que, no final das contas, os resultados serão mesmo positivos. Mas há algumas coisas a serem considerados.
Se o varejo sabe tanto sobre nós a ponto de nos enviar produtos não solicitados (e as pessoas acharem isso o máximo), quanto falta para que as nossas compras sejam feitas automaticamente? E, por isso, eu quero dizer que não tenhamos mais que nos preocupar com isso: os próprios varejistas identificarão nossas necessidades, selecionarão os produtos, enviarão a encomenda a nossas casas e debitarão tudo em nosso cartão de crédito. Sem nenhuma intervenção nossa.
Certamente essa é uma comodidade e tanto! Mas o que impediria o varejista de, por exemplo, começar a oferecer não exatamente o que seria mais interessante ao consumidor, e sim o que fosse mais conveniente para ele? Só para ficar em exemplos simples, seleção de marcas que estejam com estoque muito alto ou que lhe paguem pela “seleção preferencial”.
Honestamente entendo que isso acontecerá inevitavelmente: é apenas uma questão de tempo. Mas, quando isso acontecer, seremos capazes de perceber essa eventual manipulação? Já que estamos caminhando para isso –e tudo isso pode nos trazer muitos benefícios reais– precisamos estar atentos.
Afinal, todo tipo de informação nossa, inclusive de consumo, já está “voando” por aí. E pensar que ainda tem gente que não quer informar o CPF para emitir a nota fiscal, com medo de que o governo descubra o que ele está comprando…
Montagem com imagens do filme “Homem de Ferro 2” e da animação “Pokémon”
No dia 6 de julho, a Nintendo e a Niantic lançaram Pokémon GO, um jogo de realidade aumentada que virou um fenômeno instantâneo. Mas as aplicações dessa tecnologia vão muito além dos games: diversos negócios podem alçar voos mais altos com ela. E já é possível ganhar muito dinheiro ou fazer belas economias com investimentos mínimos, ao alcance de qualquer um.
Muita gente acha que é coisa de ficção científica ou que funciona apenas para grandes corporações. Mas a verdade é que não é preciso ser o Tony Stark para aproveitá-la: indústria, varejo e diferentes serviços de qualquer porte, como escolas e até um salão de cabeleireiros, podem usar a realidade aumentada agora. Basta pensar criativamente e lançar mão de algum dos diversos aplicativos gratuitos disponíveis no mercado.
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O vídeo acima traz exemplos de todas as aplicações mencionadas no texto
Para quem não sabe do que se trata, realidade aumentada é um conjunto de tecnologias que permite que elementos que só existem no mundo digital sejam projetados no mundo real. Mais que isso: é possível manipular esses objetos como se eles fossem reais e estivessem de fato no ambiente. O conceito não é novo. Alguns experimentos nessa área já eram feitos nos anos 1970. Mas não há dúvida que ela ficou incrivelmente mais poderosa e disseminada com a popularização dos smartphones, que puseram, na mão de qualquer pessoa, um computador com grande poder de processamento, permanentemente online e com recursos de geolocalização.
Ela não deve ser confundida com outra “realidade” que também está ficando bastante popular: a realidade virtual, aquela dos Oculus Rift. Nesse caso, o usuário é “transportado” para um ambiente digital bastante imersivo, que faz com que ele se sinta em uma outra situação. Já na realidade aumentada, isso acontece exatamente onde a pessoa está, e isso a torna tão interessante para qualquer empresa.
Mas, afinal, como essa coisa pode ajudar o seu negócio?
Varejo e indústria
Se você vende qualquer coisa, a resposta é muito simples: permitindo que o consumidor veja o produto em detalhes e por todos os ângulos. Como consultor de e-commerce, posso afirmar que a impossibilidade para se experimentar o produto é uma grande barreira para as vendas online.
Muitos poderiam argumentar que bastaria colocar um modelo tridimensional no seu site para resolver esse problema. Isso é parcialmente verdade: um modelo desses realmente permitiria ao potencial comprador olhar o produto (por exemplo, um tênis) por todos os lados. Já seria uma grande ajuda, porém os e-commerces não fazem nem isso. Mas e se a pessoa estiver comprando um novo sofá, uma mesa ou uma TV? Como eles ficariam na SUA sala? Ficariam bonitos? Combinariam com o resto da mobília? Encaixaria naquele espaço? São perguntas que pedem que a TV, a mesa, o sofá estejam na casa do cliente, ainda que virtualmente. A realidade aumentada pode responder isso, projetando esses produtos em tamanho real e tridimensionalmente onde eles ficarão na casa do cliente.
Outra aplicação bastante evidente no varejo é o teste de um mostrador em um ponto de venda. Ele chamaria a atenção do consumidor? Qual o melhor lugar da loja para ele ficar? Ele cabe naquele espacinho? Com a realidade aumentada, não é preciso criar modelos caros para testar tudo isso: basta um modelo digital e alguém com um tablet posicionando-o na loja. Como se ele realmente estivesse lá! No caso de uma rede de lojas espalhadas pelo país, a economia é ainda maior, pois, além de não ser mais necessária a produção dos modelos, tampouco é preciso transportá-los a cada um dos pontos de venda a serem testados.
Na indústria os ganhos também podem ser enormes. Tomemos como exemplo os projetos de um novo produto ou a alteração de algo já existente. A realidade aumentada pode simular, por exemplo, o impacto de uma nova peça no produto. Além disso, equipes distribuídas em cidades diferentes podem não apenas participar de reuniões virtuais como se estivessem em um mesmo local, como manipular objetos digitais simultaneamente, colocado “sobre a mesa” de todos os participantes.
Médicos, cabeleireiros e professores
A medicina também tem feito grande uso dessa tecnologia. Médicos ganham “visão de raio-X” em cirurgias, conseguindo ver os órgãos de seus pacientes graças a óculos ou telas que os projetam sobre a pele, tornando os procedimentos muito mais assertivos.
Mencionamos no início do artigo o caso de cabeleireiros. Seus clientes ficariam muito mais felizes se pudessem ver, em tempo real e tridimensionalmente, como ficaria seu novo corte no próprio cabelo. Isso antes que qualquer fio fosse tocado.
Há ainda a educação, uma área que pode atingir um nível novo e incrível com a realidade aumentada. Afinal, muito do que se aprende em sala de aula é essencialmente abstrato. Por exemplo, como os átomos se conectam em uma ligação covalente? Mais que isso: quantos átomos são necessários para se formar uma molécula específica? Todo aluno do Ensino Médio estuda isso, porém de maneira teórica. Mas o aprendizado seria mais eficiente (e divertido) se ele pudesse, de alguma maneira, manipular os átomos com as próprias mãos e visse o compartilhamento dos elétrons acontecendo diante de seus olhos.
A realidade aumentada também pode ser útil para que os estudantes se apropriem do espaço em que vivem, como seu bairro ou cidade, com atividades pedagógicas. A fundação holandesa Waag vem realizando coisas incríveis nesse sentido! Um incrível exemplo é o game Frequency 1550, que nem é tão novo, mas faz com que alunos do Ensino Médio de Amsterdã saiam para as ruas com seus smartphones para realizar tarefas associadas ao conhecimento histórico da cidade. Funcionando como uma gincana, diferentes equipes de estudantes têm que ir até pontos específicos da cidade para realizar tarefas. Um detalhe interessante: na tela dos aparelhos, os alunos veem um mapa da Amsterdã medieval, e a localização de cada um é exibida no mapa em tempo real. Em determinados pontos da cidade, os alunos podem colocar os aparelhos na vertical para ver ilustrações medievais daquele mesmo local. Todas as tarefas acadêmicas são realizadas e enviadas pelos próprios smartphones. Outros games semelhantes, como The Island, colocam alunos de países diferentes em contato (nesse caso, Holanda e Estados Unidos).
Dá vontade de voltar aos bancos escolares para aprender dessa forma!
Como participar de tudo isso?
Criar uma aplicação como Pokémon GO não é para qualquer um. Mas a realidade aumentada hoje está ao alcance de todos. Para isso, existem diversas aplicações e serviços, muitas delas gratuitas.
Algumas delas dispensam qualquer programação, oferecendo um ambiente de fácil operação, que torna o processo tão simples quanto montar uma apresentação. Entre os melhores exemplos dessa categoria, estão o Augment e o Aurasma. Outros, como o LayAR, trazem também recursos para programadores.
Para essa turma que sabe como polir os bits e criar aplicações inteiras, várias plataformas oferecem tudo para introduzir poderosos recursos de realidade aumentada nos seus produtos. Entre elas, destacam-se o Vuforia, o WikiTude, o Kudan AR e o ARToolKit.
O interessante disso tudo é que se pode ir tão longe quanto se queira na oferta de realidade aumentada, e um bom resultado depende muito mais de um uso criativo de suas potencialidades que o domínio de ferramentas de programação. Os ganhos podem ser surpreendentemente bons. Claro que eles são proporcionais ao tamanho do seu negócio e do investimento que fizer.
Vejamos o caso do Pokémon GO, mencionado no primeiro parágrafo. Apesar de, no momento em que este artigo está sendo escrito, ainda estar disponível apenas nos EUA, Reino Unido, Alemanha, Austrália e Nova Zelândia, o game surpreendeu a Niantic e a Nintendo. Em apenas cinco dias, teve 7,5 milhões de downloads, e já está sendo executado em mais de 3% dos smartphones Android do mundo, superando o Tinder (2%) e encostando no Twitter (3,5%).
Os desenvolvedores estão correndo para aumentar a potência de seus servidores, que estão abrindo o bico diante de tantos acessos. E isso significa muito dinheiro entrando: apesar do game ser gratuito, ele permite que os jogadores comprem itens para facilitar sua vida no game. Essas microtransações renderam US$ 14 milhões na primeira semana. Além disso, as ações da Nintendo dispararam, acrescentando US$ 9 bilhões ao valor da empresa.
Mas se usar a realidade aumentada é relativamente simples, por que então não a temos espalhada por milhares de negócios em toda parte? Na verdade, do pouco que se vê, a maioria a maioria é composta de uns experimentos bem toscos e de utilidade duvidosa.
Isso acontece por pouco conhecimento das possibilidades ou por achar que “é areia demais para seu caminhãozinho”. E principalmente falta de criatividade para sair do básico de se colocar uma animação 3D no lugar de uma imagem plana. Isso é divertido, mas dá para fazer muito mais com as mesmas ferramentas! A criatividade é a chave: nem é preciso desenvolver nada para ganhar com essa tecnologia.
Por exemplo, uma pizzaria de Long Island (EUA) está usando um recurso que pode ser comprado no Pokémon GO para atrair clientes. O proprietário paga, com um smartphone que fica no estabelecimento, para que temporariamente um grupo de pokémons virtuais sejam atraídos para o aparelho. Junto com os monstrinhos, um monte de gente vai até a pizzaria para capturá-los. E algumas dessas pessoas podem decidir comer uma pizza.
Então, a criatividade é o que manda! A realidade aumentada pode ajudar qualquer negócio, de maneiras simples ou elaboradas. Felizes aqueles que conseguiremos pular nesse “cenário de negócios aumentado”.
Quais os direitos e deveres que uma empresa tem sobre as informações que seus clientes lhe confiam? Em tempos em que as redes sociais ocupam um papel central em nossas vidas, essa pergunta é fundamental e serve como base para outras, como até que ponto ela pode se recusar a ajudar a Justiça, alegando proteção à privacidade dos seus usuários? Mais que isso: um sistema pode manipular as pessoas?
As empresas podem dizer que tudo está descrito nos seus “termos de uso”, documentos com os quais todos nós concordamos ao começar a usá-las. Mas sejamos sinceros: ninguém lê aquilo! E, caso leia, nem sempre fica claro o que está escrito ali. Por exemplo, você sabia que, de acordo com os termos do Facebook, ele tem direito a usar qualquer coisa que publiquemos na sua rede (incluindo fotos e vídeos), sem nos pagar nada?
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Há alguns dias, o WhatsApp anunciou que toda a comunicação entre seus usuários passou a ser criptografada de ponta a ponta. Em tese, isso significa que ninguém, além dos próprios interlocutores, podem entender o que está sendo dito, mesmo que a informação seja interceptada.
A empresa afirma que, com isso, nem ela mesma é capaz de decodificar essa informação. É um álibi técnico muito interessante contra as constantes determinações judiciais para informar às autoridades o conteúdo de conversas entre usuários que estão sendo investigados. O Facebook, dono do WhatsApp, tradicionalmente se recusa a cooperar, alegando respeito à privacidade dos usuários. E isso regularmente evolui para batalhas jurídicas, como a que tirou o WhatsApp do ar no Brasil por 12 horas, em dezembro passado.
O cuidado com a privacidade e a integridade dos dados de usuários é mais que bem-vinda: é fundamental! Então, se as empresas estão cumprindo a promessa de não os compartilhar com ninguém, nem mesmo com o governo, isso deve ser comemorado!
Entretanto, sem entrar no mérito de que podemos supor que nem todas fazem isso, é razoável perguntar: o que as próprias empresas fazem com tanta informação pessoal, inclusive muitas intimidades, que lhes entregamos graciosamente?
Apaixonando-se pelo sistema
Psicólogos diriam que qualquer relação em que apenas um dos lados sabe muito do outro é desequilibrada, e potencialmente condenada por isso. Mas é exatamente assim que nos relacionamos com as redes sociais, que provavelmente nos conhecem melhor que nossas próprias mães.
Isso foi brilhantemente ilustrado no filme “Ela” (“Her”, 2013), de Spike Jonze. Para quem não viu o filme (que recomendo fortemente), ele conta a história, que se passa em um futuro próximo, do romance entre o protagonista Theodore (Joaquin Phoenix) e Samantha (voz de Scarlett Johansson).
Acontece que Samantha não é uma pessoa: é o sistema operacional que controla o computador e o smartphone de Theodore, tendo acesso a todo tipo de informação dele. O humano se apaixona pelo sistema de inteligência artificial, e é correspondido por ela! Alguns podem achar isso impossível ou até mesmo uma perversão. Mas, ao assistir ao filme, é muito difícil não se apaixonar também! E não pense que Samantha faz tudo que Theodore queira: ela também diz não e demonstra sentimentos como insegurança, ciúmes e raiva. Mas tudo isso é feito de acordo com o que Theodore espera de uma mulher.
Pobre Theodore! Samantha sabe tudo sobre ele, e ele não sabe nada sobre ela.
Não é pessoal, são apenas negócios
De volta ao mundo real, várias empresas são candidatas a nossas “Samanthas”. Facebook e Google são, de longe, as que mais sabem sobre nós, mas Apple e Amazon não fazem feio nesse pelotão de elite. E há uma infinidade de outras empresas que também são capazes de traçar nossos perfis psicológicos e de consumo a partir de nossas pegadas digitais, que, cada vez mais abundantemente, deixamos por aí.
Essas empresas certamente podem nos influenciar para, por exemplo, comprar um produto, em uma nova e eficientíssima forma de marketing. E são capazes até de manipular algumas emoções nossas. Não como Samantha! Mas o Facebook já fez algo nessa linha.
Em 2012, Adam Kramer, pesquisador da empresa, demonstrou ser possível “transferir estados emocionais” a pessoas simplesmente manipulando o que elas veem online. Por análise semântica, os feeds de notícias de 689.003 usuários foram manipulados pelo sistema por uma semana. Metade deles ficou sem receber posts negativos; a outra metade não viu nada positivo. Ao final, o cientista concluiu que pessoas expostas a posts positivos tendiam a fazer posts mais positivos, enquanto as expostas a posts negativos tendiam a fazer posts mais negativos! Ou seja, Kramer atuou decisivamente no humor de quase 700 mil pessoas, apenas manipulando o que viam no Facebook! O estudo foi publicado na prestigiosa “Proceedings of the National Academy of Sciences of USA”.
Mas as empresas não querem que nos apaixonemos por elas: querem apenas que compremos os produtos e serviços que elas promovem.
Como diz o ditado, “não existe almoço grátis”. Todas essas empresas nos oferecem uma infinidade de produtos incríveis aparentemente sem nenhum custo. Mas não se engane, se você não está pagando, você não é o cliente: você é o produto!
Somos influenciados, conduzidos, e sabemos disso. Mas continuamos cedendo nossa informação e usando os produtos, pois não dá mais para imaginar a vida sem eles. Ou alguém deixará de usar o seu smartphone, a mais perfeita máquina de coleta de dados pessoais, que carregamos conosco o tempo todo?
Tais empresas estão erradas em fazer isso? Provavelmente não. Elas realmente nos oferecem produtos e serviços incríveis (e um outro tanto de quinquilharias) sem que tenhamos que explicitamente pagar por eles. Mas isso tem um custo. Pagamos contando-lhes o que somos.
Se existe realmente uma ética, tudo tem limite. E é esse limite que diz se o que elas fazem é certo ou errado. Não há problema em fazer uma publicidade muito assertiva. O que não é aceitável é a manipulação das pessoas.
Então, da próxima vez que estiver usando seu smartphone ou a sua rede social preferida, tente manter o controle da sua experiência e não acredite piamente em tudo que vir. Será que você consegue?
Desde que discuti aqui a polêmica dos sites que dispensam usuários que têm ad blockers, me perguntam se o conteúdo afinal não tem mais valor. Resposta: não como as empresas de comunicação trabalham há 150 anos! Mas ele é fundamental para o negócio. E quem pode explicar isso é o Uber. Aliás, pode indicar o caminho para qualquer empresa de serviços na nova economia.
Mas o que o Uber tem a ver com um jornal? Ou o varejo, uma escola, um profissional liberal? Acontece que, na realidade que começamos a viver, não basta ser bom no que se faz: além disso, é preciso entregar o serviço e o produto que o consumidor quiser de uma maneira que lhe faça sentido. Aí reside o novo valor, aquele que as pessoas percebem e pelo qual estão dispostas a pagar! Todo o resto é commodity.
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Não é um conceito simples de entender, muito menos de aceitar. Mas ele está aí, subvertendo modelos de negócios consolidados há muitas décadas! No caso do Uber, a commodity é o transporte de passageiros. O que diferencia o Uber de um taxista convencional é que o primeiro vende a sensação do prazer de solicitar um motorista, com a garantia de que virá em um carro confortável, novo e limpo, com cortesia, boa conversa e um serviço de bordo superior. Embaixo disso tudo, está o transporte do passageiro, que evidentemente é o alicerce de todo o serviço, mas que não é mais pelo que as pessoas estão pagando. É por isso (e pelos recorrentes casos de agressão a motoristas e passageiros do Uber) que os taxistas estão perdendo a preferência do consumidor: eles querem continuar concorrendo nessa camada inferior do serviço, onde o valor, o diferencial vem sendo retirado pelos seus clientes. Não há como ganhar, exceto pela criação de leis retrógradas ou pela agressão física.
Consideremos o varejo: os produtos oferecidos e a própria venda são a commodity. Já há muitos anos –e isso vem sendo agravado pelo crescimento do e-commerce– o varejo (especialmente o grande varejo) vive uma situação dramática de uma dificuldade crescente de se diferenciar da concorrência. Afinal, todos eles fazem basicamente a mesma coisa, do mesmo jeito. Então todos partem para práticas autofágicas de baixar os preços e investir pesadamente em publicidade, queimando sua margem até o limite da irresponsabilidade. São recursos legítimos, claro! Mas o problema surge quando essas são as únicas ferramentas disponíveis, por sinal igualmente para todos.
Mas vejam os casos das startups Carrinho em Casa e Rabixo. Ambos são varejistas, mas que colocam uma camada extra de serviço acima da venda dos produtos em si. Perceberam que há pessoas sem tempo de fazer suas próprias compras (ou que não gostam ou simplesmente não querem) e criaram bons negócios resolvendo esse problema. São pequenas empresas, mas o conceito também vale para corporações gigantes, como a Amazon demonstra o tempo todo.
Voltando ao caso dos veículos de comunicação, a commodity é o conteúdo, mesmo que seja um excelente conteúdo! Se você, leitor, for um jornalista, pode estar com o cabelo em pé agora. Mas acredite: não é motivo para desespero! É apenas um alerta para mudanças que são inevitavelmente necessárias.
As pessoas sempre terão a necessidade de se informar. Em tempos pré-Internet, isso exigia ler jornais, revistas ou assistir ao noticiário na TV ou no rádio. Havia ainda um consenso de que, se quisesse ficar realmente bem informado, era necessário assinar pelo menos um jornal ou uma revista. E as pessoas pagavam por isso. Entretanto faziam isso por absoluta falta de alternativa! E as empresas de comunicação cresceram com a ideia de que o que elas vendiam era informação.
Ledo engano!
Claro que o conteúdo é importante: sem ele simplesmente não existiria a empresa de comunicação. Mas pelo que as pessoas estavam realmente pagando era a edição desse material, sua organização em páginas, impressão e entrega. E os veículos prosperaram assim, enquanto eram as únicas opções disponíveis!
Mas hoje todo mundo produz conteúdo, incluindo empresas que não tem nada a ver com isso (eu ouvi Red Bull?). Há conteúdo de alta qualidade de montão na Internet, e de graça! É commodity! Isso quer dizer que fica cada vez mais difícil ganhar dinheiro vendendo conteúdo.
Mas dá para ganhar muito dinheiro GRAÇAS ao conteúdo.
É como música aos ouvidos
Assim como o transporte de passageiros para o Uber, o conteúdo é algo essencial para viabilizar um negócio, mas não é O negócio. Algumas empresas de comunicação, como Vice e Catraca Livre, já sacaram isso, e, apesar da natureza do seu produto, aprenderam a ganhar dinheiro de outras maneiras. O papel do conteúdo ali é aumentar a sua reputação e a sua popularidade, viabilizando os outros negócios, onde está o dinheiro.
Nesse sentido, o jornalismo vai muito bem! Quem vai mal são as empresas e os profissionais que continuam querendo ganhar dinheiro apenas vendendo a notícia.
O conteúdo jornalístico não é o único que passou por esse choque de realidade. Muito mais emblemático foi a derrocada da indústria fonográfica no modelo de venda de música em CDs. Venceram parcialmente a primeira batalha, a dos usuários trocando as músicas no formato MP3. Mas foram destruídos quando a Apple lançou o iTunes, que começou a vender as músicas individualmente a US$ 0,99, de uma maneira cômoda, segura e de alta qualidade. Quem continuaria comprando CDs diante disso?
A pá de cal veio com serviços como o Spotify e o Apple Music, que tornaram o iTunes obsoleto: por uma pequena assinatura mensal, dão acesso ilimitado a um acervo gigantesco, em qualquer lugar. Para o consumidor, é música aos ouvidos.
Nem todos os artistas acham isso bacana, especialmente as grandes estrelas. Argumentam que esses serviços lhes pagam apenas uma pequena fração do que eles ganhavam vendendo CDs. E isso é verdade!
Mas eles não vendem mais CDs.
A música também virou commodity. Esses serviços não vieram para substituir os discos. São um espaço de divulgação e consolidação dos artistas. Se os medalhões ganham hoje muito menos, existe a contrapartida que artistas obscuros podem conhecer a fama de uma maneira que jamais aconteceria quando as gravadoras dominavam o processo. O sistema democraticamente dividiu os ganhos entre muito mais gente. E quem é famoso deve agora ganhar dinheiro de outro jeito, por exemplo fazendo shows.
Críticas ao modelo
Muita gente acha tudo isso um absurdo!
Há muitos críticos, por exemplo, ao Uber. Eles dizem que a empresa explora os motoristas, ganhando em cima deles, que são os donos dos carros e os únicos a correr riscos (inclusive de apanhar de taxistas raivosos). Seria, portanto, o capitalismo do pior tipo.
Esses críticos deveriam conversar com esses motoristas. Uso o serviço frequentemente e sempre faço isso. Seus trabalhos anteriores variam de engenheiros a motoristas de táxi. Até hoje não encontrei um que não estivesse satisfeito com o modelo. Nenhum deles me pareceu explorado; na verdade, a sensação mais comum era de gratidão. Afinal, sem isso, estariam desempregados.
Não quero parecer Poliana. Sei que o Uber já disse que, no futuro, espera ter uma frota de carros-robôs, sem motorista. Mas isso ainda vai demorar um bom tempo, pois os tais carros ainda estão em testes preliminares. Até lá, os motoristas continuarão felizes.
Os críticos afirmam que o Uber ganha dinheiro sem risco e “sem fazer nada”. Essa é uma afirmação maniqueísta e rasa, pois a empresa atua justamente na camada do negócio onde está o real valor, como descrito mais acima. Sem isso, o que nos restaria seriam os taxistas, e os motoristas do Uber talvez estivessem desempregados.
São como Elton John, que, em 2007, propôs o fim da Internet, pois ela estaria “destruindo a indústria musical e as relações interpessoais”. Na verdade, ele reclamava porque não estava mais vendendo tantos CDs.
Gosto muito das músicas dele, mas prefiro ouvi-las no Spotify. Por outro lado, irei feliz ao seu próximo show!
Na última quinta-feira (21), a Amazon começou a vendar livros impressos em sua operação brasileira, antes restrita a livros digitais, aplicativos e seus e-readers Kindle. Isso detonou uma gritaria acusando a gigante do varejo de práticas draconianas contra editoras e de descontos agressivos, o que liquidaria os pequenos livreiros. Mas ninguém está falando daquilo que a entrada da empresa no varejo de produtos físicos realmente representa: a desconstrução dos modelos de negócios das editoras e das livrarias.
A Amazon de fato pratica preços baixos, mas eles não são necessariamente os mais baixos do mercado. Peguemos, como exemplo, o livro de não-ficção mais vendido no Brasil de 11/8 a 17/8, segundo o Publishnews: “Destrua Esse Diário”, de Keri Smith. No momento em que esse texto está sendo escrito, a Amazon o vende a R$ 16,20, mais caro (segundo pesquisa no Buscapé) que Ponto Frio.com (o mais barato, a R$ 14,85), Saraiva.com e Livraria da Folha, e empatado com a Fnac.com.
A empresa também é reconhecida por um atendimento e respeito ao consumidor excepcionais, indo muito além do que a lei exige. Um bom exemplo é o prazo de devolução do produto: 30 dias, quando o Código de Defesa do Consumidor prevê apenas 7 (para os quais a maioria dos varejistas torce o nariz e “esconde” essa informação). Traz também soluções comerciais e técnicas muito interessantes, como entregas rápidas e o serviço “Leia enquanto enviamos”, que permite a leitura da versão digital do livro comprado enquanto ele não chega. Sem falar no uso do “big data”, para criar ofertas realmente diferenciadas para cada consumidor.
É difícil ir contra qualquer uma das coisas ditas acima: em tese, elas obrigarão o mercado como um todo a elevar a qualidade de seu atendimento. Então qual é o “problema”?
A Amazon realmente causa estragos tornando modelos de negócios obsoletos. Ela impõe ao varejo e ao mercado editorial mudanças que outras indústrias já enfrentam (não raro sem sucesso), como a fonográfica.
No caso do varejo, os preços baixos são o menor dos problemas dos concorrentes. Qualquer e-commerce é uma operação de varejo, que entrega produtos físicos (muitas vezes grandes e pesados, em lugares distantes). Não basta, portanto, ter um site bacaninha e vender a preços mais baixos que as lojas físicas. Práticas comerciais e logística deficientes, aliadas à queima de preços, geram operações altamente deficitárias, e temos gente muito grande no e-commerce brasileiro tomando prejuízo por isso.
A turma de Jeff Bezos não costuma cometer esses erros. No caso do varejo de livros, outros e-commerces e livrarias do tipo “megastores” são os grandes prejudicados, pois seu diferencial de mix de produtos e preços baixos desaparece. O impacto é menor em livrarias com gestões mais inteligentes, como a Cultura e a Livraria da Vila (e até algumas livrarias de bairro), onde o simples comércio evoluiu para uma experiência rica de compras, com lojas transformadas em espaços de eventos e vendedores transformados em consultores editoriais.
No caso das editoras, a situação é mais grave. A Amazon realmente aperta seus pescoços para que os preços caiam. E essa é uma briga mundial, como pode ser visto em várias batalhas jurídicas entre o varejista e editoras nos EUA e em países da Europa. Porém o mais grave, que atinge o coração das editoras, é a oferta aos autores para que eles editem e publiquem, por sua conta, seus livros. A própria Amazon, a Apple e outros oferecem sistema de “autopublicação” poderosos e fáceis de usar, que tornam a publicação de um livro uma tarefa que dispensa a figura da editora. De quebra, esses players promovem e vendem as obras em suas lojas virtuais, garantindo aos autores royalties incrivelmente mais alto que o oferecido pelas editoras tradicionais.
Não é de hoje que esse tema frequenta “O Macaco Elétrico”. Editoras e livrarias tentam encontrar maneiras de perpetuar seus modelos moribundos, normalmente tentando aprovar leis que contrariam os interesses dos consumidores, e se organizando para enfrentar as exigências dos varejistas mais exigentes. Mas agora a Amazon finalmente chegou para essa queda de braço.
Como pode ser visto, não é uma questão simplória de preço. Trata-se de modernizar o negócio de livros. Não dá para continuar tapando o sol com a peneira.