metaverso

O CEO da Meta, Mark Zuckerberg, durante apresentação que simulou sua proposta do que deve ser o metaverso, em outubro de 2021

Esse será o ano da “virtualização”

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Uma das características essenciais do mundo digital é seu dinamismo, mas ele nem sempre segue o que usuários e empresas desejam. Algumas tecnologias que despontam como grandes promessas nunca deixam de ser apenas isso. Foi o caso do deep fake, que ganhou notoriedade em 2019 com a criação de convincentes vídeos falsos com rostos alheios. E como não mencionar a visão de metaverso de Mark Zuckerberg, apresentado como a grande promessa de 2022? Por enquanto, não virou nada muito útil e ainda corroeu cerca de 70% do valor de mercado da Meta, empresa dona do Facebook, do Instagram e do WhatsApp.

Agora que começamos 2023, outras tecnologias prometem grandes mudanças em nossas vidas. Agrupei-as debaixo de um guarda-chuva que chamei de “virtualização”, indo muito além de usos óbvios nas redes sociais. Essa nova proposta envolve recursos que de fato ampliam digitalmente nossas habilidades.

Com ela, esse pode ser o ano em que experimentaremos a ampliação da inteligência artificial que vemos (como as plataformas criadoras de textos e imagens) e a que não vemos (que, por exemplo, aumenta o poder de nossos smartphones). A realidade mista –que mistura realidade virtual e realidade aumentada– deve também ficar mais próxima de nós. E até o metaverso pode finalmente acontecer no nosso cotidiano.

Agora é ver o que disso tudo realmente se concretizará nos próximos 12 meses.


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Quero começar com o afamado metaverso. Para mim, não é uma questão de “se” acontecerá, e sim de “quando”. Antes de prosseguir, vale definir o termo. O metaverso, como uma plataforma em que pessoas se encontram para realizar atividades em um ambiente digital tridimensional, já existe há 20 anos. Mas aqui me refiro à proposta de Zuckerberg, como um espaço altamente imersivo, formado pela combinação de diferentes tecnologias, em que poderemos “entrar” com equipamentos de realidade virtual e onde poderemos até manipular à distância objetos virtuais ou reais.

A principal barreira para sua adoção são os equipamentos necessários para viabilizar plenamente essa experiência, cujos preços são proibitivos para a imensa maioria das pessoas. Enquanto não ficarem mais baratos, o metaverso continuará sendo uma aplicação de nicho e comercialmente pouco atraente. Para 2023, a Meta promete novos dispositivos, e ela terá concorrência de empresas como Apple e Sony.

Isso pode baixar o preço dos equipamentos a médio prazo, o que é bem-vindo. Mas há também o software envolvido. Para o metaverso ocupar o espaço que hoje está com as redes sociais, ele precisa ser “aberto”. Ou seja, será difícil prosperar se cada empresa oferecer uma plataforma que não converse com as demais. Nesse sentido, é interessante notar que quase todas as big techs aderiram ao MSF (sigla em inglês para Fórum de Padrões do Metaverso), que prevê essa interoperabilidade.

Uma ausência importante desse grupo é a Apple, que, como de costume, tentará manter seus usuários dentro de sua própria solução. Se ela prosperar nisso, poderemos ver outras grandes seguindo por esse caminho. Mas imagine como teria evoluído a Web se cada site só funcionasse em um navegador: provavelmente nunca teria se tornado onipresente em nossas vidas.

A consultoria Gartner divulgou um e-book com tendências globais de tecnologia para 2023. O metaverso aparece na categoria “pioneirismo”, devendo se concretizar, segundo o estudo, em um horizonte de dois a três anos.

 

Ganhando “superpoderes”

Outra tendência que deve se fortalecer na esteira do metaverso, graças aos novos equipamentos, é a realidade mista. Se a realidade virtual nos coloca em um ambiente digital totalmente imersivo e a realidade aumentada projeta elementos virtuais no “mundo real”, a realidade mista combina o melhor de ambos. Por exemplo, poderemos experimentar o funcionamento de equipamentos reais com a adição de peças virtuais. Ou ainda participar de um “game em primeira pessoa” com elementos digitais e outros jogadores projetados em um cenário real.

Com tudo isso, a “virtualização” praticamente nos confere “superpoderes”. Poderemos “ver” o que não víamos, estar onde não estávamos e realizar tarefas antes impossíveis no seu escopo ou no tempo. É onde entra com força a inteligência artificial, aliás também destacada no estudo do Gartner de duas formas: no gerenciamento de confiança, risco e segurança, e na chamada “IA adaptável”.

O crescimento da inteligência artificial é galopante em diferentes áreas. Longe de ser novidade, até poucos anos atrás ela ainda era limitada, caríssima e pouco eficiente. Hoje ela faz parte de nossas vidas, até mesmo sem que saibamos.

Possivelmente você já usou algum sistema impulsionado por ela hoje mesmo, no seu celular. Alguns dos recursos mais incríveis de nossos smartphones nem acontecem nele, que funciona apenas como uma janela para sistemas de inteligência artificial que rodam em um servidor do outro lado do mundo, que usamos de maneira transparente.

A grande novidade de 2022 e que deve se expandir muito em 2023 é a chamada inteligência artificial generativa, aquela capaz de produzir conteúdos inéditos em texto, som, imagem e vídeo a partir de comandos simples do usuário. Elas também já estão por aí há alguns anos (por exemplo, em sistemas de produção de contratos), mas atingiram uma eficiência e uma popularidade inéditas há alguns meses, com o gerador de textos ChatGPT e o criador de imagens DALL-E 2 e Lensa.

As redes sociais foram inundadas com suas produções, criadas a partir de comandos simples de texto. Todas elas são verdadeiramente inéditas e tão bem-produzidas, que fica difícil distingui-las das feitas por profissionais humanos.

Em 2023, devemos ver essas ferramentas sendo cada vez mais usadas até mesmo em ambiente profissional. É inevitável! Como costumo dizer, o que puder ser automatizado será.

Mas isso abre um complexo debate ético e trabalhista. Até onde será legítimo usar um sistema que pode tirar empregos de pessoas, sendo que ele entrega suas produções a partir do que aprende do trabalho de outros profissionais (e, vale dizer, sem remunerá-los)? Deslumbrado com essas possibilidades tecnológicas, o mercado não vem dando ao tema a atenção necessária.

Temos diante de nós 12 meses para ver como e quanto de cada uma dessas tecnologias se materializará ou quanto ainda continuará como promessa. Qualquer que seja o caso, precisamos compreender e nos apropriar de cada uma delas, para que nos tragam benefícios a muitos, sem causar riscos ou prejuízos a ninguém.

 

“Horizon Worlds”, plataforma de metaverso que a Meta vem desenvolvendo, mas cujos próprios funcionários usam pouco

O que falta para o metaverso deixar de ser uma promessa

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As big techs estão ocupando grande espaço no noticiário nas últimas semanas, por causa de seus problemas e demissões: a Meta (dona do Facebook, Instagram e WhatsApp) mandou embora 11.000 pessoas, a Amazon 10.000 e o Twitter perdeu algo como 5.000 funcionários (entre os demitidos e os que pediram para sair). Esse último é o que tem feito mais barulho, por causa do estilo midiático de seu novo dono, Elon Musk. Mas o maior deles é o que pode nos afetar mais diretamente, com o metaverso idealizado por Mark Zuckerberg.

Apesar de o CEO da Meta ter prometido uma revolução há um ano e ter investido mais de US$ 10 bilhões na sua visão de um mundo digital incrivelmente imersivo e poderoso, sua entrega até agora foi mínima e decepcionante. Tanto que os investidores não o perdoaram, fazendo com que a empresa perdesse três quartos de seu valor de mercado no período.

Afinal, o que falta para o metaverso “virar”, tornando-se uma realidade na vida de todos nós? A resposta passa por entender que essa não é uma mudança essencialmente tecnológica, e sim cultural. O ser humano não pode ser retirado dessa equação.


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Isso ficou claro para mim no sábado, enquanto participava do painel “Comunicação, marcas e aspectos jurídicos no metaverso”, no Expo Metaverso. O conceito foi cunhado em 1992 por Neal Stephenson, no livro “Nevasca”. De lá para cá, apareceu em várias plataformas digitais, sendo a mais popular o Second Life, lançado em 2003.

Apesar dessa longevidade, poucas pessoas entendem o que ele realmente é e menos gente ainda está nele. E isso acontece porque esses sistemas, apesar de tecnicamente disruptivos, acabam oferecendo uma experiência ruim, ou pelo menos pior que alternativas já disponíveis, como sites, aplicativos e redes sociais.

O próprio Second Life é um exemplo emblemático. Desde sua concepção, era bem construído, sendo incrivelmente poderoso e flexível na sua proposta. Mas sempre exigiu computadores robustos para funcionar bem. Como poucas pessoas conseguem atender esse requisito, usar a plataforma chega a ser torturante para alguns, pela lentidão com que, por exemplo, seus avatares se movimentam ali.

Para essas pessoas, é melhor investir o tempo em uma experiência que, mesmo sendo mais limitada, entrega o que promete e de maneira divertida, como as redes sociais. As próprias marcas entenderam isso, migrando toda sua atenção para essas plataformas mais eficientes, onde podem, ademais, fazer negócios com o público.

Entretanto, desde que Zuckerberg deu com a língua nos dentes em outubro do ano passado, apontando todos seus recursos para o metaverso, muitas empresas começaram a olhar para as incríveis possiblidades que ele oferece, e voltaram a investir em diferentes plataformas para criar novos canais com seus clientes.

Ainda não vi nada que pudesse ser considerado um sucesso de massas, mas esse movimento é válido. Afinal, se quisermos chegar a algum lugar, precisamos nos mover. E essas empresas estão fazendo isso.

 

Fugindo das caixas pretas

O norte-americano Henry Jenkins, professor da Universidade do Sul da Califórnia e considerado um dos maiores pesquisadores de mídia do mundo, forjou um conceito que se aplica muito bem para essa dificuldade de o metaverso “vingar”: a “falácia da caixa preta”.

Em seu best-seller “Cultura da Convergência” (publicado originalmente em 2006), Jenkins explica que há uma fantasia no mercado de que diferentes mídias convergirão e serão transformadas por um único dispositivo agregador, que ele chamou de “caixa preta”. Mas, segundo ele, “parte do que faz do conceito da caixa preta uma falácia é que ele reduz a transformação dos meios de comunicação a uma transformação tecnológica, e deixa de lado os níveis culturais que estamos considerando aqui.” E conclui: “tecnologias de distribuição vêm e vão o tempo todo, mas os meios de comunicação persistem como camadas dentro de um estrato de entretenimento e informação cada vez mais complicado.”

Os criadores do metaverso precisam prestar mais atenção nisso. Vale notar que as redes sociais nasceram mais ou menos na mesma época que as primeiras plataformas de metaverso e transformaram o mundo, tornando-se parte indissociável de nossas vidas. Em grande parte, esse sucesso se deve ao fato de que, apesar de se viabilizarem com tecnologias e conceitos muito inovadores, elas sempre colocaram o foco no benefício que traziam às pessoas. Tudo isso de uma maneira extremamente fácil e funcionando até em computadores e smartphones bastante simples.

Para o metaverso abandonar de vez seu aspecto experimental, precisa então se demonstrar útil não na perspectiva de quem cria as experiências, mas na do público que espera cativar. E isso deve funcionar nos equipamentos que todos nós já temos, e não apenas em óculos de realidade virtual que custam centenas de dólares.

As possibilidades que ele traz são imensas, em terrenos como trabalho, estudo, diversão e até relacionamentos. E é importante que fique claro que não se trata de substituir as experiências presenciais por equivalentes virtuais, e sim a chance de se fazer coisas que a distância e até a física não permitem, como manipular versões digitais de objetos com times distribuídos por vários países.

Há muitos riscos também, que não podem ser ignorados. Uma realidade virtual tão poderosa pode diminuir nossa capacidade de distinguir entre o presencial e o virtual, “enganando” nosso cérebro para acreditarmos que a simulação seja real. E nosso corpo reage a isso! Em um cenário extremo, as pessoas poderiam começar a usar o metaverso como uma fuga das limitações da realidade, como se fosse uma droga.

Já discutimos amplamente esses benefícios e riscos nesse espaço. Afinal, por muito menos, passamos mais horas que deveríamos nas redes sociais, “viciados” na dopamina que elas estimulam nosso cérebro a produzir. Um metaverso realmente eficiente pode potencializar todas essas sensações para o bem e para o mal.

Resta perguntar se as empresas que criam essas plataformas estão se preocupando com isso tudo, ou estão apenas pensando nos aspectos tecnológicos e financeiros do metaverso. A maior delas, a Meta, não tem um bom histórico de cuidado com seus usuários, como ficou claro no ano passado, no escândalo dos “Facebook Papers”.

Quanto a nós, os usuários, precisamos estar atentos! Quando (e não “se”) o metaverso realmente se tornar um fenômeno de massas, precisaremos aprender a tirar o máximo proveito de seus recursos, sem cairmos nessas armadilhas. O ser humano não pode ser ignorado nessa poderosa “caixa preta”.

 

O CEO do Google, Sundar Pichai (no canto inferior esquerdo), apresenta o protótipo do novo Glass no Google I/O 2022, no dia 11 de maio

Google aponta alternativa ao metaverso com a realidade aumentada

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Nos últimos minutos de uma palestra de duas horas que abriu a conferência Google I/O no dia 11 de maio, o CEO da empresa, Sundar Pichai, apresentou brevemente a proposta da nova versão de um produto que deu bem errado há alguns anos: o Google Glass. Apesar de ter ocupado muito menos espaço que os outros produtos exibidos ali, o fato de ela encerrar a apresentação é emblemático.

O Google costuma usar seu evento anual para desenvolvedores como um espaço para apresentar conceitos que ficarão no imaginário das pessoas e eventualmente se tornarão produtos de fato. Dessa vez, o anúncio oferece uma alternativa ao metaverso, ideia que vem sendo martelada por Mark Zuckerberg, que até trocou o nome de sua empresa de Facebook para Meta.

Caminhamos a passos largos para uma vida digital mais imersiva. O “novo Google Glass” ainda é um protótipo, mais próximo de um desejo que de algo comercial. Ainda assim, ele abre incríveis possibilidades tecnológicas. Resta saber se a empresa conseguirá contornar os problemas da malfadada versão original, especialmente os ligados à invasão de privacidade.


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O Google Glass foi lançado em 2013, aproveitando o movimento da indústria de tecnologia na época em favor de produtos inteligentes sem botões. Ele era um projeto pessoal de Sergey Brin, cofundador da empresa, que propunha a habilidade de fazer chamadas sem o smartphone, tirar fotos e gravar vídeos de maneira fácil e consultar páginas da Web, que eram projetadas em uma minúscula tela diante do olho direito.

As inovações tecnológicas e a expectativa criada em torno do Google Glass indicavam que ele seria mais um grande sucesso da empresa. Mas uma série de problemas o transformaram em um fracasso retumbante, sendo descontinuado em 2015.

Para começar, por que pagar US$ 1.500 por algo que ninguém sabia direito para que servia e cuja bateria durava apenas três horas? O pouco que o Glass oferecia poderia ser feito com vantagens até por smartphones. Além disso, o produto era considerado feio ou, no mínimo, não combinava com a maneira de as pessoas se vestirem.

Mas um dos maiores problemas eram as questões ligadas à invasão de privacidade. Uma câmera apontando continuamente para si incomodava os interlocutores, ainda mais quando o usuário podia tirar fotos e até gravar vídeos sem que a outra parte soubesse. Havia ainda o temor que o equipamento fosse invadido por hackers

Talvez fosse um produto à frente do seu tempo, entretanto o mais provável é que ele foi lançado com uma euforia tecnológica que não considerou os impactos que aquilo poderia ter na vida das pessoas. Agora o Google tem muito mais maturidade tecnológica para lançar um produto mais útil e consistente. Mas permanece a pergunta que deve ser feita diante de toda nova tecnologia: seus benefícios superam eventuais problemas que ela traz?

A empresa parece ter aprendido com os erros do Glass original. Ao contrário daquela utilidade questionável, a nova versão apresentada estava focada na solução de uma necessidade real. “A língua é fundamental para conectar um ao outro. Ainda assim, entender alguém que fala uma língua diferente ou tentar conversar se você for surdo ou tiver dificuldade de escutar pode ser um verdadeiro desafio”, disse Pichai na apresentação. Por isso, o novo Glass capta o áudio do interlocutor e apresenta legendas com a tradução projetada na lente do óculos.

 

Realidade aumentada e metaverso

Existe uma diferença fundamental entre os conceitos de metaverso, como o da Meta, e o de realidade aumentada, como o do Google Glass. O primeiro significa estar imerso em uma realidade que não existe, em um ambiente totalmente digital. É como estar dentro de um game, e não interagindo com ele “de fora”. Já a realidade aumentada projeta elementos digitais em nossa realidade, permitindo que se interaja com eles como se realmente existissem.

O metaverso é mais simples de ser compreendido, pois já existem produtos que bebem dessa fonte há duas décadas. O mais conhecido deles é o Second Life, lançado em 2003 e que ainda existe, apesar de hoje ter proporcionalmente poucos usuários.

A proposta de Zuckerberg agora acrescenta imersão nesse ambiente digital, graças a dispositivos como óculos de realidade virtual. Considerando os bilhões de dólares que a empresa vem investindo na tecnologia, não é uma questão de “se”, mas de “quando” ela será oferecida com tudo que vem sendo apresentado. Talvez a maior barreira seja a popularização dos dispositivos de realidade virtual, ainda muito caros para as massas.

A realidade aumentada, por sua vez, causa um impacto ainda maior, pois não somos nós que “entramos” no mundo digital, e sim elementos virtuais que “invadem” nosso mundo, permitindo sua manipulação. Filmes e séries têm abusado desse recurso, para demonstrar futurismo.

É o caso da interface usada pelo personagem Tony Stark, em alguns dos filmes do “Homem de Ferro”, da Marvel. Muita gente sai dos cinemas querendo poder usar o recurso! Mas propostas bem ousadas também existem no mudo real, como as apresentadas pela Microsoft já há alguns anos, em torno de produtos seus como os óculos HoloLens.

Muitas outras empresas também tentam fincar sua bandeira nesse terreno, como o Snapchat, que oferece seus óculos Spectacles, criados para que as pessoas compartilhem fotos e vídeos, com uma nova versão oferecendo também recursos de realidade aumentada. E não se pode esquecer da Apple, que promete para breve seus próprios óculos com esse recurso.

Talvez o Google Glass original tenha sido um fracasso comercial, mas ele permitiu que pensássemos nos problemas potenciais de uma tecnologia como essa. Isso abriu caminho para melhores serviços de realidade aumentada e o próprio metaverso. O que não quer dizer que eles já tenham sido todos resolvidos.

A questão da privacidade ainda está em pauta, aguardando regulamentação das empresas e até de legislações para se evitar abusos. Além disso, alguns especialistas temem que, com mundos digitais cada vez mais imersivos e personalizáveis, muitas pessoas passem a recorrer a eles como uma fuga de seus problemas reais, quase como se fossem um novo tipo de droga.

Não há dúvida que caminhamos para isso. As realidades virtual e aumentada trazem incríveis possibilidades para melhorar nossas vidas e, a despeito dessas preocupações, quanto mais imersivas forem, mais poderosas e divertidas ficarão.

Portanto, querer “resistir” a isso não faz muito sentido. O que precisamos é entender e nos apropriar de todos os seus benefícios e controlar seus riscos.

 

Entramos no ano mais digital de nossas vidas

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Este promete ser o ano mais digital de nossas vidas. Por isso, entender o que aconteceu nesse setor em 2021 pode nos ajudar a aproveitar melhor o que a tecnologia tem de bom a nos oferecer e a fugir de enormes arapucas que já armaram para todos nós. E a maioria das pessoas não tem esse conhecimento.

Por exemplo, no final de novembro, o dicionário Collins escolheu NFT como a “palavra do ano”. Como toda seleção assim, ela é controversa, mas essa representa bem os efeitos da digitalização galopante de nossas vidas, dando o tom do ano que começa. Essa sigla indica um conceito que poucos conhecem e que, mesmo entre os que já ouviram falar dele, muitos não entendem. E há ainda uma multidão completamente de fora, por não ser tão digital assim.

A pandemia acelerou incrivelmente esse processo, abrindo oportunidades para empresas e indivíduos, mas aumentando o risco de se criar “cidadãos de segunda categoria” entre os “menos digitalizados”. Governos, instituições e companhias precisam ajudar para que isso não ocorra, e cada um de nós deve abraçar o digital com consciência, evitando, de um lado, o deslumbramento e, do outro, o medo.


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Para quem nunca ouviu falar, NFT é a sigla em inglês para “tokens não-fungíveis”, uma comercialização de arte digital que combina tecnologia e mudança cultural. Com ela, ao comprar uma obra, a pessoa passa a ser sua legítima dona, mas isso não lhe garante nenhum controle ou remuneração por qualquer reprodução do material. Além disso, os direitos autorais continuam sendo do autor da obra.

É como o Museu do Louvre ser dono da Mona Lisa, mas ele não tem como impedir que as pessoas fotografem o quadro, e usem isso como quiserem. Mas, se algum dia quiser vender o original, o Louvre receberá uma fortuna.

O que dificulta o entendimento do NFT é que o original pode ser algo simplório como um meme famoso, facilmente reprodutível com um clique do mouse. Ainda assim, em maio, o meme “Disaster Girl” foi vendido por incríveis R$ 2,5 milhões.

NFT venceu, entre os pesquisadores do Collins, a palavra metaverso, outro conceito digital que certamente impactará muito mais nossas vidas em breve. Se bem usado, esse mundo virtual abrirá uma infinidade de oportunidades de trabalho, aprendizagem e diversão. Trata-se de um ambiente digital em que as pessoas entrarão com seus avatares para interagir mesmo com quem estiver do outro lado do mundo e com ferramentas que só existem ali.

Apesar de não ser algo novo, o metaverso ganhou holofotes em 2021 pela disposição do Facebook de investir pesadamente nessa tecnologia. Mas o que a torna tão incrível também inspira muitos cuidados. Por ser um ambiente completamente imersivo, há um enorme risco de manipulação dos usuários, muito maior que o já visto nas redes sociais. Além disso, por exigir equipamentos poderosos para ser usado, ele pode ampliar o abismo digital entre os mais ricos e os mais pobres.

Mas a virtualização de nossas vidas já acontece com força de outras formas. Desde que a Internet comercial foi lançada, em 1994, realizamos cada vez mais atividades de nosso cotidiano pelo meio online. A popularização dos smartphones, há uma década, acelerou muito esse processo.

Mas foi a pandemia que definiu um novo patamar aí.

 

Tudo de casa

Possivelmente a mudança mais profunda e permanente que o vírus nos apresentou foi o home office. Antes do lockdown (aliás, a palavra de 2020 para o mesmo dicionário Collins), trabalhar de casa era algo inimaginável ou pelo menos visto com enorme desconfiança por gestores de empresas de todo tipo. Mas hoje isso se tornou tão aceito, que muitas empresas adotaram, mesmo com a retomada das atividades nos escritórios, o trabalho híbrido, em que os profissionais desempenham suas tarefas de casa em alguns dias da semana. Há casos em que o trabalho remoto se tornou definitivo. Dessa forma, os escritórios ficaram menores ou simplesmente desapareceram.

Primo dessa mudança é o crescimento explosivo do ensino a distância. O tempo em casa permitiu que as pessoas experimentassem e gostassem desse jeito de aprender, vencendo muitos preconceitos contra o EAD. Agora, muita gente faz cursos que antes eram inacessíveis pela distância ou por horários inflexíveis.

Mas tanto o home office quanto o EAD reforçam as diferenças entre a população digitalizada e a “nem tanto assim”. Afinal, para participar dessas atividades é preciso ter uma boa conexão com a Internet e um computador, pois a experiência pelo celular acaba sendo de pior qualidade. E nem todos têm isso.

O e-commerce também se enquadra nessa mudança de comportamento. Apesar de crescer consistentemente na casa dos dois dígitos percentuais desde que surgiu, as vendas online praticamente dobraram seu faturamento nos primeiros 12 meses da pandemia. Com a reabertura das lojas físicas, esse crescimento perdeu um pouco de fôlego, mas o e-commerce permaneceu em um patamar muito superior ao que tinha antes da Covid-19. Graças a isso, muitas entregas, que antes levariam dias para serem feitas, passaram a acontecer em algumas horas.

O e-commerce pelo menos é um pouco mais democrático: funciona bem em praticamente qualquer smartphone.

 

Virtualização de valores

O Pix, sistema de transferências e pagamentos instantâneos do Banco Central, também poderia concorrer à palavra do ano, se não fosse restrito ao Brasil. Ele já é usado por 71% dos brasileiros, com aprovação de 85% deles, segundo a Febraban (Federação Brasileira de Bancos). Já há mais Pix que TED, DOC e cheque juntos! Entre os jovens de 18 a 24 anos, a aprovação chega a 99%, semelhante aos 96% da faixa seguinte (de 25 a 44 anos). A maior resistência fica entre as pessoas de baixa renda e os de menor escolaridade, mas ainda com adesão superior a 50%.

Muita gente tem medo do Pix devido aos incontáveis golpes que usam essa tecnologia. Essa, aliás, é outra coisa que explodiu nesses dois anos e que infelizmente deve se ampliar em 2022. Vale lembrar que o ano passado começou com o maior vazamento de dados da história do Brasil e terminou com um suspeito “ataque hacker” aos sistemas do Ministério da Saúde que gerenciam os dados relativos à Covid-19 e à vacinação, que demoraram semanas para serem restabelecidos.

As pessoas precisam de orientação para escapar desses problemas, que acabam atingindo mais os de renda inferior ou os menos informados. O que nos leva a um último flagelo digital que vem crescendo com força nos últimos anos e deve chegar às raias da loucura em 2022: a desinformação. O que me faz lembrar que, em 2016, outro importante dicionário, o de Oxford, elegeu pós-verdade como a palavra daquele ano.

Ela explica que importam menos os fatos e mais as versões construídas a partir deles (ou da ausência deles). Assim, quem elaborar as versões mais “palatáveis” para o público convencerá as pessoas com suas ideias, por mais bizarras que sejam.

Isso fica particularmente mais grave em anos de eleições, como esse que estamos começando. Políticos sempre mentiram, mas a combinação da pós-verdade com as redes sociais criou as fake news, que se tornaram a ferramenta suprema de manipulação da sociedade. E políticos que mais dominam esse recurso vêm se elegendo.

Por isso, se puder desejar algo a todos nesse ano que se inicia, minha escolha é conhecimento e informação, para que possamos usar o mundo digital que tivermos a nossa disposição –seja muito, seja pouco– da melhor maneira possível. Ele deve ser usado para melhorarmos (e muito) nossa vida, e não para sermos controlados por quem quer que seja.

 

O Decentraland, metaverso em que um “terreno virtual” foi vendido no dia 23 por R$ 13,4 milhões

Por que alguém pagaria R$ 13,4 milhões por um “terreno” que só existe na Internet

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Depois da pandemia, algumas das principais cidades do mundo vivem um “boom imobiliário”. Mas a transação no setor que mais chamou atenção recentemente aconteceu no dia 23, quando um “terreno virtual” foi vendido pelo equivalente a US$ 2,4 milhões (cerca de R$ 13,4 milhões na cotação do dia).

Apesar de ser apenas digital, ele mede 566 m2, o que dá cerca de R$ 24 mil por metro quadrado. Para comparação, esse valor médio de um terreno real em São Paulo gira em torno de R$ 10 mil, custando R$ 16 mil em Buenos Aires, R$ 83 mil em Paris, R$ 90 mil em Nova York e R$ 91 mil em Londres.

Para muita gente, não faz o menor sentido investir tanto dinheiro em algo que sequer se pode tocar. Mas em um mundo cada vez mais digitalizado, um espaço em um metaverso pode ser tão real quanto um pedaço de chão na sua cidade.


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Qualquer coisa tem o valor que as pessoas atribuem a ele. Claro que uma casa, um carro ou uma máquina têm um valor intrínseco, derivado do que foi usado para a sua construção, seja matéria-prima, mão de obra e até pesquisa. Mas o que realmente importa é a percepção de valor associado aos benefícios de se ter aquilo. Por exemplo, uma casa em um bairro com segurança e muitos serviços vale mais que uma construção idêntica em uma região violenta e com uma infraestrutura ruim.

Dessa forma, o alto investimento em um “terreno virtual” pode se justificar, dependendo do que será feito com ele e quais os ganhos ele trará a seus donos. Ainda assim, essa é uma lógica que desafia o senso comum.

O “terreno virtual’ mais famoso do mundo fica no metaverso Decentraland, um espaço online onde os usuários entram com seus avatares (suas representações digitais) para interagir com outras pessoas e até mesmo fazer negócios com elas, contratando serviços e comprando produtos que só existem no mundo digital. O pagamento é feito em criptomoedas.

Esses ambientes existem há muitos anos, mas ganharam novamente os holofotes em outubro, quando o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, rebatizou a empresa de Meta e disse que ela estava migrando do negócio de rede sociais para o de metaverso. Entretanto, ainda se viu muito pouco de efetivo vindo dessa mudança.

Antes dela, o metaverso mais famoso era o Second Life, um mundo virtual lançado em 2003. Ele foi revolucionário ao permitir que qualquer usuário entrasse e interagisse naquele mundo digital com outras pessoas e realizasse transações ali, que poderiam ser revertidas em dinheiro de verdade. A diferença fundamental é que o Second Life se parece mais com um game, enquanto a proposta de Zuckerberg visa permitir que o usuário “entre” no ambiente e interaja com elementos ali, graças às realidades virtual e aumentada agora disponíveis.

O dono do terreno milionário no Decentraland é a empresa Tokens.com, especializada em ativos digitais, criptomoedas, NFTs e metaverso. A empresa declarou que pretende usar o espaço para fazer desfiles de moda de roupas virtuais, que serão vendidas a usuários da plataforma para usarem em seus avatares.

Em junho, outra área no Decentraland foi vendida por cerca de US$ 913 mil. Os donos construíram ali um shopping center virtual para vender roupas digitais, mas o espaço costuma estar às moscas.

A Tokens.com teria que vender muita roupinha para os bonecos digitais para pagar os US$ 2,4 milhões investidos ali. Mas esse não é o seu verdadeiro ganho. O maior benefício para a empresa é valorizar suas atividades e os serviços com os quais atua. Dessa forma, os desfiles de moda virtuais soam quase como uma desculpa para encobrir suas verdadeiras motivações.

 

Difícil de entender

A empresa precisa de ações como essa para gerar debate e ajudar potenciais clientes a entender do que se tratam seus serviços.

É o caso dos NFTs (sigla em inglês para tokens não-fungíveis), uma modalidade de comercialização de arte digital viabilizada por uma combinação de tecnologia e mudança cultural. Com ela, ao comprar uma obra de arte digital, a pessoa passa a ser reconhecida como sua legítima dona, mas isso não lhe garante nenhum controle ou remuneração por qualquer reprodução do material. Além disso, os direitos autorais continuam sendo do autor da obra.

Façamos uma comparação com uma obra de arte física, como um quadro. Por mais que ela exista e tenha um dono, nada impede que seja reproduzida. Peguemos como exemplo o “O Grito”, obra-prima do norueguês Edvard Munch. Apesar de existir a original, ela é reproduzida em pôsteres, em publicações, em fotos de turistas e até na Internet. Os proprietários do original não recebem nada por isso, sequer têm qualquer controle sobre essas reproduções. Mas ninguém duvida que eles são os donos da obra e, se algum dia resolverem vendê-la, serão remunerados por isso.

O que dificulta a compreensão do NFT é que o original pode ser algo como um meme, que pode ser facilmente reproduzido por milhões de pessoas, e essas cópias serão idênticas ao original. Além disso, é legítimo perguntar então se qualquer pessoa poderia vender uma foto sua como NFT.

Na verdade, não. Para algo ser classificado como NFT, aquilo precisa ser muito conhecido, como a fotografia em um meme. E o “primeiro dono” precisa, de alguma forma, ter relação com a obra, por exemplo, sendo a pessoa retratada nela.

Vale lembrar que esse mercado não é regulamentado, por isso, esses valores são totalmente voláteis e sem garantias. Ainda assim, as vendas de objetos virtuais atingiram US$ 10 bilhões no terceiro trimestre, segundo a empresa de análise de mercado DappRadar. Já a consultoria Emergen Research calcula que o metaverso pode representar um mercado US$ 829 bilhões em 2028.

Tudo isso chega a transcender os conceitos do livro “Modernidade Líquida” (Editora Zahar, 2001), do filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Para muitos, o metaverso e suas transações são ilusórias, beirando o estelionato. E essa virtualização da vida afastaria as pessoas umas das outras.

Precisamos de algum tempo ainda para validar esses conceitos, o que só será possível quando o metaverso se tornar uma realidade no cotidiano das massas, como aconteceu com as redes sociais. Mas uma coisa é certa: para algo ser real, não precisa ser tocado!

Basta que as pessoas acreditem que seja!

 

Mark Zuckerberg, cofundador e CEO do Facebook, demonstra seu metaverso com um avatar de si mesmo

Os benefícios e os riscos do metaverso de Zuckerberg

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A nova fixação de Mark Zuckerberg, criador e CEO do Facebook, é o seu metaverso. Trata-se de um ambiente digital em que as pessoas entrarão usando equipamentos de realidades virtual e aumentada, e farão diversas atividades lá, como trabalhar, estudar ou se divertir. Isso pode representar um grande salto tecnológico, com benefícios incríveis. Mas quais são os riscos que pode embutir?

Parece ficção científica. E, por enquanto, é! Ninguém sabe com certeza quando isso deixará de ser um conceito e passará a ser um produto maduro e acessível às massas. Entretanto precisamos saber se as pessoas estão prontas para viver nessa realidade alternativa. Afinal, se tanto já debatemos sobre os efeitos da exposição exagerada às redes sociais, o metaverso pode potencializar esses problemas.


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Esqueça as videochamadas que se popularizaram na pandemia! O novo mundo de Zuckerberg permitirá que usuários sintam como se estivessem lado a lado, mesmo que, na verdade, estejam em países diferentes. Poderão ter o aspecto que desejarem e o próprio ambiente será construído de acordo com suas necessidades. Todos poderão interagir com o que estiver ali, como se tudo realmente existisse.

Quando vi a proposta, eu me lembrei do Second Life, um mundo virtual lançado em 2003. Apesar de ter pretensões muito menores que as de Zuckerberg, foi revolucionário ao permitir que qualquer usuário criasse um mundo digital em que entrasse e interagisse com outros. A diferença fundamental é que o Second Life continuava sendo algo apenas como um game, enquanto a proposta atual permite que o usuário “entre” no ambiente e interaja com elementos ali, graças às realidades virtual e aumentada agora disponíveis.

Apesar de ainda funcionar, hoje o Second Life tem poucos “residentes”, como seus usuários se autodenominam. O principal motivo para a perda de interesse foi a necessidade de equipamentos poderosos e uma conexão muito rápida para que a experiência fosse boa, e isso estava fora do alcance da maioria das pessoas.

Esse também é um problema do novo mundo de Zuckerberg. Os equipamentos de realidade virtual e aumentada ainda são caros e limitados, e uma boa conexão de banda larga é luxo restrito a poucos. E, se a experiência imersiva não for realmente convincente, a grande vantagem do metaverso cai por terra.

 

Trocando o real pelo virtual

O termo “metaverso” foi cunhado em 1992 por Neal Stephenson, em seu livro “Nevasca”. E, como acontece com muitas ideias da ficção científica, inspirou a realidade. O próprio Second Life é um metaverso.

Mas o conceito nunca teve tanta chance de “virar” como agora, graças à betoneira de dólares e à atenção de Zuckerberg. Tanto que, na quinta passada, durante a conferência anual da empresa, ele anunciou a criação de uma holding que controlará todas as suas empresas. Ela foi batizada de Meta, uma clara referência ao metaverso.

Para se ter uma ideia de quanto isso representa, a empresa já tem mais de dez mil pessoas trabalhando em projetos ligados às realidades virtual e aumentada, que começaram há alguns anos. A Meta pretende dobrar essa equipe e o investimento nesses projetos está na casa de bilhões de dólares

Um metaverso traz benefícios inegáveis, como elevar os ambientes de trabalho e de estudo a distância a um patamar antes inimaginável. Pode ser também um poderoso espaço de relacionamento com o consumidor e de experimentação, barateando o lançamento e a venda de produtos. Até a telemedicina pode ganhar com isso!

Mas nada deve ser tão beneficiado quanto o entretenimento e os aspectos sociais. Imagine a sensação de estar dentro de um filme ou de um game! Ou ainda de se encontrar com amigos a distância, de uma maneira bastante convincente. Há ainda o sexo virtual, que se tornará cada vez mais realista, à medida que novos equipamentos para simular sensações se tornem disponíveis e estejam conectados ao metaverso.

A imaginação é o limite! E isso nos leva a possíveis riscos dessa experiência.

Por muito menos, pessoas descobriram, durante o distanciamento social provocado pela Covid-19, vantagens de se fazer coisas a distância, ao invés de presencialmente. Agora, mesmo com a flexibilização das regras, elas mantiveram esses hábitos online.

Uma realidade virtual poderosa pode diminuir nossa capacidade de distinguir entre o presencial o virtual. Nosso cérebro pode ser “enganado” para acreditarmos que a simulação seja algo real. E reagirmos a isso com nosso corpo.

Isso pode se tornar uma possível fuga das limitações da realidade. De certa forma, as redes sociais já oferecem isso, mas, com o metaverso isso pode ser maximizado pelo seu aspecto imersivo, criando uma distração idealizada dos problemas. E isso pode levar as pessoas a se tornarem mais suscetíveis a ideias e a produtos, pois baixam suas defesas mentais.

Há ainda riscos físicos! Durante uma simulação imersiva, as pessoas podem inadvertidamente se mover em um espaço a sua volta que não condiz com o que seu cérebro acha que está. E o menor dos problemas que podem surgir daí são tropeços.

Do ponto de vista da saúde mental, estudos sugerem que uma exposição prolongada a uma experiência virtual tão profunda pode levar indivíduos a casos de comportamentos antissociais, violência, depressão e, no extremo, suicídio. E justamente por ser algo tão novo e pouco estudado, não se sabe exatamente quais seriam esses efeitos colaterais e como preveni-los.

O que nos leva a um ponto crucial: como isso impactará crianças e adolescentes. Uma das piores acusações contra o Facebook feitas por Frances Haugen, uma ex-gerente da empresa que vem fazendo delações nas últimas semanas, é a de que a companhia sabe que o Instagram, um de seus principais produtos, acentua problemas de saúde mental em adolescentes, especialmente em meninas, e faz muito pouco para prevenir isso.

Com o metaverso, esses problemas na formação dos mais jovens podem se tornar exponencialmente maiores. Como suas capacidades cognitivas ainda estão em formação, a diferença entre realidade e simulação se torna ainda mais difusa. Tanto que empresas que produzem essas tecnologias sugerem que não sejam usadas por quem tiver menos que 13 anos. Mas como garantir isso?

Os jovens são, portanto, ainda mais suscetíveis aos estímulos que recebem em realidade virtual, o que cria preocupações não apenas em questões comerciais, mas também de bullying e até de pedofilia. Para tornar a situação mais dramática, é muito difícil monitorar um ambiente tão dinâmico. E vale destacar que Zuckerberg deseja criar estratégias para atrair e reter o público jovem, algo essencial para seus negócios, que estão ficando envelhecidos e pouco atraentes para os mais novos.

À medida que o metaverso ocupe mais espaço em nossas vidas, todos esses aspectos precisarão ser cuidados. Sem falar que, caso se torne um recurso importante para trabalho e estudo, pode provocar um novo tipo de abismo social, separando aqueles que conseguirão aproveitar a simulação daqueles que não terão como fazer isso.

Não deixa de ser curioso todas essas novidades aparecerem justo quando o Facebook passa pela sua maior crise de reputação, que pode levar à divisão da empresa e até à queda de Zuckerberg do posto de CEO. Se o metaverso der certo, isso pode ampliar ainda mais a dominância que ele tem sobre as pessoas e as empresas no mundo todo, e emergir como um visionário. Mas, se der errado, pode entrar para a história como um vilão que destrói democracias e vicia pessoas. É uma aposta alta!

Do nosso lado, temos que cuidar que o mundo online não se torne mais importante que o real. Os valores que verdadeiramente contam estão aqui, “do lado de fora”, e não devem ser simulados ou sintetizados.