William Bonner

Os perigos de ser famoso

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Em 1968, o genial artista americano Andy Warhol disse que “no futuro, todos serão mundialmente famosos por 15 minutos”. Ele não poderia antecipar o fenômeno das redes sociais, que, 35 anos depois, viabilizariam, pelo menos em tese, sua visão. Afinal, com elas, uma publicação de qualquer pessoa pode potencialmente ganhar visibilidade internacional, mas esse indivíduo provavelmente voltará depois ao anonimato com a mesma velocidade com que dele saiu.

Isso não é uma abstração filosófica: é um fato! As redes sociais realmente vêm permitindo isso, especialmente na última década, o que iniciou uma corrida generalizada pela fama, de uma maneira que deixaria Warhol surpreso.

Muita gente quer ser famoso e trabalha para tal nas redes sociais. Uns tantos querem o dinheiro que pode vir disso, mas a maioria quer mesmo aquilo que eles acreditam serem benefícios da superexposição. Mas são iludidos ao pensar assim!

Primeiramente porque as redes sociais, com raríssimas exceções, não tornam as pessoas verdadeiramente famosas. No máximo, dão a elas os tais “15 minutos de fama”. Depois porque elas não estão nem de longe preparadas para o lado sombrio da fama, do qual ninguém quer falar.

E é aí que a coisa complica!


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Posso usar o meu próprio exemplo para ilustrar o caso. Escrever no Estadão e ser LinkedIn Top Voice, com mais de 750 mil seguidores nessa rede me dão uma ótima visibilidade a minhas ideias. Toco a vida de muitas pessoas e espero, pelo menos em alguns casos, inspirá-las e compartilhar um pouco do que sei. Eventualmente sou reconhecido em eventos, em aulas e, em raras ocasiões, na rua. Mas isso não me faz famoso.

Famosos são, por exemplo, o William Bonner, o Fausto Silva, o Mário Sergio Cortella, o Caetano Veloso. Esses são reconhecidos em qualquer lugar que estiverem, a qualquer hora. Caetano chegou até a “virar notícia” em 2011 ao estacionar seu carro no Leblon, uma pérola do antijornalismo que rendeu muitas piadas, mas que demonstra a perseguição que alguém famoso de fato sofre. Há também o caso da barba de William Bonner, que sacudiu as redes sociais após sua volta de férias, na segunda passada.

Afinal, qual o real interesse nesses dois casos? Nenhum! Mas a quem se referem interessa.

Muitos daqueles que querem ser famosos buscam desesperadamente ser amados, para compensar carências pré-existentes. Sem dúvida, alguém famoso tem a possibilidade de conhecer uma quantidade enorme de pessoas, e algumas delas podem se tornar verdadeiros amigos e (quem sabe?) algo mais. Mas é preciso ter consciência que será necessário beijar muitos, muitos sapos até encontrar o príncipe.

Há aqueles que esperam ganhar rios de dinheiro! Ser famoso pode, de fato, ajudar nisso. Mas, mesmo para famosos, o dinheiro só vem com trabalho. Muitos bons negócios podem surgir disso, mas não se deve achar que o dinheiro simplesmente cairá do céu.

É possível se tornar o rosto de ações importantes para a sociedade. Isso pode ser particularmente gratificante quando a iniciativa está em linha com suas próprias crenças, emprestando sua imagem para melhorar a vida de quem precisa.

Por outro lado, tem gente que quer ser famosa para ganhar presentes e “furar filas”. Particularmente acho isso muito ruim, mas, para esse pessoal, essa é a melhor coisa de ser famoso.

 

O lado sombrio

As pessoas adoram falar do lado bom dessa vida, mas infelizmente nem tudo são flores nisso. Quem quiser trilhar esse caminho precisa lidar com alguns aspectos bem sombrios.

Por exemplo, é preciso estar preparado –emocionalmente e às vezes com medidas práticas– para enfrentar todo tipo de insultos e ameaças, até mesmo contra a sua vida, as de seus familiares e as de seus amigos. Na imensa maioria dos casos, elas são inócuas, vindas de haters e de outros tipos de desocupados que simplesmente não gostam de você. Mas, com o aumento da polarização política e da irracional intolerância, essas ameaças nem sempre podem ser simplesmente ignoradas.

Por outro lado, muitas pessoas acham que são “amigas de infância” do famoso. Isso não seria um problema, se algumas delas não exigissem um comportamento recíproco e atenção, o que obviamente é inviável. Diante dessa negação, elas podem cair no grupo anterior, dos haters, que, em muitos casos, não passam de fãs que querem colo.

Outro fator com o qual também se deve lidar (e muito) é a quantidade de pessoas (a maioria desconhecidas) que lhe pedem todo tipo de favor. E não me refiro a autógrafos, mas sim a emprego, dinheiro e até alguns pedidos bem esquisitos ou questionáveis. Naturalmente, também não é possível atender isso, especialmente quando se avolumam. Alguns “famosos de primeira viagem” tentam ajudar, mas se sentem culpados quando percebem que não conseguem. Precisam entender que não podem salvar o mundo e que devem conviver com isso!

Uma das piores coisas de ser famoso é perder a liberdade para se fazer em paz coisas básicas, como ir a um restaurante, supermercado ou cinema. Sempre haverá alguém que o reconheça e que se sentirá no direito de invadir seu espaço pessoal, como se atender fãs fosse um trabalho contínuo. Mas ainda pior é quando quem faz a abordagem não é um fã, e sim um hater, que se dá o direito de fazer agressões publicamente.

Na mesma linha, a pessoa famosa tem muito mais chance de ser perseguida presencial e digitalmente. Tudo que faz será visto e divulgado, mesmo as coisas mais insignificantes, o que pode causar muitos transtornos. Há ainda o roubo de informações e de identidade, e tentativas de extorsão. Nesse caso, o problema necessariamente deve envolver a esfera jurídica, ou pode resultar em muita dor de cabeça.

Em uma situação extrema, há o risco de sequestros ou coisas do tipo. A ironia maior é que o famoso nem sempre é rico. Mas, por ser muito conhecido, os bandidos acham que pode render um vultoso resgate.

 

Vidraça maior, pedrada mais fácil

É triste, mas o famoso pode não ter feito absolutamente nada de errado e ainda assim sofrer um ou mais desses problemas. Eles não estão associados a ser uma pessoa boa ou ruim, e sim ao tamanho da sua exposição. Em resumo, quanto maior a fama, mais coisas boas e ruins virão com ela.

Isso me faz lembrar de quando Pedro Bial entrevistou William Bonner para seu programa. A conversa foi ao ar no dia 26 de maio do ano passado. Em determinado momento, o editor-chefe do Jornal Nacional explicou como tem dificuldade de ir até a uma padaria, não pelo assédio dos fãs, mas pela hostilidade de haters. Morador do Rio de Janeiro, em determinada época, teve que viajar de carro todos os fins de semana para ver o pai doente em São Paulo, porque não conseguia mais pegar um avião. O mais triste é saber que isso se deve à sistemática campanha do governo federal de inflamar a população contra jornalistas, e ele é o jornalista mais famoso do país.

Pouquíssimas pessoas têm o preparo e o apoio de Bonner para lidar com alguma exposição que as redes sociais lhes dão. Às vezes, sequer recebem algo do lado bom da história. Isso explica, pelo menos em parte, por que, de vez em quando, vemos casos de influenciadores digitais cometendo suicídio.

Curtidas não pagam boletos e seguidores não fazem ninguém famoso!

Ter 5.000 ou 50.000 fãs faz tanta diferença assim? “Fazer dancinhas” no TikTok ou tirar fotos insinuantes no Instagram podem dar isso a qualquer um. Mas o que há de realidade nessa exposição? Essa “fama” provavelmente é ilusória!

Se o que se procura é dinheiro, melhor que ter seguidores é fazer verdadeiramente um bom trabalho. No caso das redes sociais, o que mais importa é construir conversas com profundidade e que acrescentem algo ao outro. Se isso for bem feito, a fama pode vir, e de maneira mais sustentável.

No final, exceto para os egocêntricos, é muito melhor que conheçam seu nome que seu rosto. Do meu lado, quero apenas compartilhar minhas ideias, meu conhecimento e meu trabalho. Talvez o melhor seja mesmo ter apenas 15 minutos de fama.

Ou 30 talvez.

 

Se não souber como falar com seu público, ele o abandonará

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“Quem não comunica se trumbica”: os veículos de comunicação deveriam prestar mais atenção à célebre frase do Chacrinha - Foto: divulgação

“Quem não comunica se trumbica”: os veículos de comunicação deveriam prestar mais atenção à célebre frase do Chacrinha

Recentemente assisti a uma entrevista com a youtuber Kéfera Buchmann, que já tem mais de 5,5 milhões de seguidores e está fazendo um bom dinheiro com seu canal. Na hora, pensei na Info, que não resistiu e anunciou, no dia 12 de agosto, o fim da sua versão online (a impressa já não circulava desde fevereiro). Mas, afinal, o que uma coisa tem a ver com a outra?

Não, esse não é mais um melancólico post lamentando a morte de um veículo de comunicação. A proposta aqui é debater como o sucesso da primeira e a derrocada da segunda têm muito a ver com o uso adequado da linguagem.

Kéfera é bonita e divertida, e seus vídeos, apesar se resumirem a mostrar situações prosaicas de seu cotidiano, têm uma boa produção. Mas seu grande trunfo é usar uma linguagem adequada para seu público, que ela conhece bem. E, por linguagem, não me refiro apenas às palavras que ela escolhe. O ritmo, a edição e os efeitos aplicados nos vídeos são importantíssimos elementos para quem quer ter sucesso no YouTube. Seu bom manejo da linguagem digital continua em como promove seu conteúdo (e a si mesma) e como interage com seus fãs nas redes sociais, aproveitando-se das peculiaridades de cada uma. Ou seja, nada de tentar empurrar uma mesma chamada para todas ou ignorar as pessoas!

Voltemos à Info: para muitos, o fim da publicação era inevitável. Como me disse um colega, um dos melhores jornalistas de tecnologia do país, “não há mais espaço para revistas de tecnologia em Língua Portuguesa, há espaço para sites”.

Opa, mas a Info já era apenas um site desde fevereiro!

Muita gente vai dizer que o problema da publicação era o mesmo que assola a imprensa escrita de forma generalizada: a enorme queda das receitas publicitárias, acompanhando a fuga de leitores. Mas será que isso é tudo, especialmente em um veículo segmentado, talvez o melhor que já cobriu o noticiário de tecnologia do país?

A Info já sofria a concorrência de sites havia muitos anos. Chegou a ela antes de outros títulos, pela natureza de seu assunto e de seu público. Esse enfrentamento provocou, há uns cinco anos, uma mudança editorial que desfigurou a revista: a Info passou a ser menos técnica e a cobrir assuntos da “vida digital”, com pautas sobre negócios e até comportamentais. Na minha opinião, essa decisão foi desastrosa, e acabou afastando parte considerável de seu público mais fiel e antigo.

Junto com a mudança nas pautas, veio uma mudança na linguagem, que tentou ser mais descontraída. Isso pode ter reforçado a distância do leitor mais tradicional da revista, sem conseguir atrair o público de sites de tecnologia, que já nasceram com essa proposta. Apesar de ser um dos títulos mais vanguardistas da Editora Abril na adoção de novas formas de distribuição digitais, é um fato que a Info nunca conseguiu fazer aquilo que a Kéfera faz com extrema desenvoltura. Nesse ponto, o veículo ficou sem uma identidade clara. Tempere tudo isso com a crise do setor, e o desfecho da Info estava definido.

 

Atualizar sem se perder

Uma mudança de linguagem não implica em um veículo perder a sua essência. Um exemplo bastante interessante vem acontecendo no Jornal Nacional. William Bonner e sua equipe não se limitaram às tradicionais mudanças cosméticas do cenário e implantaram alterações significativas editoriais e técnicas, conferindo ao telejornal um novo ritmo, mas sem deixar de ser o JN.

Além de uma linguagem muito mais próxima do público e reportagens mais longas, o uso de um truque de câmeras combinado a um enorme telão permite que os âncoras conversem de pé com os jornalistas que fazem entradas ao vivo como se estivessem lado a lado. Vale destacar também a reinvenção da previsão do tempo (um noticiário tradicionalmente relegado ao segundo plano) com Maria Júlia Coutinho, que ganhou um destaque que poucos têm no JN. A nova “moça do tempo” não apenas informa a previsão, mas também explica o porquê dos fenômenos climáticos para o público. Além disso, o próprio Bonner extrapola os limites da telona e faz um bom uso de sua conta no Twitter, mesclando algum humor, tuítes pessoais e promoção do Jornal Nacional do dia.

 

“Quem não comunica se trumbica”

A famosa frase do Chacrinha é uma dessas obviedades da vida que muitas vezes passam despercebidas no cotidiano. Mas é inaceitável que uma empresa de comunicação não consiga praticar isso.

É claro que a crise financeira parece ser o maior dos problemas dessas companhias, metidas em um buraco que teima em ficar cada vez mais fundo. Ontem mesmo O Globo e Extra demitiram cerca de 60 jornalistas (aparentemente os de salários mais altos), no seu segundo “passaralho” do ano (o primeiro aconteceu há seis meses). Mas esse problema é uma “crônica de uma morte anunciada” diante da inabilidade (ou teimosia) dessas empresas em insistir em um modelo de negócios que não se sustenta mais há anos (e debatido exaustivamente neste blog).

A situação fica desesperadora quando notamos que há ainda essa crise de linguagem nos veículos tradicionais. Qualquer um sabe que não se deve usar as mesmas palavras de uma mesa de bar com os amigos ao se escrever um e-mail comercial, que, por sua vez, também não serve para um artigo científico.

Cada público e cada ocasião têm a sua maneira de se comunicar. Isso vale também para os meios digitais, e cada um deles tem suas peculiaridades. Quem não respeita isso assiste impotente a seu público ir embora. Kéfera explica.