Monthly Archives: abril 2020

É hora de se unir, não de desprezar o seu consumidor

By | Educação | No Comments

Ao longo do primeiro mês de distanciamento social para tentar conter a disseminação do novo coronavírus, vimos alguns empresários fazendo declarações desastrosas, que provocaram grande prejuízo a imagem de suas companhias. Ainda que tenham sido possivelmente reações espontâneas diante do impacto nos seus negócios, essas falas ofenderam o público, em um momento difícil para todo mundo.

Sim, qualquer um pode ter opinião sobre qualquer coisa. Mas, em um mundo hiperconectado, as palavras têm ainda mais peso. Elas demonstram nossos valores! Só que as pessoas, cada vez mais, compram de empresas cujos valores estejam alinhados aos seus.


Saiba mais sobre esse assunto no vídeo abaixo:


Entra em cena a “customer experience”, a aclamada experiência do cliente. Ela não sumiu com essa pandemia. Pelo contrário! Ficou ainda mais importante!

A parte boa dessa história é que mais empresas e mais profissionais estão se preocupando com a experiência do cliente. É verdade que, para muita gente, isso é só uma moda. Até embarcam nela, mas sem entender de verdade para que serve, e sem estar tão disposto a mudar a estratégia da empresa e o seu foco, passando da própria companhia para o cliente.

Se antes da pandemia, empresas que não se conectavam verdadeiramente com seus clientes e com a sociedade já vinham tendo dificuldades, sua situação agora ficou ainda mais complicada. Ter um bom produto e um bom preço já não são suficientes para o sucesso. As pessoas hoje compram “a tal da experiência”, que é um grande pacote que -claro- inclui também o produto e o preço. Mas vai muito além disso: ele engloba todo o relacionamento, toda a percepção da pessoa com a marca, mesmo antes de comprar o produto, desde que descobre que a gente existe!

Como eu sempre digo, “customer experience” não é para “ficar bonito na foto”, não é para fazer amigos: é para fazer negócios!

Empresas que oferecem uma experiência superior a seu público conseguem mais clientes, e têm clientes mais fidelizados, que consomem mais! E, como já foi dito, as pessoas compram de empresas cujos valores estejam alinhados aos seus.

E justamente aí chegamos aos maus exemplos citados no começo desse texto.

Uma pesquisa recente da Agência de Bolso analisou centenas de menções em redes sociais sobre a rede de hamburguerias Madero, cujo dono, Junior Durski, deu uma polêmica declaração em março. Ele disse que não poderia fechar seus negócios “por 5.000 ou 7.000 pessoas que vão morrer”. O público reagiu imediatamente, com 63% de menções negativas nas redes! Uma semana depois, a mesma rede demitiu 600 funcionários: as menções negativas saltaram para 67%!

Na mesma época, em um outro caso que não aparece na pesquisa, Alexandre Guerra, sócio da rede de restaurantes Giraffas, ameaçou os próprios funcionários, que estavam em casa por causa das regras de distanciamento social, dizendo que eles deveriam ter mais medo de perder o emprego que do novo coronavírus. A reação nas redes sociais também foi de forte repúdio, com gente pedindo o boicote à marca. Isso fez com que o pai do empresário viesse a público desautorizar o filho e dizer que ele não seria mais membro do conselho, e sequer acionista da empresa.

Em contrapartida, a mesma pesquisa acima trouxe o caso da rede de restaurantes Outback, também da mesma época. Eles doaram ovos de Páscoa, que não seriam vendidos pelo fechamento de seus restaurantes, para mercados de bairro. Dessa forma, buscavam ajudar pequenos varejistas a ter uma renda adicional, nesse momento de dificuldades para todos. Resultado: 74% das menções na rede ao Outback foram positivas! Apenas 5% traziam alguma negatividade.

Em outros casos, vi pessoas reclamando que tiveram a sua Internet sumariamente cortada, porque não conseguiram pagar a conta, devido às dificuldades provocada pelo impacto do distanciamento em negócios.

Cortar Internet nesse momento em que tudo está sendo feito online por muitas pessoas e muitas empresas? Sim, sei que essas empresas podem fazer isso por contrato: afinal, a conta não foi paga. Mas precisavam fazer isso nesse momento? Não poderiam demonstrar um pouco de empatia, alguma flexibilidade? As empresas estão, sim, sendo impactadas por essa crise. Mas as operadoras de telefonia não vão quebrar. Aliás, se tem um negócio que não vai quebrar nesse momento é esse.

O comportamento descrito demonstra uma enorme falta de empatia. Se tivesse feito diferente, poderia ganhar alguém que promovesse a marca, em um segmento cujas empresas normalmente são rejeitadas pelos próprios clientes. Mas, com o que fizeram, só pioraram ainda mais a própria situação!

No caso dos restaurantes acima com declarações infelizes, talvez contem com a memória curta das pessoas, com o fato de que muitos não se importam e que muitos nem souberam do caso. Mas isso é uma roleta russa empresarial! As pessoas têm cada vez mais acesso à informação, e esse tipo ruim se espalha como rastilho de pólvora.

Entendamos de uma vez por todas: o público precisa estar conosco!

O empreendedor pode ter tido uma ideia brilhante e a executado muito bem quando abriu a empresa. Mas o seu negócio só deu certo porque teve uma equipe comprometida e clientes que consumiram seu produto. Se perder qualquer um desses dois, será colocado para fora do mercado. A concorrência está acirrada -na sua porta ou na internet- e está disposta a atender bem esses dois públicos.

Todo negócio tem que dar lucro, claro! Não há nada de errado nisso. Mas qualquer empresa também é uma entidade social: faz parte da sociedade, influencia e é influenciada por ela.

Peter Drucker, considerado o pai da administração moderna, disse há 60 anos: “lucro não é a explicação, causa ou razão de comportamento de negócios e decisões de negócios, mas o teste de sua validade.” Em outras palavras, empresas que só pensam no lucro eventualmente conseguirão isso, porém terão que trabalhar mais para tal. Por outro lado, se a empresa busca verdadeiramente oferecer uma boa experiência a seu público, o trabalho fica melhor e o lucro é uma consequência.

Com distanciamento ou sem distanciamento, temos que entender e aceitar que as coisas já estão diferentes. Temos que nos unir a nossos clientes para encontrar soluções boas para todos. Não adiantar “forçar a amizade” para que tudo seja como antes.

Não será!

Mas podemos nos adaptar! O público coloca da sua parte; a empresa também.

Empatia de todos com todos: precisamos dela para sairmos disso melhores.

Seu celular pode espionar você

By | Tecnologia | No Comments

Com o governo de alguns Estados usando os celulares para saber se as pessoas estão respeitando o distanciamento social, um assunto voltou à mesa: nossos smartphones nos espionam?

Essa informação seria usada pelos gabinetes de crise para tomar diferentes decisões, como planejamentos da área de saúde e até mesmo se medidas restritivas ao deslocamento precisariam ser endurecidas. O Governo Federal se preparava para fazer o mesmo, quando recuou, argumentando que isso violaria a privacidade do cidadão. Os Estados juram que não é arapongagem! Pode até ser, mas o processo poderia ser mais transparente.

Como isso tudo funciona? Dá para se proteger?


Saiba mais sobre esse assunto no vídeo abaixo:


Resposta rápida se o celular pode nos espionar.

Claro que sim!

Isso não é nenhuma novidade e pode ser feito de diferentes maneiras.

No caso do que alguns governos estão adotando, isso é feito com a colaboração das operadoras de telefonia celular, como a Vivo, a TIM, a Oi e a Claro.

Elas fazem a chamada triangulação a partir das estações rádio-base, as antenas das suas redes de celulares. Isso é uma matemática simples: ao medir a distância de um aparelho celular até as três antenas mais próximas a ele, a operadora da linha consegue definir com precisão onde ele está.

Isso não tem nada a ver com o GPS do aparelho, que pode estar até desligado. Não há como impedir essa leitura tecnicamente e ela é bastante precisa.

Isso, entretanto, não seria suficiente para saber se as pessoas estão desrespeitando os pedidos de distanciamento social. Para isso, a empresa precisa saber onde cada pessoa mora. E isso também é fácil de fazer: basta guardar a posição onde o celular fica entre 22h e 2h. Como supostamente é o lugar onde a pessoa dormiu, a empresa assume que é a sua residência. A partir dessa informação, se o celular se afasta mais que 200 metros desse ponto, a empresa considera que a pessoa está “furando” o distanciamento social.

Ao agrupar toda essa informação as operadoras geram as chamadas “nuvens de calor”, manchas coloridas que indicam concentrações de pessoas que se afastaram de suas residências. Esses gráficos seriam sempre enviados aos comitês de crise com informações do dia anterior. Ou seja, não é uma informação em tempo real.

No exemplo acima, temos a região metropolitana do Rio de Janeiro. Dá para ver que há muita gente desrespeitando o distanciamento na Zona Sul e no Centro.

As operadoras de telefonia celular sabem exatamente onde nós estamos, mas afirmam que não entregam ao governo qualquer informação que possa identificar os donos dos celulares. Antes de enviar a informação, ela é agrupada e “anonimizada”: todos os dados de identificação são eliminados antes de criar os mapas.

Especialistas afirmam, entretanto, que, em alguns casos, é possível identificar usuários cruzando diferentes dados “anonimizados”. A privacidade só seria, portanto, garantida se o governo realmente só recebesse os gráficos prontos das operadoras.

Ainda assim, algumas coisas poderiam ser feitas para melhorar o cenário. Uma delas é que as informações geradas pelas operadoras passassem antes por outras empresas, cuja função seria aplicar uma camada adicional de remoção de eventuais identificações remanescentes. Além disso, amostras aleatórias de dados deveriam ser constantemente disponibilizadas para serem verificadas pela comunidade de desenvolvedores. Os algoritmos, os programas envolvidos em todo esse processo também deveriam ter seus códigos publicados, para serem aferidos.

A LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) é a legislação que regula o uso dos nossos dados. Ela foi promulgada ainda no governo Temer e deveria começar a valer agora em agosto, mas, com a pandemia, seu início deve ser postergado. Entre suas regras, está que qualquer dado nosso só pode ser coletado se nós autorizarmos explicitamente. E, para isso, temos que ser informados que dados serão coletados e para que serão usados.

De novo, se o que estiver sendo entregue ao governo for apenas o mapa de calor, a LGPD não estaria sendo violada. Mas o problema é que governos não são conhecidos exatamente por respeitarem a privacidade do cidadão.

Por isso, mais transparência seria muito bem-vinda. Por exemplo, falta também uma declaração pública deixando claro quais as decisões poderão ser tomadas a partir desses dados e até quando essa colaboração das operadoras com o governo vai durar. Temos que evitar que se crie um “legado de vigilância” após isso.

Há outras formas de sermos rastreados pelos nossos celulares, que não têm nada a ver com isso que os governos têm feito. E que são muito mais complicadas de se coibir.

Isso porque muitos dos serviços dos nossos smartphones que nós amamos dependem dessa capacidade de geolocalização. O GPS do celular mede continuamente onde nós estamos. Claro que podemos desligar esse recurso, mas aí muitas coisas do celular simplesmente vão parar de funcionar. E não estamos dispostos a ficar sem elas.

O Google e a Apple, fabricantes dos sistemas operacionais Android e iOS, que controlam praticamente todos os smartphones do mundo, têm acesso a essa informação. Eles negam que infrinjam a privacidade de seus usuários. Mas, sim, eles coletam isso o tempo todo.

Por exemplo, o Google vem produzindo relatórios públicos que medem se as pessoas estão respeitando o distanciamento social na maioria dos países. No Brasil, cria relatórios semanais consolidados pelo país e por cada Estado e Distrito Federal.

Aqui vemos que a movimentação de pessoas no varejo, que aparece nos três gráficos de cima, está sendo retomada. Já em casa, nos três gráficos de baixo, as pessoas começaram o período de distanciamento ficando mais tempo lá, mas agora estão saindo mais.

Mas há tantas outras maneiras de os celulares nos espionarem, como naquela história de que eles ouvem o que dizemos para depois nos vender todo tipo de quiquilharia.

Sim, eles nos ouvem mesmo! Até para atender a nossos comandos.

De novo, Apple e Google afirmam que não usam essa informação indevidamente e não a compartilham com terceiros. Por outro lado, você já pensou quantos aplicativos você instalou no seu aparelho? Todos eles podem ter acesso a seu GPS, a sua voz captada pelo microfone, e mais um monte de dados do celular. Quem garante que todos eles sejam éticos? Portanto, escolha com cuidado os aplicativos que você instala!

Temos que entender como isso funciona para, pelo menos, tentar não sermos feitos de bobos. Com relação aos governos, precisamos criar mecanismos de verificação desses processos pela sociedade civil. Ou corremos sério risco de nosso smartphone se transformar em um agente do Grande Irmão, o Big Brother do livro “1984”, de George Orwell.

E isso ninguém quer.

O isolamento nos transformou em pequenas emissoras de TV

By | Jornalismo | No Comments

Nos últimos dias, temos assistido (literalmente) à explosão da quantidade de “lives” -transmissões de vídeos ao vivo nas redes sociais. Elas deixaram de ser uma moda entre adolescentes para se tornar uma poderosa ferramenta de negócios e de promoção de qualquer coisa.

O grande impulsionador disso é o isolamento social por conta do Covid-19. Como muita gente não sai mais de casa e eventos públicos estão proibidos, as “lives” se tornaram a melhor alternativa para conversar com seu público. Assim, as transmissões se multiplicam, com pessoas ensinando um pouco do que sabem, fazendo propaganda de seus serviços, reunindo grupos em torno de interesses em comum. E não podemos deixar de mencionar as “superlives”, shows online ao vivo -especialmente de artistas sertanejos- que têm reunido milhões de pessoas que os assistem ao mesmo tempo, um público que não caberia em nenhum espaço físico.

Por que as “lives” fazem tanto sucesso afinal? De onde elas vieram? E o que é preciso para fazer a sua?


Saiba mais sobre esse assunto no vídeo abaixo:


As “lives” começaram a ficar mais populares com o YouTube, que lançou o recurso em 2010. Depois vieram muitas outras plataformas, como o Twitch (mais focado em games, criado em 2011 e comprado pela Amazon em 2014) e o Periscope (criado em 2015 e incorporado depois pelo Twitter). E a coisa ficou mesmo popular quando o Facebook e o Instagram lançaram esse recurso em suas plataformas, em 2016.

Mas pouca gente sabe que transmissões ao vivo digitais existem desde antes da Web, quando a Internet ainda era um ambiente árido e restrito a cientistas e militares.

A primeira coisa que poderia ser chamada de “live” foi criada em 1991 por alguns estudantes da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Eles apontaram uma câmera para a cafeteira de um dos laboratórios da universidade, para saber se tinha café sem ter que ir até lá.

Depois que a Internet comercial foi lançada, em 1994, surgiu a primeira transmissão ao vivo regular de uma pessoa: a JenniCam. E que transmissão: ela durou incríveis sete anos e oito meses!

Em 3 de abril de 1996, Jennifer Ringley uma estudante de economia da Universidade Dickinson, na Pensilvânia (EUA), então com 19 anos, ligou uma câmera no seu dormitório estudantil, que transmitia em tempo real tudo que ela fazia lá. Na maior parte do tempo, o quarto estava vazio, mas a câmera chegou a capturar até cenas de sexo da estudante. Cerca de 4 milhões de pessoas assistiam à vida de Jennifer no seu quarto, o que é impressionante, se considerarmos que existiam apenas 36 milhões de internautas no mundo na época. Isso a transformou na primeira celebridade digital.

Mas isso é história. As “lives” hoje duram de poucos minutos a algumas horas e transmitem desde conversas de amigos até shows superproduzidos.

Por exemplo, no último dia 4, a dupla sertaneja Jorge e Mateus fez um show em uma “live” que durou quatro horas e meia e teve 3,1 milhões de pessoas assistindo ao vivo, um recorde absoluto no YouTube. Mas esse recorde foi ultrapassado apenas quatro dias depois, no show da “Rainha da Sofrência”, Marília Mendonça, que juntou 100 mil pessoas a mais na sua “superlive”.

Além de arrecadar uma enorme quantidade de doações para a luta contra o novo coronavírus, as “lives” foram patrocinadas. Uma fonte de uma agência de publicidade afirma que uma delas levantou, só em merchandising, R$ 5 milhões! Nada mal para algo feito com uma produção relativamente barata, incrivelmente mais simples que a estrutura de qualquer show em um estádio.

É importante que fique claro que esses artistas já tinham uma presença bem forte nas redes sociais antes de tudo isso. Marília Mendonça, por exemplo, tem mais de 30 milhões de seguidores no Instagram.

Mas não só de “superlives” de artistas vive o período de distanciamento. Tenho visto uma explosão de oferta desse formato, especialmente no Instagram, de “lives” de todo tipo. São pessoas ensinando algo, oferecendo serviços, fazendo propaganda de seu trabalho ou simplesmente “fazendo um social” de dentro do seu distanciamento.

Não se trata mais de uma coisa restrita a adolescentes ou nerds. As “lives” vieram para ficar e estão se transformando em uma nova linguagem, uma nova forma de comunicação. E são muito fáceis de serem produzidas: basta um celular e uma conta em uma das plataformas já citadas. E é tudo grátis!

O poder do vídeo interativo é inegável. Aliás, a interatividade é uma das características das “lives”. Diferentemente dos vídeos gravados, as “lives” permitem que o público deixe seus comentários nelas em tempo real. E o dono da “live” ou sua equipe podem responder, também em tempo real. É comum também que as pessoas que estão assistindo à “live” acabem conversando entre si.

Essa dinâmica é algo que não existe em nenhuma outra mídia, e é muito interessante! Isso é diferente de uma videoconferência, outra coisa que também já existe há muito tempo e que ganhou força com o distanciamento social. Sim, as videoconferências também são transmissões de vídeo ao vivo, com várias pessoas interagindo. Mas, ao contrário das “lives”, elas não são públicas. Por isso, normalmente são usadas para reuniões de trabalho ou aulas. Já as “lives” são totalmente abertas, e quanto mais gente entrar, melhor, mesmo que sejam desconhecidos.

Até grandes eventos estão se transformando em “lives”. Por exemplo, dois megaeventos da área de tecnologia que costumo cobrir e que aconteceriam agora no início de maio, foram convertidos em uma sequência de “lives”. O primeiro é o Red Hat Summit, que aconteceria esse ano em San Francisco (EUA), e agora será online, nos dias 28 e 29 de abril. O outro é o SAP Sapphire Now, que seria em Orlando (EUA), e acontecerá online nos dias 12 a 14 de maio. São congressos que reuniriam, em um único espaço, mais de 15 mil pessoas, e agora potencialmente juntarão muito mais gente online!

Muitos outros eventos importantes estão acontecendo dessa forma. Eu mesmo tenho dado palestras em eventos, agora sem sair de casa.

O fenômeno é tão intenso que muita gente está creditando às “lives” uma sobrecarga sentida na Internet nos últimos dias. Afinal, elas acontecem, na maioria dos casos, no mesmo horário: no fim da tarde ou começo da noite. E, como expliquei na semana passada, existe mesmo um enorme pico de uso da Internet entre 15h e 21h, mas não podemos creditar isso apenas às “lives”.

É curioso que, nesse momento em que todos podem praticamente se tornar pequenas emissoras de TV, vejo que os veículos de comunicação, inclusive as próprias emissoras de TV, não estão aproveitando esse recurso. Talvez achem que não precisem disso, pois já têm os seus formatos consolidados. Mas é uma pena, pois as “lives” são mais que uma curiosidade online: elas são uma verdadeira linguagem nova do tempo em que vivemos.

Eu mesmo tenho usado o formato para criar um programa jornalístico, aproveitando a sua característica interativa. O Jornal da Live vai ao ar toda quinta no LinkedIn, onde sou um dos poucos brasileiros já autorizados a fazer essas transmissões, que ainda estão em teste na plataforma. O programa dura cerca de uma hora e nele eu discuto algumas das notícias mais importantes do momento com todos os participantes, um jeito totalmente novo de se fazer jornalismo, com uma participação inédita e intensa do público!

Tudo isso é sinal do que vivemos. O novo coronavírus e o isolamento social têm provocado intensas e rápidas mudanças na vida das pessoas e das empresas. Muitas pessoas têm me perguntado recentemente se a vida será a mesma depois que isso tudo passar. Certamente não! Já não é a mesma!

Muitas coisas que estamos aprendendo agora, às vezes de maneira dolorosa, permanecerão depois. E as “lives” certamente estarão entre elas. Mais que exibicionismo, elas mudaram a maneira como nos relacionamos e criaram uma nova linguagem.

E aí, vamos criar “lives”?

Batemos no limite da Internet?

By | Jornalismo | No Comments

Desde a semana passada, muitas pessoas vêm relatando diversos problemas com a Internet. Eles vão desde falhas em conversas por vídeo, serviços online de todo tipo ficando mais lentos ou caindo, piora em plataformas de vídeo e até demora para enviar mensagens no WhatsApp.

É fácil explicar o problema! Com o distanciamento social, com muita gente trabalhando em casa, sem falar nas crianças e adolescentes confinados, o consumo na rede cresceu muito! Isso acontece não só porque as pessoas estão usando todo tipo de sistema para trabalhar e estudar, mas também porque a diversão cada vez mais migra para as redes.?


Saiba mais sobre esse assunto no vídeo abaixo:


Será que a gente bateu no limite da Internet? O que a gente pode fazer para melhorar isso?

Para responder isso, a gente precisa entender como a transmissão de dados na Internet funciona e qual o tamanho do problema.

Segundo o IX.br (Brasil Internet Exchange), divisão de infraestrutura do Comitê Gestor da Internet no Brasil, a infraestrutura brasileira da rede apresentou um tráfego de 11 Tb/s já no dia 23 de março. Para se ter uma ideia de quanto isso é fora do normal, a média registrada ao longo de 2019 foi de 4,69 Tb/s.

Claro que existe um aumento natural do consumo de Internet, e ele é forte, como se pode ver nos dois gráficos a seguir, do próprio IX.br. O primeiro mostra o crescimento ao longo dos últimos doze meses; o seguinte, ao longo dos últimos dez anos. Em ambos, fica claro o pico a partir de março agora.

Outra coisa que se observa é uma evidente mudança do consumo ao longo do dia, como pode ser visto no terceiro gráfico. Na Internet doméstica, existia um pico logo de manhã e outro à noite, ou seja, antes de as pessoas saírem de casa para o trabalho ou a escola e depois que voltavam.

Agora esse pico da manhã se transforma no início de uma subida ininterrupta que vai até às 13h, quando o uso se mantém lá no alto. Daí cresce ainda mais a partir das 19h, batendo no máximo do dia lá pelas 21h, quando começa a cair com força, atingindo um mínimo lpor volta de 6h, quando começa tudo de novo.

Alguns podem argumentar que o aumento do tráfego doméstico é compensado pela queda do tráfego nas empresas. Mas isso é apenas meia-verdade. Isso porque muitas, muitas atividades que são feitas hoje online em casa antes eram feitas presencialmente nas empresas e nas escolas.

E o problema se agrava por dois motivos. O primeiro é uma explosão no uso de serviços digitais, desde filmes online até pedir comida por aplicativo. O segundo é que a estrutura da Internet nas casas não costuma ser tão boa quanto a das empresas. Ou seja, o crescimento do tráfego esperado por todo ano aconteceu em uma semana.

Mesmo com tudo isso, segundo o Comitê Gestor da Internet, a rede no Brasil é bem robusta e ainda opera com folga. Então por que estamos sofrendo isso tudo?

Temos que entender que existem diferentes redes compondo a Internet. Partindo da sua casa ou de empresa, existem as redes de acesso, que se conectam às operadoras contratadas. A partir delas, os dados são trafegados entre servidores em conexões mais parrudas, chamadas de backbones nacionais. Por fim, entre países, existem as conexões internacionais.

Com exceção das primeiras, que conectam nossas casas e empresas, nas demais existem esquemas de redundância, ou seja, se uma rota estiver congestionada, os dados automaticamente vão por outro caminho. Ele pode ser mais longo, demorará um pouco, porém entregará a informação.

Entretanto, na chamada “última milha”, a rede que chega em casa ou no escritório, isso não existe. E quanto mais pessoas e quanto mais equipamentos se pendurarem nessas redes, pior! É como se tivéssemos mais carros ao mesmo tempo em uma avenida estreita e sem vias alternativas: mais carros geram congestionamento e velocidades menores, o mesmo acontece com os dados.

A situação se agrava quando nos afastamos dos grandes centros urbanos. Na verdade, se você for para a periferia de uma cidade como São Paulo, a qualidade da Internet fica sofrível, tanto a fixa quanto a móvel, pois a infraestrutura é obsoleta ou insuficiente.

Se qualquer uma dessas redes fica congestionada, sofremos o impacto com lentidão e serviços caindo.

Há ainda um outro fator que pode causar isso, e provavelmente é onde a maior parte do problema está agora: os servidores dos serviços digitais. Qualquer serviço online roda em um computador -seu servidor- que tem capacidade finita, claro. E essas máquinas estão fortemente sobrecarregadas.

Ou seja, o caminho saindo de nossos celulares, nossos computadores, nossas TVs e tudo mais que conectamos à Internet até os servidores dos serviços que usamos está “segurando as pontas”, mas os servidores desses serviços não estão “aguentando o tranco”.

A lentidão tem sido observada até em serviços singelos, como trocas de mensagens pelo WhatsApp. Em serviços que exigem mais dados e processamento, como videoconferências e vídeos online, a coisa fica mais dramática.

E por falar em vídeos, quero falar das lives, as transmissões ao vivo que qualquer um de nós pode fazer em serviços como Instagram, Facebook ou YouTube. A oferta delas explodiu nos últimos dias, sejam de famosos, sejam de anônimos. Tenho ouvido reclamações de que a maioria dessas transmissões é muito ruim, com pessoas consumindo a rede apenas para jogar conversa fora.

Pode até ser verdade, mas temos que tomar cuidado ao apontar dedos. Primeiramente porque todo mundo tem o mesmo direito de usar esse recurso. Depois porque, nesse momento de distanciamento social, as lives acabam sendo uma boa maneira de apresentar o seu trabalho. E nem todo mundo domina a tecnologia ou a narrativa para fazer lives incríveis. A maioria está aprendendo a fazer isso agora, e “na marra”!

Diante de tudo isso, o que a gente deve fazer para melhorar a experiência online de todos?

Cada um tem seu papel e todos devem colaborar, começando pelas operadoras de telecomunicações. A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) firmou um compromisso público com as principais empresas provedoras para manter o país conectado. A agência vai monitorar o tráfego e, junto com as operadoras, tomar ações para resolver problemas que surjam. As teles também trabalham nos sistemas para desviar dados de rotas congestionadas para alternativas mais vazias no momento.

Quanto aos serviços online, precisam ajustar suas entregas e ampliar seu parque de servidores. O Google, por exemplo, já reduziu a qualidade dos vídeos do YouTube de alta definição para padrão. A Netflix fez algo semelhante, economizando 25% da banda e o mesmo foi praticado por alguns concorrentes, como Amazon Prime Video e Globoplay. Até o WhatsApp se mexeu: o sistema limitou os vídeos nos status de seus usuários na Índia, onde é muito popular, a 15 segundos.

Por fim, nós mesmos. Como todo recurso que está escasso, precisamos fazer um uso inteligente dele. Claro que não estou pedindo para não usar o meio digital nesse momento, pelo contrário. Mas use apenas o que for preciso ou razoável. Se possível, divida o uso da Internet pelas pessoas na casa ao longo do dia. Além disso, tente realizar atividades que exigem mais da rede fora dos horários de pico.

São medidas simples, mas que podem trazer um alívio para a rede e par nossas mentes, aumentando a produtividade nesses dias em que estamos sendo obrigados a repensar muito de nosso cotidiano.