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Crianças com “laptop de US$ 100” do projeto “One Laptop Per Child”, criado por Nicholas Negroponte - Foto: OLPC/Creative Commons

Volta às aulas reacende debate sobre o lugar da tecnologia na escola

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Estamos em plena volta às aulas! Com os alunos, ressurge o debate sobre como usar a tecnologia na educação, com uma inteligência artificial cada vez mais poderosa. E a prefeitura do Rio de Janeiro jogou lenha na fogueira ao proibir, na sexta passada, que os alunos usem celulares nas escolas públicas municipais, mesmo no recreio.

Especialistas aprovam a decisão, que tem 30 dias para ser implantada. Já debatemos longamente, nesse mesmo espaço, como os celulares em sala de aula em atividades não acadêmicas roubam a atenção dos alunos e prejudicam profundamente seu aprendizado. No caso do recreio, eles atrapalham os processos de socialização entre as crianças, necessários para o seu desenvolvimento. Pela nova regra, os equipamentos devem ficar desligados ou silenciados na mochila do estudante, podendo ser usados apenas se o professor os solicitar para alguma atividade, ou em casos excepcionais, como alunos com algum problema de saúde.

A determinação é interessante para ampliarmos o debate sobre a digitalização do ensino. Nessa mesma época, no ano passado, os professores estavam em polvorosa devido ao então recém-lançado ChatGPT. Muitos achavam que não conseguiriam mais avaliar seus alunos e alguns temiam até perderem o emprego para as máquinas.

Passado um ano, nada disso aconteceu, até porque descobrimos que essa tecnologia ainda erra muito. Mas todo aquele burburinho serviu para, pelo menos, os professores repensarem os seus processos de avaliação. Em uma sociedade altamente digitalizada, não dá mais para só pedir que alunos entreguem textos escritos em casa.

Mas se sabemos o que não deve mais ser feito, ainda não há clareza sobre como usar todo esse poder digital de maneira criativa e construtiva com os estudantes, desde a infância até a universidade. A despeito dos riscos e problemas conhecidos, os alunos devem aproveitar o que ela também oferece de bom, de forma adequada a sua idade. Essa é uma lição de casa que todos nós temos que fazer.


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Há 15 anos, eu trabalhava com o desenvolvimento de conteúdos didáticos digitais e sistemas de apoio pedagógico. Era uma época em que Nicholas Negroponte, fundador do Media Lab, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), propunha o uso de notebooks de US$ 100 para crianças estudarem melhor com o apoio da tecnologia.

Essas máquinas chegaram a ser criadas e pude conhecer alguns modelos. Eram pequenas maravilhas tecnológicas para a época, a um preço convidativo. O projeto foi implantado em alguns países, mas em muitos casos (inclusive no Brasil) não evoluiu, não pela tecnologia, mas porque os professores não sabiam bem o que fazer com ela.

De certa forma, vivemos algo semelhante agora. Estamos cercados por telas, e as crianças têm acesso a elas cada vez mais cedo. Segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil, divulgada em 25 de outubro pelo Cetic.br (órgão de pesquisa ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil), 95% dos brasileiros entre 9 e 17 anos estão online, e 24% tiveram seu primeiro acesso até os seis anos de idade.

O ChatGPT popularizou a inteligência artificial, e muitas empresas correm para criar soluções educacionais com ela. Como exemplo, em maio, Salman Khan, fundador e CEO da Khan Academy, uma organização que oferece educação online gratuita, demonstrou uma ferramenta que auxilia professores e alunos. Ela não dava respostas aos estudantes, ajudando-os a pensar na solução dos problemas. Para professores, a ferramenta ajudava a planejar aulas engajadoras. Khan afirmou que, para os alunos, a IA atua como um tutor, enquanto, para os professores, age como um assistente.

Esse é um sonho antigo do Vale do Silício. Não tenho dúvidas que a tecnologia pode ajudar na educação: eu cresci com isso! Mas também sei que ela sozinha não resolve, nem mesmo a “IA tutora” de Khan. Uma educação eficiente em qualquer idade não se resume a conteúdo de qualidade ou tutores que façam provocações inteligentes. Ela depende também da humanidade dos professores, capazes de ensinar, mas também de engajar e acolher seus alunos além de suas necessidades pedagógicas.

De todo jeito, está na hora de repensarmos a educação à luz da tecnologia.

 

Celulares e IA como apoio

Vivemos um cenário paradoxal. Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), o excesso de telas sem orientação prejudica a aprendizagem e até a saúde mental de crianças e adolescentes. O órgão sugere também que a IA não seja usada antes dos 13 anos de idade. Por outro lado, a ausência de tecnologia põe estudantes em desvantagem educacional.

Devemos ter cuidado para não nos deslumbrarmos com as possibilidades da tecnologia nem tampouco rechaçá-la por temor do desconhecido. Isso significa que as escolas não podem abraçar inconsequentemente uma solução como a de Khan (que tem muitos méritos), especialmente como marketing, nem demonizar as telas na sala de aula, como alguns podem entender a determinação da prefeitura do Rio de Janeiro.

Precisamos ser guiados por consciência e equilíbrio. Vimos, no ano passado, a tentativa do governo do Estado de São Paulo de abandonar os livros, que seriam substituídos por questionáveis slides produzidos pelo próprio governo. Isso sim é um uso inadequado da tecnologia, reduzindo profundamente o papel do professor.

Há muito tempo, a sociedade brasileira debate a “atualização” e a “utilidade” dos currículos escolares. E nos últimos anos, uma parcela da população aprendeu a demonizar os professores. Para esses, quanto menos professor, melhor, e a inteligência artificial poderia ser a resposta a suas preces.

Naturalmente a escola precisa estar alinhada ao nosso mundo em constante transformação. Mas devemos ter cuidado para não reduzi-la a algo meramente utilitário. A escola deve principalmente formar cidadãos conscientes e viáveis, capazes de lidar com os desafios da sociedade e melhorá-la, e isso não se faz só com a capacidade de ler ou de fazer contas: são necessárias empatia, inteligência emocional, pensamento livre e humanidade.

Quem ensina isso são os professores e o melhor lugar para uma criança e um adolescente aprenderem é a escola. A tecnologia deve ser vista como uma parceira valiosa nesse processo de transformação, não uma substituta.

Por tudo isso, tenho visto professores em algumas listas de “profissões do futuro”. Mas naturalmente serão aqueles que usam a tecnologia para ampliar seus próprios limites e os de seus alunos. O amanhã pertence a quem domine a tecnologia, sem perder nada de sua humanidade.

 

Salas de aulas presenciais vazias e online lotadas: EAD vem provocando mudanças na educação – Foto: Creative Commons

Ganância de faculdades massifica ensino ruim a distância

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Na quarta passada (29), o Ministério da Educação (MEC) publicou uma portaria suspendendo por 90 dias novos cursos a distância em 17 áreas, incluindo todas as licenciaturas. Mais que bem-vinda, a decisão já deveria ter sido tomada há tempos, pois o ensino a distância (EAD) vem deixando de ser uma poderosa ferramenta de inclusão e flexibilidade na educação, para se tornar um mecanismo de massificação de ensino de baixa qualidade por instituições que visam apenas o lucro.

Segundo o Censo de Educação Superior, publicado em outubro, em uma década os cursos acadêmicos por EAD cresceram 700%, ficando hoje com dois terços dos ingressantes no Ensino Superior e formando 31% do total. Mas a qualidade é muito ruim: apenas 19% dos cursos privados e 34% dos públicos obtiveram notas 4 ou 5 nas avaliações do MEC.

Se considerarmos a formação de novos professores, que pede presença em sala de aula para se aprender o ofício, a situação fica dramática: na licenciatura e pedagogia, 65% dos formandos são por EAD. Na rede particular, 93,7% dos ingressantes desses cursos, onde a média de alunos em sala é de 171, estudam online.

Cursos da área de saúde, os de áreas que exijam ir a campo como parte da formação, Pedagogia e licenciaturas jamais deveriam acontecer por EAD. Esses profissionais acabam sendo despejados no mercado com formações muito deficientes. A sociedade precisa parar de ver esses números como “democratização do ensino”, porque essas pessoas aprendem muito pouco, na prática apenas “comprando um diploma barato”.


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O ensino a distância traz vantagens inegáveis. Provavelmente a maior delas é a flexibilidade de horários e a dispensa de se deslocar até a escola, o que economiza muito tempo e dinheiro em grandes cidades. Também é uma ferramenta de inclusão para pessoas com deficiência ou que vivam em locais que não oferecem os cursos. Por fim, eles tendem a ser mais baratos que os presenciais.

Naturalmente também há desvantagens. Uma delas é a exigência de uma autodisciplina muito maior dos alunos, para que aproveitem o curso, algo que muitos não têm. A distância também prejudica seriamente a interação social entre alunos e professores. É necessário ainda ter uma infraestrutura digital para assistir às aulas. E como o MEC aponta, a qualidade dos cursos realmente tem ficado a desejar.

“Eu sou uma grande defensora da educação a distância, mas nós estamos imersos nos grandes grupos empresariais, para quem a educação é um produto”, afirma Ana Lúcia de Souza Lopes, professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em tecnologia para educação. “Isso pasteuriza a educação e as turmas acabam sendo enormes, com 200 alunos, e aí você pode ter o melhor professor do mundo, que ele não dá conta!”

O EAD explodiu com o relaxamento de suas regras em governos anteriores e com a pandemia. Antes dela, muita gente torcia o nariz para o ensino a distância. Agora a situação se inverteu.

Representantes do ensino privado afirmam que o EAD permite que alunos mais pobres estudem. Em muitos casos, é verdade, mas há instituições que aproveitam isso para criar cursos baratos, que não se sustentam na qualidade. Seu modelo exige centenas de alunos em sala, para que sejam lucrativos. Mas, com isso, os professores nem sabem quem são os alunos, prejudicando severamente o ensino.

Quando o MEC instalou um grupo de trabalho sobre o tema, diversas entidades públicas e privadas ligadas à educação publicaram uma carta aberta solicitando melhorias estruturais em três frentes: a expansão desenfreada do EAD, a baixa qualidade dos cursos e a alta evasão de alunos.

 

Professores sem sala de aula

Uma das principais críticas da formação de professores a distância é estarem justamente fora de uma sala de aula presencial. Especialmente no caso de crianças e adolescentes, isso exige habilidades muito específicas, que só se adquirem com o contato com esses grupos. Em alguns anos, teremos uma geração de professores em salas de aula formados sem essa experiência.

Como já foi dito, o ensino a distância não é necessariamente ruim. Na verdade, se for bem implantado, pode ser ótimo! Mas para isso, várias coisas precisam ser observadas.

A primeira delas, responsabilidade das instituições, é a qualidade do material pedagógico, que, no caso, se reflete em bons conteúdos e boa infraestrutura digital. A quantidade de alunos nas turmas também deve ser limitada, para que exista uma troca proveitosa entre professores e alunos. Os professores, tanto os conteudistas (que preparam o material) quanto os tutores (que ministram as aulas), precisam ser formados para aulas nessa modalidade, que exige conhecimentos técnicos para tirarem proveito pleno desses recursos. Por fim, os alunos precisam de muito mais autodisciplina, para realizar todas as tarefas e interações adequadamente.

Essa explosão da formação de professores a distância tende a corroer ainda mais o já raso prestígio da carreira no Brasil. Segundo o relatório “Global Teacher Status”, entre 35 países avaliados, o Brasil é o que menos prestigia seus docentes. Nos países desenvolvidos, os professores vêm dos 30% melhores alunos; por aqui, a esmagadora maioria está entre os 10% com pior desempenho no Enem.

“Muito se fala do ‘apagão docente’, que mesmo quem faz a graduação em Pedagogia não tem interesse em atuar nessa área”, explica Lopes. “Faz porque, no nosso país, o diploma universitário é um status dentro da sociedade, não porque quer ser professor”.

Essa explosão de cursos a distância rasos por R$ 99 cria uma lógica perversa no mercado. Os alunos são atraídos pelo preço, mesmo não aprendendo grande coisa com eles. E isso força mesmo instituições que prezam pela qualidade a oferecer algo nessa linha, ou correm o risco de fecharem as portas.

É por isso que o governo precisa “colocar ordem na casa”! Esse mercado claramente não sabe se autorregular e os gestores educacionais criaram uma armadilha para si mesmos.

O EAD deve ser implantado da maneira correta, pelo que traz de benefícios. Ele não pode ser usado para criar cursos com salas lotadas, baratos e que não ensinam os alunos. Da mesma forma, não deve ser demonizado. Mas para isso precisa ser regulamentado, para ganhar credibilidade e qualidade. Quantidade de alunos e excelência acadêmica devem ser objetivos permanentes de todos.

Agora que o governo suspendeu novos cursos, o próximo passo é descredenciar os já existentes que não consigam comprovar o nobre papel de ensinar. Educação não pode ser vista de maneira tão displicente e focada apenas nos lucros. Enquanto isso não mudar, o Brasil continuará descendo a ladeira em todas suas métricas sociais. Até onde chegaremos no fundo desse poço?

 

Alunos precisam de 20 minutos para se reconectar ao estudo depois de usar smartphones para outras coisas - Foto: RDNE/Creative Commons

Pais e educadores devem “fazer as pazes com o não” para combater excesso de telas

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Ganha força a tese de que crianças e adolescentes fazem um uso excessivo de telas na escola e em casa, e que isso provoca grandes prejuízos ao seu desenvolvimento. No dia 26 de julho, um relatório da Unesco (a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) destacou pela primeira vez o problema e como um quarto dos países já faz alguma restrição de celulares em sala de aula. Mas ainda se fala pouco sobre como professores sem autoridade e até coibidos por pais de alunos podem ser levados a contribuir com essa situação.

Isso aparece no recém-lançado estudo “Educando na era digital”, da consultoria educacional OPEE. Ele indica que 97% dos educadores brasileiros concordam que há “uso excessivo de telas sem acompanhamento”, mas paradoxalmente apenas 9,7% deles acham que elas devem ser proibidas na sala de aula.

O exagero digital dos jovens vai além da escola. Outra pesquisa, a TIC Kids Online Brasil, divulgada no dia 25 de outubro pelo Cetic.br (órgão de pesquisa ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil), indica que 95% dos brasileiros entre 9 e 17 anos estão online, e que isso acontece cada vez mais cedo: no ano passado, 24% tiveram seu primeiro acesso até os seis anos de idade; em 2015, eram 11% nessa faixa etária.

Todos esses fatos estão interligados e se retroalimentam. Enquanto pais e educadores não resgatarem a consciência de sua autoridade para impor limites aos mais jovens, esse quadro tende a se agravar. É impensável negar o acesso à tecnologia digital no nosso mundo hiperconectado, mas é preciso ensinar crianças e adolescentes a usarem-na de maneira construtiva e responsável.


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“Muitos educadores nem podem dizer ‘não’, porque a escola está muito refém da ‘carteirada’, no caso da escola particular, e até da agressão ou da humilhação, na escola pública”, afirma Leo Fraiman, mestre em psicologia educacional e autor da metodologia OPEE. “O professor hoje é tido, por muitas famílias, como um funcionário, um empregado seu, e não mais como uma autoridade.”

Segundo o psicoterapeuta, existe uma esquizofrenia entre famílias e escolas. As primeiras exigem das segundas o ensino de limites, de valores, de humanidade. Mas quando surge algum limite, até em uma simples nota baixa, os pais reagem negativamente.

“Viemos de um modelo mais rígido, de onde muitos adultos saíram ressentidos, até machucados emocionalmente”, explica o pesquisador. “E hoje, como pais, é como se quisessem se vingar das suas próprias feridas, superprotegendo os filhos.”

As telas de crianças e adolescentes são subprodutos dessa cultura. Muitos pais argumentam que elas desenvolvem, nos mais jovens, necessárias habilidades digitais, o que não deixa de ser verdade, desde que feito com orientação. Entretanto, o que se observa é que principalmente o celular se tornou um “companheiro” que ocupa o tempo dos pequenos, uma “babá eletrônica” (posto que foi ocupado pela TV há 30 anos) que falsamente desobriga os pais de dar mais atenção aos filhos.

Isso se reflete na escola, com pais exigindo a possibilidade de falar com seus filhos a qualquer momento, mesmo nas horas em que estiverem em aula. Com o smartphone, os alunos acabam impactados pelas incontáveis notificações, além da sedução das redes sociais, destacadas pela Unesco como fortes fatores de distração. E os alunos podem levar até 20 minutos para se concentrar novamente no que estavam aprendendo depois de usarem o smartphone para atividades não-educacionais.

É importante que fique claro que ninguém está dizendo que os jovens não devem usar a tecnologia, e sim que façam isso de forma comedida e sob orientação de adultos. A Unesco aponta que o excesso e a falta de critérios podem levar ao surgimento de problemas de alimentação, sono, saúde mental e saúde ocular.

 

Cyberbullying e outras agressões digitais

Outro estudo do Cetic.br, o TIC Educação, divulgado em 25 de setembro, indica que um terço dos professores brasileiros disseram que seus alunos pediram ajuda após terem sofrido assédio ou agressões pelo meio digital, ou terem suas fotos publicadas sem consentimento. Em um ano, os casos de vazamento de fotos saltaram de 12% para 26% e os de cyberbullying passaram de 22% para 34% dos estudantes. Esses números estão em linha com as observações dos educadores ouvidos pela pesquisa da OPEE: 80,9% deles acreditam que o acesso às telas favorece o cyberbullying.

É muito bom observar que os alunos recorrem a seus professores para lidar com problemas gravíssimos criados ou agravados pelo meio digital. Isso demonstra uma relação de confiança diante de algumas das maiores agressões que eles podem sofrer. Entretanto os professores precisam ter autonomia para atuar como necessário, até mesmo limitando o uso das telas e das redes sociais. A escola ganha também um novo papel, que é o de educar os pais no convívio digital, uma habilidade que possivelmente eles mesmos não dominem.

Fraiman alerta que estamos “contraindo uma dívida enorme para as próximas gerações” ao não as educar para um uso construtivo do meio digital, abrindo brechas para o surgimento de todos esses problemas educacionais e emocionais. E provoca: “diante de um mundo que vai ser cada vez mais competitivo, exigente, caro, acelerado, complexo, qual é a chance de uma criança, de um adolescente realmente se tornar ativo e inserido na sociedade e no mercado de trabalho, se ele for uma pessoa rasa, individualista, narcisista, acomodada e amedrontada?”

Isso vem de quebras de paradigmas sociais que a tecnologia continuamente nos impõe. As potencialidades oferecidas são fabulosas e surgem em escala exponencial, assim como problemas da nossa inadequação a tantas novidades. Começou com o surgimento da Internet comercial, foi seguida pela explosão das redes sociais e posteriormente dos smartphones. Agora a inteligência artificial é a bola da vez. É muito difícil absorver adequadamente tanta mudança!

A Unesco defende o uso de telas nas escolas, desde que claramente destinadas ao apoio ao ensino, e não como distração dos alunos. Além disso, nunca podem substituir o papel dos professores. Esses, por sua vez, precisam ter sua autonomia e autoridade resgatadas por boas políticas educacionais e pelas próprias instituições de ensino. Quanto às famílias, cabe a elas trabalharem em parceria com as escolas para a criação de limites a seus filhos, respeitando e valorizando os educadores.

A escola é um espaço de aquisição de conhecimento, mas também de respeito a diferenças e de fortalecimento de uma cidadania inclusiva, com um uso inteligente de todos os recursos disponíveis. Isso só acontecerá com a colaboração de todos os envolvidos, e nossos jovens precisam desesperadamente disso.

 

Crianças participam em atividade de aula de robótica em sua escola - Foto: Arno Mikkor/Creative Commons

Pensamento computacional em crianças e jovens ajuda a formar melhores cidadãos

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Em uma famosa entrevista em 1995, Steve Jobs disse que “todos neste país deveriam aprender a programar um computador, pois isto ensina a pensar.” O cofundador da Apple foi visionário, pois dominar a tecnologia se tornou crucial em um mundo imerso nela. A explosão no debate e aplicações de inteligência artificial reacendeu o tema, pois fica cada vez mais claro que ela pode colocar pessoas e empresas em um patamar superior àquelas que não se aproveitam de seus recursos.

Mas o pensamento computacional transcende programar computadores. Na verdade, hoje podemos fazer usos incríveis das máquinas sem escrever uma linha de código. Essa maneira de raciocinar envolve a capacidade analítica de resolver qualquer tipo de problema, de identificar padrões, de modelar processos. Ela aprimora nossa capacidade de aprender e de pensar criativa e criticamente, mesmo sem nada digital.

Nas últimas décadas, muitas escolas tentaram implantar computadores no cotidiano escolar em iniciativas muitas vezes improdutivas. Até pouco tempo, muitas ainda tinham “aulas de informática” sobre Windows e Word. Isso já erra por segregar a “informática” a uma aula, ao invés de encará-la de maneira transversal nas disciplinas.

Agora nos aproximamos do momento em que as escolas precisarão implantar a Política Nacional de Educação Digital, que estabelece diretrizes e metas para a promoção da educação digital, instituída no dia 11 de janeiro pela lei 14.533/23. Resta saber se as escolas estão preparadas para isso.


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Não podemos esquecer que muitas dessas instituições no país não têm infraestrutura para isso, carecendo de computadores e acesso à Internet. Mas esse trabalho pode começar mesmo sem o lado digital.

“Se a gente trabalha isso desde cedo nas escolas, com crianças e jovens, a gente consegue uma geração que sabe pensar de um jeito melhor, mais estruturado”, explica Cristina Diaz, diretora da UpMat Educacional, empresa que atua na educação básica a partir de conteúdos de matemática e pensamento computacional. Para ela, as crianças que desenvolvem essas habilidades desde cedo têm mais chance de criar um gosto pelo aprendizado, que levarão para o resto da vida.

Uma resolução do MEC (Ministério da Educação), de 4 de outubro do ano passado, determina que, a partir do mês que vem, as escolas passem a ensinar computação. A lei de janeiro detalha como isso deve ser feito, considerando a inclusão digital da sociedade, a educação digital nas escolas, as ações de capacitação do mercado de trabalho e o incentivo à inovação, à pesquisa e ao desenvolvimento.

Se isso já não bastasse, o lançamento do ChatGPT em novembro passado provocou um enorme debate sobre como a inteligência artificial impacta as atividades escolares, com professores e alunos usando a ferramenta sem preparo. Coincidentemente, na quinta passada, a Unesco (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) publicou orientações sobre o uso da inteligência artificial na educação e na pesquisa. Nelas, o órgão sugere que a IA não seja usada antes dos 13 anos de idade.

Diaz não acredita que a inteligência artificial deixará as pessoas menos inteligentes ou preguiçosas, um temor que vem sendo ventilado por muita gente. O motivo é simples: “para manusear esse tipo de tecnologia, a gente vai ter que aprender coisas mais sofisticadas, uma leitura crítica, a utilizar competências superiores”, afirma.

De fato, uma ferramenta tão poderosa como a inteligência artificial generativa oferece os seus maiores benefícios àqueles que sabem tirar proveito dela, com perguntas inteligentes. Infelizmente, a recíproca também é válida.

Como diz um ditado americano, “se entra lixo, sai lixo”.

 

Aliada da educação

Ao contrário do que muitos temem, a tecnologia digital –e a inteligência artificial particularmente– não ameaça a educação ou o papel do professor. Pelo contrário, pode ser uma incrível aliada no processo, se bem usada.

Em uma palestra há quatro meses, Salman Khan, fundador e CEO da Khan Academy, uma organização que oferece educação gratuita pela Internet, demonstrou uma ferramenta de IA generativa que auxilia professores e alunos. Nela, é possível ver, no caso dos estudantes, a máquina não lhes dando respostas prontas e ajudando-os a pensar na solução dos problemas. Para os professores, a ferramenta ajuda no planejamento de aulas mais engajadoras. Como disse Khan, para os alunos, a IA atua como um tutor, enquanto, para os professores, age como um assistente.

Os professores, as escolas e as políticas educacionais precisam se modernizar para absorver essas mudanças aceleradas da sociedade. Ainda temos um sistema educacional conteudista, com uma quantidade de informação tão grande, que pode desestimular o aluno a querer aprender mais.

Isso se reflete nos péssimos resultados do Brasil nas diferentes avaliações internacionais de eficiência educacional. Nossos estudantes, na média, sabem muito pouco de linguagem, ciências e matemática. Essa última é particularmente maltratada em nosso país, cujas últimas gerações parecem não gostar dela por definição.

Mas como ser um bom cidadão em uma sociedade profundamente digital sem uma boa base de pensamento computacional?

Engana-se quem acha que isso impacta apenas habilidades ligadas às Exatas. Um pensamento computacional limitado afeta diretamente o senso crítico do indivíduo. Em um mundo em que redes sociais e smartphones se transformaram em ferramentas de dominação ideológica pelas infames fake news, nada é mais necessário e determinante para a criação de um cidadão consciente, com sua mente livre.

“As escolas já estão reconhecendo a sensação de que não tem para onde escapar, e não porque é uma demanda da lei, mas porque é uma demanda da sociedade, das crianças, das famílias, da vida”, acrescenta Diaz. “Ninguém fala em outra coisa: o mundo do trabalho depende disso!”

Pais e escolas precisam se unir para que as crianças sejam incentivadas a desenvolver seu pensamento computacional. A matemática e o raciocínio lógico não podem continuar sendo encarados como “coisas chatas”, pois são os alunos que dominam esses recursos que escreverão o futuro de um mundo melhor para si e para todos os demais.

 

Elon Musk, CEO do Twitter, que relaxou o controle de conteúdo quando comprou a rede social - Foto: Daniel Oberhaus / Creative Commons

A marcha da insensatez nas redes sociais e a falência da sociedade

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Na última semana, um dos debates mais intensos no país foi a apuração da culpa das redes sociais no crescimento de ataques em escolas. Se já não bastasse a incredulidade diante de alunos e professores brutalmente assassinados, o posicionamento do Twitter em uma reunião de representantes das principais plataformas com o ministro da Justiça na terça provocou revolta. Entretanto, apesar daquela pavorosa declaração, precisamos olhar o problema sem simplificações.

Especialistas de educação e de saúde mental afirmam que a explosão de conteúdo nas redes sociais que menciona e até glorifica esses crimes serve como catalisador para novos atentados. Neste mesmo espaço, destrinchei o tema na semana passada. Mas como expliquei, apesar da contribuição dessas publicações para esses crimes, eles não podem ser atribuídos apenas a isso.

Ao longo da semana, conversei com profissionais de diferentes áreas sobre o caso. É um consenso que as redes sociais fazem muito menos do que poderiam e deveriam para o combate a esses crimes, como quando o Twitter disse naquela reunião que fotos de assassinos e de vítimas em posts não violariam as regras da rede ou sequer seriam apologia a crimes.

Muitos afirmam que retirar esse ou qualquer outro conteúdo seria censura. Alguns vão além e sugerem que esse movimento encobriria o interesse de um governo que, na verdade, estaria usando essa comoção para controlar a mídia.

São argumentos fortes, e eu até concordaria com isso, se as redes sociais fossem meios de comunicação tradicionais. Mas elas não são: sua gigantesca capacidade de nos convencer de qualquer coisa concentra o núcleo dessa discussão.


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Houve uma época em que eu era muito mais liberal sobre o que poderia ser publicado nas redes sociais. Eu as via como ferramentas que garantiam uma liberdade inédita ao cidadão para expor ideias em pé de igualdade com veículo de comunicação. Em 2015, cheguei a discordar publicamente do escritor e filósofo italiano Umberto Eco, quando ele disse que as redes sociais haviam dado voz a uma “legião de imbecis”, e que “o drama da Internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade.”

Quando alguém argumentava que essas plataformas deveriam ter alguma responsabilidade sobre o que seus usuários publicavam nelas, eu comparava isso com culpar o fabricante de um carro se ele fosse usado em um assalto a banco. Porém, à medida que fui estudando mais os algoritmos das redes sociais, fui percebendo que essa analogia era muito errada. Se os carros fossem como redes sociais, eles eventualmente convenceriam seus donos a roubar o banco!

A minha “fase mais liberal” com as redes sociais vinha do fato de usar essas plataformas desde suas primeiras aparições, como o Friendster e o Orkut, há cerca de duas décadas. Elas eram quase pueris, feitas para encontrar velhos amigos e conhecer gente nova. Todo mundo “brincava” ali, sem ofensas, sem medo, sem ódio.

E tudo isso porque tampouco existiam algoritmos de relevância, popularizados pelo Facebook em 2014. São eles que escolhem o que seus bilhões de usuários veem nas redes. Mais que isso, para que as pessoas se sintam “confortáveis”, exibem apenas conteúdos de que elas gostem, prendendo cada um de nós nas infames “bolhas”.

Ao fazer isso, as redes sociais se transformaram nas ferramentas perfeitas de convencimento de qualquer coisa, até mesmo para se cometer um crime bárbaro.

É nessa hora que “o carro pode induzir seu dono a roubar o banco”.

 

A responsabilidade de cada um

As redes sociais estão na berlinda. Diante de sua apatia, o governo quer que as empresas criem canais para rápida remoção de conteúdo ligado a esses crimes, e ameaça com multas e até bloqueios a quem não colaborar.

“O governo tem na lei os limites aos quais suas ações podem chegar, e não pode haver liberdade para multar ou banir sem a devida previsão legal”, explica Márcio Chaves, sócio da área de Direito Digital do Almeida Advogados. No caso brasileiro, há o Marco Civil da Internet, que prevê que uma plataforma digital seja responsabilizada por um conteúdo apenas se não o remover após uma ordem judicial. “Esse limite foi imposto justamente para evitar a censura prévia e não jogar para o provedor essa obrigação”, acrescenta.

Mas Chaves acredita que a legislação dificilmente dará conta de todas as situações em que a segurança da sociedade seja ameaçada por uma suposta “liberdade de expressão”. Segundo ele, “por isso é tão importante estimular um ambiente não de imposição, mas de cooperação entre as empresas e a administração pública, no qual ferramentas tecnológicas, conselhos de supervisão, e autoridades judiciais possam endereçar situações sensíveis como a que estamos passando agora com os ataques nas escolas, em uma velocidade mais compatível com a que estamos sujeitos com o uso das tecnologias digitais”.

O debate sobre mais responsabilidade para as redes sociais acontece há alguns anos no Brasil. Ele está, por exemplo, no Projeto de Lei conhecido como “PL das Fake News” e em sugestões de atualização do Marco Civil da Internet. No geral, pede-se que essas plataformas sejam mais atuantes e efetivas na identificação de discurso de ódio, desinformação e outros crimes em suas páginas, removendo esse conteúdo sem necessidade de uma ordem judicial, mesmo não sendo obrigadas a isso.

O grande risco é se criar uma espécie de “censura algorítmica”, com essas plataformas eliminando equivocadamente conteúdos legítimos. É verdade que a tecnologia para essas identificações vem progredindo a passos largos, inclusive com o apoio da inteligência artificial, mas ela ainda não é garantida.

Precisamos encontrar mecanismos eficientes para coibir a escalada de crimes incentivados nas redes sociais, sem criar outros problemas. O que não pode acontecer é uma empresa não remover um conteúdo de ódio “porque não violaria seus Termos de Uso”, como disse o Twitter. Chaves lembra que eles “são contratos entre a plataforma e o usuário, e só há liberdade contratual se não for contrária à lei”.

Sobra o temor de o governo usar isso para controlar a mídia. Todos governantes desejam isso, em alguma escala. Antes se restringia à imprensa, mas ela, ainda que independente, obedece a leis. Além disso, o jornalismo profissional segue um Código de Ética, que faz com que sua produção, ainda que às vezes falha, tenha um mínimo de qualidade. Já as redes sociais parecem ser guiadas apenas pelos seus interesses.

Por fim, isso não pode virar uma discussão político-partidária, como muitos já têm feito. Tampouco há espaço para deixar tudo como está, pois o discurso de ódio nas redes agrava o problema de fato. Essas empresas devem abandonar sua complacência, para evitar medidas mais drásticas. E a sociedade precisa ficar vigilante para que nenhum governo use o pânico para controlar qualquer mídia.

 

Escolas se tornaram alvo porque abordam questões que podem alimentar o extremismo - Foto: Max Klingensmith / Creative Commons

Como as redes sociais influenciam os ataques a escolas

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Na quarta passada, o Brasil vestiu luto mais uma vez diante do ataque à creche Cantinho do Bom Pastor, em Blumenau (SC). Ela foi invadida por um homem de 25 anos que, de maneira brutal e imotivada, assassinou quatro crianças. O delegado-geral da Polícia Civil de Santa Catarina, Ulisses Gabriel, afirmou que não há indícios de que o crime tenha sido coordenado por meio de redes sociais ou games. Mas apesar de ele estar correto ao dizer que não existe vínculo direto no caso, o papel do meio digital em ataques como esse não pode ser ignorado.

A declaração me fez lembrar de um crime semelhante. No dia 13 de março de 2019, dois ex-alunos invadiram a escola estadual Professor Raul Brasil, em Suzano (SP). Eles mataram estudantes e funcionários e depois se suicidaram. Autoridades, ainda no local do atentado, sugeriram que a culpa seria do game que os assassinos jogavam.

Especialistas descartam a relação entre jogos digitais e a violência, mas o mesmo não pode ser dito das redes sociais. O aumento de grupos de ódio em suas páginas incentiva pessoas a praticar esses atos bárbaros. A sociedade precisa entender suas dinâmicas, para buscar soluções sustentáveis e eficientes.


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O crescimento desses grupos e dos ataques não é uma coincidência. Nove dias antes do atentado em Blumenau, um aluno de 13 anos assassinou uma professora de 71 anos em uma escola na Vila Sônia, na capital paulista. Em 2021, um homem de 18 anos matou duas funcionárias e três bebês em uma creche na também catarinense cidade de Saudades.

Até 2002, não havia relatos de atentados em escolas brasileiras. De lá para cá, 40 pessoas morreram em casos assim. O primeiro aconteceu em Salvador, em 2002. Depois dele, houve um caso em 2003, dois em 2011, um em 2012, 2017 e 2018, dois em 2019 e um em 2021. Já em 2022 foram seis ocorrências. Em 2023, estarmos ainda em abril, e já aconteceram três atentados, um deles felizmente sem vítimas.

“As escolas se tornaram alvos porque abordam questões que podem alimentar o extremismo, como educação sexual, diversidade, racismo e violência de gênero”, explica Evelise Galvão de Carvalho, mestre em Psicologia Forense e especialista em comportamento antissocial na Internet. “Dessa maneira, é necessário considerar esses ataques como crimes de ódio”, afirma.

Quando atentados assim acontecem, os participantes de um movimento online conhecido como “True Crime Community” se agitam, repercutindo os ataques como se fossem grandes feitos. Eles destacam os nomes dos autores e, quando disponíveis, distribuem fotos e vídeos da ação. Por isso, muitos desses participantes buscam essa perversa “fama”, por mais fugaz e doentia que seja.

O problema fica ainda mais preocupante quando se observa que esses grupos agora podem ser encontrados facilmente nas redes sociais, inclusive naquelas preferidas por adolescentes, como o TikTok. Até pouco tempo atrás, eles trafegavam apenas em áreas restritas nas redes sociais a na chamada “Dark Web”, em que são necessárias ferramentas e autorizações especiais para entrar, o que a torna ideal para criminosos.

Essa nova “liberdade” amplia o efeito de “contagiar” pessoas para que outras ações sejam realizadas. É o que aconteceu em 15 março de 2019, quando um supremacista branco matou 51 pessoas em duas mesquitas na Nova Zelândia. A ação foi transmitida ao vivo pelas redes, sendo massivamente compartilhada depois.

 

Redes de intolerância

Tais grupos são motivados por crenças de superioridade racial, étnica, religiosa ou nacionalista, e consequente inferioridade de quem é diferente. Alguns visam proteger valores tradicionais que consideram ameaçados. Frequentemente promovem suas ideias por desinformação e violência, e chegam a propor uma sociedade em que os outros sejam subjugados ou excluídos.

Esses ataques não são atos terroristas convencionais. As pessoas que os praticam costumam agir sozinhas, incentivadas pelo que veem na Internet, mas não se pode atribuir seus atos exclusivamente a esses grupos.

Os agressores seriam predispostos a cometer os atentados pois viveriam em ambientes violentos. Fatores como agressividade em casa, bullying nas escolas e insucesso em relacionamentos podem contribuir. Vale dizer ainda que a sociedade se tornou muito mais intolerante e radicalizada nos últimos anos, com grupos de poder desvalorizando o afeto, pregando o ódio e até desumanizando quem pensa de forma diferente. Por fim, a pandemia agravou problemas de saúde mental na população.

“Alguns grupos podem enxergar meninos como futuros líderes e tentar doutriná-los desde cedo, para garantir seu engajamento contínuo à medida que envelhecem”, explica Carvalho. “Os meninos são frequentemente socializados para valorizar a força e a agressão, e grupos de ódio podem tentar explorar essas normas culturais para recrutar novos membros.”

Não se trata, portanto, apenas de casos de polícia. Detectores de metal e até policiais das escolas podem reduzir esses ataques, mas não resolvem a violência, que se manifestará de outras formas.

A escola deve ser fortalecida, como um espaço de diversidade e de debate. Professores precisam ser valorizados e pais e mães devem se unir nesse esforço, ao invés de combatê-los por não concordar com algo. Também é um problema de saúde pública, com as autoridades precisando ficar atentas ao crescimento de isolamento social e problemas de saúde mental. As famílias também precisam de apoio para que consigam construir relacionamentos positivos com seus filhos, minimizando o desejo de se unir a esses grupos, por exemplo, por falta de afeto.

A mídia pode contribuir ao não divulgar nomes e imagens dos crimes, dificultando a sua promoção nas redes de ódio, que é o “prêmio” desses criminosos. No atentado de quarta passada, grandes veículos de imprensa agiram assim.

Da mesma forma, as redes sociais precisam fazer mais. Para Carvalho, “é de extrema importância que sejam regulamentadas, e indivíduos e empresas que permitem que esses grupos se organizem e disseminem o ódio e desinformação sejam penalizados”.

Caímos no tema da regulamentação das redes sociais, que tanto debate vem provocando. Qualquer que seja seu desfecho, casos como esses escancaram o tamanho do estrago que essas plataformas causam por se portar apenas como inocentes “mensageiros”: ao não serem responsabilizadas pelo que seus usuários publicam, continuam oferecendo os caminhos para fake news e o ódio destilado.

Se a desinformação política já não fosse ruim o suficiente, a fluidez digital do discurso de ódio agora está literalmente matando crianças.

 

A Finlândia firmou-se como referência em educação midiática, após mudanças nas escolas em 2016 – Foto: Felicity Weary/Creative Commons

Precisamos de uma boa educação midiática para nossa sociedade não desaguar na barbárie

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Sempre que viajo, costumo analisar a mídia de onde vou. É cristalino que, quanto mais livre e profissional é a imprensa do lugar, mais bem informada é a população e consequentemente mais vibrante é a sociedade. Por essas e outras, governos autoritários combatem a imprensa, algo que vem sendo praticado no Brasil de maneira sistemática e crescente nos últimos anos.

Não se trata apenas de ataques a veículos de comunicação e a jornalistas, inaceitáveis em uma democracia. Como exemplo, na terça passada, a repórter Renata Cafardo e o fotógrafo Tiago Queiroz, do Estadão, foram agredidos física e verbalmente por moradores de um condomínio de luxo em São Sebastião, enquanto cobriam as tragédias causadas pelas chuvas. De onde vem tanto ódio gratuito?

O afastamento das pessoas de boas fontes de informação, substituindo-as por questionáveis redes sociais, coloca a própria democracia em risco à medida que derrete a capacidade do cidadão de discernir entre a verdade e a mentira, entre o bem e o mal. O resultado desse processo em nosso país é a grotesca polarização que nos rachou ao meio, culminando nos abomináveis ataques à democracia de 8 de janeiro.

A reversão do caos em que vivemos passa pela educação midiática, um conjunto de práticas que ensina crianças e adolescentes a desenvolver uma visão crítica sobre o que a mídia –em todos seus formatos– lhes apresenta, para que sejam capazes de consumir, compreender e até produzir informação de qualidade.


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“É mais que preparar para o uso da mídia: é preparar para compreender esse mundo em que a gente vive”, explica Ana Lúcia de Souza Lopes, professora de Pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “E todo esse universo midiático faz parte dele.”

Um ótimo exemplo dos ganhos da educação midiática para uma sociedade vem da Finlândia. Quando a vizinha Rússia tomou da Ucrânia a região da Crimeia em 2014, os finlandeses começaram a ser bombardeados com altas cargas de desinformação, para influenciar o debate política em favor dos russos.

O governo então reformou seu sistema educacional em 2016, para incluir uma disciplina de alfabetização midiática, que também é abordada de maneira transversal em todas as matérias. Como resultado, a Finlândia tornou-se o país mais resistente à desinformação entre as nações da Europa pelo estudo anual do instituto Open Society, firmando-se como uma referência mundial no combate às fake news.

Se me permitem um abuso de linguagem, uma “boa desinformação” é aquela que parece ser verdadeira e que reforça desejos de quem a lê. É por isso que se espalha rapidamente e ganha ares de fato incontestável. E quanto menos a pessoa tiver uma visão crítica das informações, mais suscetível será a esse controle.

Se já não bastasse esse desafio, especialistas temem que as recém-popularizadas inteligências artificiais generativas, como o ChatGPT, sejam usadas para criar fake news ainda mais críveis. Fiz alguns testes com essa ferramenta e –justiça seja feita– na maioria das vezes, ela respondeu que não poderia entregar o que eu pedia porque era falso. Mas nas ocasiões em que fiz pedidos que já continham várias mentiras, ela pariu obras-primas da desinformação.

Ter uma visão crítica da mídia e do mundo torna-se uma questão de sobrevivência!

 

Mudança de época

Em junho de 2014, em entrevista ao jornal italiano “Il Messaggero”, foi perguntado ao papa Francisco se o aumento da corrupção se deveria à mídia dar mais destaque ao tema. O pontífice explicou que “vivemos não só uma época de mudanças, mas uma mudança de época”. Para ele, isso altera profundamente aspectos culturais.

A digitalização da vida está no centro desse processo. Os mais jovens têm grande acesso a conteúdo, normalmente sem a necessária visão crítica. E assim como podem influenciar positivamente suas famílias com o que aprendem na escola, como respeito ao meio ambiente e diversidade, também podem ser vetores de fake news.

“A criança não só consome a desinformação: ela é uma propagadora”, explica Maria Carolina Cristianini, editora-chefe do “Joca”, um jornal brasileiro dedicado a crianças e adolescentes. Por isso, segundo ela, os pequenos leitores precisam entender a sua responsabilidade sobre o que leem e o que reproduzem em seus círculos sociais.

“Participar de um meio de comunicação é uma das maneiras de dar a dimensão real da importância da imprensa, da conscientização sobre a desinformação, e que informação de qualidade não é uma expressão vaga”, conta Mônica Gouvêa, diretora educacional da Editora Magia de Ler.

Crianças são naturalmente curiosas e participativas, por isso a educação midiática ganha ainda mais importância. “É nessa geração que a gente tem que trazer essa mudança de época, para mudar a sociedade”, explica Lopes. “Senão, cada vez mais, estaremos com uma sociedade alienada”, conclui.

A escola é o melhor lugar para isso, pela visão diversa de mundo que embute. No Brasil, a educação midiática ainda engatinha, com iniciativas pontuais de algumas escolas e redes de ensino. Ainda assim, alguns pais e mães se colocam contra essas práticas, argumentando que a escola estaria doutrinando ideologicamente seus filhos.

Cristianini argumenta que essa reação é inócua, pois é impossível manter a criança em uma “bolha de pensamento único”. É melhor que ela esteja preparada para lidar com pensamentos divergentes, que a impactarão mais cedo ou mais tarde. Além disso, ela explica que as famílias podem usar até conteúdos de que discordem para explicar aos filhos suas visões de mundo. “As notícias podem ajudar nisso, podem ser a base para essa conversa”, acrescenta.

“Alguns pais acham que tem o momento certo para você saber de algumas coisas, mas não existe isso”, explica Gouvêa. Os jovens consomem conteúdo o tempo todo, e sempre é uma oportunidade de se desenvolver seu senso crítico.

Aqueles que lucram com a desinformação atuam maquiavelicamente na contramão disso. Ao invés de dizer o que as pessoas devem fazer, oferecem um mecanismo para que essas pessoas se enredem em uma narrativa profunda que distorce a realidade, acreditando que elas chegaram a essas conclusões, e que não estão sozinhos.

A Finlândia é um exemplo a ser seguido. Governo, escolas, educadores e famílias precisam se unir para a disseminação da educação midiática, para formar gerações saudavelmente críticas e menos suscetíveis à desinformação. Elas construirão uma sociedade melhor e ajudarão as gerações anteriores a fazer o mesmo.

Caso contrário, corremos o risco de ver a democracia se esfacelando, com os ataques de 8 de janeiro parecendo manifestações legítimas.

 

ChatGPT não ameaça educação, mas nos desafia a repensar como aprendemos e ensinamos

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Educadores estão em polvorosa, diante de uma nova plataforma de inteligência artificial. Apesar de ter sido liberada há apenas dois meses, o ChatGPT vem provocando discussões éticas, tecnológicas e profissionais sobre se o digital poderá substituir seres humanos em tarefas intelectuais em que ainda nos sentíamos “seguros”. Nas escolas, esse temor chegou quando estudantes começaram a apresentar trabalhos que haviam sido escritos pela máquina.

Diante da qualidade dos argumentos e da fluência da escrita naquelas tarefas, professores passaram a se perguntar se perderiam a capacidade de identificar “plágios” de seus alunos. Outros, mais fatalistas, já se questionam se a própria profissão poderia desaparecer, sendo substituídos pelas máquinas.

Essas perguntas estão erradas! E a escola, mais que ensinar boas respostas aos alunos, deve ensiná-los a fazer as perguntas certas na vida.

Entendo que professores estejam preocupados. Esse desafio não pode ser ignorado, mas ele não pode servir como motivo para bloquearem a entrada da inteligência artificial nas aulas. Isso, sim, seria uma ameaça à manutenção de seu ofício.


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O ChatGPT é uma plataforma criada pela empresa OpenAI capaz de escrever textos complexos a partir de comandos em linguagem natural. Ele simula uma conversa com uma pessoa, permitindo o encadeamento entre respostas e perguntas. Funciona em vários idiomas, inclusive no português, e suas produções vêm surpreendendo especialistas e o público, pela qualidade.

Os mais entusiasmados dizem que poderia até ameaçar a supremacia do Google como ferramenta de busca. Tanto que, no dia 23, a Microsoft fez um investimento bilionário na empresa (o mercado estima em algo como US$ 10 bilhões), para incluir essas funcionalidades em seus produtos, como o Office e o Bing.

“A tecnologia, desde a invenção de Gutenberg, entra cada vez mais no âmago do humano”, explica Lucia Santaella, professora-titular da PUC-SP. “Com a inteligência artificial, ela penetra nas questões que a gente considera o mais nobre do humano, que é a sua capacidade de pensar e de falar.”

De fato, essa interação como conversa é decisiva para seu sucesso. “Ele é baseado em perguntas, e é da natureza do humano a investigação, a pergunta, a exploração e a conversa”, afirma Ana Paula Gaspar, especialista em tecnologia e educação.

Para muitos, o ChatGPT pode vencer o “teste de Turing”, método criado há 70 anos para descobrir se uma máquina é inteligente. Ele prevê que uma pessoa tenha uma longa conversa por texto e, ao final, não consiga distinguir se falou com outra pessoa ou um robô.

“É uma visão totalmente equivocada achar que a tecnologia é uma mera ferramenta”, sugere Santaella. “Ela é linguagem!”

 

Ferramenta pedagógica

Tanto que o caminho para resolver os temores escolares já citados passa pelos professores se apropriarem da inteligência artificial, ao invés de tentar bloqueá-la.

“Toda tecnologia, quando aparece, muda comportamentos”, afirma Diogo Cortiz, professor da PUC e especialista em IA. “Isso causa medo, espanto, porque a gente não sabe muito bem o que vai acontecer.”

“A grande questão é de educação do humano para utilizar bem esse recurso”, propõe Ana Lúcia de Souza Lopes, professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “E o que a escola faz? A escola se retira!”

Os entrevistados são unânimes ao afirmar que tentar impedir que os alunos usem a ferramenta é inócuo, pois encontrarão maneiras de burlar as restrições. Mas manter os processos atuais de aprendizagem e de avaliação é igualmente inadequado.

A tecnologia deve ser usada como aliada para alunos ganharem recursos para entender o porquê do que aprendem, abandonando o infame “decoreba”. “A partir do momento em que tem um desafio que o algoritmo vence, eu preciso liberar o estudante cognitivamente para tarefas mais complexas”, explica Gaspar.

Como exemplo, pode ser usada para uma produção colaborativa dos alunos, em que avaliem a qualidade e a precisão do que o robô gerou. Ela também pode ser usada como apoio para debates e até estudo de idiomas. “Devemos colocar os estudantes para usar essa ferramenta, mas sempre com um olhar muito crítico”, indica Cortiz.

A inteligência artificial faz parte do nosso cotidiano de maneiras que nem suspeitamos, como viabilizando, de maneira transparente, alguns dos recursos mais incríveis de nossos celulares. E ela cresce de maneira exponencial: o ChatGPT deu apenas mais visibilidade ao tema. Ainda assim, essas transformações têm acontecido sem debates com a sociedade sobre suas consequências.

As escolas –as universidades especialmente– têm um papel importantíssimo nesse processo. São elas que realizam as pesquisas sobre seus impactos sem um viés econômico. As empresas criadoras desses recursos deveriam, por sua vez, fazer o mesmo, mas nem sempre isso acontece, preferindo promover inconsequentemente seus lançamentos que podem lhes render bilhões em lucros. “A gente tem que entender qual é a responsabilidade que a gente tem quando a gente põe um conhecimento no mundo”, alerta Lopes.

É nas escolas também onde crianças e adultos precisam entender a se apropriar desses recursos para aprender mais e melhor. Um uso da inteligência artificial que respeite isso favorecerá nossa própria inteligência humana. Como explica Santaella, “a inteligência é metabólica, então ela cresce através do aprendizado.”

Por tudo isso, plataformas como o ChatGPT não podem ser temidas nas escolas. Pelo contrário, precisam ser abraçadas pelos educadores, para prepararem seus alunos para um mundo já inundado pelo digital. Precisamos reaprender a aprender diante de tantas e incríveis possibilidades. E quem melhor que os próprios professores para nos ensinar a fazer isso?

 

“Matemática ruim” e baixa identificação de jovens com TI fazem Brasil importar tecnologia

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Na semana passada, publiquei nesse espaço uma reportagem que indicava como o setor de TI no país “rouba” profissionais de outras áreas para suprir um déficit de formação universitária que pode passar de meio milhão de trabalhadores até 2025. Mas, se a procura é tão grande e essa área paga tão bem, é natural perguntar por que então não temos mais pessoas procurando por essas graduações.

Apesar de a pergunta ser simples, a resposta é complexa. A procura existe, os cursos estão cheios, entretanto poderia ser mais. Isso começa por um interesse relativamente baixo pelo aprendizado de Matemática, passa por questões culturais e familiares, choca-se com barreiras para grupos sociais nessas profissões e desemboca em um Ensino Médio Técnico que poderia suprir muitas dessas necessidades do mercado.

É uma combinação que demonstra como o problema é sistêmico, prejudicando profissionais, empresas e a própria sociedade. Os primeiros perdem oportunidades, as segundas pagam caro por trabalhadores e a última enfrenta o fato de que importa tecnologia ao invés de produzi-la nacionalmente, aproveitando a criatividade brasileira.

Da mesma forma que todos sofrem com o problema, a responsabilidade para sua solução precisa envolver a sociedade como um todo.


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“A escolha da profissão tem a ver, entre outras coisas, com o status social”, explica Ana Paula Gaspar, especialista em tecnologia e educação. “Falta uma dimensão subjetiva e humana na análise desses fenômenos sociais, porque as pessoas não escolhem apenas por conta de quanto vão ganhar.”

Segundo ela, não se pode esperar que jovens se decidam por uma graduação de Engenharia se eles não tiverem acesso a produtos com boa engenharia. “Então é muito natural que uma criança deseje mais ser youtuber que astronauta, porque tem a ver com o que ela consome”, explica. “E há esses dados escabrosos que mostram que muitos ainda têm dificuldade de estar no mercado de trabalho por conta de preconceito de classe ou de raça”, acrescenta.

“É um pressuposto equivocado da cultura brasileira de que o profissional, para trabalhar, precisa sair do ensino universitário”, afirma Marcelo Krokosc, diretor do Colégio FECAP, em São Paulo. Segundo ele, países da América do Norte e da Europa têm um Ensino Técnico muito valorizado, que supre parte da demanda por profissionais. “O aluno que faz o Ensino Técnico sai preparado para o mercado de trabalho com 17 anos, porque já veio aprendendo aquilo que tem interesse”.

Alunos de cursos técnicos de TI levam vantagem se prosseguem na área no Ensino Superior. David de Oliveira Lemes, diretor da Faculdade de Estudos Interdisciplinares da PUC-SP, explica que muitos deles chegam com uma maturidade em Matemática e aspectos técnicos que os demais estudantes não costumam ter. “Já passaram por alguns percalços, já ‘sofreram’ com programação, com Matemática, com Lógica”.

O aprendizado deficiente em Matemática acaba atrapalhando na escolha e no desenvolvimento nessas carreiras. “A educação matemática no Brasil é muito pobre: entre alunos que saem do Ensino Médio, apenas 5% têm a proficiência necessária para essa etapa”, explica Gaspar.

“Nos anos iniciais, a escola deve manter o interesse pela Matemática da mesma forma como mantém pela alfabetização”, afirma Krokosc. Ele conclui que “as famílias devem vibrar quando o filho lê uma palavra, mas também quando faz uma conta”.

Gaspar explica que essa baixa qualidade matemática no país se deve a como ela chegou por aqui, por uma influência francesa de uma “matemática pura”, sem ser aplicada e com a “matemática do dia a dia” desvalorizada. “Se a matemática que chega na escola está muito distante da realidade dos alunos, é um problema”, conclui.

 

Novos caminhos

Lemes acredita que a nova BNCC –a Base Nacional Comum Curricular, o conjunto de regras que determina como escolas devem organizar seus currículos e propostas pedagógicas– pode melhorar o ensino da disciplina. Ele explica que, “com ela, os professores precisam aplicar a Matemática em situações dentro e fora da escola, não só naquele contexto da Matemática pura”.

Isso não pode ser encarado apenas como um problema escolar. Esses desafios afetam a sociedade em geral e todos precisam se unir para sua solução.

“A responsabilidade do governo é a formulação de políticas públicas, e a das instituições de ensino é a oferta, quantidade e qualidade de vagas”, explica Gaspar. Ela afirma que “o mercado ‘lava as mãos’ para a formação, porque acha que seu papel é dar emprego, fazer negócios e gerar renda”.

Mas essa é uma visão míope e ultrapassada, especialmente em uma área tão dinâmica quanto TI, em que o conhecimento envelhece muito rapidamente. Por isso, as empresas devem cuidar da formação contínua de seus profissionais.

Gaspar sugere que um profissional só poderia ser considerado sênior e fosse capaz de formar outras pessoas, mas isso hoje não é feito. “Daí fica todo mundo roubando sênior de todo mundo, ao invés de formar júnior”. E conclui: “se as pessoas não forem parte do resultado das empresas, a gente nunca vai sair desse buraco.”

Não há outro caminho viável: qualquer que seja a sua profissão, se você quiser continuar relevante no mercado, precisará continuar estudando até o último dia. Por outro lado, precisamos ajudar crianças e jovens a desenvolver as competências necessárias, tanto em linguagem, quanto em Matemática. Além disso, precisamos dar a eles exemplos e modelos para que façam escolhas profissionais conscientes.

Se apresentada do jeito certo, a Matemática pode ficar até mais divertida. “É muito interessante ver um aluno com o cubo mágico na mão ao invés do celular”, sugere Krokosc. Precisamos dela para uma leitura crítica do mundo e uma vida melhor.

“Fala-se que vai faltar muito programador, mas para qualquer profissão hoje, para ser cidadão no mundo, é preciso ter fluência em competências digitais”, afirma Gaspar. E não adianta que apenas um pequeno grupo social atinja isso, ou a sociedade não se desenvolverá plenamente, nem diminuiremos nossa dependência tecnológica de fora. Como diz Lemes, “a gente tem que ser o produtor de conhecimento!”

 

Na Semana da Criança, perderam os professores e ganharam as armas

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Na quarta passada, Dia da Criança, fiquei abismado quando a prefeitura de Uberaba (MG) montou com a polícia e com o exército, em um evento dedicado aos pequenos, um estande para lhes explicar como funcionam diferentes tipos de armas e bombas. As crianças até mesmo tocavam nos equipamentos.

Já no sábado, Dia do Professor, o Instituto Semesp fez um alerta de que essa profissão, historicamente tão maltratada em nosso país, passa por um momento dramático, com grave insuficiência de profissionais. A carreira há muito deixou de ser atraente pelos baixos salários, por condições deploráveis de trabalho e, de uns anos para cá, por uma abominável perseguição dos professores pelo governo, por pais e até por alunos.

Crianças são fortemente influenciadas pelos adultos, especialmente “autoridades”, como os pais, os professores e até a polícia. Se crescerem vendo que o contato com armas no cotidiano é corriqueiro, aceitarão uma sociedade mais violenta, onde desavenças podem ser resolvidas pela força.

Por outro lado, assistimos a pessoas desqualificadas e sem vocação assumindo o fundamental papel do professor, no espaço deixado por aqueles que seriam bons mestres, mas que foram afugentadas por um ambiente hostil e sem perspectivas. Um bom docente não ensina apenas a parte acadêmica: ele forma melhores cidadãos, mais humanos, empáticos, tolerantes, colaborativos e resilientes.

Diante disso, essa semana nos convida a refletir sobre quais são os exemplos que realmente interessam às crianças, para que cresçam de uma maneira saudável. E, em muitos casos, o que elas precisam difere daquilo que alguns adultos defendem, inflamados por temas do momento ou por uma visão limitada do mundo.


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Segundo a prefeitura de Uberaba, o objetivo do estande da polícia e do exército era “afastar o medo culturalmente imposto nas crianças sobre as forças de segurança”. Achei a justificativa estranha: por que a população teria medo de quem a deveria proteger? Mas infelizmente isso acontece, especialmente entre os mais pobres.

A iniciativa contraria o que educadores defendem há anos. Eles tentam até mesmo tirar armas de brinquedo das mãos das crianças, para construir uma sociedade menos violenta.

E, por falar em educadores, o alerta do Instituto Semesp se baseia em estudo divulgado na última semana de setembro, que indica que o Brasil enfrentará um déficit de 235 mil professores em 2040. Vale notar que, entre 2010 e 2020, os ingressantes nos cursos de Licenciatura aumentaram 61%, mas os formandos cresceram só 4%, indicando uma enorme desistência da carreira antes de se formar.

Outro ponto importante demonstra que a imensa maioria desses estudantes estão em cursos a distância (EAD), o que é temerário, pois professores que terão que lidar com crianças em salas de aula estão sendo formados fora de uma sala de aula. Além disso, boa parte dos formandos já atuam como professores, o que indica uma baixa qualificação de muitos docentes atuais.

Com isso, o Brasil corre sério risco de ficar sem professores, à medida que os existentes abandonam a sala de aula ou se aposentam, sem que haja reposição suficiente. Isso já está acontecendo: a rede estadual de São Paulo não conseguiu preencher todas as vagas de professores temporários para o Novo Ensino Médio.

Isso implicará em salas mais lotadas e professores ainda mais sobrecarregados, com evidente piora na qualidade do ensino.

 

Todos perdem

Não é possível conceber um futuro para o país sem mais e melhores professores, e que eles tenham liberdade para exercer sua carreira em paz e com apoio. Tal liberdade pode chocar alguns pais, pois os professores trazem visões diversas do mundo, o que não tem sido bem aceito por algumas famílias, um sinal de nossos tempos que está na raiz da perseguição sofrida pelos docentes.

Mas as crianças precisam dessa oxigenação nas ideias, e os professores são perfeitos para isso, pois conseguem ver seus alunos de uma maneira diferente e menos idealizada que seus pais. Dessa maneira, as crianças se desenvolvem melhor, com uma visão menos enviesada da vida.

Quando eu tinha 17 anos, entrei na Escola Politécnica da USP, no curso de Engenharia Elétrica. Era o que curso e a escola que eu havia escolhido, enchendo meus pais de orgulho. Mas sentia que algo me faltava.

Lembrei da minha professora de Língua Portuguesa do Ensino Médio, que dizia que eu não deveria ir para a engenharia, e sim para algo na área de Humanas. Então, quando eu estava no segundo ano na Poli, conversando com ela, incentivou-me a tentar uma vaga de trainee na Folha de S.Paulo, apesar de não ter nada que sugerisse que conseguiria. Mas o fato é que deu certo, e aquilo mudou minha vida profundamente!

Se tivesse continuado na engenharia, possivelmente teria progredido bem na carreira. Mas a mudança para o jornalismo foi um dos meus maiores acertos! Em um primeiro momento, aquilo desagradou meus pais, mas sou feliz e grato à minha professora por ter percebido minha vocação e me incentivado a persegui-la.

Coincidentemente na semana passada, assisti ao episódio “O flautista”, da série coreana “Uma advogada extraordinária”, da Netflix. Ele aborda o caso de um jovem que “sequestra” um grupo de crianças da escola de sua mãe para levá-las a brincar durante uma tarde, devolvendo-as felizes e saudáveis no fim do período.

O jovem apenas brincou com elas, sem nenhuma intenção obscura. Para ele, as crianças precisam brincar, ser saudáveis e felizes. Sua ação se deve a uma revolta com o estilo educacional da escola da mãe, em que as crianças precisam estudar diariamente por 12 horas, mal têm tempo para comer e podem ir ao banheiro apenas uma vez por dia. Ainda assim, acabou preso. Afinal, as atividades recreativas foram dadas sem a autorização dos pais, quando seus filhos deveriam estar estudando.

Claro que essa foi uma atitude extrema, ainda que bem-intencionada. Mas serve para a reflexão: afinal, do que as crianças precisam para se desenvolver? Estudar 12 horas por dia? Aprender como funcionam armamentos pesados?

Há o momento de estudar e o de brincar! Sem isso, seu desenvolvimento ficará prejudicado. O brincar é um treino para a vida adulta, por isso educadores defendem que as armas fiquem de fora.

Pais devem se aliar a professores, apoiando esses profissionais, para reforçar o respeito de seus filhos aos mestres. Isso não quer dizer que precisem concordar em tudo! Mas, no caso de divergências ideológicas, culturais ou acadêmicas com algo dito em sala de aula, os pais não devem simplesmente tentar cesurar ou ameaçar os professores. Pelo contrário, devem conversar com eles, entender seu ponto de vista e tentar encontrar um consenso. Além disso, os pais sempre podem apresentar seu ponto de vista aos filhos em casa.

Essa é uma maneira madura e positiva de colaboração entre pais e professores. E assim essas crianças crescerão com uma visão mais real e ampla do que é o mundo.

Crianças precisam ser crianças, e a educação deve sempre permitir isso.

 

Escolas e mídia precisam se unir na busca pela verdade

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A menos de três semanas do primeiro turno das eleições, as pesquisas indicam que a imensa maioria dos eleitores já escolheu em quem votará para presidente. Isso explica por que, a despeito dos esforços dos candidatos, os índices de intenção de voto se mantêm relativamente estáveis semana após semana. Mas vale questionar o quanto de tanta convicção vem de informações confiáveis e análises conscientes, e o que se deve ao processo de desinformação ou simplesmente da raiva de um ou outro nome.

O questionamento é pertinente, pois se observa que os candidatos que lideram todas as pesquisas se dedicam mais a atacar um ao outro, inflamando a polarização social. Enquanto isso, aqueles preocupados em apresentar ideias mais consistentes para os problemas do país não decolam na preferência dos eleitores.

Esse não é um fenômeno recente, mas se tornou determinante nesse pleito. Isso se explica pelo ápice (pelo menos até o momento) da influência das redes sociais em nossas decisões e pela histórica baixa educação midiática do brasileiro.

A solução do problema é tão mais eficiente quanto mais cedo começar. A escola e a mídia são os principais responsáveis por reverter esse quadro. Não é de se estranhar, portanto, que esses políticos combatam ostensivamente esse trabalho de professores e de jornalistas, desacreditando-os e até os agredindo.


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O recém-divulgado “Estudo global sobre alfabetização da informação” indicou que 55% dos entrevistados dizem que já compartilharam informações falsas porque achavam ser verdadeiras, sendo que um terço fez isso impulsivamente. Ainda assim, muitos disseram que “estavam ocupados demais” para verificar se o que passavam adiante era verdade.

A pesquisa foi realizada pelo Instituto Poynter para Estudos da Mídia, o projeto MediaWise e a consultoria YouGov, com apoio do Google. Foram ouvidas 8.585 pessoas na Alemanha, Brasil, Estados Unidos, Índia, Japão, Nigéria e Reino Unido.

O levantamento indica ainda que 62% dos entrevistados dizem ser impactados por informações falsas online toda semana, mas a maioria, especialmente os mais velhos, relutam em corrigir pessoas que publicam informações falsas.

Outro estudo, publicado no ano passado por pesquisadores da Universidade de Stanford (EUA) a partir de entrevistas com estudantes do ensino médio americano, indicou que eles têm enorme dificuldade em identificar notícias falsas, sendo facilmente enganados por dados mentirosos ou maquiados. Em um exemplo gritante, 97% deles acreditaram em um site que alegava trazer fatos sobre estudos do clima. Na verdade, ele defendia a indústria de combustíveis fósseis, que o patrocinava.

Os autores do estudo afirmam ser crítico que a educação midiática seja incluída nas escolas, e que os estudantes aprendam como jornalistas e agências de verificação trabalham. Segundo eles, isso deve integrar, de maneira transversal, todas as disciplinas, “de História a Matemática”.

Felizmente, há esperança, mesmo em uma sociedade fortemente polarizada e vítima da desinformação, como a brasileira. No sábado, o Datafolha divulgou pesquisa que aponta que mais brasileiros buscam informações jornalísticas para decidir em quem votar. Foram avaliados o impacto das notícias na TV, nas redes sociais e no rádio.

O índice dos que consideram as notícias muito importantes para o voto para presidente cresceu em todas elas, frente ao que se observava na eleição anterior, em 2018. No caso da TV, isso subiu de 43% para 48% dos entrevistados, indo de 38% para 44% de notícias nas redes sociais, e de 39% para 42% no rádio.

 

Desde pequeno

Educadores afirmam que a educação midiática deve começar com as crianças, especialmente porque elas ficam online cada vez mais cedo. Assim como pessoas que começam a fumar muito jovens desenvolvem um vício mais resistente, a polarização pelas fake news é mais poderosa e nociva se começa já com adolescentes.

A escola é o melhor lugar para isso, até pela diversidade do ambiente. Educadores precisam usar os recursos do mundo digital na tarefa, ensinando os alunos a verificar diferentes fontes, a fazer pesquisas eficientes em buscadores, a usar as agências de checagem de fatos, a desconfiar do que lhes chega por redes sociais e comunicadores, e a entender que mesmo um conteúdo “viralizado” pode ser falso.

A mídia vem realizando campanhas de esclarecimento da população, mas ainda está distante de uma colaboração ativa com as escolas. Isso precisa mudar! Afinal devem desenvolver um senso crítico apurado, mas não apenas nos adultos.

A escola não pode ser apenas um lugar para se aprender as disciplinas tradicionais, como linguagem e matemática. Deve ser um espaço de desenvolvimento de cidadania, diversidade, inclusão e tolerância. Por isso, erra quem diz que não devam debater política de maneira construtiva com seus alunos.

Os estudantes devem ser auxiliados a entender não apenas como funcionam as instituições democráticas, mas também como a política influencia nossas vidas de maneira determinante, e o papel ativo de cada um de nós no processo democrático.  Isso não tem nada a ver com partidarização da escola, e sim de consciência cívica, para que as crianças cresçam com menos chance de ser tornarem adultos manipuláveis pelos diferentes grupos de poder.

Nesse esforço essencial para a democracia, educadores e jornalistas precisam cuidar apenas para inadvertidamente não criar um efeito indesejado de as pessoas ficarem tão críticas a ponto de achar que todas as fontes de informação são igualmente suspeitas. Risco maior seria desenvolver um tipo de niilismo sugerindo que todas teriam algum tipo de motivo oculto para querer manipular a população. Esse, aliás, é uma tese difundida por aqueles que se beneficiam da desinformação.

Quando eu era adolescente, tive a felicidade de contar com essa orientação de meus professores, que contrapunham ideias progressistas e conservadores, ajudando-me a elaborar uma compreensão ampla do mundo, que é necessariamente diverso. Educadores devem ser ajudados e orientados, nunca censurados ou constrangidos.

Também tive a felicidade de ter uma robusta educação midiática desde pequeno, aprendendo o papel essencial do jornalismo na manutenção da democracia. E assim aprendi a “separar o joio do trigo” desde cedo.

Temos que parar de acreditar que “política, religião e futebol não se põem à mesa”. Isso só serve para criar cidadãos mais “dóceis”, que não se envolvem com temas delicados, aqueles que convidam a pensar e a melhorar a sociedade. Com isso, tornam-se mais suscetíveis a comandos de líderes em quem acreditam.

Em um mundo em que a desinformação conseguiu levar a sociedade à beira de um precipício fatal, aqueles que trabalham com a verdade, com a ciência, com a cidadania e com o bem comum precisam se unir para ajudar jovens e adultos e escapar do sedutor mecanismo da desinformação. A democracia não pode continuar sendo usada para destruir a própria democracia.

 

Guarda da série “Round 6”, que se tornou a mais vista na Netflix, cujos jogos violentos estão sendo simulados em escolas

O que pode haver de mortal em brincadeiras infantis

By | Educação | No Comments

Na semana passada, “Round 6” se tornou a série mais vista da história da Netflix. Mais de 111 milhões de pessoas assistiram à produção sul-coreana nas primeiras quatro semanas no ar. Ela retrata uma macabra competição entre 456 endividados, que se dispõem a participar de versões de seis jogos infantis. O vencedor leva um prêmio equivalente a R$ 213 milhões. Todos os demais morrem ao longo dos jogos.

Mas algo sinistro se formou em torno da série, indicada para maiores de 16 anos. Crianças de vários países, inclusive do Brasil, estão simulando a competição nas escolas. No caso, os perdedores são surrados pelos vencedores.

Esse comportamento não chega a ser surpreendente, e é um reflexo do mundo em que vivemos. E, ao contrário do que alguns estão se apressando a dizer, a culpa não é da Netflix, nem dos produtores da série. Mas temos que entender o problema para resolvê-lo.


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Originalmente escrito em 2008, “Round 6” se tornou um fenômeno de mídia. Além da enorme audiência na plataforma de streaming, seus atores, até então desconhecidos fora da Coreia do Sul, ganham milhões de seguidores nas redes sociais.

Também é um fenômeno comercial. Os tênis brancos Slip-On, da marca Vans, usados pelos jogadores, viram suas vendas aumentarem em incríveis 7.800%. Além disso, o uniforme dos guardas da série se tornou a fantasia mais buscada. Isso lembra o que aconteceu com o macacão vermelho e a máscara de Salvador Dali usados pelos assaltantes de “La Casa de Papel”, outra série da Netflix, há quatro anos.

Diante desse frenesi, seria, portanto, inocência assumir que crianças e adolescentes não assistiriam à série apenas pela sua classificação etária. Muitos fazem isso até junto com seus pais, o que, dentro das circunstâncias, pode até uma alternativa menos pior, se bem aproveitado esse convívio em torno da história.

Todos nós nascemos com capacidades para discernir o certo do errado e o verdadeiro da fantasia. Mas essa habilidade só amadurece ao longo dos anos, precisa ser “treinada” com estímulos, com exemplos e com explicações de pessoas e de instituições que os pequenos têm como referência, como seus pais e a escola.

“Round 6” (que no resto do mundo é chamado de “Squid Game”, ou “Jogo da Lula”) obviamente é uma fantasia perturbadora. Traz uma feroz crítica social sobre a diferença entre as classes sociais e a dependência que as pessoas desenvolvem do dinheiro, até o ponto de algumas morrerem por ele em situações extremas.

Fica a pergunta: isso poderia acontecer de verdade em algum lugar do mundo?

 

Violência relativizada e normalizada

Às vezes, tenho a impressão de que o mundo ando louco demais.

Acho pouco provável que alguém se dispusesse a criar uma “brincadeira” tão distópica, em que pessoas morressem para sua diversão. Se bem que já tivemos algo assim em vários lugares do mundo ao longo da história, como nas arenas romanas.

Por outro lado, não me espantaria se, caso isso se concretizasse, um bando de malucos topasse arriscar a própria vida pela adrenalina e pelo dinheiro. Como sempre abordo nesse espaço, a dinâmica das redes sociais vem criando uma geração de pessoas “viciadas” em dopamina e com uma percepção fugaz da própria realidade, sempre a busca de novos estímulos.

Se isso impacta decisivamente até os adultos, adolescente e crianças se tornam presas fáceis desse ambiente. Seu senso crítico ainda não está desenvolvido para digerir tantos estímulos. Eles não têm as experiências de vida para colocar tudo na sua devida perspectiva.

No caso de “Round 6”, a profundidade da crítica social desaparece, permanecendo apenas o jogo puro. E a própria violência, que culmina na morte de pessoas, fica relativizada e perde força. Corre-se o risco de achar que tudo aquilo é normal.

O criador de “Round 6”, Hwang Dong-hyuk, disse que estava perplexo que crianças estivessem assistindo à série. Em entrevista a uma emissora sul-coreana, ele disse que espera que os pais e os professores ao redor do mundo sejam prudentes, para que os pequenos não sejam expostos a esse tipo de conteúdo.

 

Como proteger as crianças

“Round 6” é a bola da vez, mas, nos últimos anos, as crianças vêm sendo impactadas por diferentes conteúdos que levam muitas delas a dor, violência e até morte.

Em 2017, a “Baleia Azul” teve grande repercussão. Consistia de 50 tarefas que adolescentes recebiam de “curadores”, envolvendo automutilação e culminando no suicídio. Até hoje, há controvérsias sobre sua origem. Aparentemente, no início, não passava de um boato. Entretanto, diante da exposição que teve, acabou se “concretizando”, e várias mortes estariam associadas à Baleia Azul.

Dois anos depois, surgiu a Momo, uma boneca fantasmagórica que estaria invadindo o YouTube Kids para convencer crianças a fazer coisas como se cortar e até mesmo matar os próprios pais. Não passava de uma combinação de “fake news” com “efeito manada”, mas o movimento criado levou algumas crianças a realmente se automutilar.

Não podemos deixar de mencionar a suposta influência maligna dos games. Ela ressurge em casos de adolescentes que matam colegas, como aconteceu em 2019 na escola estadual Professor Raul Brasil, na cidade de Suzano, na Grande São Paulo. Mas estudos sérios demonstram que esses jogos não incentivam assassinatos reais. Pelo contrário, profissionais de psicologia explicam que esse tipo de criminoso é movido por outros problemas, muito mais profundos, que ele já carrega dentro de si.

Muitos propõem que “Round 6” seja sumariamente retirada do ar. Isso é algo totalmente inócuo: o buraco é muito mais embaixo!

Especialistas da área de saúde mental e de educação afirmam que a solução desses problemas passa por pais mais presentes na vida de seus filhos, para lhes oferecer carinho e orientação diante de tantos estímulos. Além disso, devem se unir a professores para ajudar a escola na tarefa de educar crianças e adolescentes.

Proibir o acesso raramente é eficiente. As crianças sempre darão um jeito, especialmente aquelas que têm acesso a smartphones e computadores. Mesmo que não vejam a série na Netflix, algumas cenas aparecem fora do contexto, no YouTube e até no TikTok. Além do mais, tudo que proibido desperta ainda mais o interesse.

Pais e educadores devem abordar esses temas com sinceridade e paciência, para explicar às crianças o que tudo aquilo significa e por que não devem fazer algumas coisas. Crianças, mesmo as pequenas, têm uma capacidade de compreensão que pode surpreender os próprios pais, quando eles se dispõem a oferecer essa orientação.

Elas devem se sentir acolhidas pelos seus pais. E esses devem criar, desde pequenos, um canal sincero de confiança com seus filhos, para que se sintam à vontade para compartilhar suas dúvidas e seus medos. Mas é importante entender que a confiança é uma via de mão-dupla: os pais também devem oferecer confiança e ser confiáveis.

A educação midiática se torna cada vez mais crítica em nosso mundo. Pais e educadores têm um papel central nisso. E devem sempre pedir ajuda a profissionais, como psicólogos, quando necessário.

Mas nada substitui o carinho, a presença e a confiança entre pais e filhos.

 

A origem do negacionismo

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No mundo todo, a educação sofre há um ano com a Covid-19. No Brasil, com o avanço galopante da doença, governadores e prefeitos vêm adotando medidas mais severas para conter o vírus, incluindo fechar as escolas. O impacto na formação de crianças e jovens é inevitável. Mas a educação sofre muitíssimo no nosso país desde muito antes da pandemia. De certa forma, grande parte do caos que vivemos se explica pelo desprezo histórico que o Brasil tem pela educação.

Basta ver que esse debate atinge basicamente educadores e pais de alunos. O resto da população passa ao largo do tema. Mas o fechamento de bares causa comoção nacional!

É sabido que cidadãos bem educados fazem valer seus direitos e igualmente cumprem seus deveres. Não ficam esperando que o governo os “salve de suas próprias vidas”. É assim em sociedades desenvolvidas. Por outro lado, os menos educados criam uma zona de conforto em torno de um pacto pela mediocridade: “se você me der o mínimo que preciso, eu não incomodo você, e vou levando minha vidinha”.

Como não somos bem educados, diante de algo muito maior que nós (como uma pandemia), procuramos uma “solução mágica”. Como isso não existe, negamos os fatos. Afinal, o que os olhos não veem o coração não sente, certo?

Errado!


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A nossa má educação é, portanto, a principal causa desse negacionismo que jogou o Brasil nas mais profundas trevas, que, para nossa desgraça, foram ampliadas pela pandemia. Não dá nem para dizer que foi azar: plantamos isso.

Não é de se estranhar que o nível da educação no Brasil caia gradativamente desde o tempo da ditadura militar. Um povo mal educado é um povo mais dócil e facilmente manipulável. Mas, com isso, jogamos tudo no colo do Estado ou damos um jeito de responsabilizar o outro quando algo dá errado. Esperamos que o mundo nos sirva e nos salve, mas damos muito pouco em troca. Ao fazer isso, cada um de nós, individualmente, e o Brasil, como sociedade, afundamos ainda mais no lamaçal.

Para completar a tragédia, o caminho para sairmos disso, que é a busca pelo conhecimento e a ciência, é banalizado, desvalorizado, ridicularizado até por governantes e seus seguidores. Quem estuda, quem pesquisa e quem ensina no Brasil não tem valor.

Para compensar essa gravíssima falha, nós nos apoiamos, até para afagar nosso ego, na crença de que somos um povo criativo e “esperto”, que consegue “sair de qualquer buraco”. A verdade é que essa “esperteza” está muito mais para malandragem burra. Trabalhamos muitas horas, mais que outros povos, porque somos profissionais de baixa produtividade e baixa inventividade.

Dói dizer isso! Mas temos que encarar o problema de frente se quisermos corrigi-lo.

Somos ótimos seguidores de ordens, com pouca iniciativa. Fomos educados assim! Além disso, trabalhamos mal em equipe. Basta ver a enorme quantidade de chefes tóxicos e as “puxadas de tapete” na própria equipe que ainda temos em pleno ano de 2021.

Que fique claro: ao dizer tudo isso, não estou afirmando que somos um povo “sem jeito” ou condenado. Muito pelo contrário! Mas estamos indo por um caminho muito errado há décadas, sem nenhuma perspectiva de melhora. Basta ver o Ministério da Educação, que está em coma desde que Bolsonaro assumiu o poder.

 

Brasil X Coreia do Sul

Em novembro, pesquisadores da FGV (Fundação Getúlio Vargas) divulgaram um estudo apontando que, se o Brasil investisse, a cada ano, 1% a mais do seu Produto Interno Bruto em ensino básico, o padrão de vida médio da população aumentaria até 26% nos próximos 50 anos. Em 2050, a população brasileira poderia atingir o mesmo padrão de vida da portuguesa. Além disso, investir (bem) na educação 2% do que o país produz levaria a um aumento de quase 32% na produtividade do trabalhador.

Um dos reflexos do nosso terrível fracasso nisso é que, apesar do altíssimo desemprego por aqui, as empresas não conseguem preencher vagas que exigem qualificação profissional e competências específicas, por causa da baixa qualificação média do brasileiro.

É possível mudar esse quadro, mas isso exige trabalho sério e consistente, investimento e tempo. Podemos pegar, como exemplo, a evolução da Coreia do Sul.

Antes da Guerra da Coreia, que durou de 1950 a 1953, o país era um dos mais pobres do mundo, muito mais que o próprio Brasil da época. Após o conflito, o sul capitalista criou um plano de longo prazo de industrialização do país (a partir de tecnologia estrangeira) e de educação de alta qualidade para todos.

O resultado é que, depois de cerca de 30 anos, a Coreia do Sul passou da sua antiga situação miserável para ser um dos Tigres Asiáticos. Não por coincidência, na pandemia de Covid-19, o país ostenta um dos melhores resultados do mundo.

 

Para que estudamos?

A educação certamente tem uma função utilitária, crítica para o desenvolvimento de uma nação. Estudamos para aprender a fazer coisas e, dessa forma, melhorar de vida.

Mas não pode ser apenas isso! A educação também tem o papel de desenvolver em nós o amor pelo conhecimento, transcendendo seu aspecto prático. Apenas alguém que goste de aprender coisas novas impulsiona a sociedade para um estágio superior, pois tem uma mente flexível e aberta à inovação. Infelizmente, o Brasil investe pouco em ciência, e o que se investe vai quase tudo para a ciência aplicada, ficando quase nada para a ciência de base.

No início da minha carreira, eu sempre ouvia que mestrados e doutorados só serviam para quem queria “dar aula”, que era muito melhor fazer um MBA para subir na carreira. De tanto ouvir isso, acabei fazendo primeiro o MBA na FIA, que de fato foi incrível! Mas, quando fiz meu mestrado na PUC-SP alguns anos depois, minha mente se expandiu a um outro nível. Por isso, afirmo que todos deveriam ter a oportunidade de seguir esse caminho: não é “só para dar aula”, mas sim para criar cidadãos e profissionais melhores!

Precisamos plantar em nossas mentes, desde a mais tenra idade, o amor pelo aprendizado. Vejo com tristeza crianças e adolescentes reclamando “por que estudar isso, se nunca será usado”. Tudo que estudamos serve para entendermos melhor o mundo em que vivemos e nos ajudará, quando necessário, a nos posicionarmos melhor nele.

Apesar de ser um profissional da área de Humanidades, quando cursava ainda o Colégio Mackenzie, minha matéria preferida era Física. Isso porque eu tive a sorte de ter bons professores que não se resumiam apenas a “dar a matéria”, como alguns inimigos da educação exigem hoje. Um bom professor vai muito além e contextualiza o conhecimento na vida do aluno e na sociedade.

No mundo ideal, os alunos estudariam para aprender e não para tirar nota na prova, um instrumento de avaliação falho que perpetua essa distorção no objetivo do ensino. Nesse mundo, entenderiam que Língua Portuguesa e Matemática são ferramentas para fazer melhor qualquer coisa na vida e que todas as outras disciplinas, de Química a Filosofia, servem para se desenvolverem mentes livres e se tornarem cidadãos conscientes de seus direitos e deveres.

Todos nós –e não apenas os educadores– precisamos nos engajar pela melhora da educação. Precisamos ser parceiros das escolas e dos professores, resgatando seu valor e sua autonomia, e dando a eles condições para realizar um bom trabalho.

Sem isso, nunca seremos como a Coreia do Sul ou qualquer outra nação desenvolvida. Nossa sociedade permanecerá estagnada e continuaremos sendo indivíduos que produzem pouco e produzem mal. E agora, pelo nosso negacionismo, nem somos aceitos nos aeroportos do mundo.

É isso que queremos para nós e para nossos filhos?

Já dá para voltar às salas de aula?

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Já dá para voltar para a escola ou é melhor continuar estudando em casa?

Um dos setores que enfrenta mais dúvidas para retomar suas atividades diante da pandemia de Covid-19 é a educação. De um lado, há o alto risco de contaminação de estudantes e de professores, que podem levar a doença para dentro de suas casas. Do outro, os inegáveis prejuízos no aprendizado e até na formação dos alunos, especialmente entre os mais jovens. Há também a pressão de escolas particulares pela reabertura, temendo que ainda mais clientes cancelem suas matrículas.

Em paralelo, corre outra discussão: a tecnologia dá conta de suprir as demandas de aprendizagem, para que as aulas em casa sejam eficientes?


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No meio de toda essa indefinição, muitas cidades reabriram suas escolas públicas e privadas já há várias semanas, enquanto outras ainda resistem. É o caso da maior cidade do país, São Paulo, que autorizou a volta apenas de alunos do Ensino Superior no dia 7 de outubro. Os Ensinos Infantil, Fundamental e Médio voltam nesse dia apenas com atividades extracurriculares opcionais.

Aula mesmo, ainda não se sabe quando. No dia 3 de novembro, será apresentada uma nova posição do município, com base na evolução da pandemia.

E se não voltar?

A tecnologia desponta em um papel central para solucionar esse problema. Mas, como tudo nessa vida, há um jeito certo e um jeito errado de se usar esse recurso.

Algumas coisas precisam ser levadas em consideração, e muitas delas vêm antes da própria tecnologia. A primeira é que a dificuldade de um aluno se concentrar em uma aula online é tão maior, quanto mais jovem ele for.

O ensino à distância pode ser excelente, mas exige muita dedicação do estudante. Por isso, ele tende a funcionar muito bem para o Ensino Superior, e mal para os Ensinos Infantil e Fundamental. As crianças normalmente se dispersam das atividades na tela, o que tem exigido muito de pais e mães para acompanhá-los nas aulas. E, depois de sete meses de distanciamento social, muitos desistiram dessa tarefa.

Além disso, a maioria dos alunos, incluindo muito de escolas particulares, não tem a infraestrutura necessária para estudar em casa. Falta uma boa conexão de Internet, para começar. Ela precisa ter uma boa velocidade e não ser limitada. Mas a maioria dos domicílios brasileiros não tem isso, com a Internet restrita aos planos para smartphones, que são lentos e com uma franquia de dados que acaba rapidamente. Sem falar que muitos simplesmente não têm conexão alguma.

Algumas instituições estão dando chips de celular com plano de dados para estudantes de baixa renda, o que é uma iniciativa muito bem-vinda. Mas infelizmente isso é um privilégio para poucos.

Vale dizer também que a experiência de aprendizagem fica muito melhor em uma tela grande, como a de um tablet e principalmente a de um computador. Só que, segundo o relatório PNAD Contínua do IBGE, apenas 48,1% dos domicílios brasileiros com Internet tinham um computador em 2018. E essa porcentagem vem caindo: em 2017, eram 52,4%. O uso dos tablets também diminuiu: de 15,5% em 2017 para 13,4% em 2018. Já os smartphones crescem, passando de 98,7% dos domicílios em 2017 para 99,2% em 2018. Ou seja, praticamente todos os domicílios brasileiros com Internet têm celulares, sendo que, em 45,5% dos casos, é a única forma de conexão.

Mas calma: nem tudo são notícias ruins!

Quando e como a tecnologia ajuda

Apesar de todas essas dificuldades, coisas muito interessantes surgiram desse processo de transformação digital acelerado.

Sou especializado na criação de conteúdo digital e acompanho a evolução do mercado de educação à distância há 15 anos e de mídia digital desde seu dia zero, há 25 anos. Desde o início da pandemia, em março, ministrei cerca de 350 horas de aulas em salas digitais, e cerca de 30 horas de palestras também online. E os resultados têm sido muito bons!

Por que dá certo para alguns e errado para outros?

Temos que entender que o meio digital pode ser uma ferramenta incrível, mas ela nunca pode substituir os conceitos básicos de uma boa educação e nem o professor. Por exemplo, a aula que eu dou online é a mesma que eu ministro presencialmente: nenhum conteúdo fica de fora!

Por mais que as íntegras das aulas sejam gravadas, elas são dadas ao vivo, e os alunos participam na hora marcada da aula, pois a sua experiência fica muito melhor assim. Os alunos fazem suas perguntas e debatem livremente, por voz, exatamente como em uma sala de aula presencial.

Aliás, a quantidade de alunos por sala também é a mesma de um curso no prédio da escola, limitado a 30, no máximo 40 alunos. Isso me permite conhecer cada um deles! Se tiver mais gente, abre-se uma nova turma, com horário próprio. Como as gravações incluem todas as interações com os alunos, elas só servem para aquela turma, não sendo reaproveitadas para outras.

É a mesma experiência que teríamos se estivéssemos em sala de aula? Claro que não! Eu mesmo sinto falta de estar na sala com meus alunos. Sou uma pessoa cinestésica e sei das perdas.

Por outro lado, sei também que há ganhos, muitos associados à vida moderna. Por exemplo, não é necessário gastar um tempo enorme no trânsito para se chegar à escola. Aliás, se não for possível chegar na hora, não tem problema: a aula não será perdida, pois ela fica gravada.

Além disso, meus alunos agora não ficam restritos a São Paulo. Nesse período, cheguei a ter uma aluna que assistia às aulas ao vivo de Dubai (Emirados Árabes Unidos), mesmo estando cinco horas a nossa frente. Ou seja, ela ficava, por iniciativa própria, acordada de madrugada para participar ao vivo das aulas, que aconteciam das 19h às 22h (hora de Brasília). Sem falar de muitos alunos do interior de São Paulo e de muitos Estados brasileiros, que agora podem se matricular nos cursos.

Posso garantir que todos os objetivos de aprendizagem são atingidos nessas aulas à distância. Os alunos aprendem tudo que aprenderiam presencialmente.

Muitas coisas são necessárias para esse sucesso. Primeiramente, os alunos são todos adultos. Portanto, eles estão assistindo aula porque querem, e estão pagando por isso. Eles têm a disciplina para cumprir as exigências do curso.

Além disso, eu tenho o privilégio de ministrar aulas em instituições sérias que se preocupam com a qualidade do ensino. E aqui cito nominalmente a PUC de São Paulo, a Universidade Presbiteriana Mackenzie e a ESPM, onde estou dando aulas nesse período de pandemia. Todas elas proporcionaram o que eu disse acima. Ofereceram a estrutura necessária para a viabilização dos cursos e respeitaram alunos e professores nesse momento de transformação.

Por outro lado, vejo com muita tristeza outras instituições, que não vou citar seus nomes aqui, fazendo mudanças inaceitáveis! Por exemplo, salas de aula que antes tinham 30 alunos agora passam a ter 500! Elas agrupam todas as turmas de uma mesma disciplina, de diferentes campi, às vezes de diferentes cursos, colocando todo mundo em um “saco” só, com um único professor. E daí dispensaram os professores que “sobraram”.

Que atenção esses professores podem dar aos 500 alunos? Que interação pode acontecer nessas aulas?

Há casos de professores que foram demitidos por um pop-up que apareceu em sua tela, quando tentaram entrar na plataforma da universidade para dar uma aula. Há ainda casos de provas dissertativas sendo corrigidas por robôs. A despeito dos avanços da inteligência artificial, qual a garantia que os alunos têm de uma avaliação justa nesses casos?

Que nível de ensino essas instituições estão oferecendo a seus alunos? E que falta de respeito com seus profissionais é essa? Isso é obsceno, e essas escolas deveriam se envergonhar por se dizer instituições de ensino.

A educação é essencial para que o Brasil avance! Muitos dos problemas de nossa sociedade seriam resolvidos se tivéssemos uma população mais bem educada, no sentido amplo da palavra.

A tecnologia é uma ferramenta magnífica para melhorarmos a educação. Mas ela deve ser usada exatamente para isso: para melhorar a educação, e não para piorar a experiência de alunos e de professoras.

Por isso, escolha bem onde você vai estudar. E estude!

Videodebate: você educa seus filhos?

By | Educação | No Comments

Você se sente preparado para cuidar de toda a educação de seus filhos?

O ensino brasileiro pode estar prestes a passar por uma grande mudança. Mas ela não acontecerá nas escolas, e sim nas residências.

No dia 11, o Governo Federal apresentou um Projeto de Lei que regulamenta o chamado ensino domiciliar, e agora vai a votação no Congresso. Ele prevê que pais possam optar por não matricular os filhos na escola, se responsabilizando pela educação em casa.

Caso seja aprovado, não será uma obrigação, e sim uma opção, claro. E a imensa maioria dos pais deve continuar educando seus filhos com as escolas.

Mas me preocupa muito a simples possibilidades de algumas crianças serem privadas de uma educação adequada pelas crenças de seus pais. Isso provocaria um dano irreparável em sua formação, pois a escola é muito mais que apenas ensinar disciplinas. E as outras coisas não podem ser supridas em casa.

E você, o que pensa do ensino domiciliar? Veja o meu ponto de vista no vídeo abaixo, e depois vamos debater aqui.