Talvez você já tenha se deparado em alguns sites com uma inusitada mensagem ocupando toda a tela, para que desligue o seu “ad blocker” para que possa ver seus conteúdos. Essa é a mais nova moda de algumas publicações: se você não carregar os nossos banners, não é bem-vindo aqui. Vá se informar em outro lugar!
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Para quem não sabe o que são “bloqueadores de anúncios” (ou “ad blockers”), eles são pequenos programas que permitem que as páginas dos sites sejam carregadas sem exibir nenhuma publicidade. E não se trata de um truque meramente visual: os banners nem chegam a ser baixados, pois esses sistemas colocam os servidores de publicidade em uma lista negra.
Ao detectar esses programas, algumas publicações decidiram dar com porta na cara do usuário, como a Forbes e a Wired,. Nesse caso, o usuário tem três opções: desabilitar o sistema para que os banners sejam carregados, assinar a publicação ou ir embora. Outros sites não chegam a barrar o usuário, mas assim mesmo exibem uma mensagem pedindo que o bloqueador seja desativado ou faça uma assinatura.
Os ad blockers têm um efeito duplamente negativo. Evidentemente o usuário jamais clicará em um banner que ele não está vendo, reduzindo os ganhos do site. Mas a situação fica ainda pior porque, como as peças não são baixadas, os veículos não são remunerados sequer pelas simples exibições. Dessa forma, a audiência do site pode até crescer, mas seu inventário de publicidade encolhe.
Segundo levantamento do Instituto Verificador de Comunicação (IVC), algo em torno de 20% dos usuários têm algum tipo de ad blocker instalado, e 15% das páginas brasileiras têm anúncios bloqueados. Em alguns sites, o bloqueio ultrapassa 30%.
Bloquear publicidade não é algo novo. Nos anos 1960, começaram a surgir os primeiros controles remotos para as TVs, para que os telespectadores mudassem rapidamente de canal durante os comerciais. O ad blocker mais popular de todos é o Adblock Plus, com mais de 300 milhões de instalações. Mas o assunto ganhou notoriedade em setembro, quando a Apple liberou esse tipo de programa para iPhones e iPads. A repercussão se deve não apenas pelo que a empresa representa, mas porque o tráfego atual dos veículos de comunicação já acontece mais em dispositivos móveis que em computadores. E isso deve aumentar cada vez mais.
Isso disparou o alerta vermelho de muitos editores.
O lado do usuário
As publicações têm um argumento válido. Afinal de contas, se você estiver vendo os seus conteúdos, parece justo que sejam remuneradas, pelo menos pela publicidade. Desgraçadamente para essa turma, muitos usuários discordam desse argumento. E eles também têm um ponto de visto razoável.
Os sites dos veículos “perderam a mão” há bastante tempo, e vêm exagerando na publicidade em suas páginas, muitas delas extremamente invasivas, a ponto de prejudicar a experiência do usuário. Além disso, é muito comum que a maior parte das centenas de kbytes que compõem a página seja de anúncios. E, em tempos em que as empresas de telefonia ficam regulando cada kbyte trafegado, isso se torna inaceitável.
Assim, além de deixar as páginas menos “poluídas” visualmente, os ad blockers as carregam mais rapidamente, pois as peças publicitárias ficam de fora. Além disso, economiza-se no pacote de dados de Internet, fundamental para usuários de smartphones, cujas conexões são lentas e a franquia de dados é bastante limitada.
Nesse embate entre a monetização do serviço online e a experiência do usuário, a Apple decidiu ficar com o segundo.
E quem dirá que ela está errada?
Modelo falido
No centro dessa discussão, está o fato de que os veículos de comunicação insistem em modelos de negócios e de produção que não se alinham mais aos seus próprios usuários.
Entre vários outros erros, querer continuar vivendo da histórica dobradinha assinatura-publicidade está cada vez mais difícil. Os usuários, sim, pagam por conteúdo online, mas apenas quando a oferta lhes faz sentido, e os veículos não vêm conseguindo justificar isso. Por outro lado, a publicidade online nunca foi suficiente para fechar a conta.
Mas o que mais me assusta é como os executivos dessas empresas estão dissociados de seu público. Se o usuário chegou até o site, é porque ele viu algum valor naquilo, ainda que pontualmente. Tratem de ganhar dinheiro com ele de outra forma, e são várias disponíveis!
Uma audiência parruda implica que o produto é bom e, portanto, tem valor para seu público. Se é assim, fica muito mais fácil, por exemplo, conseguir patrocínios para viabilizar o veículo, um modelo que vem ganhando popularidade. Ou então criar outros produtos vinculados à publicação, no próprio site ou no formato de consultoria. Ou ainda, se essa equipe é tão boa, ela pode ser contratada para produzir conteúdo para outras empresas!
Esses são só alguns exemplos de como veículos modernos conseguem ser lucrativos na realidade atual. Eles perceberam que a audiência não é mais a fonte da receita, mas a justificativa para todas as outras receitas! Portanto, é perfeitamente viável oferecer conteúdo de graça, com pouco ou nenhum banner.
A única coisa que não dá é chutar o usuário para fora. Espero que essa moda não pegue, para o bem das próprias publicações.
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