Enquanto superinteligência artificial continua na ficção, agentes tentam ampliar poderes da IA

By 9 de junho de 2025 Tecnologia No Comments
Thiago Viola, diretor de Inteligência Artificial, Dados e Automação da IBM Brasil, durante o AI Forum – Foto: Paulo Silvestre

Desde o fim de 2024, ouço líderes de grandes empresas de tecnologia dizer que 2025 seria “o ano dos agentes de inteligência artificial”. Estamos agora no meio do ano, e esses sistemas começam a mostrar mais força, inclusive com o surgimento de plataformas que integram diversos deles para realizar tarefas mais complexas. Resta saber quanto disso cumpre a promessa e quanto é apenas marketing tecnológico, e quais os benefícios e os riscos de seu uso.

Agentes são sistemas potencializados pela IA capazes de realizar tarefas com pouca ou nenhuma supervisão humana. Ao contrário de plataformas populares, como o ChatGPT, podem funcionar de maneira contínua, monitorando o ambiente sem necessidade de comandos para cada ação, e aprendendo a cada interação.

Essa autonomia representa um grande benefício, mas também acende alguns alertas. Especialmente com a chegada da inteligência artificial generativa e suas conhecidas “alucinações”, a operação de agentes não supervisionados pode incluir erros sérios nos negócios. E com diversos deles trabalhando de maneira orquestrada, um agente “mal-comportado” pode corromper outros, até mesmo disseminando vieses.

O discurso das big techs se apoia em investimentos bilionários e em sua corrida tecnológica. Mas é preciso separar o que já é realidade do que ainda é expectativa. O levantamento CEO Study, publicado pelo Institute for Business Value da IBM, mostra que, enquanto 61% das empresas no mundo que usam IA em sua operação já implementaram agentes, no Brasil esse índice é de 67%. Até o fim do ano, a taxa global deve chegar a 85%.

No entanto, a autonomia desses agentes ainda é limitada. O que se vê, na prática, é uma adoção para tarefas específicas e repetitivas, enquanto usos mais sofisticados ainda exigem supervisão humana e governança robusta.

Assim, passada metade do “ano dos agentes”, eles avançam, mas de uma maneira não tão exuberante. A desejada autonomia plena, com tomada de decisões complexas e adaptação a contextos ambíguos, segue como objetivo em desenvolvimento.


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Na quinta passada, participei do IBM AI Forum, em São Paulo, onde conversei com Thiago Viola (foto), diretor de Inteligência Artificial, Dados e Automação da IBM Brasil. Segundo ele, o crescimento dos agentes está migrando para fluxos mais sofisticados, com agentes especializados e independentes atuando em conjunto.

Para que isso seja possível, plataformas como o IBM Watsonx Orchestrate e a SAP Joule atuam como interfaces amigáveis, que recebem as demandas dos usuários em linguagem natural. Elas então acionam os agentes necessários, mesmo de diferentes fornecedores, para realizar a tarefa. As respostas, até as mais complexas, chegam consolidadas e também em bom português.

Isso é um grande avanço. Assim, o usuário fica livre de interfaces às vezes demasiadamente complexas de sistemas como ERPs e CRMs, ou de aplicações antigas. Os agentes extraem e consolidam todas as informações necessárias.

“É como se o sistema legado virasse uma base de conhecimento, e o agente de IA passa, então, a criar essa camada de uso, sem que o usuário precise tocar no sistema”, explica Viola. “O agente terá essa conexão criada e esse ‘self learning’ de fazer esse recorte, entender e projetar isso como resposta para o usuário.”

A orquestração de agentes também traz riscos. A chance de ciberataques cresce, com esses sistemas podendo se tornar vetores para extração de dados e invasões. A complexidade de coordenação aumenta exponencialmente com mais agentes, elevando o risco de conflitos (comportamentos contraditórios) e conluios (cooperação indesejada) entre os agentes, podendo levar à perda da tarefa determinada.

“Se você tiver um modelo que está enviesado e você o combina com outros, a tendência é que isso comece a gerar um ‘drift’, ele começa a sair do foco”, detalha Viola. Para mitigar esses riscos, seres humanos precisam usar ferramentas para calibrar alucinações, rastrear tomadas de decisão e auditar comportamentos da IA.

 

IA mais fácil

Essas plataformas de orquestração de agentes devem ainda ajudar a resolver a baixa utilização dos dados empresariais pela IA, outro ponto crítico para melhores decisões de negócios. Estima-se que 99% deles ainda não sejam usados, por estarem armazenados em sistemas legados, não estruturados ou de baixa qualidade.

Mas vele lembrar que a IA não toma boas decisões com dados ruins. Como já foi dito nesse espaço várias vezes, o primeiro passo para uma boa IA é o investimento em governança de dados, com curadoria, normalização e atualização constante.

Com essas novas interfaces, a criação de agentes de IA também se torna cada vez mais fácil, sem a necessidade de programadores experientes. Ainda assim, isso não elimina a necessidade de conhecimento do negócio, de gestão de riscos e de uma cultura organizacional preparada para lidar com tecnologias autônomas.

Por isso, a narrativa de que os agentes de IA redefinirão o trabalho não implica substituição em massa, mas sim uma mudança fundamental em como trabalhamos. A realidade de sua adoção em 2025 é a de equipes híbridas, em que agentes lidam com a rotina e o volume, liberando os humanos para o pensamento crítico, a criatividade e a tomada de decisões complexas, que não devem ser totalmente automatizadas.

Essa tecnologia, embora avançada, ainda não atingiu a maturidade para operar sem uma significativa intervenção humana, especialmente em cenários de alta criticidade ou complexidade. Por isso, os inegáveis benefícios oferecidos pelos agentes não podem justificar que abandonemos nossa responsabilidade ou autonomia. Só assim poderão cumprir seu papel como aliados e não como riscos ocultos disfarçados de eficiência.

O “hype” em torno dos agentes de IA serve como um catalisador para investimentos e experimentação, impulsionando a inovação. A tendência é de uma integração cada vez mais profunda da IA com os fluxos de trabalho, com a evolução de agentes mais especializados e multimodais.

O sucesso dependerá de as organizações se adaptarem cultural e operacionalmente, transformando o potencial da IA em resultados sustentáveis e garantindo que a tecnologia sirva como um motor de desenvolvimento inclusivo e responsável, sem dispensar os seres humanos.