Brené Brown

Assis Chateaubriand, o “rei do Brasil”, que construiu um império de mídia na primeira metade do século XX só porque “queria ter opinião”

A verdade e os limites de cada um

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Segundo consta, o paraibano Assis Chateaubriand (que aparece na foto acima) começou a construir seu império de comunicação dos Diários Associados porque queria “ter opinião”. No início de sua carreira, ouviu do patrão que, para falar o que bem entendesse, tinha que comprar um jornal. E foi o que fez! Depois outro, outro e mais outro, até ser dono do maior conglomerado de mídia da América Latina na primeira metade do século XX, que chegou a contar com mais de cem jornais, emissoras de rádio e TV, revistas e agências.

Nada mal para quem só queria publicar suas ideias sem pedir permissão ao outro!

Passados cem anos, a coisa ficou bem mais simples. Não é preciso ter jornal, nem rádio, nem TV para expressar sua opinião. Basta uma conta nas redes sociais.

O problema é que, como diz o ditado, “quem nunca comeu melado, quando come, se lambuza”. Opinião todo mundo pode ter sobre tudo, inclusive religião, futebol e, mais recentemente, política. Mas ter opinião embasada e saber expor isso de forma respeitosa e construtiva exige habilidades que poucos carregam. E, nesse emaranhado de ideias sem limite, pessoas e empresas tentam se encontrar.


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Chatô, como era conhecido Chateubriand, virou o “rei do Brasil” pelo poder que construiu na mídia. Acabou incorporando a bravata do antigo chefe, que repetia a seus subordinados: “se você quiser ter opinião, compre um jornal (ou uma revista)!” Defendia seu direito de se expressar, mas não que outros promovessem suas “verdades”, especialmente as contrárias às suas.

Esse comportamento condenável combinava com a personalidade autoritária e egocêntrica de Chatô. Apesar do poder acumulado, estava longe de ser um exemplo a ser seguido. Infelizmente agora a Internet permite que isso se multiplique indefinidamente por pessoas de todo tipo e todo lugar, donos de seus “pequenos castelos”.

Esse diálogo de surdos nas redes sociais se construiu porque as pessoas confundem sua opinião com fatos. É possível acreditar em algo, é possível repetir isso mil vezes, mas não é possível ser dono dos acontecimentos.

A intensa virtualidade em que vivemos, reforçada pelas várias horas que passamos metidos nas redes sociais todos os dias, favorece essa sensação de poder se controlar a verdade: qualquer coisa que dissermos nessas plataformas ecoará em muitas pessoas, graças aos algoritmos que criam bolhas de pensamento único a nossa volta.

Não podemos perder as referências do real e de nossa humanidade por essa sensação de falso poder. E isso nos traz outro desafio de nosso tempo, que é o de se posicionar, de promover a proximidade com o outro sem parecer oportunista ou piegas. Pelo contrário, como fazer isso de maneira construtiva e genuína?

 

Coragem e vulnerabilidade

O cenário de insana polaridade que vivemos decorre disso. Quando todos têm razão, ninguém tem razão. É como se, de repente, o Brasil fosse tomado por milhões de Chatôs.

Essa intolerância pode calar muitas boas vozes: pessoas não apenas com opinião, mas também com embasamento, só que sem interesse em entrar nos intermináveis e infrutíferos debates online. Daí, para se proteger, criam “couraças” sobre a pele.

Mas –suprema ironia– as redes sociais justamente premiam quem se mostra. Considerando que a presença nessas plataformas se tornou essencial para se posicionar, fica o dilema de como fazer isso sem se machucar.

Um dos caminhos é se demonstrar autêntico, despir-se da defesa da couraça. Para isso, é preciso coletar excelentes argumentos e fatos de fontes fidedignas antes de se pronunciar. E, nesse processo, temos um ganho secundário importantíssimo, que é separar aqueles que “falam apenas porque têm boca” dos que realmente têm algo útil a se dizer.

Não é uma tarefa simples. Em nossa sociedade competitiva e guiada pela tal meritocracia, mostrar-se genuinamente virou algo de certa forma indesejado. Ao tirarmos as “máscaras”, mostramos nossas imperfeições, e isso é visto como sinal de fraqueza, de alguém que não deve ser, por exemplo, contratado para um trabalho.

Esse pensamento é um grande erro, pelo simples fato de que ninguém é perfeito. Segundo Brené Brown, pesquisadora em serviço social da Universidade de Houston (EUA), “imperfeições não são inadequações: são um lembrete de que estamos nisso todos juntos.”

Brown é uma referência internacional quando se trata de vulnerabilidade. Para ela, demonstrar-se vulnerável pode ser uma poderosa ferramenta de autoconhecimento, que nos permite identificar e melhorar nossas deficiências e reforçar nossas habilidades. Esse é um passo essencial para demonstrarmos empatia por nós mesmos. Sem isso, não seremos eficientes em ser empáticos com o outro.

Não precisamos ter respostas para tudo na ponta da língua. Ninguém sabe tudo sobre algo e nem algo sobre tudo. Sempre teremos o que aprender. Dessa forma, o antídoto para a intolerância das redes passa pela coragem de se demonstrar vulnerável e construir algo com isso.

 

“Meta as caras”

Muito antes de saber dessas histórias de Chateubriand, eu criei um jornal, um tabloide mensal que chegou a ter 52 páginas coloridas e 50 mil exemplares por edição, que durou de 1991 a 1998.

O que me motivava era compartilhar um pouco do que eu sabia com muita gente, em um tempo em que a Internet comercial ainda não existia (só foi liberada no Brasil no fim de 1994) ou era muito restrita.

Era o começo da minha carreira. Ainda havia muito a se lapidar em mim, mas acreditava que podia contribuir com as pessoas. E fazia isso cuidadosamente, da melhor maneira que podia. Quando o impresso acabou, eu já tinha o digital para ampliar minha voz.

Hoje, só no LinkedIn, tenho mais de 750 mil seguidores. Naturalmente nem todos veem o que publico, e, dos que veem, nem todos gostam. E está tudo bem! Eu não quero ter uma opinião para impor aos outros e não sinto que sou dono da verdade. Entretanto, ao escrever um artigo, gravar um vídeo, fazer um simples post, procuro saber muito bem do que estou falando e me apresentar com autenticidade.

Em um mundo tão complexo como o atual, precisamos de menos Chatôs e de mais Brené Browns. Portanto, convido você a trilhar esse caminho da vulnerabilidade, da empatia e do compartilhamento de ideias construtivas. Ganhará você e quem você tocar.