renda básica universal

Tarefas que exigem criatividade, empatia, crítica e julgamento moral são difíceis de automatizar - Foto: Freepik/Creative Commons

IA avança sobre empregos, mas não quer dizer que você perderá o seu

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Entre as ações bombásticas de Donald Trump em seu primeiro mês como presidente dos EUA, uma das mais emblemáticas visa demitir 2 milhões de servidores federais. Parte dessas vagas será reposta com pessoas mais alinhadas a suas ideias, mas muitas funções passarão a ser desempenhadas por sistemas de inteligência artificial.

Esse movimento vem se acelerando também na iniciativa privada, mas a magnitude sem precedentes daquela iniciativa reacende o debate global sobre o impacto da IA no mercado de trabalho. A substituição de profissionais por máquinas afeta de funções básicas a cargos de alta qualificação, o que é inédito. E isso gera questionamentos sobre o futuro, incluindo o que acontecerá com uma crescente massa de desempregados que não conseguirá se recolocar.

Para muita gente, o que importa é como “não entrar para a estatística das vítimas da automação”. Tarefas que exigem, por exemplo, criatividade, empatia, pensamento crítico e julgamento moral são difíceis de automatizar. Migrar o trabalho para atividades que exijam essas habilidades pode garantir o salário.

Mas, em qualquer caso, a IA já está transformando as mais diversas funções. Sendo assim, a sociedade deve não apenas preservar empregos, como também garantir que os benefícios da automação sejam distribuídos de forma mais equitativa, para que as pessoas desempenhem suas tarefas com IA, para não serem substituídas por ela.

Resistir a essa tecnologia já não faz sentido. O desafio de todos é se apropriar de seu poder com inteligência, criatividade, ética e segurança.


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Recentemente, Jensen Huang, CEO da Nvidia, a fabricante de chips cujo valor de mercado hoje é de US$ 3,3 trilhões graças à IA, disse que essa tecnologia não é uma assassina de empregos. Para ele, todos deveriam usá-la como um tutor pessoal, que lhes ajudaria a coletar qualquer tipo de informação rapidamente, a escrever e até a pensar melhor. Huang ecoa a visão de muitos líderes do setor, que enxergam o futuro do trabalho com as pessoas capacitadas pela IA, e não substituídas por ela.

Claro que ele está “vendendo seu peixe”, por isso sua afirmação deve ser analisada com cautela. É fato que a IA pode ajudar qualquer um em suas tarefas, mas não é verdade que todo mundo sabe como fazer isso! Não é realista esperar que alguém que passou décadas em uma função se torne um “engenheiro de prompt” da noite para o dia.

A verdade nua e crua é que a maioria das pessoas simplesmente não tem habilidades básicas para fazer isso, e não consegue “tirar o atraso”. O problema não é apenas a substituição em si, mas a velocidade com que isso está acontecendo. É a revolução tecnológica mais rápida e abrangente já vista, atropelando muita gente no caminho.

O desafio aumenta com uma requalificação que não acompanha a automação, novas vagas que não repõem as eliminadas, e o consequente aumento da concorrência por trabalho. Isso se agrava pela desigualdade no acesso à educação e à tecnologia e à concentração do mercado em menos setores.

Isso pode levar a um aumento da pobreza e desigualdade social, com crises econômicas causadas por um forte desemprego. Se a IA passar a ser vista como uma vilã pelas massas, isso pode levar a uma resistência à automação maior que a devida.

E isso também esquenta outro debate: o de uma renda básica universal.

 

Garantia de sobrevivência

Ela não surgiu com a inteligência artificial, mas vem sendo apresentada como uma solução caso o desemprego graças às máquinas saia do controle.

Entre os argumentos favoráveis à renda básica universal estão a mitigação dos efeitos de um desemprego em massa, um estímulo ao empreendedorismo e a redução da desigualdade social. Já seus críticos afirmam que não há dinheiro para isso, que ela pode gerar inflação e até desestimular o desejo de trabalhar. Por isso, alguns especialistas sugerem que ela seja apenas parte da solução, garantindo a sobrevivência do indivíduo, mas sem eliminar a necessidade de se trabalhar.

Com ou sem ela, é preciso criar políticas para requalificação de trabalhadores em novas áreas, além da criação de empregos “híbridos” que combinem os benefícios da IA com funções humanas, para evitar a eliminação completa de postos de trabalho. Mas não se pode deixar tudo a cargo do governo: essa responsabilidade deve ser dividida com empresas, instituições educacionais e os próprios trabalhadores.

O que já se observa é que, enquanto profissões inteiras estão sendo eliminadas, as demais não desaparecerão, mas serão transformadas. Quem desenvolver habilidades complementares para usar a IA terá mais oportunidades.

A automação do trabalho é inevitável, mas seu impacto social não precisa ser devastador. Com planejamento adequado, investimento em educação e políticas de proteção social, é possível construir um futuro em que humanos e máquinas não apenas coexistam, mas colaborem para criar uma sociedade mais próspera e equitativa.

Por outro lado, se a implementação for feita sem um planejamento detalhado e sem considerar os impactos sociais, como aparentemente está sendo feito nos EUA, há um grande risco de que os serviços prestados à população percam qualidade, se tornem mais burocráticos e menos acessíveis.

É fundamental considerar as implicações éticas e sociais dessas medidas, garantindo que a implementação da inteligência artificial, seja no setor público ou no privado, aconteça de maneira responsável e equilibrada, aproveitando todos os benefícios que ela traz, mas preservando os direitos dos trabalhadores e a qualidade dos serviços prestados à população.

Precisamos de estratégias que coloquem o ser humano no centro da revolução digital. As lideranças políticas e empresariais devem sair de suas torres de marfim, de onde acham que as oportunidades são as mesmas para todos. Sem isso, corremos o risco de criar uma sociedade ainda mais desigual, onde a tecnologia, em vez de libertar, aprofunda as divisões sociais. E não é para isso que ela está sendo desenvolvida.