shopstreaming

Enquanto alguns choram, outros vendem lenços online

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Depois de um ano e meio de pandemia, há um consenso entre empresários de que as adversidades que ela trouxe impulsionaram um incrível avanço na transformação digital: o que aconteceria em cinco anos aconteceu em cinco semanas! Isso explica por que algumas empresas quebraram no período, enquanto concorrentes diretos não apenas sobreviveram às provações, como ainda cresceram. Mas esse não é um processo apenas tecnológico: as empresas vencedoras são aquelas que captaram as mudanças no consumidor.

Do ponto de vista do e-commerce, a recém-lançada edição 44 do relatório Webshoppers, da consultoria Ebit|Nielsen em parceria com o Bexs Banco, demonstra que o enorme crescimento do varejo digital, observado nos primeiros meses da pandemia, se consolidou em um novo patamar de consumo. Além disso, evidencia como o celular se torna, cada vez mais, o canal preferido de compra.

O consumidor quer mais e iniciativas das empresas mais agressivas permitem esse comportamento. Entregas em poucas horas, ofertas mais diversificadas de produtos vindos do mundo todo e até lives com vendedores fazem parte da atual experiência de compra.


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O Webshoppers 44 não deixa dúvida sobre a força do e-commerce brasileiro. Apesar do faturamento do varejo online sempre aumentar ano após ano, no primeiro semestre de 2021, ele chegou a R$ 53,4 bilhões, um crescimento de 31% sobre o mesmo período de 2020, que tinha crescido 55% sobre o primeiro semestre de 2019. Foi um recorde impulsionado pelo período mais severo do distanciamento social. Isso é muito mais que o observado nos anos anteriores, mesmo aqueles antes da crise econômica iniciada em 2015.

A quantidade de consumidores online se manteve praticamente a mesma, chegando a 42 milhões. Isso se deve ao grande crescimento no início da pandemia, quando os compradores digitais saltaram de 29,4 milhões no primeiro semestre de 2019 para 41 milhões no mesmo período de 2020. As principais portas de entrada usadas pelos clientes foram os buscadores e as redes sociais.

Para os brasileiros, as fronteiras não representam um problema. Os sites internacionais (com um especial destaque no crescimento de sites chineses) tiveram 15% a mais de pedidos.

E, por falar em China, um fenômeno que já existe lá desde 2014 se tornou mais importante para os consumidores aqui com a pandemia: o live commerce, também conhecido como shopstreaming. Trata-se de uma live em que um vendedor, uma celebridade ou um influenciador apresenta produtos ao vivo para o público, que pode tirar dúvidas e fazer a compra na hora.

Mas, ao contrário do que já se vê há décadas em programas comerciais de TV, no live commerce o apresentador efetivamente interage com o público. Além disso, ele não tem a função apenas de vender, dedicando-se também a explicar seu uso e até divertir quem está assistindo.

No ano passado, as lojas chinesas venderam US$ 200 bilhões em produtos assim. Nesse ano, devem chegar a US$ 300 bilhões! No Brasil, o Webshoppers informa que as vendas concretizadas pelo live commerce foram de 10% em média de quem assistiu aos programas.

Como se pode ver, assim como o marketing deixou de ser apenas uma ferramenta promocional há muitos anos, passando também a divertir, inspirar e educar interativamente o público, as vendas agora seguem por esse caminho.

 

Compra e entrega em qualquer lugar

O consumidor tem hoje muito poder na palma de sua mão. Literalmente!

O Webshoppers 44 mostrou que o celular continua sendo um canal cada vez mais importante para o e-commerce, com 53% do total das vendas, chegando a R$ 28,2 bilhões no primeiro semestre. Isso é um aumento de 28,4% frente ao mesmo período de 2020.

Isso não chega a surpreender. Segundo o relatório PNAD Contínua do IBGE, apenas 48,1% dos domicílios brasileiros com Internet tinham computador em 2018. Essa porcentagem vem caindo: em 2017, eram 52,4%. Já os smartphones crescem, passando de 98,7% em 2017 para 99,2% dos domicílios em 2018. Praticamente todos os domicílios brasileiros com Internet têm celulares, sendo que, em 45,5% dos casos, é a única forma de conexão.

Já não é de hoje que a experiência de compra precisa ser ótima na telinha dos smartphones, mais importante até que nos computadores. Por isso, é incrível ver que muitos varejistas –inclusive alguns grandes– continuem fazendo de seus aplicativos apenas uma versão do site ajustada para o celular. Para piorar, usam muito pouco os recursos incríveis que os smartphones têm, como sensores, localização ou a própria câmera.

Isso é dinheiro que fica na mesa: estão perdendo vendas e clientes! Precisam mudar essa cabeça!

Esse poder do usuário e a concorrência acirrada estão redefinindo também o prazo de entrega. Serviços de compra programadas, como Amazon, Magazine Luiza ou Americanas.com, que antes da pandemia demoravam dias para entregar produtos, agora fazem isso em horas, em alguns casos.

De certa forma, essas operações se sobrepõem agora a aplicativos como Rappi e iFood, acostumados a entregas em minutos. Esses, por sua vez, ampliam o tipo de produtos atendidos, não se restringindo mais a comida por motos ou bicicletas. Eles cresceram muito em pedidos de mercado, que muitas vezes precisam ser entregues por carros.

Essa entrega rápida segue outra tendência importada da China: o same hour delivery, ou seja, e-commerces que prometem fazer suas entregas dentro da mesma hora. Isso ficou tão importante lá, que bairros de grandes cidades atendidos por essa modalidade experimentaram um aumento nos valores dos imóveis.

Para cumprir essa meta, vale tudo! Reportagem de Elisa Calmon e Talita Nascimento, publicada no Estadão no sábado, mostra como o Mercado Livre se vale de barcos e até de cavalos para chegar a locais remotos do Brasil.

Como se pode ver, não dá para continuar se relacionando com o público como se fazia até antes da Covid-19. O consumidor se transformou profundamente no período de distanciamento social. Agora, com o fim das restrições, quem continuar atendendo do jeito velho poderá ficar para trás, chorando. E talvez ainda tenha que comprar lenços online.

De que lado dessa transação você quer ficar?

 

O que mais vem da China?

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Nunca se falou tanto da China quanto desde o começo do ano!

Por conta da pandemia de Covid-19, o gigante asiático ganhou um destaque global ainda maior que o que naturalmente já tem. É alvo de todo tipo de teorias da conspiração, por ter sido o país onde o novo coronavírus surgiu, e pela guerra particular contra ele do presidente americano, Donald Trump, que busca a reeleição.

A despeito de tudo isso, a China foi um dos primeiros países do mundo a relaxar as medidas de distanciamento social, que lá foram muito mais severas que aqui. Mas, por isso mesmo, duraram menos de um mês.

Hoje o país é um dos que lideram a corrida por uma vacina contra o vírus. Eles também desenvolveram hábitos e tecnologias que podem ser muito úteis no mundo pós-pandemia, inclusive para nós.

O que os chineses estão fazendo que nós podemos copiar?


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A China é o maior parceiro comercial do Brasil no mundo. O país asiático tomou esta posição dos Estados Unidos em 2009, e não perdeu mais. Segundo o Ministério da Economia, em 2018, o comércio entre China e Brasil foi de US$ 98,6 bilhões, com superávit para o Brasil de US$ 29,2 bilhões.

Já foi o tempo em que a China era um mero reprodutor de versões baratas e de baixa qualidade de produtos ocidentais, os chamados “Xing Ling”. Sim, a China ainda exporta todo tipo de quinquilharias para o mundo todo. Mas o país é hoje dono de uma das indústrias tecnológicas mais pujantes do planeta, em todos os segmentos.!

No mundo pós-pandemia -pelo menos para eles- algumas novidades podem indicar caminhos a ser seguidos por outros países.

Um estudo realizado pela consultoria Inovasia entre 2 de abril e 15 de junho identificou várias dessas inovações.

Um deles é o pagamento digital pelos celulares. Em uma época em que o contato se tornou um fator potencial de contágio, até o cartão de crédito nas mãos de um lojista ou de um entregador é visto com receio por alguns. Portanto os meios digitais de pagamento crescem fortemente e os pagamentos por aproximação do celular estão consolidados lá. Aqui no Brasil, isso ainda está começando.

Os superapps chineses, como WeChat e AliPay, concentram o processo, algo que também está engatinhando aqui, com operações locais. Dessa forma, dinheiro em papel é cada vez mais raro na China, o que é muito bem-vindo, pois as notas sempre foram instrumentos de propagação de doenças, e não só de Covid-19.

Nessa mesma linha, empresas que ofereçam produtos que não exijam contato com o público ganham espaço. Até o mundo do trabalho deve ir por esse caminho, com menos reuniões em salas fechadas. Aliás, trabalho remoto, sempre rejeitado por muitos, se tornou uma possibilidade vantajosa! O mesmo se observa com o ensino à distância. Mesmo com as escolas reabrindo, parte do público preferiu continuar com as aulas online.

A tecnologia é essencial nesse ponto, com a adoção de equipamentos que ajudam em atividades como telemedicina, além de realidade virtual e realidade aumentada.

O varejo de agora em diante

O varejo também se beneficiou da tecnologia. Não apenas pelo crescimento explosivo do e-commerce, mas pela consolidação do chamado shopstreaming. Trata-se de lives em que vendedores ou celebridades apresentam produtos ao vivo, para que os consumidores tirem dúvidas e façam compras na hora.

Segundo o instituto iMedia Research, o “comércio ao vivo” movimentou US$ 63 bilhões na China, em 2019. Com a pandemia, este número deve saltar para US$ 135 bilhões em 2020.

A Inovasia aponta uma coisa interessante nisso: o apresentador não deve ser uma celebridade qualquer, paga para só “puxar o saco” da marca! O que realmente funciona é um influenciador que seja um especialista no produto, que pode falar com propriedade sobre ele. A agência de comunicação Dentsu Aegis Network indicou que mais de 90% dos gestores aumentarão seu investimento em influenciadores digitais, e 80% melhorarão sua infraestrutura de e-commerce.

Outra tendência ligada ao varejo é a entrega em menos de uma hora. Isso já existe na China há uns cinco anos, mas ficou muito mais importante agora. A consultoria britânica Real Capital Analytics indica que imóveis em bairros de Pequim, Xangai e Shenzhen que são atendidas por supermercados que entregam em até 30 minutos tiveram valorização média de 10% só por essa facilidade.

Outra tendência chinesa ligada ao varejo que se vê timidamente por aqui é a preferência pelo comércio local. Com um consumo mais consciente, as pessoas procuram comprar de pequenos varejistas do próprio bairro, como uma maneira de ajudá-los. Além disso, a Inovasia identificou um crescimento por marcas nacionais, em detrimento de produtos importados.

A alimentação dos chineses também ficou mais saudável. Alimentos frescos estão sendo mais buscados, em detrimento dos congelados. As pessoas também estão cozinhando mais em casa, outra coisa que se observa no Brasil.

Os chineses também estão se exercitando mais, porém não em academias, por serem locais fechados. Cresceu a compra de produtos para atividades físicas na residência.

Do ponto de vista de mobilidade, assim como no Brasil, a venda de carros desabou por lá durante a pandemia: 89% de queda! Mas, com a retomada das atividades, muitas pessoas voltaram a comprar carros. O motivo é não querer usar o transporte público, um foco de contágio.

Além das onipresentes bicicletas, quando o carro se faz necessário, os chineses estão preferindo os veículos LSV, ou Low Speed Vehicles. São carrinhos parecidos aos de campos de golfe, totalmente elétricos, conectados e que se movem a, no máximo, 40 km/h. A sua autonomia varia entre 40 km e 90 km e seu tempo de carregamento é de apenas três horas.

Assim como aconteceu no Brasil, a China experimentou uma explosão de “fake news” durante a pandemia, disseminadas principalmente por redes sociais. E, assim como aconteceu no Brasil, os veículos de comunicação tradicionais emergiram como fontes confiáveis para combater a desinformação. Os mais jovens tiveram um papel interessante nisso, ajudando parentes e amigos mais velhos a separar as notícias falsas de material produzidos por veículos sérios.

Precisamos melhorar muito nisso aqui no país.

Não tem volta!

É interessante observar que essas mudanças vieram para ficar, mesmo entre os “late adopters”. Segundo a consultoria chinesa ChoZan, esse público é, em geral, formado por homens acima de 50 anos, com pouca intimidade com smartphones e que têm medo de sofrer golpes online. O mesmo raciocínio se aplica a empresas que, por questões culturais, não sentiam a necessidade de oferecerem seus produtos digitalmente.

A pandemia forçou todos a mudar de postura. E o fim da crise sanitária no país não fez o comportamento dos “late adopters” retornar ao estágio pré-Covid. O motivo principal para a mudança de postura é que seus temores não se concretizaram: a coisa “deu certo”! No caso das empresas, houve aumento de receita em 87% dos casos. O consumo, aliás, voltou com força após o isolamento, porém mais consciente, incluindo evitar dívidas de longo prazo.

Como se pode ver, a China pós-pandemia traz caminhos interessantes, que podem nos ajudar também. Cabe a nós aproveitar essas ideias da melhor maneira possível.

Vale lembrar que se trata de um país em que as liberdades individuais são restritas e que a arapongagem é algo comum e até aceita. Por exemplo, todo cidadão é obrigado a informar, em um aplicativo, viagens intermunicipais e sintomas de saúde às autoridades. O sistema, que roda nos superapps WeChat e no AliPay, confere classificações verde, amarelo e vermelho a cada cidadão, determinando seu grau de liberdade de circulação.

Fica a questão se queremos fazer algo assim por aqui. O histórico do governo brasileiro de proteção aos próprios cidadãos não anda muito favorável. Devemos estar atentos para que o governo brasileiro não passe dos limites.

Temos muito que aprender com os chineses! Vamos então adotar as coisas positivas que vêm de lá. E aprender o que não fazer com o que não é legal.