A frase acima, atribuída a Steve Jobs, não é muito inspiradora, mas abre a cena abaixo de “Piratas da Informática” (“Pirates of Silicon Valley”, 1999), talvez a mais memorável do filme. Em apenas três minutos, o filme demonstra como a Apple “roubou” a ideia da interface gráfica e do mouse da Xerox e, ao lançar o Lisa e principalmente o Macintosh, passou ao mundo a ideia de que que foram eles que inventaram tudo aquilo.
A sequência, com narração em off de Steve Wozniak (co-fundador da Apple) é memorável e merece ser vista. Mesmo por que ela traz vários ensinamentos para qualquer negócio:
valorize a “prata da casa”;
não despreze o que não entende;
esteja aberto a oportunidades e ao novo;
fique atento à concorrência;
surpreenda sempre o consumidor;
a galinha que cacareja mais alto nem sempre é a dona dos ovos, mas leva a fama.
Esse filme de baixo orçamento é brilhante! Nada daqueles filmes “chapa branca” sobre o Jobs que saíram nos últimos anos. Mostra o surgimento da microinformática contando os primeiros anos da Apple e da Microsoft. Infelizmente está meio difícil de encontrá-lo online ou em DVD. Mas, se tiver chance, assista!
E você, já passou por experiências com as dos itens acima na sua carreira? Compartilhe aqui com a gente 😊
O visionário Norville Barnes demonstra sua revolucionária e simples invenção, o bambolê, em cena do filme “A Roda da Fortuna”
Ninguém discute o valor da inovação. Grandes empresas, universidades, imprensa, gurus incensam a sua importância como o caminho para o sucesso. O próprio LinkedIn está cheio de artigos sobre isso. Mas, se o discurso é lindo, a prática é medonha: empresas e profissionais passam seus dias fazendo mais do mesmo, até se escondendo da inovação! Por que existe esse paradoxo?
Inovar não é nada de outro mundo, mas exige algumas condições, umas quantas habilidades e bastante disposição. Entretanto a nossa sociedade não anda proporcionando nada disso já há um bom tempo. Na verdade, o que vemos é um certo movimento contrário à inovação, que nasce em casa, flui pelas escolas e desemboca nas empresas. Isso é uma tragédia para o profissional, para as companhias e para a sociedade como um todo. Então como romper isso e mudar para o rumo certo?
Vídeo relacionado:
Boa parte da resposta eu vi nos dias 3 e 4, quando visitei o SAP Labs Latin America, a convite da empresa. Trata-se de um centro da gigante de software para pesquisa e desenvolvimento de seus produtos e de soluções criadas com eles. Localizado no Parque Tecnológico São Leopoldo (região metropolitana de Porto Alegre), dentro da Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos), é um dos 19 centros desse tipo que a SAP mantem espalhados pelo mundo, o único da América Latina.
Como se pode imaginar, uma empresa assim é movida por inovação: essa é a linguagem corrente. Por isso, basta chegar ao Labs para notar a primeira coisa necessária para se inovar: um ambiente que o tempo todo convide as pessoas a fazer isso. Não apenas pela construção moderna e acolhedora ou as melhores ferramentas para se desenvolver o trabalho, mas porque a empresa e sua liderança fazem de tudo para manter acesa a fagulha criativa dos profissionais, a vontade de querer fazer algo novo ou de maneira diferente. Tanto é assim que os funcionários podem dispender 10% de seu tempo de trabalho para contribuir mesmo para projetos com os quais não estejam envolvidos.
Quantas empresas você conhece que oferecem tal coisa? Infelizmente a resposta provavelmente será “poucas”. É uma pena, pois a inovação começa a morrer justamente aí. Nem me refiro a “liberar” 10% do tempo do funcionário para ele colaborar em outros projetos, mas a criar mecanismos que incentivem o pessoal a ter uma visão diferente ou pouco convencional do mundo, transformando isso em ganhos para o negócio. E antes que alguém diga que isso é fugir do processo, não é! Trata-se apenas de liberdade de pensamento, abertura a ideias novas e pontos de vista inovadores (e até mesmo conflitantes).
Nesse ponto chegamos à maior inimiga da inovação: a capacidade de correr riscos.
Quem fica parado é poste!
Só há um jeito de inovar: tentando algo novo. Mas qualquer tentativa embute algo que deixa a maioria dos gestores de cabelo em pé: o risco de algo dar errado.
As empresas tradicionalmente punem seus funcionários que comentem falhas, pois entendem que estão perdendo dinheiro. Sem entrar no mérito da incoerência disso pela falibilidade humana, com esse comportamento elas jogam mais uma pá de terra sobre a inovação. Todas querem atingir o sucesso, crescer muito, destacar-se da concorrência. Entretanto, cada vez mais, isso só é possível fazendo algo incrível! Mas não dá para se chegar lá sem tentar!
O guru da administração Tom Peters costuma dizer que “o fracasso é uma medalha de honra”, pois ele demonstra que se buscou o novo. E conclui: a única maneira de não fracassar em algo é não tentar. Mas essa também é a garantia de que jamais se atingirá o sucesso!
Não é a primeira vez eu falo disso aqui, mas não tem como deixar de lado esse aspecto quando se pensa em inovação. A maior das ironias é que todos nós nascemos com a disposição para correr riscos. Crianças aprendem de duas maneiras principais: pela imitação e pela experimentação. Elas sabem que podem tentar e, se a coisa não sair como planejado, podem tentar uma outra estratégia para atingir seus objetivos. E até mesmo quando a coisa já deu certo, elas ainda buscam alternativas mais inovadoras, para fazer aquilo de uma maneira melhor! Qualquer bom gamer sabe disso! É por isso que as crianças tendem a jogar melhor que os adultos, que racionalizam e coíbem seus movimentos para minimizar as falhas.
Empresas tradicionais tendem a funcionar como esses gamers adultos, entrincheiradas naquilo que já conhecem e que, em algum momento no passado, deu muito certo. Busca-se a perfeição na mesma, acreditando que isso os protegerá da concorrência. Nada mais equivocado, pois isso tem o efeito exatamente contrário: cega a empresa e sua liderança ao novo, esteja ele dentro de casa ou além de seus muros.
E não se enganem: o novo sempre chega abalando estruturas.
Empresa e escola ficam melhores juntas
As novidades nem sempre são óbvias, e muitas vezes dispensam grandes investimentos, Veja o caso do bambolê, cuja invenção foi romantizada no brilhante filme dos irmãos Coen “A Roda da Fortuna” (“The Hudsucker Proxy”, 1994), cujo sucesso custou um pouco a acontecer, como pode ser visto na cena abaixo:
O brinquedo foi inventado pelos americanos Arthur Melin e Richard Knerr. No filme, surgiu da mente do mensageiro Norville Barnes (Tim Robbins). Considerado um idiota pelos poderosos da empresa, sua ideia só foi para frente como parte de um plano maquiavélico do principal executivo da empresa.
Que sorte!
Ficção à parte, o exemplo demonstra que não podemos estar cegos a possibilidades, muito menos desdenhar aquelas que são contrárias a nossas crenças. E tais possibilidades podem estar lá fora, na nossa empresa ou dentro de nós mesmos.
Mas se nascemos abertos à inovação, porque crescemos e ficamos “quadrados” desse jeito? O principal motivo, ironicamente, é a escola. Somos apresentados à punição aos erros ainda nela: afinal, quando erramos na prova, tiramos nota baixa. Além disso, somos expostos a um ambiente que prega a repetição de padrões consagrados e de competição interna constante. Logo, os 16 anos (ou mais) nos bancos escolares são suficientes para introjetarmos os conceitos de que devemos “estudar para a prova” (e não para aprender) e trabalhar sozinhos.
Não é de estranhar, portanto, que cheguemos às empresas com dificuldade em trabalhar em grupo e com nossa iniciativa e nossa criatividade tolhidos. Somos máquinas de execução de tarefas repetitivas, mesmo em atividades que deveriam ser essencialmente criativas, como o marketing.
Desnecessário dizer que a escola precisa abandonar esse modelo oriundo da Revolução Industrial e criar algo que forme profissionais e cidadãos para o mundo atual, dispostos e capazes de inovar, com uma visão comunitária desenvolvida, e que queiram muito mais colaborar que competir. E isso tem que começar na Educação Infantil e ir até a pós-graduação.
Nesse sentido, o lugar onde o SAP Labs Latin America fica também é incrível. Aquele edifício de 17 mil metros quadrados foi construído dentro da Unisinos não por acaso: a empresa criou ali iniciativas como o SAP Next-Gen, que permite que estudantes, professores, pesquisadores, startups e a própria SAP colaborem entre si para a criação de soluções para a comunidade.
Como professor, isso é algo que me encantou, pois eu sinto muita falta de uma maior proximidade entre os mundos acadêmico e empresarial. A grande maioria das universidades resiste a parcerias como essa, como se as empresas fossem, de alguma forma, macular seu ensino e sua pesquisa.
Tremenda bobagem! O resultado dessa resistência são recém-formados com conhecimentos inadequados para o mundo em que vivemos, e uma avalanche de pesquisas que não têm nenhuma utilidade social. E eu sempre digo: pesquisa para ficar pegando poeira em biblioteca de universidade não serve para nada: deveria ser proibida! Os países mais desenvolvidos são justamente aqueles em que a universidade assume o seu papel de inovação, e produz para a sociedade e não apenas para os egos acadêmicos.
Esteja aberto ao novo
Não sabemos de onde virá o próximo grande sucesso. Mas, se quisermos ter a chance de fazer parte dele, devemos estar abertos ao novo, olhar o que está a nossa volta, valorizar as ideias, especialmente as que são diferentes das nossas.
A cena acima do bambolê é fictícia, mas a abaixo, do filme “Piratas da Informática” (“Pirates of Silicon Valley”, 1999), é real. Mostra como os engenheiros da Xerox desenvolveram o conceito de interface gráfica e o mouse, e acabaram ridicularizados pela direção da empresa. Eles acharam aquilo uma bobagem e entregaram tudo de mão beijada para Steve Jobs usar na Apple:
Sim, Steve Jobs “roubou” a ideia da Xerox, que não viu valor em uma inovação que simplesmente mudaria o mundo. Mas o Lisa, primeiro computador da Apple com essa tecnologia, foi um fracasso. O sucesso só veio um ano depois, com o lançamento do Macintosh.
Que teria sido da Apple, de Steve Jobs ou do mundo se ele se acorvardasse diante dos inúmeros desafios técnicos, da resistência na própria empresa, dos riscos gigantescos de seus projetos? É verdade que ele era uma pessoa extremamente difícil de lidar, mas isso não é pré-requisito para ser inovador. Felizmente, como ele “bancou” tudo isso, o mundo ganhou o Apple II, o Mac, o iPod, o iPhone e o iPad. E todos os produtos da concorrência derivados deles.
Portanto, a mensagem que deixo aqui, inspirado pelo que vi no SAP Labs, é que não devemos nunca deixar de seguir adiante. Temos que querer melhorar o que fazemos, nosso negócio e nossa carreira, E podemos fazer isso! Se a sua empresa não pensa assim, faça um favor a você mesmo: mude de emprego! É por isso que companhias “quadradinhas” acabam perdendo os seus melhores profissionais.
É claro que dificuldades aparecerão pelo caminho. Mas, longe de serem obstáculos intransponíveis, elas servem para depurar o que criamos e fazer de nós mesmos profissionais e pessoas melhores. Vá em frente!
A bandeira pirata hasteada à frente da sede da Apple em 1983
A Apple acaba de ganhar mais um round contra a Samsung: dessa vez, impediu que sua filial alemã distribua o Galaxy Tab 2, de 10,1 polegadas. Apesar de provavelmente não trazer muitos efeitos práticos, pois os aparelhos poderão ser trazidos de outras partes do mundo para ser vendidos na Alemanha, é mais um capítulo de uma guerra travada por advogados das duas empresas. A Samsung contra-ataca com processos contra a Apple, também por violação de patentes.
Ninguém sugere que uma companhia não defenda seus investimentos milionários em pesquisa, mas não deixa de ser irônico ver a Apple tentando impedir que outras companhias lancem produtos que, digamos, se pareçam muito aos seus.
Vale aqui uma pequena aula de história da indústria de microinformática. No início dos anos 1980, quando a Apple atingiu o topo pela primeira vez, com seu Apple II, a empresa investiu em uma nova tecnologia: a interface gráfica, que viabilizou o seu Apple Lisa e, logo na sequência, o primeiro Macintosh.
A referida ironia está no fato de que a primeira interface gráfica e o mouse não terem sido inventados pela Apple, e sim por um grupo de pesquisa da Xerox. Os executivos dessa última não deram a menor bola para a criação de seus engenheiros. Pior que isso: abriram caminho para que Steve Jobs e sua turma literalmente se apropriassem dessa tecnologia e praticamente assumissem a sua paternidade. Não é de se espantar que, à frente da sede da Apple, a bandeira pirata estilizada (acima) ficasse hasteada.
Logo depois, a Apple provou do próprio veneno, quando a Microsoft se “inspirou” no Mac para lançar o seu Windows. Esses dois “roubos”, o da Apple e o da Microsoft, estão magistralmente representados no vídeo abaixo, um trecho do filme “Piratas da Informática” (“Pirates of the Silicon Valley”, no original):
A Apple sempre acusou a Microsoft de ter copiado o sistema operacional do Macintosh para criar seu Windows. Felizmente nunca conseguiu impedir que a turma de Bill Gates seguisse adiante com sua própria interface gráfica. Pois, se a Xerox inventou e a Apple refinou o conceito, foi indubitavelmente a Microsoft quem o popularizou, tornando o computador finalmente algo acessível às massas.
De volta a 2011: a Apple agora quer impedir o crescimento do Android, apontando sua artilharia principalmente para os produtos da linha Galaxy, os principais concorrentes do iPhone e do iPad. O fato é que o hardware do Galaxy Tab 2 é superior ao do iPad 2. O Android também chegou lá, na sua versão 3: é um produto maduro e sofisticado. Pesam a favor do iPad várias vantagens por ter sido lançado muito antes (pelo menos para os padrões dessa indústria alucinada).
Afinal, qual o problema com a turma de Cupertino? Seus produtos são excepcionais, e a Apple se parece mais a uma religião que a uma empresa, com uma (crescente) legião de fieis. Mas eu darwinianamente acredito que a diversidade e as interações entre as espécies levam à evolução. Tentar frear isso em tribunais é muito triste, para dizer o mínimo. Além disso, ter uma concorrência forte é a receita para uma empresa continuar inovando, e já passou da hora de a Apple ser confrontada de verdade. Por isso, espero que as empresas tirem logo seus advogados de cena e deixem seus engenheiros trabalhar. É aí que está a centelha criativa. É aí que os usuários e as próprias empresas ganham.