Info@Trends

Quando a quantidade e a diversidade levam à qualidade

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Para Arianna Huffington, o jornalismo depende cada vez mais da blogosfera

Para Arianna Huffington, o jornalismo depende cada vez mais da blogosfera

Depois de Julian Assange, criador do WikiLeaks, que ontem abriu o Info@Trends 2011, hoje foi a vez de Arianna Huffington iniciar os trabalhos do evento. A grega, criadora do The Huffington Post e presidente do AOL Huffington Post Media Group (desde que a AOL lhe pagou US$ 315 milhões para incorporar seu veículo), veio ao Brasil para participar do congresso e se reunir com jornalistas e executivos de empresas de mídia. Explica-se: ela quer lançar uma versão brasileira do HuffPost, de preferência ainda neste ano.

Distribuindo sorrisos, Arianna reafirmou suas crenças sobre como o jornalismo deve ser feito. E, para ela, a blogosfera é decisiva. O HuffPost, apesar de possuir uma grande equipe de jornalistas profissionais, nasceu e se mantém pela contribuição -não remunerada-, de milhares de blogueiros. Dessa forma, o veículo oferece enorme abrangência em suas coberturas e uma saudável pluralidade de ideias. O resultado é mais que positivo: a rede de blogs de Arianna construiu uma boa reputação e superou até o aclamado The New York Times em audiência.

Apesar disso, seus ideais não são uma unanimidade na indústria. Muita gente, principalmente da mídia tradicional, torce o nariz para o jornalismo produzido na blogosfera, especialmente por pessoas que não são jornalistas. “É tão difícil para tanta gente entender por que tanta gente escreve de graça”, disse Arianna, que emendou uma alfinetada: “então por que tanta gente passa cinco horas assistindo a TV ruim de graça?”

Arianna tem uma explicação na ponta da língua: “a autoexpressão se transformou em um novo tipo de entretenimento.” Foi-se o tempo em que as pessoas queriam apenas consumir notícias. Agora elas querem pautar (inclusive jornalistas profissionais), apurar, escrever, publilcar, promover. “Tem tudo a ver com compartilhamento e tem tudo a ver com engajamento”, completou.

Ela está certíssima! A maioria dos jornais está se esquecendo do que é contar uma boa história. Ficam reféns do jornalismo palaciano, declaratório e demasiadamente dependente de números. Redações, cada vez mais jovens (e baratas), são vítimas de balões de ensaio de fontes sem escrúpulos, propagando versões falsas dos fatos. E fazem isso de uma maneira chata, cansativa.

Não é de se admirar que o HuffPost ganha espaço de seus concorrentes centenários. Seus jornalistas e blogueiros não se limitam apenas a trazer informação: fazem isso com personalidade, sabor. “Nossos editores são preparados para fazer manchetes mais intimas com o leitor, com humor, quase como um amigo.” Além disso, funcionam como “curadores” da enorme massa de material produzido pela comunidade.

A mídia tradicional se defende com a promessa de entregar aos leitores a melhor informação disponível. “Mas é falso”, disparou Arianna. De fato, por mais preparada e equipada que seja uma Redação, sua capacidade de produção é limitada. Isso é um tremendo problema em um mundo em que as pessoas não mais se contentam com um noticiário limitado: querem um noticiário hiperlocal e hiperpersonalizado. Querem um noticiário feito “exclusivamente” para cada um, algo que uma empresa de mídia tradicional simplesmente não consegue entregar. Na aurora desse novo jornalismo, o modelo do The Huffington Post floresceu e já deu frutos.

Em poucos meses, os brasileiros poderão experimentar a proposta de Arianna em bom português. Resta saber se ela repetirá aqui o sucesso que alcançou lá fora. Façam suas apostas!

Sem vender a alma ao diabo

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Hoje cedo, no Info@Trends, Julian Assange afirmou que The New York Times e The Guardian sonegam informações a seus leitores por interesses espúrios

Hoje cedo, no Info@Trends, Julian Assange afirmou que The New York Times e The Guardian sonegam informações a seus leitores por interesses espúrios

“Quando uma grande empresa de mídia se aproxima do poder, ela começa a legitimar esse governo.” A frase foi dita por Julian Assange, criador do WikiLeaks, ao abrir, hoje cedo, o Info@Trends 2011. Assange, que falou por videoconferência, pois está em prisão domiciliar na Inglaterra, acusado de assédio sexual pela promotoria sueca, fez pesadas criticas a governos e também à imprensa. Segundo ele, as investigações do WikiLeaks demonstram que veículos de comunicação deliberadamente sonegam informações a seu público, citando nominalmente o The New York Times e o The Guardian.

Vários motivos explicam essa associação espúria entre a imprensa e governos (ou outras instituições ou companhias), mas as mais comuns são o medo de atentados e represálias políticas, e o interesse econômico das empresas de comunicação. Esses itens acompanham a história do jornalismo, mas o bom exercício da profissão sempre implicou em resistir a eles.

Sobre esse último, o jornalismo sério tradicionalmente se protege “associando-se” a seu consumidor –leitor, espectador ou internauta– que banca parte da produção com assinaturas e vendas avulsas. Com seus verdadeiros clientes pagando pelo conteúdo jornalístico, os veículos não precisam depender financeiramente de grupos externos. Dessa forma, os jornalistas podem exercer seu ofício de maneira independente.

Mas o que acontece quando esse mesmo público se recusa a pagar pelo conteúdo? Esse é o dilema que o jornalismo vem vivendo há uma década. Com a overdose de informação na Internet, criou-se a falsa e polêmica ideia de que o conteúdo deve ser gratuito. Falsa porque produzir jornalismo de qualidade custa dinheiro; polêmica porque é verdade que se pode encontrar bom conteúdo de graça na rede, normalmente produzido como atividade secundária ou de apoio por outras pessoas ou empresas.

O fato é que esse conceito trouxe a imprensa a uma crise econômica sem precedentes. Então seria legítimo, em nome da sobrevivência, trair o interesse do leitor, como Assange acusa os veículos de fazer?

Não estou inocentemente propondo que as empresas de comunicação nunca se vendem por interesses econômicos ou políticos. Mas vamos supor, para efeito de análise, que isso não seja pelo menos algo sistematicamente recorrente. Como os veículos podem então sobreviver com seus clientes resistindo a pagar pelo conteúdo e com suas fatias publicitárias minguando continuamente?

A verdade é que o bom jornalismo jamais perderá seu valor, porém o quanto as pessoas estão dispostas a pagar por ele se corroeu pela enorme quantidade de informação gratuita. Em outras palavras, os consumidores ainda veem valor no bom jornalismo, mas talvez não queiram mais pagar por ele se tiverem, de graça, um concorrente que ofereça um produto inferior, mas “quase tão bom”.

Se não alterarem seu produto e seu modelo de negócios, não há saída para os veículos e as perspectivas são ruins para o futuro. Em um mundo onde as pessoas têm cada vez menos tempo para tudo, vivem sob crescente pressão e todas as atividades parecem ter a obrigação de lhes trazer ganhos imediatos, o que as empresas de comunicação e os jornalistas precisam entender –e praticar– é que o resultado de seu trabalho é, mais que nunca, um serviço. Dessa forma, precisa ser re-empacotado para atender a demandas específicas de cada indivíduo, suas necessidades pessoais quanto a assunto, freqüência e horário de publicação e até formato editorial.

Essa resposta não chega a ser uma novidade: eu já a trombeteio há anos. Mas ela ainda causa arrepios em publishers e editores, pois subverte conceitos que norteiam o jornalismo desde que ele se profissionalizou, no século 19. Por isso, resistem bravamente às mudanças, por mais que sintam a água chegando ao pescoço. Ainda não se sentem seguros para dar o salto no abismo do qual estão à beira. Não confiam que a mesma tecnologia digital que os colocou nessa incômoda posição seja também o caminho para que se reinventem, sobrevivam e prosperem.

Se continuarem assim, só lhes restará vender a alma ao diabo. Exatamente a ferida na qual Assange enfiou o dedo hoje cedo.