Trump

A responsabilidade das redes sociais nos ataques à democracia

By | Tecnologia | No Comments

O mundo assistiu horrorizado, na quarta passada, ao Congresso americano sendo invadido e depredado por apoiadores do (ainda) presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O ato, sem precedentes na história do país, se torna ainda mais emblemático porque foi incentivado pelo próprio mandatário, que incendiou a turba, gritando palavras de ordem em frente à Casa Branca, protegido por um vidro blindado.

Mas isso não aconteceu de uma hora para a outra. Foi o dramático clímax de um movimento que se constrói há uma década, com uma hábil combinação de neurolinguagem, observação política, oportunismo e domínio de plataformas digitais.

No centro disso tudo, como principal ferramenta, estão as redes sociais. Tanto que, depois do ataque, Mark Zuckerberg suspendeu as contas de Trump no Facebook e no Instagram até pelo menos a posse de seu sucessor, Joe Biden, no dia 20. Já o Twitter baniu Trump de sua plataforma para sempre. As empresas justificaram as medidas como necessárias para evitar uma escalada ainda maior da violência provocada por Trump.

Mas tais ações pontuais são suficientes? Por que não foram tomadas antes? E ainda outra pergunta que não pode ficar para trás: as redes sociais sairão limpas dessa história?


Veja esse artigo em vídeo:


Trump sabia exatamente o que estava fazendo, mas para sorte da democracia, seu objetivo fracassou. Infelizmente não sem antes deixar um rastro de destruição e cinco mortos, incluindo um policial.

A pergunta que surge imediatamente nas mentes que separam o certo do errado é: como isso pôde acontecer na autoproclamada maior democracia do mundo e na incontestável maior potência militar da Terra?

Empresas, políticos e grupos de toda natureza descobriram nas redes sociais uma caixa de ressonância para fazer valer suas ideias, mesmo as mais grotescas. Potencializaram o risco de aglutinar um grande grupo de pessoas descontentes ou com necessidades não atendidas, e muito ódio para fazer valer suas pautas.

Trump soube identificar esses elementos no povo americano. Aproveitou-se do fato de os algoritmos de relevância das redes falarem diretamente com as camadas mais primitivas de nosso cérebro, responsáveis pela nossa autopreservação sem recorrer à racionalidade. Com isso, milhões de pessoas passaram a se recusar a ver as verdades que não lhe convinham e a combater qualquer um que dissesse o contrário, a todo custo.

O congressista republicano Mike Gallagher, que apoia Trump, descreveu bem o resultado. Segundo ele, o incidente no Capitólio (como é chamado o Congresso americano) transformou os Estados Unidos em uma “república de bananas”.

Trump digitalizou uma fórmula de dominação de massas há muito conhecida. Trata-se da cartilha escrita por Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolph Hitler, usada para legitimar as atrocidades do Fürher. Foi dessa maneira que o povo alemão da época apoiou a política de conquista de outros países, a expropriação de bens dos “inimigos do povo” e o confinamento e posterior extermínio de judeus e outros grupos. Isso parece monstruoso a nossos olhos, mas o que se vê hoje é a mesma coisa, apenas em uma etapa anterior; Por outro lado, atinge escala planetária, graças às redes sociais.

 

Enfrentado o homem mais poderoso do mundo

Bater de frente com o presidente dos Estados Unidos não é tarefa fácil. Agora que Trump dá suas últimas baforadas na Casa Branca, parece que os gigantes do Vale do Silício finalmente resolveram agir.

Ele se faz de vítima, dizendo que está sendo perseguido, que o querem calar. É exatamente isso, mas pelas barbáries que promoveu. E não foi sem lhe emitir diversos avisos prévios.

Trump disse na sexta que criará a sua própria rede social. Ninguém pode impedir uma pessoa de fazer isso, ainda mais um milionário. Mas dificilmente ele repetirá o sucesso que teve nas plataformas globais, com centenas de milhões de usuários.

Além disso, o Vale do Silício resolveu agir também contra os seguidores e contra o próprio discurso de ódio. Por exemplo, no sábado, a Apple e o Google tiraram de suas lojas o aplicativo da rede social Parler. A Amazon, por sua vez, suspendeu a hospedagem do serviço em seus servidores na AWS (Amazon Web Services).

O Parler é uma plataforma que diz se basear na “liberdade de expressão”. Ele se tornou o destino de apoiadores de Trump banidos do Twitter e do Facebook, onde destilam o pior de seu veneno. Além disso, aparentemente a “liberdade de expressão” só existe nele para usuários conservadores. Os progressistas são banidos da plataforma.

Isso não é liberdade de expressão!

É verdade que, para falar, basta te boca. Mas existem leis, e grande parte do discurso desses usuários pode ser facilmente enquadrado em crimes de intolerância, calúnia, difamação, injúria entre outros. Portanto, a liberdade de expressão não dá direito a alguém falar o que bem entender impunemente.

Trump abusou disso, mesmo antes de se tornar presidente. Criou essa máquina de desinformação, que provocou um “travamento cerebral” em grande parte da população. Isso acabou o levando à Casa Branca, onde seus danos foram multiplicados pelo poder natural do cargo.

É verdade que o contexto importa e faz toda a diferença. A invasão do Capitólio fez com que as plataformas se posicionassem diante de algo que elas sempre deixaram passar, apesar de saber que estavam alimentando um enorme monstro, que feria repetidamente seus termos de uso.

Resta agora saber se elas serão coerentes e terão o mesmo comportamento com outras autoridades do mundo que seguem a cartilha trompista, ou se continuarão alimentando esses “monstros regionais”.

O bode está na sala, com seu cheiro insuportável e mastigando o sofá.

 

A responsabilidade pelo que se diz

Todos nós, inclusive presidentes, somos responsáveis pelo que dizemos, pelo que propagamos. Essa é uma responsabilidade que sempre tivemos, mas da qual muitos andaram se esquecendo por influência do falso véu do anonimato das redes sociais e do “efeito manada”.

Se a verdade absoluta é difícil de ser encontrada, temos que, pelo menos, identificar o que é legítimo. E isso se define pela defesa de valores inegociáveis, como o direito à vida, à liberdade, à igualdade e a democracia.

Trump sempre atuou no extremo oposto. Ele chegou a desenvolver uma linguagem própria, que foi mapeada pela linguista francesa Bérengère Viennot. Ela analisou centena de discursos, entrevistas e tuítes de Trump, para escrever o livro “A Língua de Trump”.

A pesquisadora identificou que, para facilitar a compreensão por qualquer um, as falas de Trump têm sintaxe truncada, vocabulário muito raso e repetições incansáveis das mesmas palavras. São carregadas de agressividade, ameaças, ataques à reputação, sexismo e cinismo. E ele nunca se arrepende ou pede desculpas por nada. Do ponto de vista de forma, abusa de aspas, pontuações descontextualizadas e palavras e frases inteiras grafadas em maiúsculas.

Por fim, Trump é seu próprio referente. Ou seja, a única realidade é a dele e quem disser o contrário está automaticamente mentindo, especialmente se for a mídia.

Segundo o Washington Post, depois do ataque ao Capitólio, centenas de funcionários do Twitter exigiram que seus executivos suspendessem Trump permanentemente, classificando as ações da empresa até então como “insuficientes“. Os funcionários também solicitaram uma investigação sobre os últimos anos de ações do Twitter, que culminaram no ataque.

As redes sociais devem mesmo ser responsabilizadas pelo que está acontecendo. Trump as utiliza há uma década para promover o ódio, a segregação, o ataque a instituições democráticas e à ciência.

Seu legado é o de muita gente achar que pode fazer qualquer coisa, porque seriam “ungidas” por um suposto direito que as colocaria acima de tudo e de todos, e que suas ideias e suas vontades seriam mais importantes que as do próximo. Mais que isso: qualquer coisa que fizerem estaria automaticamente perdoado pelo usurpado conceito de “liberdade de expressão”.

A sociedade e a democracia se enfraqueceram. O Capitólio depredado não é causa, e sem sintoma desse processo, para não deixar nenhuma dúvida do caminho que infelizmente a humanidade está tomando.

Somos seres viáveis apenas enquanto nos organizarmos em uma sociedade construtiva, colaborativa e tolerante.

Trump deve ser apeado do poder por mecanismos legítimos, mesmo que isso lhe abrevie em apenas um dia seu mandato. Será um importantíssimo símbolo de que ninguém está acima da lei e nem pode fazer tudo, nem os presidentes.

Quanto às redes sociais, devem indubitavelmente arcar com o seu quinhão nesse ataque à democracia.

As ameaças à (e da) Internet

By | Jornalismo | No Comments

O aplicativo TikTok, da chinesa ByteDance, vem se destacando nas manchetes nas últimas semanas. E não é só porque ele se tornou o app mais instalado nesses meses de pandemia: de janeiro a junho, foram 315 milhões de instalações, o melhor desempenho de um app na história. O principal motivo foi ter sido alçado à posição de estrela na guerra que o presidente americano, Donald Trump, trava com a China, visando sua reeleição em novembro.

Mas o que um aplicativo de vídeos curtos pode ter de tão importante? Quanto das acusações de Trump são verdadeiras? E principalmente como isso impacta a vida de cada um de nós?


Veja esse artigo em vídeo:


Shakespeare escreveu: “há mais coisas no Céu e na Terra que foram sonhadas na filosofia”. Esse famoso trecho de Hamlet é muito propício ao momento.

Trump, como sempre, cria uma cortina de fumaça para esconder suas reais intenções. Mas há muito, muito mais em jogo, muito além até dos mesquinhos interesses do mandatário americano.

Algo que nos afeta a todos.

Primeiramente vamos contextualizar a história para quem não sabe do que se trata.

O TikTok vem sendo acusado de coletar muitas informações dos usuários, e de uma maneira mais sorrateira que o normalmente feito pelos aplicativos que instalamos despreocupadamente em nossos celulares. Até a famosa rede de hackers Anonymous chegou a levantar essa bandeira em julho.

Trump enxergou nisso uma oportunidade de fustigar ainda mais a China. Ele começou a afirmar, sem nenhum embasamento, que, além de coletar nossos dados, o TikTok os repassa ao governo chinês, como uma poderosa ferramenta de controle da população mundial.

A empresa e até o governo de Pequim sempre negaram isso. A plataforma até contratou, em maio, o americano Kevin Mayer como seu principal executivo, nunca tentativa de demonstrar que o TikTok é independente de seu país de origem.

Trump então ameaçou banir o TikTok do território americano. Foi quando, na semana passada, apareceu na história a Microsoft. A gigante do software disse que gostaria de comprar as operações do TikTok nos Estados Unidos, no Canadá, na Austrália e na Nova Zelândia. Ainda que relacionado a apenas esses países, isso lhe daria acesso aos códigos do programa.

Trump resolveu interferir na relação comercial entre duas empresas, o que é, no mínimo, inadequado. Em primeiro lugar, deu 45 dias para que a transação acontecesse. Depois disse que a compra deve ser total. E, por fim, o mais bizarro: disse que, qualquer que seja o valor que a Microsoft pague à ByteDance, uma “grande parte” deve ir para os cofres do governo americano: afinal, ele estaria permitindo que o negócio se concretizasse.

Parece que a conhecida liberdade empresarial americana virou fumaça, em uma narrativa digna de um ditador.

Mas, como já dito, essa história esconde um monte de elementos que vão muito além de Trump, do TikTok e da Microsoft. Coisas que nos afetam profundamente como cidadãos e como profissionais.

Quando eu comecei a desenvolver produtos digitais, bem lá no começo da Internet comercial, em 1995, ela despontava como um espaço idílico em que os dados trafegariam livremente, em que pequenos teriam o mesmo espaço dos gigantes, um mundo de oportunidades infinitas e democráticas.

Infelizmente aquela utopia se dissipou em poucos anos.

O tráfego livre dos dados se tornou um negócio de grandes conglomerados que descobriram maneiras cada vez mais eficientes para coletar nossos dados e organizá-los para serem transformados em informações comerciais valiosíssimas. Ou seja, a terra digital do “amor livre dos dados” rapidamente foi dominada por quem tinha muito dinheiro, de uma maneira que transformou profundamente nossas vidas.

O casamento dos smartphones com as redes sociais

O auge disso começou com a combinação de duas coisas. A primeira foram os smartphones, graças ao seu poder computacional imenso, que carregamos conosco o tempo todo. São a máquina perfeita de espionagem, pois nossa vida hoje acontece neles. A segunda foram as redes sociais, que criaram algoritmos e maneiras de convencimento para que compartilhemos alegremente todo tipo de informação pessoal.

Na verdade, essa combinação provocou uma incrível mudança cultural, em que sabemos que estamos sendo rastreados, mas que aceitamos que nossos dados sejam levados e usados, em troca de serviços supostamente gratuitos que essas empresas nos oferecem.

Trump sabe muito bem disso. Sua eleição como presidente dos Estados Unidos é parcialmente creditada a esse controle. Em março de 2018, explodiu o escândalo da empresa de marketing político britânica Cambridge Analytica. Ela foi contratada pela equipe da campanha de Trump para ajudá-los a convencer os americanos a votar no milionário. Para isso, a empresa roubou dados de 87 milhões de usuários do Facebook e os manipulou para, entre outras coisas, uma enxurrada de disparos em massa de fake news favoráveis a Trump.

O Facebook é a grande estrela nesse mundo de captura de informações dos usuários para fins às vezes inconfessáveis. Ninguém está mais bem posicionado que ele para isso.

Tanto que, na semana retrasada, Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, foi sabatinado por deputados americanos sobre o poder imenso de sua empresa, em um processo que pode levar à divisão da companhia em empresas menores. E ele não estava sozinho: também foram questionados Sundar Pichai, CEO do Google, Tim Cook, CEO da Apple, e Jeff Bezos, CEO da Amazon.

Ou seja, o TikTok é só a bola da vez, que ganhou destaque pela sua rápida adoção, mas também por causa de Trump.

Ele coleta nossas informações? Com certeza!

Ele faz isso de maneira mais agressiva e mais furtiva que outros aplicativos, como o Facebook? Há suspeitas não confirmadas.

Ele entrega nossas informações ao governo chinês? Não há nada sério que sugira isso.

Apagar o aplicativo vai nos deixar protegidos de ladrões de dados? Claro que não! No máximo, isso nos protegeria da ByteDance, mas não dos desenvolvedores de todos os outros aplicativos em nosso celular.

Não há inocentes nessa história! Talvez os mais inocentes sejamos nós mesmos, os usuários, que entregamos graciosamente a nossa informação para aplicativos que nos dizem como ficaremos mais velhos ou com qual celebridade nos parecemos.

É a versão do século XXI dos índios que, no início da colonização, trocavam toras de pau-brasil que cortavam por espelhinhos presenteados pelos portugueses. Hoje, com nossos dados, sim, governos podem mudar o eixo de influência geopolítica do mundo.

Outra empresa chinesa que vem sendo pesadamente alvejada por Trump é a Huawei, que hoje lidera a tecnologia 5G, próxima geração de transmissão de dados por celular. O presidente americano usa seu poder para que governos do mundo todo impeçam que equipamentos da Huawei sejam adotados por empresas nesses países. Ele sabe que a nação da qual venha a tecnologia 5G dominante terá monstruosa influência política e econômica no mundo na próxima década, no mínimo. Sem falar no oceano de dinheiro que isso vai gerar, pelos royalties, licenças, compras de equipamentos e suportes.

E, no meio de tudo, estamos nós, como pessoas e como empresas.

Não sejamos otários! Não compremos brigas que não são nossas!

A verdade é que, infelizmente, continuaremos sendo colonizados. Enquanto o Brasil não investir seriamente em pesquisa, incluindo aí pesquisa de base, sempre estaremos à mercê de tecnologias de outros países, com tudo que isso traz. E nós, ao invés de avançarmos na ciência, temos dado largos passos para trás nos últimos anos!

É duro dizer isso! Mas é a verdade.

A questão é saber se continuaremos sendo colonizados pelos Estados Unidos ou se passaremos cada vez mais a ser colonizados pelos chineses. Uma vez que não conseguimos declarar até hoje a nossa independência, temos que ver, pelo menos, o que é o melhor para cada um de nós.

Quanto ao TikTok, use por sua conta e risco. Você não irá para o Inferno se continuar dançando na frente da tela com ele.

Querem calar suas redes sociais

By | Tecnologia | No Comments

Uma nova batalha ocupa as redes sociais, afetando profundamente o cotidiano de todos nós, pela importância que elas ocupam em nossas vidas. Dessa vez, ela vem de políticos, que usam seus apoiadores nas mesmas redes, robôs e a força do cargo para tentar piorar o nível das discussões e até censurar essas plataformas.

O exemplo mais recente desse embate aconteceu na semana passada, porque o Twitter começou a marcar publicações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, limitando as suas visualizações, por enaltecerem a violência.

Isso deixou Trump furioso!


Veja esse artigo em vídeo:


O Twitter sempre fez vista grossa aos impropérios de Trump e de outros líderes mundiais em sua plataforma, mesmo quando violavam seus termos de uso. Na avaliação da empresa, apesar dessa violação frequente, essas mensagens tinham valor como notícia, então as toleravam.

Só que, por muito menos, usuários comuns eram banidos da plataforma!

Agora a empresa resolveu mudar e endurecer contra esses políticos. Em represália, Trump assinou, na quinta passada, uma ordem executiva que poderia, na prática, regular as redes sociais e intervir no que se publica nelas. Em outras palavras, para combater o que ele chama de censura a suas publicações, Trump promete censura e outras retaliações contra as redes sociais, e não apenas o Twitter.

O presidente americano diz que quer eliminar o viés político nas redes. Na verdade, quer eliminar o que for contra ele nesse ano em que tenta a reeleição, deixando o caminho livre para continuar falando o que quiser.

As regras das redes sociais são claras sobre o que se pode postar ali: não aceitam “fake news”, incentivo a violência, terrorismo, racismo, ações contra a vida e a saúde.

Especialistas afirmam que Trump não pode fechar empresas que não estejam violando a lei. E mesmo a censura que ele quer fazer não deve passar, pois bate de frente com a chamada Primeira Emenda, que protege a liberdade de expressão nos Estados Unidos.

Sem falar que ele depende totalmente dessas redes para governar e se reeleger. Trump só está onde está graças ao contato que ele tem com seus apoiadores via Twitter.

No Brasil, a história é muito parecida. Nas últimas semanas, Bolsonaro teve várias mensagens apagadas pelo Twitter por violar as suas regras, com notícias falsas sobre o Covid-19. Antes dele, isso só tinha acontecido com chefes de governo nos casos de Nicolás Maduro, da Venezuela, e do aiatolá Khamenei, do Irã. Outros políticos brasileiros também já tiverem conteúdos removidos, como Flávio Bolsonaro, Ricardo Salles e Osmar Terra. Bolsonaro também já teve conteúdos eliminados no Facebook e no Instagram, segundo a empresa por “causar danos reais às pessoas”.

Bom, daí surgem as grandes perguntas! Será que essas ações das redes sociais são um ataque à liberdade de expressão? Se forem, será que governantes podem promover represálias contra as redes sociais porque seus conteúdos estão sendo eliminados? E como ficamos todos nós, os usuários das redes, no meio disso tudo?

O fato é que as redes sociais, e o Twitter principalmente, são essenciais para a eleição dessas pessoas, além da sua própria manutenção no governo.

A política dessas plataformas de até então tolerar as publicações incendiárias desses grupos permitiu que essas pessoas crescessem em popularidade e atingissem seus objetivos. Por conta disso, agora as redes têm que lidar com suas plataformas terem se tornando oceanos de desinformação e de ódio, em um nível que representa uma ameaça à sociedade organizada.

Esses grupos sabem usar e abusam desses recursos como ninguém. Combinam “fake news”, discursos de ódio e um incrível entendimento dos algoritmos de relevância das diferentes redes para espalhar seus conteúdos com o uso de robôs e de influenciadores. Por isso, qualquer coisa que ameace essa operação é uma ameaça real a seus planos de poder.

Sem as redes sociais, eles não são nada!

Ao assinar a ordem executiva na quinta passada, Trump disse que estava fazendo aquilo para “defender a liberdade de expressão”. Isso, por si só, já são “fake news”! Liberdade de expressão não implica poder falar o que quiser, atacar pessoas, grupos ou instituições, disseminar informações que coloquem em risco a saúde da população ou até a democracia.

“Fake news” não são liberdade de expressão: são crimes!

A desinformação é uma das maiores mazelas do planeta atualmente, com potencial de destruir a sociedade e matar pessoas, como literalmente está acontecendo na pandemia do Covid-19. Basta ver as ações e os resultados no combate à doença no Brasil e nos Estados Unidos comparados a, por exemplo, a Nova Zelândia, que já praticamente eliminou o vírus em seu território ao seguir rigorosamente as indicações da ciência. E só agora o país da Oceania está flexibilizando as regras de distanciamento, e de maneira bem lenta.

Portanto, liberdade de expressão não prevê que o indivíduo possa falar absolutamente qualquer coisa, pois muitas coisas que são faladas constituem crimes definidos no Código Penal. E, em tempos de redes sociais em que os algoritmos de relevância se tornaram gigantescas caixas de ressonância de qualquer ideia, isso se torna ainda mais grave!

Por isso, as redes sociais podem e devem -sim- coibir essa prática! Isso inclui eliminar ou limitar publicações de qualquer pessoa, mesmo de presidentes, que violem seus termos e o próprio conceito de civilidade.

E uma última ressalva, que precisa ser feita: os grupos conservadores acusam as redes sociais de perseguição política, pois são os que têm mais publicações eliminadas. Só que o combate às “fake news”, a desinformação, ao discurso de ódio deve ser feito igualmente contra todos que pratiquem isso. Se há mais publicações do grupo A sendo eliminadas que as do grupo B, é porque o primeiro abusa muito mais dessas práticas.

Assim sendo, nenhum governante ou grupo de poder pode legitimamente tentar cercear as redes sociais por elas eliminarem suas publicações que promovem esses atos nocivos à sociedade. Isso é uma intimidação digna de uma ditadura, usando recursos ilegítimos e prejudicando toda a população.

E nós, os usuários, o que podemos fazer para ajudar?

Em primeiro lugar, precisamos parar de acreditar em tudo o que vemos nas redes sociais. Por mais que apoiemos um político, devemos ser críticos ao que ele publica, pois muitos fazem qualquer coisa para se manter no poder.

Nós somos a chave para combater as “fake news”. Se não interagirmos com elas e principalmente se não as compartilharmos, elas perdem a força! Verifique meios de comunicação sérios, consulte agências checadoras de fatos antes de espalhar qualquer coisa. Uma notícia falsa raramente resiste a uma busca bem feita no Google.

Esse é o nosso papel para garantirmos que as redes sociais não apenas continuarão funcionando, como ainda se tornarão um ambiente melhor para todo mundo.

A minha “verdade” vale mais que a sua “verdade”?

By | Jornalismo | No Comments

Foto: Creative Commons

No dia 10 de maio, a operação brasileira do Facebook anunciou a associação a agências de checagem de fatos para combater as “fake news”, as infames notícias falsas que inundam as redes sociais. Apesar de positivo, isso vem sendo combatido por organizações conservadoras. Elas acusam a iniciativa de ser, na verdade, uma ferramenta que a rede social teria criado para censurar seus conteúdos e “asfixiar a direita”, com “agências de esquerda decidindo o que é verdade”. Bem, essa campanha difamatória, por si só, já tem muitas características de “fake news”. Entretanto, como vivemos um perigoso momento em que versões valem mais que fatos, as pessoas estão extremamente intolerantes e ansiosas. Você já parou para pensar como anda a sua capacidade de conviver com ideias divergentes da sua?

Para entender melhor o caso, de agora em diante, os usuários do Facebook poderão marcar, na própria rede social, notícias que eles acreditem ser falsas. Esse material será então verificado pelas agências selecionadas no Brasil: a Lupa e a Aos Fatos, integrantes da International Fact-Checking Network (IFCN). Caso se confirme que a notícia postada é mesmo falsa, ela não será retirada da plataforma, mas sua exibição diminuirá consideravelmente no feed de notícias dos usuários, além de não poder mais ser promovida mediante pagamento. Páginas e usuários que publicarem muitas notícias falsas serão proibidos de usar anúncios para aumentar suas audiências.

Essa iniciativa já acontece nos EUA desde dezembro. Segundo o próprio Facebook, na terra do Tio Sam, foi verificada uma redução de 80% das “fake news” na plataforma. Apenas no primeiro trimestre, foram identificadas e removidas 583 milhões de contas falsas! E vale lembrar que, no material penalizado, havia igualmente conteúdos conservadores e liberais.


Vídeo relacionado:


Assim como está acontecendo aqui, grupos conservadores também torceram o nariz lá. Entretanto, o apedrejamento moral aqui tem sido pior, com profissionais das agências sendo pesadamente achincalhados. Trata-se de um comportamento inadmissível em uma sociedade civilizada, digno de quem não consegue conviver e aprender com diferenças, criando um ambiente hostil de “ou está comigo ou está contra mim”.

Até bem pouco tempo atrás, essa gritaria jamais seria levada a sério. Entretanto, hoje ela está aí, sendo disseminada por muita gente e embolando o meio de campo. E a culpa disso é, pelo menos em parte, das próprias redes sociais e seus algoritmos de relevância, que nos apresentam conteúdos com os quais já concordamos, criando uma “bolha de conformismo”.

Resultado: pessoas cada vez mais intolerantes a quem pensa diferentemente delas.

 

O que são as “fake news”?

As malfadadas notícias falsas, que estão no centro desse imbróglio, existem desde que o jornalismo surgiu, com a “Acta Diurna”, criada por Júlio César, em 69 aC. Como pode ser visto no vídeo abaixo, uma compilação das aparições do “leitor de notícias romano” na série “Roma”, da HBO, o teor do noticiário variava de acordo com os interesses de quem era o governante da vez.

O que diferencia uma “fake news” de um simples boato é que as primeiras têm um objetivo –político, econômico, ideológico– bem definido, apesar de que, na maioria das vezes, ele não apareça. Além disso, as “boas fake news” –se me permitem o abuso de linguagem– são construídas misturando fatos verdadeiros com outros mentirosos ou distorcidos, para aumentar a sua credibilidade. Por fim, para que elas prosperem, precisam ser “plantadas” –ou seja, apresentadas diretamente– em pessoas que gostariam que aquela informação fosse de fato verdadeira, para que comecem a se espalhar com força pela rede, graças aos algoritmos.

Elas também são bastante “democráticas”, atendendo a interesses conservadores ou liberais indistintamente. Basta ver o estudo do BuzzFeed do final de 2016 que demonstrou que as notícias falsas sobre a Operação Lava-Jato, conservadoras ou liberais, geraram mais engajamento que as verdadeiras. Nos EUA, aconteceu o mesmo, com as ”fake news” engajando mais que o jornalismo na reta final da campanha presidencial.

De fato, o termo “fake news” explodiu justamente com as suspeitas de que elas teriam ajudado Donald Trump a se eleger presidente dos EUA, especialmente as publicadas no Facebook. Mesmo assim, por bastante tempo, Mark Zuckerberg tentou se eximir de qualquer culpa nisso, argumentando que sua empresa é apenas uma plataforma, não podendo ser responsabilizada pelo que as pessoas publicam ali, e que as tais notícias falsas não teriam poder de impactar uma eleição.

Que me desculpe o Mark, mas qualquer empresa que tenha 2,2 bilhões de usuários ativos, ainda mais nesse ramo, não pode se eximir de uma responsabilidade como essa. E, de fato, isso foi escancarado pelo escândalo que explodiu em março, que comprovou que a empresa Cambridge Analytica usou recursos oferecidos do Facebook para roubar dados de 87 milhões de seus usuários para justamente disseminar “fake news” para ajudar na eleição de Trump.

Algo precisava ser feito para conter esse incêndio florestal.

 

Se não é pelo amor, é pela dor

Justiça seja feita, o Facebook já vinha tomando algumas atitudes antes do escândalo da Cambride Analytica para tentar conter as “fake news”. A mudança de seu algoritmo no dia 11 de janeiro, que enfureceu empresas (inclusive de comunicação), foi uma delas. Outra coisa é justamente essa parceria com as agências de checagem de fatos.

Fico feliz de ver que o Facebook esteja, de alguma forma, assumindo a sua responsabilidade nesse cenário. Arrisco a dizer que as “fake news” são uma das maiores ameaças a democracias de todo mundo no momento. O ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, chegou a dizer que as eleições brasileiras poderiam chegar ao extremo de ser anuladas se fosse comprovado que “fake news” foram decisivas para a vitória de qualquer candidato.

Além desses macroefeitos, essa praga está nos transformando em uma sociedade que não acredita em mais nada e mais ninguém. Isso é perigosíssimo! Se essa tendência de descrença se consolidar, perderemos a nossa capacidade de inovar pelo trabalho em equipe e pela construção coletiva de ideias. Estagnaremos nossa evolução como comunidade e como indivíduos! E, para piorar, seremos cada vez mais usados como massa de manobra de vivaldinos políticos e ideológicos.

Bom para eles! Péssimo para nós!

Nosso crescimento depende da contraposição de ideias, especialmente de ideias complementares e até mesmo antagônicas! Isso vale para nossa formação escolar, para nosso desemprenho profissional, para nossas atitudes como cidadão, para nosso papel familiar. Disse certa vez o grande Nelson Rodrigues: “Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”.

Portanto, ainda bem que o Facebook firmou esse acordo com essas agências. A sociedade precisa disso! Talvez não seja ainda uma ação perfeita, mas já é algo. Devemos não apenas apoiar iniciativas como essa, como também disseminar o seu uso. Afinal, apenas o conteúdo mentiroso será impactado por essa ela, qualquer que seja o seu alinhamento.

E quem não deve não teme


Artigos relacionados:


Você acha que os escândalos vão matar o Facebook?

By | Tecnologia | No Comments
A capa de junho de 2011 da edição americana da revista Mad já satirizava “as 50 piores coisas do Facebook”, muito antes das “fake news” - Foto: reprodução

A capa de junho de 2011 da edição americana da revista Mad já satirizava “as 50 piores coisas do Facebook”, muito antes das “fake news”

Neste sábado, a hashtag #FacebookPodeAcabar era “trending topics” no Twiter, ou seja, um dos assuntos mais debatidos na rede naquele momento. É verdade que o Facebook está sendo alvejado por todos os lados, suas ações estão caindo, está perdendo usuários, ex-executivos estão criticando publicamente a empresa. Mas dizer que ele vai acabar por causa disso é, no mínimo, uma baita inocência! Mas deve, sim, sofrer grandes transformações. E isso pode ser uma boa notícia para cada um de nós. Mas também temos que ficar mais espertos!

O Inferno se instalou na vida de Mark Zuckerberg e seus amigos quando o Facebook foi acusado de ajudar a eleger Donald Trump, na campanha à presidência dos EUA em 2016. Na época, Zuckerberg disse que as acusações eram “loucura”. Mas a situação se agravou ao longo de 2017, com as “fake news”, as infames notícias falsas, tomando o seu reino de assalto.

No dia 11 de janeiro, o Facebook anunciou mudanças em seu sistema para tentar combater as “fake news”, que desagradaram muita gente e levantaram ainda mais dúvidas sobre a sua capacidade de resolver o problema. Mas o caldo entornou de vez no dia 17 de março, quando The New York Times publicou que a empresa Cambridge Analytica havia usado, sem autorização, dados de 50 milhões de usuários do Facebook para favorecer a campanha de Trump. Escândalo total!

Zuckerberg demorou cinco dias para se pronunciar sobre o caso, o que aumentou ainda mais a desconfiança. As ações despencaram 6,7% no primeiro dia. Foi a maior queda diária da história do Facebook, gerando uma perda de US$ 35 bilhões em valor de mercado. As ações continuaram caindo, arrastando também outras empresas do setor. Isso é particularmente perigoso para uma empresa que vale cerca de US$ 453 bilhões (valor de 2 de abril), dos quais “apenas” US$ 14 bilhões são de ativos físicos.

Governos europeus e dos EUA, que já vinham tentando regular as atividades do Facebook, vieram à carga. O Congresso dos EUA convocou Zuckerberg para depor em vários comitês, entre os quais o Comitê Judiciário do Senado, o que deve acontecer nos próximos dias.

Mas o que isso tudo significa para você?

 

Como você dá dinheiro ao Facebook

Charge dos porquinhos

O Facebook é a maior rede social do mundo, com mais de 2,1 bilhões de usuários ativos (que se conectam a ele pelo menos uma vez por mês). Você provavelmente é um deles, e talvez faça parte do contingente de 1,4 bilhão de pessoas que acessam a rede todos os dias.

Especialmente graças ao seu aplicativo para smartphones, tem muita gente que, na prática, nunca sai da rede. Isso permite também que uma infinidade de aplicativos de terceiros use o Facebook como ferramenta de autenticação para seus próprios sistemas.

O negócio do Facebook se sustenta no tripé de manter os usuários vidrados em suas telas, na coleta de seus dados e no seu uso para vender publicidade altamente direcionada a esses mesmos usuários. Portanto, quanto mais as pessoas usam a plataforma, mais pegadas digitais deixam, o que é ótimo para o negócio.

Além da publicidade, o Facebook compartilha esses dados com empresas que desenvolvem os aplicativos que rodam em sua plataforma, para seus próprios fins. Isso tem um valor inestimável, e está na essência do negócio de redes sociais e de sistemas operacionais, como iOS, Android e até Windows. Mas esses dados só são compartilhados com os desenvolvedores se o usuário explicitamente autorizar.

É aí que mora o problema!

 

Como se constrói um escândalo

A Cambridge Analytica conseguiu acesso aos dados dos 50 milhões de usuário graças a esse recurso e à infeliz característica de as pessoas concederem acesso a seus dados sem ler o aviso que lhes é mostrado antes de usarem um aplicativo. Esses avisos detalham tudo que será compartilhado com os desenvolvedores, mas o pessoal prefere clicar no botão “concordo” sem ler.

Os dados desse escândalo foram coletados por um aplicativo chamado “This Is Your Digital Life” (“Esta É a Sua Vida Digital”), aparentemente uma brincadeira inofensiva, mas que levava embora um caminhão de informações dos usuários e também de seus amigos. Esses dados eram depois organizados seguindo uma metodologia criada pelo Centro de Psicometria da Universidade de Cambridge (Reino Unido), capaz de traçar o perfil psicológico de uma pessoa em apenas um segundo, a partir de seus passos em redes sociais.

Como o instituto se recusou a trabalhar com a Cambridge Analytica, a empresa contatou os serviços do pesquisador Aleksandr Kogan, que na época trabalhava na universidade e conhecia aquele algoritmo. Kogan, que também desenvolveu o aplicativo, afirma estar sendo agora usado como bode expiatório pela Cambridge Analytica e pelo Facebook: ele garante que não sabia que a sua extração e classificação de dados seriam usadas na campanha de Trump.

O fato é que a Cambridge Analytica foi antiética e talvez criminosa pelo uso que fez dos dados coletados e por ferir os termos de uso do Facebook. Esse, por sua vez, criou um sistema que permite essa violação e rompeu o elo de confiança com seus usuários. Esses, por último, compartilharam alegremente suas informações sem prestar atenção no aviso que o próprio Facebook lhe dava.

Ou seja, todos têm uma parcela de culpa.

 

Como isso afeta você

A verdade é que o Facebook não tem como controlar o que as empresas fazem com os dados dos seus usuários depois que eles são extraídos de sua base. E isso é crítico, pois é bastante razoável supor que um monte de outros desenvolvedores também faça usos indevidos dessas informações, por mais que isso contrarie as regras do próprio Facebook.

A empresa está preocupada, claro. Zuckerberg chegou a citar as eleições do Brasil como um dos grandes eventos desse ano em que darão atenção redobrada, para evitar que manipulações de dados e “fake news” comprometam os resultados. Várias medidas estão saindo da “sala de guerra” em Menlo Park (Califórnia), sede da empresa. Entre elas, o Facebook vem prometendo, cada vez mais, auditar aplicativos, restringir o acesso dos desenvolvedores aos dados dos usuários e ajudar esses últimos a controlar como empresas acessarão suas informações.

Fica pergunta: o Facebook tem como verdadeiramente proteger seus usuários afinal?

A resposta: claro que não!

O elo fraco nessa história somos todos nós, que ficamos à mercê desse ecossistema digital em que estamos enfiados até o último fio de cabelo. E a nossa exposição para fins comerciais está na essência disso. Portanto, isso não mudará!

Os diversos atores nesse emaranhado contam com a inocência ou descuido das pessoas para atingir os seus fins. Basta ver o abrangente estudo sobre “fake news” que foi capa da revista Science, a melhor revista científica do mundo, na edição de 9 de março. Entre outras conclusões dos pesquisadores, as notícias falsas só “pegam” porque nós -e não sistemas automatizados- nos engajamos verdadeiramente com elas. Segundo a equipe, as “fake news” alcançam mais pessoas, são mais replicadas e fazem isso tudo mais rapidamente que as notícias verdadeiras. Como? As pessoas espalham as notícias falsas porque elas parecem trazer mais novidades que as verdadeiras. E isso mexe com nossas emoções.

Ou seja, caímos como patos!

Portanto, a melhor maneira de reduzir o crescimento das “fake news” e o roubo de nossas informações para fins criminosos é a conscientização das pessoas. Nós somos, em última instância, os detentores do poder para evitar que esses cânceres se espalhem ainda mais.

Essa consciência deve ser exercitada em cada atividade diária, em cada compartilhamento, em cada aplicativo iniciado. Não estou dizendo que nos tornemos uns chatos, que cancelemos nossas contas nas redes sociais ou paremos de usar smartphones. É claro que não! Mas, por favor, prestemos mais atenção e sejamos menos “bobinhos” em acreditar em tudo que nos dizem ou nos ofereçam.

Caso contrário, continuaremos contribuindo para uma sociedade pior e mais falsa para todos. E ninguém quer isso, não é mesmo?


Artigos relacionados:


Se a imprensa é crítica para a sociedade, por que tanta gente mete o pau?

By | Jornalismo | No Comments

Foto: reprodução

Há alguns dias, vi uma reportagem que me deixou apreensivo. Tratava de um grupo conservador nos EUA cujo objetivo é criar armadilhas para jornalistas, para que sejam gravados dando depoimentos que possam lhes causar transtornos, desqualificando o profissional e seu veículo. Porém o mais perturbador é saber que essa não é uma atitude contra a imprensa isolada, nem a mais pesada, e que observo tal coisa também no Brasil. Isso me leva à pergunta do título desse artigo. Aliás, cá entre nós, o que você acha da imprensa, especialmente da “grande imprensa”?

Apesar de o Projeto Veritas, retratado na reportagem acima, afirmar que não faz política, claramente é o contrário disso, pois todas as vítimas são veículos que fazem oposição à administração Trump. Não foi esse governo que inventou essa metodologia de desacreditar os veículos contrários a ele. Na verdade, quanto mais autoritário é um governo, mais a imprensa é apresentada como uma inimiga a ser combatida, e mais as pessoas que apoiam o regime se engajam nessa cruzada contra ela. Entretanto, não se engane: no final, invariavelmente quem perde é a sociedade.


Vídeo relacionado:


Isso sempre foi assim, e provavelmente sempre será. Mas quem elevou esse processo a um novo patamar de eficiência foi Hugo Chávez, quando assumiu o poder em 1999. O finado ditador venezuelano difundiu o conceito de que a imprensa contrária a ele era, no final, contrária ao “povo venezuelano”, legitimando assim todo tipo de censura e perseguição. Essa ideia nefasta se espalhou pela América Latina, chegando agora aos EUA, com Trump.

Já viajei por vários países e pude comprovar inequivocamente como o desenvolvimento de uma sociedade está sempre relacionado de perto à qualidade de sua imprensa. Isso acontece porque uma boa mídia possui não apenas o papel de informar, mas também o de formar o cidadão. E os veículos de comunicação têm o dever de continuamente investigar o governo, para que as falcatruas não prosperem, qualquer que seja o alinhamento político da situação.

Então por que cresce esse fenômeno de agressão moral e até física contra jornalistas?

 

Polarização e “fake news”

Vivemos uma polarização política sem precedentes no cidadão comum. Em grande parte, isso se deve aos algoritmos de relevância das redes sociais, que insistem em nos mostrar apenas aquilo que gostamos, com que concordamos, que nos mantém em nossa zona de conforto. Pode parece muito bacana a princípio -afinal, dessa maneira, usamos cada vez mais a rede social. Só que isso pode ter um resultado perverso: como não somos expostos a posições contrárias, a tendência é que nossos preconceitos sejam cada vez mais reforçados.

Daí para a intolerância política é um pulo! Mesmo que tenhamos uma pequena inclinação para certa ideologia, podemos, em pouco tempo, nos pegar gritando palavras de ordem, insultando opositores e bloqueando antigos amigos que pensem de maneira diferente.

Nesse cenário, não há imprensa boa! Pois a função de um veículo de comunicação não é agradar ninguém. Muito pelo contrário: ele incomoda muita gente! Ou não seria jornalismo: seria relações públicas!

O mais inusitado dessa história é que vejo empresas de comunicação cada vez mais sendo atacadas por conservadores e liberais ao mesmo tempo. E o argumento é sempre que os veículos estão “vendidos” ao outro lado. Até a Rede Globo, tradicionalmente associada a alas mais conservadoras, vem sendo acusada de “ficar vermelha”.

Esse mundo está ficando muito louco!

 

Afinal, os veículos se vendem?

Nessa hora, é preciso diferenciar entre ter opinião e ser vendido.

Pela nossa natureza humana, não podemos ser totalmente isentos. O que não quer dizer que não possamos ou não devamos ser profissionais. E isso vale para jornalistas e veículos de comunicação. Não há nenhum problema se qualquer um deles escolher um lado, inclusive político. Na verdade, deveriam escolher e divulgar ao público sua decisão!

Entretanto adotar um lado não significa ignorar o outro. E definitivamente não significa calar ou maquiar o noticiário para que o seu lado sempre pareça melhor e o outro pior. Ter um lado significa que se torce por ele, mas que o jornalista continuará realizando seu trabalho seguindo os preceitos éticos, que incluem ouvir sempre o outro lado, e noticiar sua opinião adequadamente, por mais que a odeie.

Infelizmente temos visto muito exemplos na imprensa que parecem ter esquecido os pilares do bom jornalismo. Peguemos os exemplos abaixo, da Veja e da Carta Capital. São dois lados extremos da mesma moeda. Comparar o conteúdo de uma com o da outra dá a impressão que estão noticiando a mesma coisa em realidades alternativas.

Mas não, não estão. Estão no mesmo país, na mesma época. E nenhuma delas fala totalmente a verdade, nem totalmente a mentira. Mas, ao carregar nas tintas tão pesadamente, o público não consegue mais sequer formar uma opinião bem embasada.

Esse tipo de obra de ficção serve muito bem para alimentar os ânimos irracionais e aos interesses de grupos políticos, econômicos e ideológicos. Plantam essas informações enviesadas, que depois alimentarão a sede dos que querem fazer valer suas teses a qualquer custo em todo lugar, de redes sociais a mesas de bar. De quebra, favorecem o surgimento de grupos patéticos como o Projeto Veritas, que, para atingir seus objetivos, chegam a usar métodos que dizem combater, como notícias falsas, distorções de fatos e falsidade deliberada.

Esse constante chute na boca da verdade abriu caminho para uma das maiores pragas modernas: o “fake news”, “notícias falsas” ou “desinformação”. Não o “fake news” que Trump vive trombeteando, que são notícias verdadeiras que o desagradam. Eu me refiro a um material cuidadosamente produzido para parecer jornalístico e verídico, mas que enviesa os fatos (ou deliberadamente traz mentiras deslavadas) para fazer com que as pessoas comprem uma ideia. E -pior que isso- que a distribuam.

Como diz o ditado: se contarmos uma mentira mil vezes, ela pode virar uma verdade.

 

Dá um tiro na cabeça, que dói menos

O “fake news” é um perigosíssimo risco à democracia. Pois ele põe a própria imprensa em risco! Diante de tanta mentira em todas as mídias e em todas as redes sociais, as pessoas estão começando em perder a fé no noticiário. E quem pode culpá-las? Ou o conteúdo que lhes é oferecido é mentiroso mesmo, ou é verdadeiro, mas, de tão enviesado, acaba passando uma mensagem falsa.

Resultado: as pessoas estão abandonando os veículos tradicionais! E, sem público, não há anúncios. Como essas empresas também têm uma dificuldade crônica em aceitar que seu modelo de negócios histórico baseado em assinatura e publicidade não tem mais lugar no mundo, não é de se estranhar que vemos título após título morrendo! Ficam então naquele chororô ridículo, tentando jogar sua culpa em outra coisa, como o meio digital.

Ah, mas que preguiça dessa gente! Os veículos tradicionais estão com sua reputação completamente carcomida -e, por consequência, também suas finanças- porque as pessoas não são trouxas! Querem se salvar? Melhorem seu produto! E isso significa parar de praticar esse antijornalismo, mudar seu modelo de negócios e reformatar seu produto para atender às novas exigências do consumidor. Isso significar mudar basicamente tudo? Sim! Mas, já que não fizeram isso aos poucos, ao longo dos últimos 20 anos, terão que fazer agora de uma vez.

Caso contrário, veremos cada vez mais surgir esses movimentos radicais (conservadores e liberais!) apontando o dedo para a imprensa, acusando-a pelos males do país. Quando, na realidade, é a mesma imprensa que cuida (ou deveria cuidar) para que os verdadeiros males e malfeitores não prosperem na sociedade.

Sem uma imprensa livre e forte, nunca sairemos desse buraco. Mas ela tem que fazer a sua parte.


Artigos relacionados:


16 de dezembro: Inclusão, qualidade de vida e diversão na Melhor Idade – Conexão Melhor Idade – Workshop (3 horas)


Você está sendo manipulado… e pode estar achando isso engraçado!

By | Jornalismo | 5 Comments

Foto: Visual Hunt/Creative Commons

Desde o ano passado, os meios digitais estão sob fogo cruzado, acusados de disseminar uma avalanche de mentiras. A “desinformação”, como tem sido chamado esse fenômeno de plantar e promover notícias falsas, não é nova e nem nasceu no meio digital, mas as redes sociais transformaram essa malandragem em um negócio gigantesco, que movimenta milhões de dólares e pode ter consequências desastrosas. Graças à criatividade de quem planta esses boatos, tais “notícias” parecem tão críveis quanto as verdadeiras. Pior: por conta dos algoritmos das redes sociais, acreditamos piamente na bobageira e até gostamos dela, ajudando na sua pulverização.

Pronto: está criado um eficiente e perigosíssimo mecanismo de manipulação social, e somos engrenagens fundamentais dele. A questão é: como escapar dessa máquina de moer mentes?


Vídeo relacionado:


O auge da gritaria foi a suspeita de que o Facebook tenha auxiliado –por omissão– Donald Trump a se tornar presidente dos EUA. A rede de Mark Zuckerberg teria sido fundamental para a vitória do bilionário republicano  por ter disseminado material falso que o enaltecia, assim como conteúdos igualmente mentirosos que prejudicariam sua concorrente, a democrata Hillary Clinton (e o inverso também aconteceu, diga-se de passagem).

Digo “por omissão” porque o Facebook teria feito muito pouco (ou nada) para evitar que as linhas do tempo de seus usuários fossem inundadas com conteúdo falso que poderia influenciar suas decisões, abrindo espaço para os boateiros deitar e rolar para atingir seus objetivos. O próprio Zuckerberg disse, logo após a vitória de Trump, que “a ideia de que notícias falsas no Facebook influenciaram a eleição é maluca”.

Mas ele e a empresa tiveram que se retratar diante dos fatos. O site BuzzFeed publicou um levantamento, feito a partir de dados públicos do próprio Facebook, que demonstrou como, na reta final da campanha, notícias falsas relativas à eleição americana geraram mais curtidas, comentários e compartilhamentos dos usuários da rede que as notícias verdadeiras!

E, se você acha que isso acontece apenas nos EUA, está muito enganado. A operação brasileira do BuzzFeed usou a mesma metodologia para chegar à conclusão que de notícias falsas sobre a operação Lava-Jato geram mais engajamento que as verdadeiras. E atualmente, na França, o candidato favorito à presidência, Emmanuel Macron, gasta seu tempo se defendendo de boatos plantados na Internet. Nesse caso, há até a suspeita de envolvimento de hackers russos, que estariam favorecendo a líder da extrema-direita Marine Le Pen, que costuma elogiar o presidente russo, Vladimir Putin.

Nada disso é coincidência. E nem deveria ser surpresa.

 

Controlando mentes

É verdade que o Facebook não é um veículo de comunicação. Como tal, em tese, poderia dizer que não é obrigado a verificar o que seus usuários publicam na rede. Pode argumentar até que checar a veracidade disso é tecnicamente muito difícil, além de que poderia estar flertando com a censura, se começasse a fazer restrições ao que fosse publicado nele.

Todos são pontos válidos e, de certa forma, já foram usados. Mas um sistema que desempenha papel central na vida de 1,9 bilhão de pessoas em todo mundo não pode simplesmente “lavar as mãos” diante de suas responsabilidades como gigantesco formador de opinião sobre potencialmente qualquer assunto. Tudo por causa do algoritmo de relevância, que seleciona o que cada um de nós recebe em nossas linhas do tempo, com base no que vimos e interagimos, nos nossos amigos, no que eles fazem, e mais uma infinidade de variáveis, em uma caixa-preta que só a empresa consegue abrir.

Acha exagero? Pois um pesquisador do próprio Facebook já demonstrou cientificamente a influência do algoritmo de relevância no que as pessoas pensam. Adam Kramer realizou em 2012, uma pesquisa que demonstrou ser possível “transferir estados emocionais” a pessoas apenas manipulando o que veem online. No experimento, os feeds de notícias de 689.003 usuários (1 a cada 2.500 na época) foram manipulados pelo sistema por uma semana. Metade deles ficou sem receber posts negativos; a outra metade não viu nada positivo. Análises automatizadas confirmaram que usuários expostos a posts neutros ou positivos tendiam a fazer posts mais positivos, enquanto os expostos a posts neutros ou negativos tendiam a fazer posts mais negativos!

Em outras palavras, Kramer atuou decisivamente no humor de quase 700 mil pessoas apenas manipulando seus feeds de notícias. O paper foi publicado na prestigiosa “Proceedings of the National Academy of Sciences of USA”. Vale lembrar que o mesmo Kramer, em outra ocasião, já tinha aumentado o comparecimento dos americanos às urnas, também manipulando seus feeds. Isso em um país em que não é obrigatório votar.

Como fica a empresa diante disso?

 

Mea-culpa e plano de ação

Diante do óbvio, a turma de Mark Zuckerberg decidiu mostrar serviço. E não está sozinha. Facebook e Google resolveram se mexer e criar mecanismos para tentar combater as notícias falsas, como não entregar anúncios de seus sistemas comerciais a sites conhecidos por promover a desinformação. O Facebook também lançou, logo após a eleição de Trump, sete medidas para minimizar as notícias falsas em sua rede, e, mais recentemente, um projeto para trabalhar com veículos de comunicação para melhorar a qualidade do que trafega pela rede. No Brasil, acadêmicos, jornalistas e empresas de mídia também criaram um grupo para tratar do problema.

Todas essas iniciativas são muito bem-vindas, porém antevejo um eterno jogo de gato e rato. Veículos e plataformas trabalharão de um lado para combater a desinformação, enquanto os boateiros encontrarão maneiras novas e ainda mais criativas de enganar as pessoas com seu material “fake”. Algo muito parecido com o que vemos há uns 30 anos entre fabricantes de antivírus para computadores e os desenvolvedores dessas pragas digitais.

E quanto a nós? Podemos fazer alguma coisa para ajudar?

Claro que sim!

 

Não alimente os trols

Sabe aquela turma que compartilha posts no Facebook sem sequer ler o texto? Aquele pessoal que reage impulsiva e emocionalmente diante de uma foto ou de um título? Esses são o principal alvo dos boateiros, pois espalham tudo que combina com o que acreditam, sem se preocupar se é verdade ou não.

O problema é que os algoritmos de relevância garantem que sejamos impactados por aquilo que gostamos, concordamos, acreditamos, mesmo coisas que reforcem nossos piores preconceitos. E aí baixamos nossas defesas e entramos no jogo alegremente.

Isso já tem até nome: “pós-verdade”, termo escolhido como “palavra do ano” pela Universidade de Oxford, que a descreve como algo “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”.

Portanto, a regra número um para combater a desinformação é bastante simples: desconfie sempre! Além disso, algumas atitudes podem ajudar a verificar a confiabilidade de um conteúdo antes de o espalhar para seus amigos.

A primeira coisa é verificar a fonte da notícia. É verdade que ultimamente veículos tradicionais já não são mais uma garantia de seriedade e precisão no seu noticiário, mas eles ainda carregam alguma reputação que os coloca em um patamar superior ao de sites completamente desconhecidos, pelo menos a princípio. Verifique também se o site é mesmo legítimo, ou uma cópia safada de um veículo famoso.

Sites desconhecidos não são necessariamente ruins. Se estiver em dúvida, procure saber mais sobre sua reputação, por exemplo pesquisando no Google seu nome junto com a palavra “falso”.

Desconfie de sites com uma quantidade absurda de publicidade: eles podem criar notícias apelativas apenas para ganhar mais dinheiro. Da mesma forma, publicações com títulos com tudo escrito em LETRAS MAIÚSCULAS ou fotos exageradas normalmente estão associadas a material criado para pegar trouxas.

Nunca é demais dizer: confie sempre nos seus instintos. Se uma notícia provoca emoções muito intensas em você, sejam boas ou ruins, redobre os cuidados. Verifique se ela também aparece em outros veículos, especialmente aqueles com mais credibilidade. Veja também se traz links ou referências externas que ajudem a corroborar o que diz, além de citações de pessoas bem identificadas (nada de “um pesquisador de uma universidade americana de renome”).

E, por fim, um pedido óbvio: leiam a notícia antes de qualquer tipo de interação! Nunca, jamais se contentem com o post no Facebook! E, mesmo depois de clicar no link, leiam além do título e do primeiro parágrafo. Esse exercício pode ser muito “esclarecedor”.

Se o Facebook tem a sua parcela de culpa na eleição do Trump e eventuais outras mazelas da humanidade, nós, usuários, também temos. Não podemos mudar todo mundo, mas podemos, pelo menos fazer a nossa parte e mudar nós mesmos, criando um uso mais consciente, crítico e construtivo da rede. E, quem sabe, ajudar quem estiver no nosso círculo de amigos e contatos. O mundo agradecerá quem fizer isso.

E nós seremos menos manipulados.


Artigos relacionados: