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Por que ainda temos chefes tóxicos

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Que tipo de chefe você tem? Ou que tipo de chefe você é?

Muito se discute sobre a diferença entre um simples chefe e um verdadeiro líder: você já deve ter lido incontáveis artigos sobre o tema.

Infelizmente, nessa pandemia, vimos várias histórias de chefes tóxicos que abusaram de sua posição com seus subordinados em home office. Justamente em um período de grande angústia pela transformação digital forçada e sem planejamento.

Mas uma pesquisa da Fundação Instituto de Administração (FIA) divulgada no mês passado traz um alento sobre as chefias brasileiras. Segundo o levantamento feito com cerca de 150 mil profissionais de mais de 300 empresas de diferentes portes e segmentos no país, os chefes brasileiros são “inspiradores”, “educadores” e “democráticos”.

Se isso já era importante antes, agora, com muitas equipes trabalhando em maneira distribuída, pode significar a diferença entre um time eficiente, entrosado e feliz, e um grupo de pessoas que não conseguem produzir juntas.


Veja esse artigo em vídeo:


Mas o que faz um chefe ser um verdadeiro líder? Por que não temos mais pessoas assim?

Não são só as crianças que aprendem com o exemplo: nós também! No ambiente corporativo, esse exemplo vem do chefe. Infelizmente também podemos aprender coisas ruins com um chefe tóxico.

A função do chefe é coordenar o trabalho de seus funcionários para atingir os objetivos da empresa. Portanto, quando se é subordinado, você é avaliado pela sua performance individual. Quando se é chefe, você é avaliado pela performance da equipe.

Entretanto, a maioria das pessoas assume uma posição de chefia sem ter sido preparada para isso. E daí passa a usar a máxima “manda quem pode, obedece quem tem juízo”.

Nada poderia estar mais errado!

E eu posso confirmar isso pela minha experiência pessoal como subordinado e como líder.

Ao longo da minha carreira, trabalhei para empresas bem diferentes, de várias nacionalidades. Tive a alegria de ter ótimos líderes e o desprazer de ter chefes ruins, felizmente mais do primeiro grupo. E posso afirmar categoricamente que os meus resultados e os das empresas como um todo eram muito melhores quando existia uma boa liderança.

Sabe aquela história da diferença entre o chefe e o líder?

O chefe é o que segue a máxima acima. Ele suga o trabalho de seus subordinados, como um parasita corporativo. Nesse cenário, apenas ele cresce, pois não dá visibilidade à equipe.

Essa é uma visão míope desse chefe e do chefe dele, que não percebe o mau instalado ali. Nessa gestão, o funcionário não oferece o melhor que tem. Adquire uma postura reativa de fazer só o que lhe mandam. Ele se desenvolve pouco e, caso acabe sendo chefe um dia, possivelmente repetirá esse padrão, criando um círculo vicioso em que todos perdem.

 

Os tipos de chefes

A pesquisa “FIA Employee Experience”, realizada há 40 anos, comprova que as empresas com melhores resultados são aquelas que têm verdadeiros líderes nas chefias.

Os dados foram coletados em uma pergunta de múltipla escolha. O chefe “inspirador”, aquele que inspira os funcionários e a equipe confia nele, aparece em 26% dos casos. Já 17% dos chefes foram considerados “educadores”, que se focam principalmente em desenvolver a equipe. Os “democráticos”, que consideram a opinião de todos nas decisões, representam 15% das chefias. Todos esses são considerados estilos positivos, somando 58% das lideranças das empresas pesquisadas.

Na ponta oposta, 9% dos chefes foram classificados como “coercitivos”, aqueles que são considerados autoritários e que não ouvem seus subordinados.

No meio do caminho, há ainda dois perfis considerados neutros. O primeiro são os “maternais”, que, segundo a pesquisa, colocam as pessoas em primeiro lugar e evitam conflitos. E, por fim, os “direcionadores”, que têm alto desempenho e cobram o mesmo de sua equipe, pressionando por metas. Cada um apareceu em 10% das respostas.

Os 13% restantes dos respondentes preferiram não classificar o estilo das suas lideranças.

Pode-se argumentar que as empresas que participam desse tipo de pesquisa, que é totalmente voluntária, de alguma maneira se preocupam com o bem estar de seus funcionários e prestam atenção no desempenho de suas lideranças. E isso pode fazer com que tenhamos mais bons resultados que a média de todas as empresas do país, que infelizmente estão longe disso.

Esse é um bom ponto. Entretanto, não desmerece suas conclusões que correlacionam boas chefias com alta performance das equipes e bons resultados do negócio.

Eu já tive o prazer de trabalhar em uma empresa que foi considerada, no ano 2000, uma das melhores para se trabalhar no Brasil: a America Online. Vale dizer que ela chegou a ser considerada a melhor empresa para se trabalhar nos Estados Unidos, na época. Era praticamente uma unanimidade que aquele foi o melhor trabalho da vida de quem passou pela AOL, especialmente a primeira turma, que ajudou a trazer o negócio para o Brasil.

Não era só pela empresa, que oferecia excelentes condições de trabalho e um pacote de benefícios atraente. O principal motivo eram as chefias, que se enquadravam perfeitamente nos papeis de “educadores”, “democráticos” e principalmente “inspiradores”. Era uma corrente de energia positiva que fazia com que os funcionários fossem todos os dias para a empresa com vontade de criar um mundo melhor a partir do resultado de suas atividades.

Quem não quer trabalhar em um lugar assim?

Foi lá que eu tive a líder mais inspiradora de minha vida, que me permitiu conhecer a sua história e descobrir que ela era daquele jeito porque também tinha sido inspirada anteriormente. Foi lá também que tive o meu líder mais democrático, uma pessoa incrível que fazia com que todos oferecessem o seu melhor, ao colocar a equipe no centro das decisões, uma pessoa muito querida que a Covid-19 levou embora há três semanas. Isso nos deixou todos em choque, porque, 15 anos depois daquele trabalho, ainda o queríamos muito bem.

 

As vantagens de um “trem da alegria”

Os exemplos desses e de outros bons líderes que tive me ensinaram como conduzir uma equipe.

Quero que quem trabalhe comigo produza não porque tem medo ou porque está sendo pressionado. Não quero que trabalhem apenas por causa do salário no fim do mês. Para mim, é importante que façam algo que seja importante para si e para a sociedade, que entendam qual é seu papel no negócio e por que são fundamentais para a equipe. Quero que compartilhem comigo seus pensamentos, mesmo os que não forem agradáveis, pois tudo isso é necessário para o conjunto melhorar.

Quando eu finalmente estive do outro lado da mesa, comandando equipes pequenas ou grandes, pude fazer isso. Em todos os casos, eu colhi os resultados esperados.

Eu me lembro de uma colega me dizendo certa vez: “você é a pessoa mais democrática que eu conheço”. Não sei se era para ser um elogio, mas nunca mais esqueci daquela singela frase.

Mas nem todos gostam desse meu estilo. Principalmente nas empresas mais “quadradas” em que trabalhei, isso às vezes era mal visto. Em uma ocasião, um outro diretor veio conversar comigo, na verdade, fazer uma reclamação velada, que meu departamento era um “trem da alegria”, que as pessoas trabalhavam rindo e se divertindo. Eu perguntei por que aquilo o incomodava, se estávamos dando um excelente resultado.

E aí é que está: chefes coercitivos, autoritários não conseguem lidar com uma equipe com autonomia, que trabalha sua liberdade com inteligência, entregando o que deve, sem que alguém os esteja pressionando. Não é de se estranhar que essa empresa, que construiu uma posição de liderança em seu segmento ao longo de décadas, não resistiu aos novos tempos e acabou sendo vendida.

Por isso, salvo talvez entre militares, aquela história de “manda quem pode, obedece quem tem juízo” não tem mais espaço.

As empresas com um futuro brilhante são aquelas que preparam seus funcionários para exercer suas funções com autonomia, eficiência e prazer. Isso não é um “trem da alegria”: ninguém está brincando em serviço, muito pelo contrário!

Esse é o caminho para termos menos chefes coercitivos e mais líderes inspiradores.

“Trabalho digital” vira salvação de muita gente, mas tem “pegadinhas”

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O personagem Quico, da série mexicana Chaves: o “dono da bola”, exatamente como os serviços digitais – imagem: divulgação

O personagem Quico, da série mexicana Chaves: o “dono da bola”, exatamente como os serviços digitais

Fazer o seu próprio horário, gerenciar seus custos e seus ganhos e, acima de tudo, não ter mais chefe: quem não gostaria de um trabalho assim? Pois tem muita gente materializando esse sonho profissional, graças a serviços digitais inovadores. Mas não há negócio mágico, nem garantido. Na verdade, “trabalhos digitais” exigem dedicação e planejamento como qualquer outro, e ainda escondem algumas “pegadinhas” que quebram as pernas de muita gente.

As aspas em volta do “trabalho digital” existem porque, na imensa maioria dos casos, a coisa acontece de forma bastante convencional, sendo apenas viabilizados, de alguma maneira, por recursos digitais. E alguns profissionais caem nas armadilhas justamente por esquecer que as regras do mercado continuam valendo da mesma forma.


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Um bom exemplo é o Uber. Uso o serviço regularmente desde que ele chegou em São Paulo e sempre “entrevisto” informalmente os motoristas sobre como eles veem a experiência de dirigir o próprio carro para os outros. Com raríssimas exceções, a resposta é sempre positiva: eles gostam e veem naquilo uma maneira de conseguir exatamente as condições que abriram esse artigo. Por outro lado, todos eles também dizem que hoje precisam dirigir muito mais para ganhar o mesmo que ganhavam há alguns meses. Isso, claro, para aqueles que já têm mais de seis meses de volante, o que é a minoria.

A empresa não divulga a quantidade de motoristas que tem em São Paulo, mas eles mesmos estimam que hoje seja algo entre 30 mil e 40 mil. Como consumidor, é fácil notar que há mesmo muito mais carros na rua: se antes eu chegava a esperar mais de 10 minutos por um deles, hoje raramente espero mais que três. Claro! Em tempos de uma gravíssima crise de empregos no país, muita gente teve a mesma ideia, e resolveu dirigir para o Uber. Pela lei de mercado, com o aumento da oferta, os ganhos caem. Sem falar que a porcentagem que o Uber retém aumentou consideravelmente.

Outra coisa que me chama a atenção desde o começo é o nível educacional dos motoristas. Claro que existe de tudo, mas já cansei de pegar engenheiros, advogados médicos e outros profissionais normalmente muito valorizados topando guiar 12 horas por dia para poder pagar suas contas, diante do desemprego explosivo. O nível dos carros também varia bastante, mas há duas semanas fui surpreendido por uma BMW impecável vir me buscar, apesar de ter chamado um carro do Uber X, versão mais barata do serviço. O carrão não se classificava na categoria Black, a mais cara, por ser de 2013, portanto velho demais para os critérios da empresa.  O dono do carro, um homem de cerca de 45 anos, estava ali porque sua empresa havia falido, e não sabia o que fazer.

No final, a corrida deu R$ 16,75, dos quais 25% ficaram com o Uber. E aí está a grande pegadinha.

 

“A bola é minha: brinco como eu quiser”

Como consumidor, eu adoro o Uber! Mesmo me colocando no lugar dos motoristas, ainda acho que ele seja interessante, especialmente porque está sendo a saída de muita gente para ganhar algum dinheiro nesses tempos bicudos.

Mas claramente eles não têm tanta liberdade quanto imaginam, pois precisam trabalhar cada vez mais para garantir um ganho mínimo, e nas condições que lhes são impostas unilateralmente. E, se não são empregados de nenhuma empresa, na prática respondem, sim, para uma companhia, que, como qualquer outra, visa lucros. Por fim, se não há um chefe personificado em alguém, ele existe de fato no aplicativo que determina quem devem transportar, de que forma e a que custo. Mais que isso: pode lhes aplicar punições se não seguirem as regras da empresa.

O aplicativo é, portanto, um chefe insensível e implacável, com quem não se pode argumentar. Assim como dizia o personagem Quico, da série mexicana “Chaves”, a bola é dele, e todos têm que brincar do jeito que ele quer.

Mas é possível se divertir muito com a bola do outro. É só alinhar as expectativas.

 

De salvação a opção de vida

A essa altura, muita gente pode estar pensando que eu acho o “trabalho digital” algo ruim ou que o Uber explora os motoristas.

É exatamente o contrário disso!

Como disse acima, especialmente em tempos de crise, o uso inovador de tecnologia para criar empregos (ou pelo menos trabalho remunerado) é muito bem-vindo! O grande desafio é que isso deixe de ser apenas uma maneira de conseguir algum dinheiro para pagar as contas por falta de alternativa, e passe a ser uma opção de vida.

A primeira coisa a se fazer é parar de achar que existe uma mágica em torno disso tudo. “Não existe almoço grátis”, como diz o ditado. Quem pensa que vai criar uma fan page no Facebook e ganhar muito dinheiro vendendo qualquer coisa está muito enganado.

Como qualquer empreitada, é preciso conhecer bem as regras do jogo para fazer um modelo de negócios confiável. Seja Uber, Facebook, Mercado Livre, Airbnb ou qualquer outro serviço digital que possa virar nosso parceiro no negócio que estejamos nos metendo, temos que saber quais seu funcionamento, exigências, restrições, vantagens e desvantagens. Cada um tem o seu e o que funciona para um cliente pode não funcionar para outro. Portanto, muita calma nessa hora, para avaliar, sem deslumbramento, o que cada um tem a oferecer.

Além disso, deve-se estudar outros fatores, como quem é a clientela, a concorrência, as características do mercado, a legislação aplicável, fornecedores e outros parceiros, custos e riscos, para então descobrir boas oportunidades.  Os “trabalhos digitais” são muito sedutores porque criam oportunidades e abrem portas que muitas vezes sequer existiam no mês passado, e por isso são muito bem-vindos! Mas a maior parte do trabalho é bastante “analógico”, como qualquer outro negócio. Sem isso, corre-se o risco de engrossar a estatística do IBGE que diz que 60% das empresas brasileiras quebram antes de completar cinco anos.

O objetivo, portanto, é fazer todo esse planejamento com calma e detalhadamente. Assim, as expectativas ficarão alinhadas e os projetos serão bem construídos, evitando-se frustrações. E aí os “trabalhos digitais” brilham com força!


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